O QUE ALGUMAS ALMAS SE ESFOLARIAM PARA SABER

Texto íntimo de julho de 2009, ainda inédito.

Empenhado em descobrir duas respostas, com contornos e pormenores razoáveis.

1. Por que sou um monstro sagrado aos 21 anos de idade? Quais os ingredientes do coquetel do sábio?

Como obtive o conhecimento trágico – em nenhum livro. Uso óculos fundo de garrafa. Tive problemas com meu corpo – adolescência clássica. Instinto para vencer e separado da vitória por muitos anos. Tiranizado sobretudo no próprio lar. Conheci uma gama vastíssima de pessoas de todos os espectros e matizes. Vivi um namoro tumultuado e longevo. Conheci de um golpe só todas as artimanhas femininas. Fui tudo politicamente. Deus nunca foi um problema para mim. Porém eu vivenciei coisas mais espirituosas que qualquer um nas sinagogas. Já fui o cume do rebelde, a vítima preferida da turma, um líder, um capacho escuso. Mas mais do que tempo de Matusalém ou intensidade de Jim Morrison, eu entendi o princípio do perder e ganhar… Ah! Nunca trabalhei, por isso minha alma ainda é pura, jovial, energética. Eu sou frágil e doentio por fora ou de acordo com a medicina moderna, mas tenho uma robustez imensurável. Ando até cair, provoco meu próprio pensar até as últimas conseqüências, brinco de ser outros e desvendar suas psicologias. Fui a pessoa que mais “pagou micos” que conheço. Sou dotado de uma sensibilidade incomum. Uma simples baforada de cigarro ou dose de qualquer coisa são uma névoa transformadora. Ou uma frase, uma chuva, um insight, um toque… Super-excitabilidade, super-irritabilidade, super-resistência e concentração: aceito me impingirem a alcunha de ditador fisiológico. Obviamente o corpo é todo o responsável. Saúde não se mede em esteiras. Nem em multidões.

2. Como seria minha namorada perfeita? (Ah, o imponderável!)

Não falemos de aparência. Para começar ela deve ser submissa a mim sem o ser verdadeiramente. Há o tipo de menina mimada que na tua frente quer impor seus caprichos e mudar tua personalidade, mas que no frigir dos ovos te ama tanto que se adequa a tuas excentricidades. Esse tipo é vil e leva para o buraco. Adoro aquelas que acatam e silenciam mas têm suas próprias vidas, sem arroubos tresloucados. Eu devo impor condições como horários de visita e “não fazer meu telefone tocar”. De preferência não deve ser “namorada” nem deve haver a cláusula da fidelidade irrestrita de parte a parte. Aliás, conservar meus mistérios e não solucionar todos os dela me satisfaria. Inclusive, é mais recomendável a infiel que realmente te ama e respeita do que a parasita do amor exclusivo e desmedido, insuportável. Não precisa saber de Nietzsche – tem que ter a sabedoria trágica. Ser uma artista. Atriz, dançarina, que se realiza. Não deve se (nos) prescrever sexo tão assíduo e “linear” (as preliminares e a ansiedade do momento são infinitamente mais gostosas). Meu espaço: roupas, manias, leituras, gostos em geral… Não muito mansa para músicas, nada de filmes da moda. Mais velha que eu, mas quanto mais velho eu for, mais essa regra caducará. É preciso tolerar futebol e bar com os amigos, bem como períodos de intenso isolamento intelectual. Não querer ser mãe. Atualmente vivo contenção de gastos. Não deve ter pais ricos, família grande e chata, que requisite para almoços constantes.

A namorada perfeita tem de ter conversado muito comigo antes das segundas intenções de cada metade terem aflorado. A ponto de não havermos desconfiado desse novo futuro no princípio de tudo! Eu ainda não conheço uma pessoa assim. Quem, que mulher, do século XXI, com mais da metade da vida por viver, brasileira e um pouco insana, ainda tem algo para me ensinar e paciência para me conquistar? É redundante cobrar o seguinte de uma artista: que compreenda minhas críticas à categoria mulher. Sentir-se ofendida em algum grau é sinalizar estultice e brutalidade, o que não combina com jóias raras: eu sou o homem mais sensível que conheço e essa linha deveria não ser objeto do ridículo. É tudo uma questão de sistema nervoso mais bem-acabado e capaz. Sensibilidade motora, afeição à vida… Potência, espera. Quem ama espera, um excedente para ser queimado… Em gestos e diálogos, mas até na distância e incompreensão. A mulher mais perfeita vai ter trejeitos masculinos, certa indiferença quanto ao “chocante que é banal” no cruzamento dos gêneros (baratas, por exemplo). Os mais sensíveis são andróginos. Mulheres são pérfidas, não têm fundamento, tenho medo delas, necessito sempre de uma barreira. Engula isso e estará apta. Nunca fui covarde, mas minhas experiências me fazem pensar que pular do barco é melhor que ser um náufrago. Estas duas linhas finais eu deixo para completar mais tarde… _____________________________________________________________________________________________.

                                                                                                  

MEA CULPA

Originalmente publicado em 1º de fevereiro de 2009 – com alterações

Tive meus anos de 2005, 2006 e 2007 pautados pelo liberalismo econômico mais ortodoxo. Relacionei-me com veículos de comunicação, pessoas e defendi idéias que não queria – não quereria, é dizer, se pudesse medir as conseqüências hoje. Me defrontei com muitas instituições, programas, crenças e vidas. Gerei polêmica, gerei tumulto. Em sala de aula ou em ambientes de trabalho. É verdade que, receber, eu jamais recebi por isso um só tostão. Até em paradas de ônibus na calada da noite eu me engalfinhei com desafetos (nem que apenas imaginários). Claramente havia uma atmosfera que me infectava, um acontecimento político escandaloso, a desilusão do passado (do infrutífero século XX), um curso superior errado, o impulso por ser contrário ao vigente, personalidades de cuja paralisia eu precipitadamente me alimentava.

Poderia elencar as principais figuras vivas, e os principais projetos em que me engajei (me enredei, vi depois) neste período, plantando desesperança e querendo colher a realização da liberdade: Diogo Mainardi, e sua sedutora e espetacularizante retórica – hoje eu não sei quem é esse homem, o que ele escreve ou deixa de escrever; Ga***** ***** – que me achem, esses indivíduos, no Google, se puderem –, o “presidente inteligente popular amigão” que atualmente enxergo lá embaixo como tendo sido uma trava temporária (ele era presidente de uma ‘limitada’ de adolescentes faz-de-conta, não se formava por incompetência, apenas puxava o saco de algumas patricinhas, era somente uma daquelas crianças rejeitadas que cresceram com seu amor pelos videogames e pelo Tio Sam sem saber o preço de uma amizade); Ra***** *****, um antiquado um pouco mais genioso que a rede de amigos geeks¹ ao seu redor, que pensa em “entabular diálogo” como “impor o meu falo”; professores muito… pessimistas; blogs em que trabalhei “querendo raciocinar em conjunto”, mas em que descobri o sobrepeso da minha opinião pessoal, dentre os quais o Abrigo Polar, o Horário de Brasília, As Fantas, o Bicarbonato de Sódio. Mi******, talentosa mas desorientada, R*****, Ma*****, um maluco ou outro da internet, Peu L*****, o adulterador de textos, Ca****, a chefe invocada, M***** S****, a de humor contagiante, colegas de ex-faculdade (ou ex-colegas de faculdade), todos me passam batido. Tem ainda o demoro.com, os jornais em que estagiei como clandestino. Seria impossível lembrar de tudo de uma lapada só.

¹ Cabe aqui esclarecer por que utilizo geeks e não nerds, uma etimologia arruinada que confundiria meu leitor – enquanto ser pensante eu ser considerado na maioria dos círculos jovens como nerd, com ou sem óculos, é auto-explicativo o bastante. Meu conceito de nerd/geek é: aceitar o mundo adulto só no que ele tem de eufórico: o aumento de poder, o carro, a bebida, as mulheres, as festas, as compras, poder olhar de olhos caídos alguém na rua e rumar para casa. Mas recusar as responsabilidades. Às vezes o nerd lê quadrinhos demais e esquece que por trás de toda a tecnologia do fabrico e a aparência há o fator humano e que nem tudo é uma rodada no Outback. Como o tio Ben do Homem-Aranha já dizia… (a frase todo mundo sabe) Porém, ninguém aqui quer saber o que implica o trabalho. Quando você cresce e seus amigos não, fica essa dificuldade de definição: o que há com eles? É precisamente isso: um estranhamento inter-geracional, porque você amadureceu mais depressa.

Este artigo não pode se resumir à modalidade acusatória. Também trago uma receita para um melhor entendimento de onde se pisa: 1) caminhar muito ao ar livre, se possível debaixo de sol forte e com roupas pesadas. Ou melhor: tentar os mesmos trajetos em diferentes horas do dia. Quando se está um pouco bêbado e se passa por uma cidade suja, escura, desolada e insolúvel não se acredita mais no capitalismo. 2) de vez em quando desligue a música e a TV e coma uma refeição em silêncio!

Continuando o que ia dizer, 2008 foi o ano da virada. E este texto é só mais uma pedra.