[ MILÉSIMO POST DO SECLUSÃO ANAGÓGICA ] THE ILLUSION OF THE END – Jean Baudrillard, 1994 (altamente comentado) [ #1000 ]

14/10/16 a 06/11/16

English translation from French by Chris Turner. Tradução do inglês ao português por mim.

history has become impossible because telling (recitatium) is, by definition, the possible recurrence of a sequence of meanings.”

No event can withstand being beamed across the whole planet.” “to pursue the same train of thought: no sexuality can withstand being liberated, no culture can withstand bein hyped, no truth can withstand being verified, etc.”

Matter shows the passing of time. To put it more precisely, time at the surface of a very dense body seems to be going in slow motion. Beyond a certain limit, time stops and the wavelenght becomes infinite.”

Qual seria o sentido de crianças nascendo mesmo após meu nascimento? I.e., do ponto de vista do combate ao niilismo. Porque se, para mim, mesmo os adultos são bebês gigantes com idéias de ter filhos e netos, trancados no ciclo da esterilidade, cuja trilha sonora é um grito estridente duma criança levada que ralou o joelho no parque… O tempo está estacionado na vaga dos deficientes.

Deep down, one cannot even speak of the end of history here, since history will not have time to catch up with its own end. Its effects are accelerating, but its meaning is slowing inexorably.”

Há uma terceira hipótese (…) o efeito estereofônico. Nós somos todos obcecados por alta fidelidade, pela qualidade da ‘reprodução’ musical. Nos consoles de nossos estéreos, abastecidos de tuners, amplificadores e microfones, misturamos, ajustamos, multiplicamos faixas em busca da batida perfeita. Isso ainda é música? Onde está o limite da alta fidelidade além do qual a música desaparece enquanto tal?” “ela desaparece em seu próprio efeito especial.” “É o êxtase e o fim da musicalidade.”

that famous feedback effect, which is produced in acoustics by a source and a receiver being too close together”

a short-circuit between cause and effect like that between the object and the experimenting subject in the microphysics” Re-re-re-re-re:RE:FWD:ENC-re-remaster of Reality

Cada bebê recria a sua Matrix. E só atinge o real em retrospecto. A revolução é mera nostalgia e arrependimento – e se?

We shall never get back to pre-stereo music (except by an additional technical simulation effect)”

Quem se recusa a esperar, espera do mesmo jeito.

Quem espera ardorosamente, na verdade faz tudo menos esperar.

Qual é a sua importante resolução?

800×600.

Baudrillard, o eterno canalha indiscordável. O autor da fascinação. Odiamo-lo, mas sempre concordamos com ele. Queremos profundamente que ele não esteja certo, mas pressentimos que está. A pobreza, recorrência e esterilidade – deliberada? Haha, qual a diferença? – de seu discurso nos resume, nos explica. Não podemos sequer simular que o superamos, ele é onipresente. Ele não foi o primeiro discurso branco (white noise, white text, white logos) intentado, mas é o primeiro consumado. Seria uma contradição dizer que é uma singularidade histórica? Ele desafia a máxima do “é possível ser filósofo a qualquer tempo”; estabelece-se como o último. Ou o primeiro de nós. Se ainda é possível não ser um Baudrillard, nascemos na época errada. É possível iniciar de forma diferente, mas ele é a conseqüência inelutável. Quando se tornar velho não será viável refutá-lo, porque então não terá o mesmo sentido a palavra “contradição”.

on edge – that is, both overexcited and indifferent”

Keith Beaumont, Alfred Jarry: A Critical and Biographical Study

A ARTE DA DETERRÊNCIA: Empurrando as revoluções com a barriga. Temos ainda muita gordura petrolífera para queimar. Deterrence is a very peculiar form of action: it is what causes something not to take place.

Marvel apresenta: O Homem que Congelou a Roda da História

Teria Alexandre realmente feito história? Historicamente feito realidade? Ponha um grande homem na frente de uma criança de 3 anos e veja-o convertido subitamente num pateta universal.

Kant, O Pataphýsico do Meião

Teleologia das 4 Patafísicas

Fenomenologia Ubuana

Patafísica Concreta

Patafisicismo Histórico-Dialético Positivista

Catecismo Patafísico

Patafisiquismo Empírico

Tu não vales meia metafa – BQT Somewhere

½ ½ ½ 3 legs

3 lags of a

2nd Messiah

A patafísica de Cristo final lapada na rachada

Os Fundamentos da Patafísica Moderna – Novo A Mosca?

apenas subtítulo… A Mosca Filosófica & Outras Estórias…

FM & Outras Estações

Neminhanamoradamelevasério

A Música Patofúsica

A liquidação da Patafísica

a $1,99

Morrenvenenado

Jarry, Exploits and Opinions of Dr. Faustroll

Veículo Cerebral Só Visível no Invisível Mapa Mental do Gênio

A Patafísica Antológica – Recipiente Líq. II – The Fly…And Other Detritus

O EXPERIMENTO ANTICAPES

ASSINE A PESTIÇÃO POR UMA VIDA

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O universo é insetocêntrico.

A mariposa gira ao redor do Sol, desse Galileu Copo&Nico, o cientista com Asas – mas não seria o inverso, ó vôo relativo?

Os homens sobrevoam sua cabeça estacionária cheia de merda, tenho a certeza.

A cabana sobrevoa sua banana

A mucama voasub sua cruz

A Multiplicidade Concreta das Bolhas Atômicas

A Guerra Quente Nua que Há – Que Continua

A decência da Subida ao Vácuo

A Meridionauta Contra o Austronato

Eu não me recordo do título do meu livro;

Eu não me livro do título que recordo.

A força anormal que contrapõe a anti-gravidade.

D-Sire

Resided on The (D) Resistance

Past Tense

Nowadays Tranquility

Rope you find the hope

Todo Rousseau tem o seu Locke-fechadura.

Todo rousse tem o seu au mericano.

Pp. 18-9: “escape the heavy form, the gravity of ‘desire’, conceived as positive attraction, by the much more subtle eccentricity of seduction (…) the last gasp escape from the body of molecules that are much too light [not dark!]

Pope’s eye beholding the espinafrican. SPIN NACH(E)

O africano giratório

seclusion of reality

SECLUSÃO ANAGÓGICA – ótimo título em termos de oferta e demanda se é que mentende. (22/10/16, momento em que escolhi o título do blog.)

If, by some strange revolution, we set off in the opposite direction and turn inwards into this dimension of the past, then we can no longer represent that something to ourselves. The beam of memory bends, and makes every event a black hole.”

Depois da Ciência Histórica, na velocidade de alguns Hegels, a Probabilidade. Depois da Ciência Probabilística, no ridículo espaço de uns 15min, o link jornalístico sem maquiagem.

Como artistas, não nos sobra nem a energia para terminar nosso quadro.

Celebration and commemoration are themselves merely the soft form of necrophagous cannibalism, [necromicrophysics] the homeopathic form of murder by easy stages. This is the work of the heirs whose ressentiment towards the deceased is boundless. (…) complete works, the publication of the tiniest of unpublished fragments (…) active age of ressentiment

Um jogo quântico de RPG em que jogar o dado é banal.

A aristocracia celebra sua própria queda, porque só a aristocracia celebra. Mais, só a aristocracia cai.

We eliminate St.-Just from the Dictionnaire de la Révolution. ‘Overrated rhetoric’, says François Furet, perfect historian of the repentance of the Terror and the glory.”

the centenary of a death. With Rimbaud, Van Gogh and Nietzsche, 1991 will have been exceptional in terms of vile acts of desecration.”

If the left were a species, and culture obeyed the laws of natural selection, it would have disappeared long ago.” Fortunately for us, we are zombies.

Ficarei cego e exorcizado após tudo ter lido. Até um Diogo, um Ueslei, sangue do meu sangue, reprovaria incêndios bibliotecários… Alexandria, o pecado do sapato de ponta fina.

HELLCICLAGEM O Incinerador de Sonhos, que levará junto alguns resíduos. Velocidade Alucinante do Sereno

Preguiça, o Primeiro Não-Pecado dos Meus-Filhos

P. 24: “The century is becoming intellectual today just as it became bourgeois a century ago.”

the word ‘burgeois’ – which now exposes only the person who uses it to ridicule”

The little trick of placing the nude from Manet’s Déjeuner sur l’herbe opposite Cézanne’s Card Players, as one might put an admiral’s hat on a monkey, is nothing more than the advertising-style irony currently engulfing the world of art.” The Facebookians

É como se a história estivesse pilhando em meio ao seu próprio lixo em busca da redenção lixosa.”

Onde jogaremos o Marxismo, que vem a ser aliás o pai dos lixos da história? (Ainda há alguma justiça aqui, já que as mesmas pessoas que geraram o lixo caíram dentro da lixeira.) Conclusão: se não há mais lixos históricos, é porque a história propriamente dita se tornou um lixo.

Quando o gelo congela, todo o excremento emerge à superfície. Então, quando a dialética congelou, todos os dejetos sagrados da dialética vieram à tona.”

O PROBLEMA DA ECONOMIA DOS RESTOS OU DO RESTO: “ideologias defuntas, utopias abandonadas, conceitos mortos e idéias possibilizadas, que continuam a poluir nosso espaço mental. A recusa histórico-intelectual cria um problema ainda mais sério que os restos industriais. Quem vai nos livrar da sedimentação de séculos de estupidez? (…) O imperativo ecológico é que todos os resíduos devem ser reciclados.”

O Corpo Que Bóia, Inanimado, na Lagoa Rodrigo de Freitas, hitchcockian classic.

Ionesco, Amédée, ou Comment s’en Débarrasser (peça)

Um velho nostálgico conta o quê? Vintage!

Democracy itself (a proliferating form, the lowest common denominator of all our liberal west common societies); this planetary democracy of the Rights of Man, is to real freedom what Disneyland is to the imaginary.”

O que foi superplantado está sob a terra.

sóbrio elefante e a tartaruga de meia-idade

Onde estão os fragmentos póstumos resultantes da exumação do cadáver do Baudrillard?

History has only wrenched itself from cyclical time to fall into the order of the recyclable.”

A China e sua burocracia de dragões fossilizada é logo ali!

the problem of liberty quite simply cannot be posed here any longer. In the West, freedom – the Idea of Freedom – has died a natural death: In the East it was murdered, but there is no such thing as the perfect crime.”

Philippe Alfonsi, Au nom de la science (livro sobre a ‘memória d’água’!)

glasnost? it is almost a post-modern remake of our original version of modernity (…) all the positive and negative signs combined: not just human rights, but crimes, catastrophes and accidents which are all joyously increasing in the ex-USSR since the liberalization of the regime.” “The irony of the situation is such that it will perhaps be us who are one day forced to rescue the historical memory of Stalinism, while the countries of Eastern Europe will no longer remember the phenomenon.”

We are in the process of wiping out the entire 20th century, effacing all the signs of the Cold Wars one by one, perhaps even all trace of the Second World War and of all the political or ideological revolutions of the 20th century. The reunification of Germany is inevitable (…) a rewriting which is going to take up a large part of the last 10 years of the century. At the rate we are going we shall soon be back at the Holy Roman Empire.”

Restoration, regression, rehabilitation, revival of the old frontiers, of the old differences, of particularities, of religions – and even resipiscence [re-sapiência] in the sphere of morals.”

Ecstasy and beatification should not be confused.”

the astonishing pre-eminence in the media of the figure of the Pope, who travels the whole world (even the Islamic Sahel!) blessing all forms of crossbreeding and repentance, while ensuing that durable forms of voluntary servitude are in place.”

we are witnessing the striking illustration of what Hegel calls ‘the life moving within itself, of that which is dead’ [Das sich in sich selbst bewegende Leben des Totes.].”

the strange ease with which all the communist regions collapsed: they had only to be touched for them to realize that they no longer existed. It was like a cartoon, where the tightropewalker, teetering over the abyss, suddenly sees his rope is gone and immediately falls, passing without transition from the imaginary to the real (this the basic mechanism of cartoons).”

Freud saw very well those strange attractors that are condensation, displacement, ellipsis and reversibility. Forms, not values. And recent events have to be seen in terms of a theory of forms, rather than any kind of theory based on relations of force. The communist systems did not succumb to an external enemy, nor even to an internal one (had that been the case, they would have resisted), but to their own inertia; taking advantage of the opportunity, as it were, to disappear (perhaps they were weary of existing.)” “Now, this form of superconductivity of events is a marvellous one, like the form of the joke

The non-existence of governmental power is, admittedly, less visible in the West, on account of its great dilution and the transparency which enables it to survive. In the East, it was opaque and highly concentrated, to the point that, as with an unstable crystal, only an extra little dose was needed for it to liquefy.”

Behind the apparent victory of the West, it is clear, on the contrary, that the strategic initiative came from the East, not by aggression this time, but by disintegration, by a kind of offensive self-liquidation, catching the whole of the West unaware. By force of circumstance, which may have equated with a perception of his own weakness, Gorbachev was able to take this strategic tack of disarmament, the real deconstruction of his own bloc, and thereby of the entire world order. This was, in a way, dying communism’s witty parting shot

Let us beware of the naïve vision of a frozen history suddenly awakening and automatically heading once again, like a turtle, for the sea (for democracy).” “The East gobbling up the West by blackmailing it with poverty and human rights.”

Chernobyl whose radioactive cloud prefigured the collapse of the wall and the progressive contamination of the Western world. Bush may well disarm in the pretence of having won the Cold War, but it is the USSR and Gorbachev who invented the real bombe à depression, the surest one, the one which turns its own depression into a bomb.”

German¹ would describe this kind of transcendent high spirits, of historical rejoicing in sudden change, as Übermut. [além-coragem; super-ânimo]You have the Mut, you have the guts.

¹ Pode se referir a:

a) Aleksei Yuryevich German (Russian: Алексей Юрьевич Герман, IPA: [ɐlʲɪkˈsʲej ˈjʉrʲjɪvʲɪdʑ ˈɡʲermən]; 20 July 1938 21 February 2013) was a Russian film director and screenwriter. In a career spanning five decades of filmmaking, German completed 6 feature films,(*) noted for his stark pessimism, long, serpentine sequence shots, black and white cinematography, overbearing sound design and acute observations of Stalinist Russia.

(*) 1967 – Sedmoy sputnik (The Seventh Companion)

1971 – Proverka na dorogakh (Trial on the Road)

1976 – Dvadtsat dney bez voyny (Twenty Days Without War)

1984 – Moy drug Ivan Lapshin (My Friend Ivan Lapshin)

1998 – Khrustalyov, mashinu! (Khrustalyov, My Car!)

2013 – Trudno byt’ bogom (Hard to Be a God) (original title History of the Arkanar Massacre)“Trial on the Road (1971) is the film that made Alexei German famous. It was banned for 15 years and was shelved by the Ministry of Culture of the Soviet Union until its release (1986) during the Gorbachev era.”

b) Yuri Pavlovich German: “His best-known work, Ivan Lapshin (1937), was a police novel in a provincial setting whose main theme was the integration of criminals into society through order and labor. In this sense it resembles old bandit tales in which outlaws are reintegrated into society by colluding with the authorities. The novel incorporates a vision of collectivity (the policemen live in a commune), rationalism, culture, and social tranquility unperturbed by the black discord of crime. For good measure, Lapshin acts as mentor to his junior colleague. All of this is captured, with a twist, in the brilliant film version, My Friend, Ivan Lapshin made by the author’s son, Alexei German in the 1980s.”

c) Lindsey Ann German (born 1951) is a British left-wing political activist. A founding member and convenor of the British anti-war organisation Stop the War Coalition, she was formerly a member of the Socialist Workers Party, sitting on its central committee and editor of its magazine, Socialist Review.” Obras que Baudrillard pudesse ter lido até escrever Illusion of The End: Sex, class, and socialism (1989); Why we need a revolutionary party (1989).

Evil takes advantage of transparency (Glasnost).” eviral

it shows through in all things when they lose their image, when they no longer offer any substance, when they become both immanent and elusive from an excess of fluidity and luminosity.”

não será mais a violência da Idéia, mas o vírus da queda da imunidade.”

A communism that dissolves itself is [in!] a successful communism.”

what’s after the God of the social?

O doente que não pára de enfraquecer; sem morrer. Adoecendo até as raias do absurdo. Já é um ser-doença, com um espectro de homem como parasita. Alergia assintomática. Inatestável. Imanente ao mundo dos desespecializados. Chiclete da alma. Mago do trouxa. Olhando-se no espelho? Rachaduras nos 4) encantos.

Dissidents cannot bear a thaw. [o descongelamento] They have to die, or else become president (WalesaHavel²), in a sort of bitter revenge which, at any event, marks their death as dissidents” Lula, Mandela… Se o Lula não se tornou o establishment (não foi engolido pela Globo após um, dois, três mandatos, etc.), podemos nos considerar felizes por isso: morrerá para se eternizar como um dissidente do espectro progressista, sempiterno ícone desse projeto de país de meio-milênio!

¹ Presidente da Polônia nos anos 90.

² Caso curioso, porque foi presidente da República Tcheca, novo país, mas eleito tanto pelos cidadãos da Rep. Tcheca quanto pelos da Eslováquia, ex-território. Morreu em 2011.

They whose strength was in silence (or censorship) are condemned to speak and be devoured by speech.” Andrei Sakharov;¹ Zinoviev.

¹ Físico nuclear que depois virou ativista pró-desarmamento – quantas camadas de ironia não há nessa sinopse? Obviamente o Ocidente vai laureá-lo com o Nobel da Paz em 1975, como não! E depois distribuir um outro prêmio anual com seu nome, como se faz sempre com heróis advindos da Cortina de Ferro (fabricados à la Tio Sam).

Cioran: history is dying for want of paradoxes

ThirdWorld War”

For the human and ideological failure of communism by no means compromises its potency and virulence as an anthropological model. (…) stratégie du pire imposed on everyone as the last immune defense.”

It would be the opposite of Orwell’s prediction (strangely, he has not been mentioned of late, though the collapse of Big Brother ought to have been celebrated for the record, if only for the irony of the date Orwell set for the onset of totalitarianism which turned out to be roughly that of its collapse). Even more ironic is that we are threatened by the democratic rewriting of history: the very images of Stalin and Lenin went away, streets and cities renamed, statues scattered, soon none of all that will have existed.”

Eliminating the planet’s blackspots [ironia africana] as we might eliminate spots from a face: cosmetic surgery elevated to the level of the political, and to Olympic performance levels.”

A zona única chamada Infernéu, o Além-agora.

Fusion always turns into confusion, contact into contamination.” “networks transmit viruses even faster than information”

It is Dracula against Snow White (the Dracula myth is gathering strength all around as the Faustian and Promethean myths fade).” “The danger is to feed them too quickly, since this kills them.”

We had never seen anything like this before – the strongest State and largest army in the world fainting right away.” “What should have been a source of universal rejoicing passed off almost without interest – a sign of the nullity of the age.” “The end of empires means the unrestricted reign of slave micro-systems.” “The energy of the corpse is recycled, just as Jarry had dead man pedalling”

even the recognition of death, the intuition of that death (of the political) is impossible, since it would reintroduce a fatal virus into the virtual immortality of the transpolitical. [os mini-Estados condenados eternamente à imanência] There is the same problem with freedom: a non-violent, consensual, ecological micro-servitude, [a Gaia] which is everywhere the successor to the totalitarian oppression. [‘Seu porco estalinista, jogue esta casca de banana no lixo, seu genocida das futuras gerações!’]Incrível que eu o tenha digitado em 25/10/16, insuspeito do genocídio (nada ecológico, é claro) que se aproximava… No momento em que digito este trecho para publicação no Seclusão, 0h15 de 6 de maio de 2023, uso máscara, uma KN95, porque sou terrivelmente alérgico a ácaros e estou remexendo em papéis velhos, onde anotei estas aspas de Baudrillard… É como reviver aqueles meses de agonia… um pouco. Comentando também sobre Stalin, quando ele definitivamente volta à baila significa: a História voltou a andar. Des-revisionismo em ação.

É preciso desistir de algo a fim de verdadeiramente alcançá-lo. (Só os grandes homens entenderão.)

O fato de Marx ter errado o vencedor não depõe contra a exatidão da análise marxista de forma alguma, só acrescenta a ironia objetiva que faltava. O destino cuidou do assunto. Foi como se um gênio mau [evil genie] tivesse substituído um pelo outro – o comunismo pelo capitalismo – no último momento.” “Uma admirável divisão do trabalho: o Capital realizou a tarefa do Comunismo e este morreu no lugar do Capital. Mas isso pode facilmente revirar.” “Mas isso também é parte da ironia da história: a inversão do propósito final – a ilusão final.”

O Capital canibalizou toda a energia negativa, a da história e a do trabalho, numa – literalmente – operação sarcástica (…) O que vemos diante de nós é o triunfo paródico da sociedade sem classes (…) o cozinheiro [chef] se torna chefe de Estado, ou quase (já vimos pior desde que Lenin proferiu este seu velho sonho). (…) de qualquer forma, quando o Estado deixa de ser Estado, o cozinheiro deixa de ser cozinheiro. Como Brecht disse, o fato da cerveja não ser mais cerveja é harmoniosamente compensado pelo fato do cigarro não ser mais cigarro também. Logo, a ordem irônica está salva.”

Gorbachev is giving up Marxism! Fantastic! But what does <giving up> mean? Can you give up Marxism in the way you give up tobacco or alcohol? Can you give up your father and mother? Can you give up God? In its time, the Church has come close to giving up the Devil or the Immaculate Conception, but this has not occurred. Renunciation is the symmetrical and opposite movement to faith – as absurd and useless. If things exist, there is no use believing in them. If they do not exist, there is no use renouncing them.” “What if one day the West too were to renounce capitalism?” « Et si un jour l’Occident était forcé de ressusciter le marxisme, qui fait quand même partie du patrimoine, que diable (le Diable aussi d’ailleurs) ! »

« desimulation » pela primeira vez no autor (p. 54).

virtual is what puts and end to all negativity”

The highest pressure of news corresponds to the lowest pressure of events and reality [le réel].”

only information has sovereign rights, since it controls the right to existence.”

Vingança pela quietude da alma.

There is no worse mistake than taking the real for the real and, in that sense, the very excess of media illusion plays a vital disillusioning role. In this way news could be said to undo its own spell by its effects.” “Television and the media world render reality [le réel] dissuasive, were it not already so.”

soaking up the sulky sucking

Saddam, who will in the end have been nothing but that fairground dummy you shot at from point-blank range, had to be saved.” Anedota: Baudrillard morreu 3 meses após Hussein.

A TV é imunizadora.” E as redes sociais são ataques à imunidade. A predominância das redes sobre a televisão é irreversível e natural.

the most odious Realpolitik: the Shi’ites, the Kurds, the calculated survival of Saddam…”

The Stoics contest the very self-evidence of pain, when the body’s confusion is at its height. Here, we must contest the very self-evidence of war, when the confusion of the real is at its height.”

In a little time it will be possible to read La guerre du Golfe n’a pas eu lieu [1991] as a science-fiction novel (…) Like Borges’ chronicling of cultures which never existed.” “Anyhow, the book has fallen – quite logically – into the same black hole as the war.” É este humor buraco negro que tanto admiro no meu ídolo Jean Baudrillard. Somos escritores-gêmeos. Não o digo para prodigalizar meu talento, mas nosso temperamento e falsa auto-depreciação são idênticos – talvez eu não saiba, mas modelei os meus nos dele, pois meu primeiro contato com sua obra foi ao redor de sua morte, quando eu chegava a meus 20.

It was the simulacrum of Helen that was at the heart of the Trojan War. The Egyptian priests had held on to the original (we do not know what became of it) when she set out again with Paris for Troy.” “the universal form of beauty is as unreal as gold the universal form of all commodities.”

P. 66: “Dianismo” [conceito meu, Princess Diana]: o demagogismo do discurso de ajuda ao próximo, sobretudo às crianças sem pais (pais = dinheiro) do famélico Quarto Mundo. Carência alheia como atalho covarde para a fama. Espetacularização do indigentismo.

…AND REPENTANCE FOR ALL

Laras Crofts nos escombros de outras sociedades…

Lúcia Maria no Lixão com Grafites Residuais na Ilha dos Porcos-Subomens

Sebastiões Salgados, Uni-Vos!

Como é doce o som da fome e do caos!

Há CPFs e CNPJs que vivem só de “denúncia anônima”.

annihibalism

The sacrifices we offer in return are laughable (a tornado or two, a few tiny holocausts on the roads, the odd financial sacrifice)”

the demographic catastrophe, a veritable epidemic which we deplore each day in pictures.”

One day it will be the Whites themselves that will give up their whiteness.”

Because it is unable to escape it, humanity will pretend to be the author of its destiny.”

Uma memória hipertélica que armazena todas as informações num estado constante de recuperabilidade instantânea, excluindo qualquer trabalho de luto, qualquer resolução do passado. O Inconsciente é já algo desse tipo. Ele não conhece passado nem esquecimento, não é arcaico nem arqueológico. Ele é, ao contrário, um perpétuo presente, uma instantaneidade de todos os eventos físicos, que aparecem em sua superfície em uma contínua, potencial passagem ao ato. Paradoxalmente, por conta desse zeloso esforço para trazer de volta à tona, de uma maneira forçada, o que nós mesmos nem lembramos mais, vivemos num mundo tanto sem memória como sem esquecimento. Isso é como o céu – ou o inferno – deve ser: o reconhecimento maciço, a cada momento, de todos os padrões de nossa vida. A imortalidade penitente e penitenciária, a imortalidade carcerária de uma memória implacável.”

75: ainda sobre as Lascaux “simulacra” caves.

Quando confrontados com as pinturas nas cavernas, os povos do século XVIII não podiam acreditar nelas. Eles as viam como uma mistificação criada por libertinos para ridicularizar a Bíblia (dizia-se que as cavernas haviam sido pintadas para fazer com que os outros acreditassem numa humanidade ante-cristã).”

Assim como com aqueles objetos de que Freud fala, que, por estarem o mais próximos dos órgãos sexuais femininos, fazem o seu papel durante as alucinações sexuais, fetichizamos fósseis e relíquias porque eles são o que há de mais parecido com nossa origem perdida e são-nos substitutos de uma possível origem.

Secretamente, preferimos não ser mais confrontados com o original. Tudo que queremos é o copyright.”

OS HUMANO-BACTÉRIAS: “Será que o total do futuro vai se exaurir nessa síntese artificial do passado? Quem sabe aonde este gigantesco movimento retrógrado poderá nos levar? Seria ele uma fase efêmera em nossa pós-história, e, conseqüentemente, um fenômeno cultural, ou será um desenvolvimento de significância ainda mais profunda, relacionando-se com o destino da espécie, ou até além, com oscilações de um tipo cósmico? (Com o girino, logo que o ápice da sexuação é atingido, há involução rumo a formas mais precoces de reprodução. Estaria o ser humano reinventando a clonagem biológica no ponto final de uma história sexuada?)”

Somos sou a última singularidade

logo serei inconfundível com o protótipo de último homem, que não poderá mais se reproduzir.

Que espécie de quadro irá se mover sozinho?

Estrelas continuarão estourando?

Idealization always goes with abjection, just as charity always goes with destitution.”

A natureza vira coisa (modernidade) para depois virar sujeito (pós-modernidade) (mau sinal): não há outro; há apenas sujeitos – e, logo, logo, só sujeitos sem objetos.”

Biosphere 2, o primeiro “zoológico humano”, Arizona. Status: fracassado.

https://en.wikipedia.org/wiki/Biosphere_2

Especially during the first year, the 8 inhabitants reported continual hunger. Calculations indicated that Biosphere 2’s farm was amongst the highest producing in the world <exceeding by more than 5x that of the most efficient agrarian communities of Indonesia, southern China, and Bangladesh’.” Ou é mentira ou realmente os americanos são obesos incuráveis…

They consumed the same low-calorie, nutrient-dense diet that Roy Walford had studied in his research on extending lifespan through diet.” Mas faltou carne.

The oxygen inside the facility, which began at 20.9%, fell at a steady pace and after 16 months was down to 14.5%. This is equivalent to the oxygen availability at an elevation of 4,080 metres (13,390 ft). Since some biospherians were starting to have symptoms like sleep apnea and fatigue, Walford and the medical team decided to boost oxygen with injections in January and August 1993.”

After Biosphere 2’s first mission, extensive research and system improvements were undertaken, including sealing concrete to prevent the uptake of carbon dioxide. The second mission began on March 6, 1994, with an announced run of 10 months.”

On April 1, 1994, a severe dispute within the management team led to the ousting of the on-site management by federal marshals serving a restraining order, and financier Ed Bass hired Steve Bannon, then-manager of the Bannon & Co. investment banking team from Beverly Hills, California, to run Space Biospheres Ventures.”

At 3 a.m. on April 5, 1994, Abigail Alling and Mark Van Thillo, members of the first crew, allegedly vandalized the project from outside, opening one double-airlock door and 3 single door emergency exits, leaving them open for about 15 minutes. Five panes of glass were also broken. Alling later told the Chicago Tribune that she ‘considered the Biosphere to be in an emergency state … In no way was it sabotage. It was my responsibility.’ About 10% of the Biosphere’s air was exchanged with the outside during this time, according to systems analyst Donella Meadows, who received a communication from Alling saying that she and Van Thillo judged it their ethical duty to give those inside the choice of continuing with the drastically changed human experiment or leaving, as they didn’t know what the crew had been told of the new situation.”

Mission 2 was ended prematurely on September 6, 1994. No further total system science has emerged from Biosphere 2 as the facility was changed by Columbia University from a closed ecological system to a ‘flow-through’ system where CO2 could be manipulated at desired levels. § Steve Bannon left Biosphere 2 after 2 years, but his departure was marked by an ‘abuse of process’ civil lawsuit filed against Space Biosphere Ventures by the former crew members who had broken in. Leading managers of Biosphere 2 from the original founding group stated both abusive behaviour by Bannon and others, and that the bankers’ actual goal was to destroy the experiment. During a 1996 trial, Bannon testified that he had called one of the plaintiffs, Abigail Alling, a ‘self-centered, deluded young woman’ and a ‘bimbo’. He also testified that when the woman submitted a 5-page complaint outlining safety problems at the site, he promised to shove the complaint ‘down her throat’. Bannon attributed this to ‘hard feelings and broken dreams’.”

Os fascistas estragam tudo que tocam. Descrição de Baudrillard agora: “Outside Tucson, in Arizona, right in the middle of the desert, a geodesic glass and metal structure accommodating all the planet’s climates in miniature, where 8 human beings (4 men & 4 women, of course) are to live self-sufficiently, in a closed circuit, for 2 years, in order – since we are not able to change our lives – to explore the conditions for our survival.”

Man is also a scorpion, just as the Bororo are arara(*) and, left to himself in an expurgated universe, he becomes, himself, a scorpion.

(*) Arara is a name of Tupi origin for a bird of the genus Ara which includes the macaws (French: aras).”

Secretamos significados como o escorpião secreta seus venenos.

Segredamos significados como o escorpião secreta seus venenos.

Homem, o grande cretino.

That is the terroristic dream of the transparency of good, which very quickly ends in its opposite, the transparency of evil. § We must not reconcile ourselves with nature.”

espaço siderreal – certamente não são Adão e Eva ressuscitando: “The elimination of all sexual reproduction: it is forbidden to reproduce in Biosphere 2; even contamination from life [le vivant] is dangerous; sexuality may spoil the experiment. Sexual difference functions only as a formal, statiscal variable [não podiam furunfar nem com camisinha?! condomnados ao celibato!] (…) if anyone drops out, a person of the same sex is substituted.” “glass coffin” coma cosmético

O GRAU 1 BILHÃO DA ESCRITURA – O SUPER-U****I – o maior filósofo se torna o mais inconseqüente dos títulos.

Como pode alguém ofender alguém de blasé a sério? Que se acredite que se ofenda alguém que nunca se ofende é um atestado de desespero.

Nada a temer em temer o nada.

God, for his part, if he exists, does not believe in his existence, but he allows the subject to believe in it, and to believe he [god] believes in it, or [the subject] not to believe that – but not to believe he [god] does not believe in it (Stavrogin [personagem dostoievekiano, Os Demônios]).” Genial!

RESUMO LÓGICO DAS IMPLICAÇÕES DO EMPOLADO RACIOCÍNIO DE STAVROGIN E O SENTIDO DE “TUDO É PERMITIDO” NA OBRA DE DOSTOIEVSKY

1. Deus existe; Deus não acredita na própria existência; Deus permite que o homem acredite na existência de deus ou não, mas não na segunda verdade fundamental.

1.1 O homem acredita na existência de deus.

1.1.1 O homem acredita que deus acredita na própria existência.

1.1.2 O homem acredita que deus não acredita na própria existência.

1.2. O homem não acredita na existência de deus.

1.2.1 O homem acredita que deus, se existisse, acreditaria na própria existência.

1.2.2 O homem acredita que deus, se existisse, não acreditaria na própria existência.

2. Deus não existe.

2.1 O homem acredita na existência de deus.

2.1.1 O homem acredita que deus acredita na própria existência.

2.1.2 O homem acredita que deus não acredita na própria existência. Este homem na verdade é um grande ateu, pois um deus que não acredita na própria existência seria pior que a não-existência de um deus.

2.2. O homem não acredita na existência de deus.

2.2.1 O homem acredita que deus, se existisse, acreditaria na própria existência.

2.2.2 O homem acredita que deus, se existisse, não acreditaria na própria existência. Este homem é, finalmente, um grande ateu, o único ateu em sentido estrito, pois um deus que não acreditasse na própria existência, pensa ele, não deveria sequer ser pensável. Seria pior e mais absurdo que a não-existência de um deus, seria como uma confissão de não-onipotência por parte deste suposto deus.

2 conclusões:

a) As possibilidades éticas são maiores sem Deus (tudo é permitido).

b) Seria possível provar a inexistência de deus (jamais a existência)¹ ao se encontrar um só indivíduo que acredita que deus² não acredita em si próprio. É o caso do personagem da novela niilista de Dostoievsky. Seu niilismo absoluto, sua negação ultimada da realidade, não se escora no ingênuo fato de que não acredite num deus, mas que para ele, como um homem uma vez fanático e que pensou a idéia de Deus até as suas últimas conseqüências, esse deus se tornou impossível. Na percepção alcançada por Stavrogin, todos os casos são iguais, apenas ele e homens análogos a ele, um novo homem, são um outro: se Deus existe, quem acredita nele ou não são iguais; se Deus não existe, e Deus não existe, pois Stavrogin recebeu essa iluminação e nova sabedoria, ateus e crentes que acreditam que deus acredita em si próprio são iguais (inofensivos); mas ateus e crentes que acreditam que deus não acredita(ria) em si próprio, estes são niilistas radicais, os únicos ateus na verdadeira acepção da palavra. Igor Karamazov (outro romance) se questiona: Tudo é permitido?, mas Stavrogin responde, em Os Demônios.

¹ Pois todos os indivíduos precisariam respeitar as vedações em 1.1 e 1.2. Mas mesmo que todos na Terra em dado dia as respeitassem, não quereria dizer que jamais um indivíduo no passado as respeitou; e nem que nunca haverá de nascer um indivíduo que não as respeite.

² O deus existente, para o crente, ou inclusive apenas uma abstração, a hipótese de deus, de um deus que não acreditasse em si mesmo, para o não-crente.

Não exageremos a importância deste raciocínio lógico elaborado, no entanto: não podemos provar crenças (talvez apenas a nossa própria, e ainda assim podemos desconfiar de que às vezes mentimos para nós mesmos).

P. 94: “Todos esses corpos de pensamento [Stirner e seu individualismo soberano, Marx e a luta coletivista na História, Nietzsche, seu Übermensch e a transvaloração de todos os valores demasiado humanos] tiveram profundas conseqüências para o mundo – nenhum se converteu em realidade.

um <além> que não é aquele da religião, mas um <além> do humano que permanece dentro e com o humano (…) uma ilusão talvez, mas uma ilusão superior.” “Contrariamente à ilusão transcendental das religiões, o jogo das aparências é supra-humano”

Se a história tivesse um fim, esse fim já teria sido alcançado… Um dia me arrependerei dos meus atuais prognósticos e escreverei o livro HEIDEGGER ESTAVA CERTO? A tecnologia nos comeu sem volta. Quem dera Baudrillard estivesse errado…

O que atualmente toma o lugar da transmutação é a transcrição da Idéia em uma operação técnica (…) O que mostra que Nietzsche, por um lado, estava certo: a raça humana, deixada a si mesma, com efeito só sabe se reduplicar e destruir.”

fetichismo técnico (…), meramente a paródia da aceitação do seu destino, através de uma manipulação biológica que é meramente a caricatura da transvaloração dos valores.” “Desnecessário dizer, essa transvaloração de valores de que Nietzsche fala não teve lugar, exceto precisamente no sentido oposto – não para além, mas deste lado, aquém, do bem e do mal

Não mais uma fetichização de divindades, grandes idéias ou narrativas, mas de diferenças mínimas e de partículas. (…) As fronteiras entre o humano e o inumano estão desvanecendo, de fato, mas essa perda de nitidez se dá numa espiral rumo ao sub-humano (…) Verklärung des Untermenschen. Transfiguração do sub-homem.”

Essa reabsorção da metáfora da vida na metástase da sobrevivência é efetuada por uma progressiva redução ao menor denominador comum.”

Paradoxalmente, é a irrupção da biologia, i.e., da ciência da vida, que marca essa irrupção do não-vivo (…) Bem como a irrupção da psicologia marca o fim da transcendência da alma e sua suplantação por uma desconstrução analítica do mundo interior. Bem como a irrupção da ciência anatômica marca o fim do corpo e da morte como metáforas e suas entradas em cena como realidade e fatalidade biológicas.”

Podemos ainda falar do inconsciente, dado o prospecto do homem vindo a ser definido geneticamente? Mesmo a imortalidade do inconsciente, tão cara a Freud, está sob séria ameaça.”

RELEMBRE DEDÊ (TESE, vide mais abaixo): “Não mais imortal em termos de alma, que já desapareceu, nem mesmo em termos de corpo, que está para desaparecer, mas em termos de fórmula, imortal em termos de código.”

The trend in physics itself is towards the reduction of this interstitial void. It is the dream of that science to render matter totally concrete, to wrest all its energy from it by impelling it to limit-densities, densities artificial and monstrous.” Como congelar a luz, o novo absurdo alquímico.

From within, a culture is immortal; it seems to approach its end in an asymptotic curve. It has, in fact, already disappeared. The elevation of a value to universality is a prelude to its becoming transparent, which itself is a prelude to its disappearance.”

the single-handed ocean crossings, which are our modern equivalent of climbing Annapurna, [pico da cadeia de montanhas do Himalaya (circa 8000m); escalado pela primeira vez em 1950] are posthumous fantasies.”

Peter Schlemihl had at least sold his shadow to the devil; ours we have simply lost.” “The atomic shadow, the only one left to us: not the sun’s shadow, nor even the shadows of Plato’s cave, but the shadow of the absent irradiated body, the delineation of the subject’s annihilation, of the disappearance of the original.”

Alain Ehrenberg, La fatrigue d’être soi

the hero of subjectivity, of breaking with the old, of free will and Stirner’s radical singularity, is well and truly dead.” “This is the age of the daily invention of new particles. (…) freedom is merely the statistical end-product of impacts between singularities and no longer, therefore, in any sense a philosophical problem.”

His [the individual of today] only aim is the technical appropriation of the self. He is a convert to the sacrificial religion of performance, efficiency, stress and time-pressure – a much fiercer liturgy than that of production – total mortification and unremitting sacrifice to the divinities of data [l’information], total exploitation of oneself by oneself, the ultimate in alienation. § No religion has ever demanded as much of the individual as such, and it might be said that radical individualism is the very form of religious fundamentalism.” “By comparison, with this voluntary holocaust, [do sujeito atomizado liberal] this escalation of sacrifice, the so-called return of religion which we pretend to fear – these occasional upsurges of religiosity or traditional fundamentalism – is negligible. It merely conceals the fundamental integrism of this consensual society (…) Religious effects are taken too seriously in their religious dimension and not seriously enough as effects, that is, as making the true process.” “each one reviving for itself, in its micro-universe, the now useless totalitarianism of the whole.”

LIVRES COMO PEIXES NÃO-CONSTRANGIDOS EM SEUS AQUÁRIOS: “Liberty operates in a field that is limited and transcendent, in the symbolic space of the subject, where he is conformed with his own finality, his own destiny, whereas liberation operates in a potentially unlimited space. It is a quasi-physical process (…) That is why liberty is a critical form, whereas liberation is a potentially catastrophic form. The former confronts the subject with his own alienation and its overcoming. The other leads to metastases, chain reactions, the disconnection of the subject. Liberation is the effective realization of the metaphor of liberty and, in this sense, it is also its end. (…) Not the free subject any longer, but the liberal individual. (…) From liberty to liberation, from liberation to liberalization. The extreme point of highest dilution, minimal intensity” “And, in the process, the concept of alienation disappears. This new, cloned, metastatic, interactive individual is not alienated any longer, but self-identical. He no longer differs from himself and is, therefore, indifferent to himself. This indifference to oneself is at the heart of the more general problem of the indifference of institutions or of the political, etc., to themselves § The indifference of time: the non-distance between points in time, the promiscuity of points in time, the instantaneousness of real time. Boredom. § The indifference of space: the televisual, remote-controlled contiguity and contamination of all points in space, which leaves you nowhere. § Political indifference: the superimposition, the proliferation of all opinions in a single media continuum. § Sexual indifference: indistinguishability and substitution of sexes as a necessary consequence of the modern theory of sex as difference.” “this identitary individual lives on the hymning and hallucinating of difference, employing to that end all the devices for simulating the other.” Certamente Baudrillard ganharia o rótulo de fascista e transfóbico pela parte “amorosa” (inofensiva, cripto-neoliberal) da esquerda de hoje. A parte <<<revolucionária>>> (com o perdão da sobreposição das aspas) da esquerda e do <<<progressismo>>>.

ESQUEÇA DEDÊ (ANTÍTESE, vide acima): “This identity syndrome has a particular form of madness specific to it. To the <free> individual, the divided subject, there corresponds the vertical madness of yesteryear: psychical madness, the transcendent madness of the schizophrenic (…) [but] horizontal madness (…) [is] autism.”

Trecho de BAUDRILLARD, Jean. The Illusion of The End (1994) e, a seguir, especulações e desdobramentos meus sobre a figura do autista que devora o seu duplo e absorve seu irmão gêmeo, seja na vida real ou na ficção, com ou sem êxito:

[Not anymore] the delirium of the schizophrenic [personalidade cindida] but of the isophrenic, [idêntico tão-só a si mesmo] without shadow, other, transcendence or image (…) the autist who has devoured his double and absorbed his twin brother¹ (being a twin is, conversely, a form of autism à deux). (…) deprived of hereditary otherness, affected with hereditary sterility, they have no other destiny than desperately to seek out an otherness by eliminating all the Others one by one (whereas <vertical> madness [o tipo antigo da loucura, a família da esquizofrenia, formas arquetípicas do <desejo> de Gilles Deleuze & Guattari] suffered, by contrast, from a dizzying excess of otherness). The problem of Frankenstein, for example, is that he has no Other and craves otherness. This is the problem of racism.”

¹ The Black-Zamasu Syndrome! a Ou a Era Messi?b

O ANTES & DEPOIS DO “PERSONAGEM DUPLICADO” ZAMASU

a Black & Zamasu: dois lados de uma mesma moeda: Dois personagens de mangá/anime que são, no enredo, a mesma pessoa, porém provindos de universos alternativos (o que seria muito demorado explicar em suas minúcias), “um deles” mortal, um tanto impulsivo e dotado de um corpo “ágil e perfeito” (em que residiria essa agilidade e perfeição será deslindado a seguir – este mortal de que falo é chamado de “Goku Black” pelos demais personagens da trama), “outro deles” imortal, possuidor de extensos conhecimentos sobre o universo e não obstante dotado de um corpo um tanto menos versátil que o de sua contraparte espelhada (este é Zamasu, a identidade ‘original’ do ‘falso duo’). “Ambos” formam um par astuto e eficiente, pode-se dizer que “se completam” de forma platônica.

A solução final encontrada pelo(s) personagem(ns) desdobrado(s) Black-Zamasu na sua tentativa de cumprir o ambicioso propósito que persegue(m) com afinco na estória – o singelo plano da extinção da humanidade não só na Terra como em todo o universo (Ningen Zero Keikaku,(*) ‘Plano Zero Humanos’), e com humanos, nesta narrativa, não entender apenas criaturas antropomórficas, os terráqueos, mas todos os seres que a filosofia existencialista classificaria como conscientes de que um dia irão morrer dada “sua natureza meramente finita, recalcitrante e imperfeita, de pecadores natos, enfim”, como diria o vilão ou a dupla de vilões em questão –, envolve a precipitada decisão de “fundir-se consigo mesmo”, acarretando a transformação de duas entidades em uma.

(*) Acho divertida a inadvertida – cacofonia intencional – coincidência acústica que a transposição da obra para o português acaba gerando: ningen, sendo o japonês para ‘humano’, corresponde exatamente à idéia que Black-Zamasu tem/têm do homem: um zé(ro)-ninguém.

Este Narciso que conseguiu mergulhar no espelho d’água e não se afogar, este Fausto do universo ficcional de Dragon Ball, após vender a alma para chegar aonde quer, percebe tarde demais que o “diabo” (neste caso ele mesmo) o ludibriou na barganha, ao constatar que, uma vez fundido com sua cara-metade, sua principal vantagem tática na trama até aquele momento é, como num simples passe de mágica, desfeita: seu senso de cooperação com um Outro (ainda que esse outro fosse apenas ele desdobrado), sua sincronia e trabalho em equipe ideais na paciente execução de um projeto maquiavélico, acabam dando lugar a uma criatura “semi-imortal e auto-suficiente”. Ora, só que não existe a semi-imortalidade (algo intrinsecamente inútil, inferior à imortalidade) nem uma auto-suficiência genuína.

A sutil tragédia desta estória, nem sempre capturada pelo leitor/espectador, está em que a fim de chegar tão longe em seus planos diabólicos Zamasu teve de roubar o corpo do artista-marcial “perfeito”, Goku, o protagonista, que encarna o próprio sentido do humano arquetípico, cheio de defeitos, carências e tolas expectativas, dotado de uma fé cega e ingênua no futuro a despeito da certeza da morte e até de uma certa dose de despeito pelo conceito de divindade (justamente o que nos torna cônscios de nossa capacidade inerente de nos corrigirmos e nos superarmos diversas vezes ao longo de nossa curta vida), conjunto de características tão abominado pelo mesmo Zamasu. A parte “humana” de Zamasu, Goku Black, ao ser incorporada ao próprio Zamasu original, constituindo a partir daí um corpo só, desestabiliza seu Ser Eterno. Seu novo invólucro, em vez de onipotente, se revela uma falsificação, um embuste. Zamasu, o Uno, não dispõe mais da vida eterna.

E este nem é o pior de seus problemas após a fusão: logo se evidencia que, contra os humanos – raça que aprende com os erros e enquanto não perece ousa tentar outra vez, mesmo sem ter idéia do desfecho, de se seus esforços serão inúteis ou não, entregando, de qualquer maneira, tudo de si –, a própria habilidade de Zamasu, da parte do Goku Black em Zamasu, que ele tomou emprestada do corpo mortal de Goku quando uma de suas metades se transformara em Black no passado, a habilidade do contínuo e incessante auto-aperfeiçoamento pessoal, não passa de uma cópia barata da versão dos humanos autênticos dessa mesma habilidade. Zamasu, principalmente agora que contaminou sua antiga parte “humana” (parte que, reitera-se, era um mal necessário para que ele sobressaísse no combate) com traços divinos (e não o contrário: em Zamasu, é o humano que decai graças a sua metade deus, e não o inverso!), não possui a vontade e a determinação necessárias que lhe possibilitariam, em última instância, ultrapassar seus próprios limites.

Ao escolher se fundir consigo próprio, Zamasu apenas antecipou o fim do combate: se tornou um adversário facilmente vencível, incapaz de acompanhar o ritmo das proezas dos rivais e de compreender o ethos do inimigo. (Em sua cabeça, devia se perguntar: Por que eles lutam comigo, em intensa solidariedade uns com os outros o tempo todo, mesmo quando se acham em nítida desvantagem na correlação de forças? E por que eles não desistem nunca de realizar o impossível? O que faz criaturas tão frágeis e insignificantes se comportarem de maneira tão absurda e ao mesmo tempo exibirem uma invejável serenidade no olhar? Que impulso é esse que os move, que nem mesmo um deus como eu entende?!) O resultado final icônico do embate é que Black-Zamasu termina cortado em dois por um dos humanos que o antagonizam. Seu corpo imortal tinha o dom da auto-regeneração, mas sozinho não poderia vencer os humanos super-poderosos da trama fantástica. Quando se fundiu consigo mesmo, seu novo corpo semi-imortal foi aos poucos se deformando e perdendo aquela capacidade restauradora, embora ele calculasse que o ganho de poder resultante da fusão decidiria a guerra a seu favor.

Aquilo que fôra cortado pela espada de um humilde ser humano (a espada, apenas uma espada como qualquer outra, nada mais é do que o símbolo da inquebrantável perseverança dos mortais) não era bem a carne de Zamasu, a dizer verdade, mas seu espírito, sua própria essência, e este profundo ferimento metafísico se mostrou uma chaga incurável.

A evolução tremendamente satisfatória (em sua ascensão e queda) do multifacetado e secretamente atormentado Zamasu – esse Prometeu negativo, esse deus presunçoso e anti-socrático, que “não sabia que nada sabia” –, e seu estratagema cínico de forjar uma hipócrita aliança com seu duplo ou Doppelgänger, um duplo que ao mesmo tempo que imitava os seres humanos teria de ser seu principal instrumento para finalmente extingui-los, tornam este personagem, de longe, no melhor antagonista jamais apresentado por esta série shounen de lutinhas acéfalas, em que normalmente imperam a superficialidade mais boçal e os velhos clichês maniqueístas.

OBS: Deve haver uma mística ligação entre Jean Baudrillard e Dragon Ball, pois não é a primeira vez que eu associo a ambos – e ser mais distintos um do outro é impossível! – em posts do Seclusão (aqui vai a pista de uma possível explicação racional: novamente o assunto abordado se refere à ‘síndrome de deus’ de que padece o animal homem em todas as culturas conhecidas)!

Vide o contexto completo da primeira “analogia” entre aspas de Baudrillard e personagens de Dragon Ball em https://seclusao.art.blog/2021/12/20/ss-em-3-atos/.

b Lional “La Pulga” Messi: O conhecido jogador de futebol foi tachado por muitos “entendidos” de “autista” nos seus anos iniciais de carreira porque ‘se comunicava’ e ‘atuava’ de forma supostamente bizarra e muito diferente da habitual, tanto nos gramados quanto na vida privada. Diferente até de outros gênios do passado, principalmente do ícone-mor argentino, o extremamente sociável e integrado com o seu povo, extrovertido e burlesco Diego Maradona, que por muitos anos foi uma sombra na trajetória de Messi.

Vemos, num dégradé perfeito, como Lionel Messi foi se tornando, com a idade, cada vez mais e mais maradônico, seja porque assim quisemos passar a enxergar após começarmos a prestar mais atenção ou porque o meia-atacante foi se tornando, sem afetação, de modo orgânico e natural, grande e irreverente tal qual seu ídolo de infância, não só através de suas quebras rotineiras de recordes e a técnica cada vez mais precisa e apurada, como também pela maturidade com que aprendeu a chamar toda a responsabilidade e estrelato para si, aglutinando os companheiros pelo bem maior da equipe e confrontando com personalidade e malemolência os críticos e adversários, cada vez mais estupefatos e rendidos.

Messi soube se desdobrar, enquanto se movimentava como uma flecha durante os jogos, separou o Messi indivíduo comum do Messi lendário, o cidadão do mago protagonista de espetáculos, se situou num ângulo favorável, numa distância confortável, diante do espelho em que se punha a observar seu próprio Outro, que na verdade são duas coisas distintas, seus dois Outros – 1) o seu futuro como será contado pela História, que só pode ser decidido por ele mesmo; 2) e aquela antiga sombra ou reflexo pertencente ao passado, que mais parecia um destino inexorável a pesar como uma bigorna sobre as suas costas, ele, Diego Armando Maradona. Por muito tempo, no entanto, pensaram, e talvez Messi tenha pensado, que seus dois Outros eram um só: Messi é Maradona; mas se Messi não tem uma Copa, então Messi não é Maradona… então,a na realidade, Messi não é ninguém… Não!… Messi será Maradona!… contanto que… Entende-se onde quero chegar.

Os anos profissionais de um jogador de futebol passam muito mais depressa que nossa já efêmera vida. E, para Messi, sua trajetória como jogador, o capítulo mais importante de sua biografia, culminou com a decretação oficial de sua “santidade atlética”, a atribuição sem direito a controvérsia de seu status de craque atemporal, diante de toda a imprensa e da atual geração de torcedores do esporte mais popular do planeta, após a apoteótica exibição na final da Copa do Mundo de 2022, no momento em que erguia a Taça Fifa. Hoje, mesmo antes da aposentadoria, Messi já é apontado (e não apo-se-ntado, leia bem!) – e por não poucos, talvez pelos mesmos que antes tentavam explicar suas performances sobrenaturais apelando para diagnósticos clínicos! – como “melhor que Maradona” enquanto jogador e “tão influente e carismático quanto Dieguito” fora das quatro linhas, façanha notável, outrora até impensável, quando nos damos conta de que na Argentina Diego Maradona é venerado como um deus…

* * *

O MAL SOMÁTICO DA HUMANIDADE: “everything is already there, everything has already taken place. § We are thus immortal survivors, since the second existence is without end. It has no end because the end is already the beginnin.” “The process of de-humanization is complete and the clear effect of this phenomenon is that we no longer possess the psychical, ethical and spiritual resources which would enable us to realize this fact (Romain Gary).”¹

¹ wikia: “Romain Gary, 1914–1980, also known by the pen name Émile Ajar, was a French novelist, diplomat, film director, and World War II aviator. He is the only author to have won the Prix Goncourt under two names. He is considered a major writer of French literature of the second half of the 20th century.” “In a memoir published in 1981, Gary’s nephew Paul Pavlowitch claimed that Gary also produced several works under the pseudonym Émile Ajar. Gary recruited Pavlowitch to portray Ajar in public appearances, allowing Gary to remain unknown as the true producer of the Ajar works, and thus enabling him to win the 1975 Goncourt Prize, a second win in violation of the prize’s usual rules.” chad move here!

R.G., Les Racines du ciel

Our systems are thus doubly chaotic: they operate both by exponential stability and instability.”

A DIALÉTICA DO REJUVENESCIMENTO: “Sensitivity to initial conditions should not be confused with fate or predestination.” “In predestination, the end is there before the beginning and every effort to move away from the end brings that end closer. [Édipo Rei, etc.]

Meteorology is chaotic; it is not a figure of destiny.”

the destiny of simulation which one may, in effect, read as a form of catastrophe of reality, this dizzyng whirl of the model, the virtual and simulation carrying us further and further from the initial conditions of the real world

Chaos is a parody of any metaphysics of destiny. It is not even an avatar of such a metaphysics. The poetry of initial conditions fascinates us today, now that we no longer possess a vision of final conditionsO Ragnarok é sempre só um Big Bang.

Destiny is the ecstatic figure of necessity. Chaos is merely the metastatic figure of Chance. [a contingência se espalhando como um câncer]

the hidden order of strange attractors” “Condemned to an intense metabolism” “They are condemned, precisely, to the epidemic, to the endless excrescences of the fractal [vertigo] and not to the reversibility and perfect resolution of the fateful [fatal]. We know only the signs of catastrophe now.” Não é como um eterno retorno com sentido, mas apenas um loop de arcade game de Atari…

“…definitive doom, which we could at least consume as spectacle. Just imagine the extraordinary good luck of the generation which would have the end of the world to itself.” “we came too late for the beginning.”

You live too fast, you live too soon. Apoteozzy

Ó TESOURA AMIGA!

CORTO EU A LINHA PELUDA?

April of the pigs

O universo é como um ano-novo.

history itself has become interminable. when we speak of the <end of history>, the <end of the political>, the <end of the social>, the <end of ideologies>, none of this is true. The worse of it all is precisely that there will be no end to anything, and all these things will continue to unfold slowly, tediously, recurrently, in that hysteresis of everything which, like nails and hair, continues to grow after death.”

homepathic end, an end distilled into all the various metastases of the refusal of death.”

This revival of vanished forms, this attempt to escape the apocalypse of the virtual, is an utopian desire, the last of our utopian desires.” Nada será como antes.

the illusion of the end of that book

can we not imagine that, in history itself, previous states never disappeared, but present themselves again in succession, as it were, taking advantage of the weakness or excessive complexity of the present structures?”

The reabilitation of old frontiers, the old structures, the old elites will never have the same meaning. If, one day, the aristocracy or royalty recover their old position, they will, nonetheless, be <post-modern>.”

Magic Country, Future World, Gothic, Hollywood itself reconstructed 50 years on in Florida, the whole of the past and the future revisited as living simulation. Walt Disney is the true hero of deep-freezing, with his utopian hope of awakening one day in the future, in a better world. But that is where the irony bites: he had not foreseen that reality and history would turn right around. And he, who expected to wake up in the year 2100, might well, following out his own fairytale scenario, awaken in 1730 or the world of the Pharaohs or any one of his primal scenes.”

Communism will have had no historical end; it will have been sold off, knocked down like useless stock.”

The sales used to come after the feast days but now they precede them. It’s the same with our century”

This is like the parable of the Russian cosmonaut forgotten in space, with no one to welcome him, no one to bring him back – the sole particle of Soviet territory ironically overflying a deterritorialized Russia. Whereas on Earth everything has changed, he becomes pratically immortal and continues to circle like the gods, like the stars, like nuclear waste.”

Nostalgia had beauty because it retained within it the presentiment of what has taken place and could take place again. It was as beautiful for never being satisfied, as was utopia for never being achieved.”

the literal manifestness of the end”

We are, then, unable to dream of a past or future state of things. Things are in a state which is literally definitive (…) deprived of its end. Now, the feeling which goes with a definitive state, even a paradisiac one – is melancholic.”

there remains the completely improbable and, no doubt, unverifiable hypothesis of a poetic reversibility of events, more or less the only evidence for which is the existence of the same possibility in language.”

Canetti diz que a vingança é supérflua; torna-se desnecessária devido à inexorável reversibilidade das coisas.”

It isn’t just terrorists who repent. Intellectuals showed them the way, the Sartreans and others having been in the van of repentence from the 50s onwards.”

Arte total = arte mais fraca

If nothing exists now but effects, we are in a state of total illusion (which is also that of poetic language). If the effect is in the cause or the beginning in the end, then the catastrophe is behind us. This reversing of the sign of catastrophe is the exceptional privilege of our age. It liberates us from any future catastrophe and any responsibility in that regard. The end of all anticipatory psychoses, all panic, all remorse! The lost object is behind us. We are free of the Last Judgement.” Lost Judgement

INVERSÃO CONTRA FIM: “Anastrophe versus catastrophe”

Might we not transpose language games on to social and historical phenomena: anagrams, acrostics, spoonerisms, rhyme, strophe and cata-strophe [a estrofe que transtorna]?”

In these times of a retroversion of history, the palindrome,¹ that poetic, rigorous form of palinode,² could serve as a grille de lecture (might it not perhaps be necessary to replace Paul Virilio’s dromology³ with a palindromology?). And the anagram, that detailed process of ravelling, that sort of poetic and non-linear convulsion of language”

¹ Frase idêntica num sentido ou noutro, como a famosa SOCORRAM-ME SUBI NO ÔNIBUS EM MARROCOS.

² Re-citação de outro trecho do mesmo autor ou poema (quando muito grande), dentro do próprio poema.

³ A ciência da velocidade. Tão rápido que assa a virilha.

pure materiality of time” “The illusion of our history opens on to the greatly more radical illusion of the world. VdP, fim da exposição inicial sobre o niilismo.

we no longer have the choice of advancing, of persevering in the present destruction, or of retreating – but only of facing up to [reconhecer, aceitar, lidar com] this radical illusion.”

Voltar é impossível. Déjà vu em extinção. E dar um passo dianteiro kantiano ainda mais difícil,

Irreverente realidade do irreal.

Presente terno,

Uma música que não sai do refrão.

That’s what life means, said a Brazilian singer and composer…

GLOSSÁRIO:

fallow: terra deixada em descanso no sistema de cultivo rotativo (também conhecida como “pousio”)

lorry: caminhão-de-lixo

[PREVIEW DO PRÓXIMO POST] Como uma discussão sobre o autismo e o conceito de Doppelgänger em Jean Baudrillard me levou a entrar em detalhes sobre o melhor vilão de Dragon Ball e a carreira do Messi… Parece uma dupla loucura, mas não é!

Trecho de BAUDRILLARD, Jean. The Illusion of The End (1994), seguido de especulações e desdobramentos meus acerca da figura do autista que devora o seu duplo e absorve seu irmão gêmeo, seja na vida real ou na ficção, com ou sem êxito:

 

[Not anymore] the delirium of the schizophrenic [personalidade cindida] but of the isophrenic, [idêntico tão-só a si mesmo] without shadow, other, transcendence or image (…) the autist who has devoured his double and absorbed his twin brother¹ (being a twin is, conversely, a form of autism à deux). (…) deprived of hereditary otherness, affected with hereditary sterility, they have no other destiny than desperately to seek out an otherness by eliminating all the Others one by one (whereas <vertical> madness [o tipo antigo da loucura, a família da esquizofrenia, formas arquetípicas do <desejo> de Gilles Deleuze & Guattari] suffered, by contrast, from a dizzying excess of otherness). The problem of Frankenstein, for example, is that he has no Other and craves otherness. This is the problem of racism.”

¹ The Black-Zamasu Syndrome! a Ou a Era Messi?b

O ANTES & DEPOIS DO “PERSONAGEM DUPLICADO” ZAMASU

a Black & Zamasu: dois lados de uma mesma moeda: Dois personagens de mangá/anime que são, no enredo, a mesma pessoa, porém provindos de universos alternativos (o que seria muito demorado explicar em suas minúcias), “um deles” mortal, um tanto impulsivo e dotado de um corpo “ágil e perfeito” (em que residiria essa agilidade e perfeição será deslindado a seguir – este mortal de que falo é chamado de “Goku Black” pelos demais personagens da trama), “outro deles” imortal, possuidor de extensos conhecimentos sobre o universo e não obstante dotado de um corpo um tanto menos versátil que o de sua contraparte espelhada (este é Zamasu, a identidade ‘original’ do ‘falso duo’). “Ambos” formam um par astuto e eficiente, pode-se dizer que “se completam” de forma platônica.

A solução final encontrada pelo(s) personagem(ns) desdobrado(s) Black-Zamasu na sua tentativa de cumprir o ambicioso propósito que persegue(m) com afinco na estória – o singelo plano da extinção da humanidade não só na Terra como em todo o universo (Ningen Zero Keikaku,(*) ‘Plano Zero Humanos’), e com humanos, nesta narrativa, não entender apenas criaturas antropomórficas, os terráqueos, mas todos os seres que a filosofia existencialista classificaria como conscientes de que um dia irão morrer dada “sua natureza meramente finita, recalcitrante e imperfeita, de pecadores natos, enfim”, como diria o vilão ou a dupla de vilões em questão –, envolve a precipitada decisão de “fundir-se consigo mesmo, acarretando a transformação de duas entidades em uma.

(*) Acho divertida a inadvertida – cacofonia intencional – coincidência acústica que a transposição da obra para o português acaba gerando: ningen, sendo o japonês para ‘humano’, corresponde exatamente à idéia que Black-Zamasu tem/têm do homem: um zé(ro)-ninguém.

Este Narciso que conseguiu mergulhar no espelho d’água e não se afogar, este Fausto do universo ficcional de Dragon Ball, após vender a alma para chegar aonde quer, percebe tarde demais que o “diabo” (neste caso ele mesmo) o ludibriou na barganha, ao constatar que, uma vez fundido com sua cara-metade, sua principal vantagem tática na trama até aquele momento é, como num simples passe de mágica, desfeita: seu senso de cooperação com um Outro (ainda que esse outro fosse apenas ele desdobrado), sua sincronia e trabalho em equipe ideais na paciente execução de um projeto maquiavélico, acabam dando lugar a uma criatura “semi-imortal e auto-suficiente”. Ora, só que não existe a semi-imortalidade (algo intrinsecamente inútil, inferior à imortalidade) nem uma auto-suficiência genuína.

A sutil tragédia desta estória, nem sempre capturada pelo leitor/espectador, está em que a fim de chegar tão longe em seus planos diabólicos Zamasu teve de roubar o corpo do artista-marcial “perfeito”, Goku, o protagonista, que encarna o próprio sentido do humano arquetípico, cheio de defeitos, carências e tolas expectativas, dotado de uma fé cega e ingênua no futuro a despeito da certeza da morte e até de uma certa dose de despeito pelo conceito de divindade (justamente o que nos torna cônscios de nossa capacidade inerente de nos corrigirmos e nos superarmos diversas vezes ao longo de nossa curta vida), conjunto de características tão abominado pelo mesmo Zamasu. A parte “humana” de Zamasu, Goku Black, ao ser incorporada ao próprio Zamasu original, constituindo a partir daí um corpo , desestabiliza seu Ser Eterno. Seu novo invólucro, em vez de onipotente, se revela uma falsificação, um embuste. Zamasu, o Uno, não dispõe mais da vida eterna.

E este nem é o pior de seus problemas após a fusão: logo se evidencia que, contra os humanos – raça que aprende com os erros e enquanto não perece ousa tentar outra vez, mesmo sem ter idéia do desfecho, de se seus esforços serão inúteis ou não, entregando, de qualquer maneira, tudo de si –, a própria habilidade de Zamasu, da parte do Goku Black em Zamasu, que ele tomou emprestada do corpo mortal de Goku quando uma de suas metades se transformara em Black no passado, a habilidade do contínuo e incessante auto-aperfeiçoamento pessoal, não passa de uma cópia barata da versão dos humanos autênticos dessa mesma habilidade. Zamasu, principalmente agora que contaminou sua antiga parte “humana” (parte que, reitera-se, era um mal necessário para que ele sobressaísse no combate) com traços divinos (e não o contrário: em Zamasu, é o humano que decai graças a sua metade deus, e não o inverso!), não possui a vontade e a determinação necessárias que lhe possibilitariam, em última instância, ultrapassar seus próprios limites.

Ao escolher se fundir consigo próprio, Zamasu apenas antecipou o fim do combate: se tornou um adversário facilmente vencível, incapaz de acompanhar o ritmo das proezas dos rivais e de compreender o ethos do inimigo. (Em sua cabeça, devia se perguntar: Por que eles lutam comigo, em intensa solidariedade uns com os outros o tempo todo, mesmo quando se acham em nítida desvantagem na correlação de forças? E por que eles não desistem nunca de realizar o impossível? O que faz criaturas tão frágeis e insignificantes se comportarem de maneira tão absurda e ao mesmo tempo exibirem uma invejável serenidade no olhar? Que impulso é esse que os move, que nem mesmo um deus como eu entende?!) O resultado final icônico do embate é que Black-Zamasu termina cortado em dois por um dos humanos que o antagonizam. Seu corpo imortal tinha o dom da auto-regeneração, mas sozinho não poderia vencer os humanos super-poderosos da trama fantástica. Quando se fundiu consigo mesmo, seu novo corpo semi-imortal foi aos poucos se deformando e perdendo aquela capacidade restauradora, embora ele calculasse que o ganho de poder resultante da fusão decidiria a guerra a seu favor.

Aquilo que fôra cortado pela espada de um humilde ser humano (a espada, apenas uma espada como qualquer outra, nada mais é do que o símbolo da inquebrantável perseverança dos mortais) não era bem a carne de Zamasu, a dizer verdade, mas seu espírito, sua própria essência, e este profundo ferimento metafísico se mostrou uma chaga incurável.

A evolução tremendamente satisfatória (em sua ascensão e queda) do multifacetado e secretamente atormentado Zamasu – esse Prometeu negativo, esse deus presunçoso e anti-socrático, que “não sabia que nada sabia” –, e seu estratagema cínico de forjar uma hipócrita aliança com seu duplo ou Doppelgänger, um duplo que ao mesmo tempo que imitava os seres humanos teria de ser seu principal instrumento para finalmente extingui-los, tornam este personagem, de longe, no melhor antagonista jamais apresentado por esta série shounen de lutinhas acéfalas, em que normalmente imperam a superficialidade mais boçal e os velhos clichês maniqueístas.

OBS: Deve haver uma mística ligação entre Jean Baudrillard e Dragon Ball, pois não é a primeira vez que eu associo a ambos – e ser mais distintos um do outro é impossível! – em posts do Seclusão (aqui vai a pista de uma possível explicação racional: novamente o assunto abordado se refere à ‘síndrome de deus’ de que padece o animal homem em todas as culturas conhecidas)!

Vide o contexto completo da primeira “analogia” entre aspas de Baudrillard e personagens de Dragon Ball em https://seclusao.art.blog/2021/12/20/ss-em-3-atos/.

b Lional “La Pulga” Messi: O conhecido jogador de futebol foi tachado por muitos “entendidos” de “autista” nos seus anos iniciais de carreira porque ‘se comunicava’ e ‘atuava’ de forma supostamente bizarra e muito diferente da habitual, tanto nos gramados quanto na vida privada. Diferente até de outros gênios do passado, principalmente do ícone-mor argentino, o extremamente sociável e integrado com o seu povo, extrovertido e burlesco Diego Maradona, que por muitos anos foi uma sombra na trajetória de Messi.

Vemos, num dégradé perfeito, como Lionel Messi foi se tornando, com a idade, cada vez mais e mais maradônico, seja porque assim quisemos passar a enxergar após começarmos a prestar mais atenção ou porque o meia-atacante foi se tornando, sem afetação, de modo orgânico e natural, grande e irreverente tal qual seu ídolo de infância, não só através de suas quebras rotineiras de recordes e a técnica cada vez mais precisa e apurada, como também pela maturidade com que aprendeu a chamar toda a responsabilidade e estrelato para si, aglutinando os companheiros pelo bem maior da equipe e confrontando com personalidade e malemolência os críticos e adversários, cada vez mais estupefatos e rendidos.

Messi soube se desdobrar, enquanto se movimentava como uma flecha durante os jogos, separou o Messi indivíduo comum do Messi lendário, o cidadão do mago protagonista de espetáculos, se situou num ângulo favorável, numa distância confortável, diante do espelho em que se punha a observar seu próprio Outro, que na verdade são duas coisas distintas, seus dois Outros – 1) o seu futuro como será contado pela História, que só pode ser decidido por ele mesmo; 2) e aquela antiga sombra ou reflexo pertencente ao passado, que mais parecia um destino inexorável a pesar como uma bigorna sobre as suas costas, ele, Diego Armando Maradona. Por muito tempo, no entanto, pensaram, e talvez Messi tenha pensado, que seus dois Outros eram um só: Messi é Maradona; mas se Messi não tem uma Copa, então Messi não é Maradona… então,a na realidade, Messi não é ninguém… Não!… Messi será Maradona!… contanto que… Entende-se onde quero chegar.

Os anos profissionais de um jogador de futebol passam muito mais depressa que nossa já efêmera vida. E, para Messi, sua trajetória como jogador, o capítulo mais importante de sua biografia, culminou com a decretação oficial de sua “santidade atlética”, a atribuição sem direito a controvérsia de seu status de craque atemporal, diante de toda a imprensa e da atual geração de torcedores do esporte mais popular do planeta, após a apoteótica exibição na final da Copa do Mundo de 2022, no momento em que erguia a Taça Fifa. Hoje, mesmo antes da aposentadoria, Messi já é apontado (e não aposentado, leia bem!) – e por não poucos, talvez pelos mesmos que antes tentavam explicar suas performances sobrenaturais apelando para diagnósticos clínicos! – como “melhor que Maradona” enquanto jogador e “tão influente e carismático quanto Dieguito” fora das quatro linhas, façanha notável, outrora até impensável, quando nos damos conta de que na Argentina Diego Maradona é venerado como um deus…

RESUMO LÓGICO DAS IMPLICAÇÕES DO EMPOLADO RACIOCÍNIO DE STAVROGIN E O SENTIDO DE “TUDO É PERMITIDO” NA OBRA DE DOSTOIEVSKY

God, for his part, if he exists, does not believe in his existence, but he allows the subject to believe in it, and to believe he [god] believes in it, or [the subject] not to believe that – but not to believe he [god] does not believe in it

Stavrogin, de Os Demônios, o psicólogo de Deus

  1. Deus existe; Deus não acredita na própria existência; Deus permite que o homem acredite na existência de deus ou não, mas não na segunda verdade fundamental.

1.1 O homem acredita na existência de deus.

1.1.1 O homem acredita que deus acredita na própria existência.

1.1.2 O homem acredita que deus não acredita na própria existência.

1.2. O homem não acredita na existência de deus.

1.2.1  O homem acredita que deus, se existisse, acreditaria na própria existência.

1.2.2 O homem acredita que deus, se existisse, não acreditaria na própria existência.

  1. Deus não existe.

2.1 O homem acredita na existência de deus.

2.1.1 O homem acredita que deus acredita na própria existência.

2.1.2 O homem acredita que deus não acredita na própria existência. Este homem na verdade é um grande ateu, pois um deus que não acredita na própria existência seria pior que a não-existência de um deus.

2.2. O homem não acredita na existência de deus.

2.2.1  O homem acredita que deus, se existisse, acreditaria na própria existência.

2.2.2 O homem acredita que deus, se existisse, não acreditaria na própria existência. Este homem é, finalmente, um grande ateu, o único ateu em sentido estrito, pois um deus que não acreditasse na própria existência, pensa ele, não deveria sequer ser pensável. Seria pior e mais absurdo que a não-existência de um deus, seria como uma confissão de não-onipotência por parte deste suposto deus.

2 conclusões:

  1. a) As possibilidades éticas são maiores sem Deus (tudo é permitido).
  2. b) Seria possível provar a inexistência de deus (jamais a existência)¹ ao se encontrar um só indivíduo que acredita que deus² não acredita em si próprio. É o caso do personagem da novela niilista de Dostoievsky. Seu niilismo absoluto, sua negação ultimada da realidade, não se escora no ingênuo fato de que não acredite num deus, mas que para ele, como um homem uma vez fanático e que pensou a idéia de Deus até as suas últimas conseqüências, esse deus se tornou impossível. Na percepção alcançada por Stavrogin, todos os casos são iguais, apenas ele e homens análogos a ele, um novo homem, são um outro: se Deus existe, quem acredita nele ou não são iguais; se Deus não existe, e Deus não existe, pois Stavrogin recebeu essa iluminação e nova sabedoria, ateus e crentes que acreditam que deus acredita em si próprio são iguais (inofensivos); mas ateus e crentes que acreditam que deus não acredita(ria) em si próprio, estes são niilistas radicais, os únicos ateus na verdadeira acepção da palavra. Igor Karamazov (outro romance) se questiona: Tudo é permitido?, mas Stavrogin responde, em Os Demônios.

¹ Pois todos os indivíduos precisariam respeitar as vedações em 1.1 e 1.2. Mas mesmo que todos na Terra em dado dia as respeitassem, não quereria dizer que jamais um indivíduo no passado as respeitou; e nem que nunca haverá de nascer um indivíduo que não as respeite.

² O deus existente, para o crente, ou inclusive apenas uma abstração, a hipótese de deus, de um deus que não acreditasse em si mesmo, para o não-crente.

Não exageremos a importância deste raciocínio lógico elaborado, no entanto: não podemos provar crenças (talvez apenas a nossa própria, e ainda assim podemos desconfiar de que às vezes mentimos para nós mesmos).

SUPERGLOSSÁRIO – LATIM

Adjetivos

ater, atra, atrum. Negro, preto, atro, escuro. Obscuro, tenebroso, tempestuoso. Sombrio, funesto, horrível. Cruel, infeliz, maligno.

attigŭus,-a,-um. (ad-tango). Contíguo, próximo. Adjacente, vizinho.

caesĭus,-a,-um. Esverdeado, de cor verde.

crudus,-a,-um. (cruor). Sangrento, ensanguentado. Cru, não processado. Não digerido, que digere mal. Que faz sangrar, violento, cruel, áspero. Vigoroso, impiedoso. Novo, recente, imaturo, inexperiente.

edax, edacis. (edo). Voraz, devorador. Consumidor.

humĭlis, humĭle. (humus). Que está no chão. Baixo, pequeno. Humilde, modesto. Fraco, sem importância, de baixa condição. Abatido, humilhado.

ignauus,-a,-um. (in-gnauus). Ignavo, indolente, inativo, preguiçoso. Covarde. Sem energia, improdutivo, inerte, inútil. Que entorpece, torna ocioso.

ignotus,-a,-um. (in-nosco). Desconhecido, ignorado. Que não conhece, ignorante.

insŏlens, insolentis. (in-solĕo). Que não tem o hábito de, não habituado. Desusado, pouco frequente, novo. Desmedido, excessivo. Altivo, arrogante, insolente.

latus,-a,-um. Largo. Extenso, espaçoso. Abundante, rico. Duradouro.

maestus,-a,-um. (maerĕo). Triste, abatido, aflito. Fúnebre, sinistro. Severo, sombrio.

mollis, molle. Mole, tenro, delicado, macio. Flexível. Brando. Fraco, tímido, sensível. Afeminado. Suave, agradável, doce. Ameno, aprazível. Favorável, propício.

opertum,-i, (n.). (opertus/operĭo). Lugar secreto. Segredo. Resposta ambígua, oráculo obscuro.

perosus,-a,-um. (perodi). Que detesta, que odeia intensamente. Muito odiado, odioso.

praeceps, praecipĭtis. (prae-caput). Que coloca a cabeça na frente. Rápido, veloz, violento, arrebatador. Impetuoso, apressado, precipitado, impaciente, ansioso, abrupto. Íngreme, muito inclinado, em declive. Perigoso, crítico.

praestans, praestantis. (praesto). Que se destaca, superior, excelso, excelente, extraordinário, preeminente.

spissus,-a,-um. Denso, compacto, espesso, consistente. Lento, vagaroso. Difícil, penoso.

ueternosus,-a,-um. (uetus). Letárgico. Adormecido, inativo, lânguido.

Advérbios

aegre. (aeger). De modo aflitivo, com dificuldade, penosamente, de má vontade.

aeque. Igualmente, da mesma maneira. Justamente, equitativamente.

cito. Depressa, rapidamente. Facilmente.

clam, prep./acus. e abl., também advérbio. Às escondidas, secretamente, às ocultas.

crebro. (creber). Frequentemente, sempre, sem interrupção. = PROTINUS

diu. Durante muito tempo, há muito tempo. Também usado como antigo locativo de dies: durante o dia, de dia. = PRIDEM

eo. I – Adv.: Para lá, para aquele lugar. A este ponto, a tal estado. II – Por causa disto, a fim de que, para que. Tanto que, tanto mais que, tanto menos que. De tal modo, assim, a tal ponto. obs: ver eo como verbo “vou lá assim” do português coloquial em latim poderia ser traduzido como “eo eo eo”.

fortasse também fortassis. (forte). Talvez, acaso. Possivelmente, provavelmente. Aproximadamente, mais ou menos, quase.

fundĭtus. (fundus). Desde os alicerces, radicalmente, inteiramente. No fundo, nas profundezas. = PENITUS

hesternus,-a,-um. (heri). De ontem, de véspera.

hic. Ver PRONOMES.

interĕa. (inter-ea). Durante este tempo, enquanto isso, no intervalo.

nimĭum. (nimis). Muito, demasiadamente, excessivamente, enormemente.

nitĭde. (nitĭdus). Claramente, nitidamente. Com brilho, em esplendor, magnificamente.

numquam. Nunca, jamais. De modo algum.

palam. I- Em público, publicamente, abertamente, claramente. De domínio público. II- Diante de, perante. = CORAM

paulo. (paulus). Pouco. De alguma maneira.

penĭtus. No fundo, até o fundo, profundamente. Internamente. = FUNDITUS

potĭus. (potis). Antes, melhor, preferivelmente, de preferência.

pridem. (prae). Há muito tempo, de longa data. Antes, antigamente, outrora. = DIU

protĭnus. (pro-tenus). Para frente, para diante, avante. Diretamente, constantemente, continuamente, sem parar, ininterruptamente. Logo em seguida, sem demora, imediatamente. = CREBRO

quantuluscumque,-tulacumque,-tulum-cumque. (quantŭlus-cumque). Por menor que, independentemente do tamanho que.

quidem. De fato, realmente, na verdade. Também, igualmente. Mas, contudo, ainda mais. Pelo menos, mas ao menos. Por exemplo, tal como. (ne…quidem = nem mesmo, nem sequer. Et/ac…quidem = e ainda por cima, e o que é melhor).

saepe. Muitas vezes, frequentemente, com frequência. (saepe numĕro = repetidas vezes).

secure. (securus). De modo despreocupado, com tranquilidade, sem cuidado. Em segurança.

simul. Ao mesmo tempo, de uma só vez, juntamente, simultaneamente. (simul et = e também, assim que, tão logo; simul…simul… = de uma parte… de outra parte, não só…mas também…; simul ac/atque/ut/ubi = assim que, tão logo).

Conjunções:

(Para outras conjunções, ver tabela nas pp. 77-8.)

atque, conj. E por outro lado, e o que é mais. E entretanto, e contudo. E.

autem, conj. (adversativa atenuada que não vem no início de frase). Por outro lado, ora, no entanto.

donec. I – com indicativo: enquanto, durante todo o tempo que. Até o momento que. II – com subjuntivo: Até que, até que finalmente, até o momento que.

ergo. I – Conj.: Pois, portanto, por conseguinte, logo. II – posposto a um genitivo = por causa de, graças a, em honra de.

ita. Assim, desta maneira, como dizes, nestas condições. Tal, do mesmo modo. Pois, portanto, por consequência. Sim (como resposta).

itaque. (ita-que). E assim, desta maneira. Pois, assim pois, por consequência. Por exemplo.

neque/nec. E não, nem.

neue/neu. E que não, e não, nem.

si. Se, se por acaso. Já que, visto que, uma vez que. (si modo = se pelo menos; si… tamen…= ainda que, mesmo se, embora).

sicut/sicŭti. (sic-ut/uti). Assim como, exatamente como. Visto que, já que. Como se fosse, tal qual. Como por exemplo, assim como. (sicut est/erat = Como é/era de fato, como realmente é/era)

tamen. Todavia, contudo, entretanto, ainda que. (claro caso de falso homônimo)

ue (-ue). Partícula aglutinante: I – como prefixo: indica privação – uesanus. II – como enclítica: corresponde a ou, nas expressões alternativas. = VEL

ut. I – Adv.: como, de modo que, de que maneira. Assim como, do mesmo modo que. II – conj.: que, a fim de que, para que. Quando, como.

uel. Ou, ou se, ou mesmo, ou então. Talvez, mesmo. = UE

Numerais

quater. (quattŭor). Quatro vezes.

ter. Três vezes. É utilizado ainda como elemento de ênfase, de indicação de que algo se repete.

Preposições

coram, prep./abl., também advérbio. Perante, em presença de, diante. Face a face, defronte. Publicamente, abertamente. = PALAM

deinde. Depois, em seguida, a seguir (no tempo e no espaço).

dum. I – com indicativo: Enquanto, durante o tempo em que. Até que, até o momento em que. II – com subjuntivo: até que, contanto que, desde que.

iam. Já, agora, neste momento. Desde agora, deste momento em diante. Ora, daí, então.

igĭtur. Portanto, pois, nestas circunstâncias. Em resumo, em suma. Então, sendo assim, por conseguinte.

licet. Embora, ainda que.

nisi. Se não. Exceto se, senão, somente se. (nisi ut = a menos que).

propter. (prope). prep./acus. Perto (de), ao lado (de), junto (a/de), ao alcance (de). Por causa de, em função de. Através de, por meio de.

rursus/rursum. (reuerto). Para trás. Pelo contrário, por outro lado, por sua vez. Novamente, pela segunda vez.

saltem/saltim. Pelo menos, ao menos, de qualquer maneira.

uix. Com custo, com dificuldade, dificilmente. Mal, apenas. Enfim, em suma.

Pronomes

(flexões às pp. 90-1 / explicação dos interrogativos à p. 97.)

an ou anne. Partícula interrogativa que traduz grande dúvida ou uma restrição. Será possível que…? Por ventura? Acaso?

eodem. (idem). Para o mesmo lugar, ao mesmo ponto. Ao mesmo fim.

hic, haec, hoc. Este, esta, isto.

hic. Aqui, neste lugar. Neste momento, agora.

ille, illa, illud. Aquele, aquela, aquilo. Usado enfaticamente: o famoso, “aquele”, célebre; para caracterizar desprezo, distanciamento: aquele, aquela.

is, ea, id. Elemento de valor anafórico: Ele, ela. O, a. Este, esta.

iste, ista, istud. Pronome demonstrativo de segunda pessoa: Esse, essa, isso. Tal, semelhante. Às vezes se emprega com sentido pejorativo.

qua. (qui). De que lado, em que lugar, em que direção, por onde. Até o ponto em que, o máximo que, pelo meio que, do lado que. Como, de que maneira, através de que meio. De qualquer maneira. (qua…qua = tanto…quanto, por um lado…por outro).

quisquam, quaequam, quicquam/quidquam. (quis-quam). Qualquer um, qualquer coisa, alguém, alguma coisa

ubi. No lugar em que, onde. Onde, em que lugar? Quando, em tal momento. Quando? Em que momento?

uter, utra, utrum. Um dos dois, não importa qual dos dois. Qual dos dois? (obs. também há um adjetivo e um substantivo uter). Provavelmente a origem ou correlacionado com other do inglês.

Substantivos

adiutor, adiutoris, (m.). (ad-iuuo). O que ajuda. Auxiliar, assistente, ajudante. Substituto.

adiutorĭum,-i, (n.). (ad-iuuo). Ajuda, socorro, auxílio. Adjutório.

adiutrix, adiutricis, (f.). (ad-iuuo). A que ajuda. Auxiliar, assistente, ajudante.

aes, aeris. (n) bronze, dinheiro, moeda, fortuna.

aestas, aestatis, (f.). Verão, estio. Calor do verão.

aetas, aetatis, (f.). Idade. Duração de uma vida. Geração, século.

aether, -ěris ou ěros. (m) éter, região superior do ar que envolve a atmosfera; parte do céu, sede do fogo; fogo; o céu, a mansão dos deuses; o ar; o mundo dos vivos (por oposição aos infernos).

afflatus,-us, (m.). (ad-flo). Sopro, vento, respiração. Inspiração.

agna,-ae, (f.). Cordeira, ovelha. Vítima oferecida em sacrifício.

agnatus,-us, (m.). (ad-gnascor). Parente pelo lado paterno. Criança nascida após estabelecidos os herdeiros.

agnina,-ae, (f.). (agnus). Carne de cordeiro.

agnitĭo, agnitionis, (f.). (ad-gnosco). Conhecimento, reconhecimento.

agnus,-i, (m.). Cordeiro, carneiro.

alĕa,-ae, (f.). Jogo de dados, jogo de sorte. Sorte. Risco, perigo, azar.

aluus,-i, (f.). Cavidade intestinal, ventre. Útero. Cortiço de abelhas.

amasiuncŭla,-ae, (f.). (amo). Amante, namorada. Namoradinha.

amasĭus,-i, (m.). (amo). Amante, namorado.

aprugnus ou aprunus,-a,-um. (aper). De javali.

aquĭlo, aquilonis, (m.). O Aquilão (vento norte).

arx, arcis, (f.). Cidadela. Altura, o ponto mais elevado. Lugar fortificado, forte, baluarte. Refúgio, proteção. O Capitólio.

ascĭa,-ae, (f.). Enxó, machadinha.

bos, bovis: (m) [seu pai tem… ] boi

brachĭum,-i (n.). Braço, antebraço. Membro anterior de animais. Braço de mar.

caecĭtas, caecitatis, (f.). (caecus). Cegueira, falta de vista.

calămus,-i, (m.). Cana, haste de plantas. Objeto feito de ou em formato de cana. Caniço, flauta, flecha. Caneta, pena de escrever. Colmo de plantas.

compressĭo, compressionis, (f.). (cum-premo). Compressão, ato de comprimir. Concisão, precisão de estilo. Abraço.

contubernĭum,-i, (n.). (cum-taberna). Camaradagem. Relações de amizade, intimidade. Habitação comum. Morada.

caro, carnis. (f) carne.

cibus,-i, (m.). Alimento, comida. Seiva. Estimulante. Isca.

cinis, cinĕris, (m.). Cinza. Cinzas dos mortos, restos mortais. Ruínas. Morte.

comĭtas, comitatis (f.). (comes). Afabilidade, cortesia, bondade. Liberalidade, generosidade. Magnificência de mesa, luxo.

corĭum,-i, (n.). Couro, pele curtida de animais. Pele, casca. Correia, chicote.

cornu,-us, (n.). Chifre, corno. Objeto feito de ou em forma de chifre. Casco do pé de animais. Bico de aves. Dente de elefante. Antena de insetos. Cornos da lua. Braço de rio. Arco. Penacho, cumeeira de capacete. Formação do exército. Vasilha de guardar azeite. Funil. Coragem, energia. Corno como símbolo da resistência e da hostilidade.

cornum, -i. Pilrito (fruta avermelhada)

cras. Amanhã.

crastĭnus,-a,-um. (cras). De amanhã. Posterior, futuro.

crus, cruris, (n.). Pernas. Pilastras. Parte inferior de um tronco.

cura,-ae, (f.). Cuidado, zelo, preocupação amorosa. Direção, administração, encargo. Tratamento (= atenção, cuidado). Guarda, vigia, protetor.

decor, decoris, (m.). (decet). Beleza física, formosura, encanto, graça. O que fica bem, o que convém. Ornamento, elegância. (Opõe-se a DECUS = beleza moral).

disciplina,-ae, (f.). (disco). Ensino, instrução, educação, ciência, disciplina. Disciplina militar. Matéria ensinada. Método, sistema, doutrina. Organização política. Princípios de moral.

dolus, -i, (m.). Manha, astúcia, sagacidade. Engano, ardil, dolo. Insídia, traição, trapaça, fraude. Erro, falta, ato censurável, negligência.

domĭna,-ae, (f.). (domus). Dona da casa, esposa. Senhora, soberana. Amiga, amante. A imperatriz.

dos, dotis, (f.). (do). Dote. Bens, talento, qualidades.

fastus,-us, (m.). Orgulho, soberba, altivez, desdém.

fauces, faucĭum, (f.). Garganta, desfiladeiro. Entrada de uma caverna, de um porto. Boca, cratera. Goela.

fel, fellis, (n.). Bílis, fel. Amargor. Cólera, inveja, veneno.

forma, formae: Pode significar forma, molde, moldura, beleza, formosura, mas também significa moeda cunhada, moeda, além de significar figura, imagem, representação. Ver VULTUS.

fraga, -orum (n. pl.). morangos

habĭtus,-us, (m.). (habĕo). Condição, estado, aspecto exterior, conformação física. Aparência, postura, situação, posição, atitude. Maneira de ser ou de agir, hábito. Veste, traje (= roupas características).

herctum,-i, (n.) Herança.

hereditarĭus,-a,-um. (heres). Relativo a uma herança, de herança. Recebido por herança, hereditário.

heredĭtas, hereditatis, (f.). (heres). Herança, ação de herdar. Sucessão.

heredĭum,-i, (n.). (heres). Herança, bens herdados, patrimônio.

heres, heredis, (m.). Herdeiro, herdeira. Proprietário, dono.

heri ou here. Ontem.

hircinus,-a,-um. (hircus). De bode, de pele de bode.

hircosus,-a,-um. (hircus). De bode, peludo como um bode, que cheira a bode.

hircus,-i, (m.). também hirquus. Bode. Cheiro de bode. Devasso.

iactura,-ae, (f.). (iacĭo). Alijamento, lançamento de uma carga ao mar, perda. Dano, prejuízo, sacrifício. Despesa, gasto, prodigalidade. ~FATURA

imber, imbris, (m.). Aguaceiro, chuva, temporal. Nuvem de chuva, chuva de pedras.

incus, incudis, (f.). (in-cudo). Bigorna.

inopĭa,-ae, (f.). (in-ops). Falta, carência, privação. Necessidade, pobreza, miséria, indigência. Abandono. Abstinência. Secura.

instar, (n.) – indeclinável. Peso que se colocava num dos pratos da balança. O equivalente, o valor de, mais ou menos, do tamanho de. Valor igual, imagem, semelhança.

interfatĭo, interfationis, (f.). (inter-for). Interrupção, interpelação.

iter, itinĕris, (n.). Caminho percorrido, trajeto, viagem, marcha. Via, meio, maneira. Curso.

iurgĭum,-i, (n.). (ius-ago). Querela, disputa, contenda. Contestação, separação (de casal).

iusiurandum, iurisiurandi. (n) Juramento.

iussum,-i, (n.). (iubĕo). Ordem, mandado, preceitos. Vontade (do povo), lei.

mentŭla,-ae, (f.). Membro viril, pênis.

mercedŭla,-ae, (f.). (merces). Pequeno salário, pequena renda. Rendimento fraco.

modĭus,-i, (m.). Módio, alqueire.

modo. Só, somente, apenas. Neste momento, imediatamente. Ainda há pouco, ainda agora. Pouco depois. (modo + subjuntivo/ut = contanto que, sob a condição de; modo…modo… = ora…ora…, sucessivamente).

moecha,-ae, (f.). Mulher adúltera, cortesã.

moechas, moechadis, (f.). Mulher adúltera, cortesã.

moechia,-ae, (f.). Adultério.

moechus,-i, (m.). Homem adúltero.

munus, munĕris, (n.). Cargo, função, ocupação, ofício público. Obrigação, serviço, tarefa. Presente, brinde. Graça, favor, benefício. Exéquias, funeral. Espetáculo público, combate de gladiadores.

oblectamen, oblectamĭnis, (n.). (oblecto). Divertimento, distração, recreação.

occidĭo, occidionis, (f.). (occido). Massacre, extermínio, carnificina, matança.

occidŭus,-a,-um. (occĭdo). Poente, ocidental, localizado no ocidente. Decadente, declinante. Perecível, que caminha para o fim.

occipitĭum,-i, (n.). (ob-caput). A parte de trás da cabeça, occipício.

officina,-ae, (f.). (opĭfex). Oficina, fábrica, laboratório, loja. Escola.

olla,-ae, (f.). Panela, caldeirão. Urna cinerária.

opĭfex, opifĭcis, (m./f.). (opus-facĭo). Autor(a), fabricante, produtor(a). Trabalhador(a), artista.

os, oris, (n.). Boca. Voz, linguagem, palavra. Expressão facial, rosto, fisionomia. Ar, aspecto. Entrada, abertura, orifício. = VULTUS. Fonte, princípio. Embocadura. Proa de Navio. (pleno ore = zelosamente, com carinho).

os, ossis, (n.). Osso, ossada. Parte interior, cerne, caroço. Esqueleto. Coração, entranhas.

ouilis, ouile. (ouis). De ovelha, lanígero.

ouis, ouis, (f.). Ovelha, carneiro. Lã. Simplório, bobo, imbecil.

plaga,-ae, (f.). Golpe, pancada, soco. Surra, açoite. Ferida, lesão, cicatriz. Desgraça, calamidade. Praga, peste. Aflição, aborrecimento. Região, setor, área delimitada, zona. Distrito, comarca. Rede de caça. Armadilha, emboscada. Cortina.

poetrĭa,-ae, (f.). Poetisa.

pontĭfex, pontifĭcis, (m.). (pons-facĭo). Pontífice, sacerdote que ocupa alto cargo. (pontĭfex maxĭmus = presidente do Colégio dos pontífices).

pontus,-i, (m.). Mar, alto mar, mar profundo. Onda, vaga.

praetexta,-ae, (f.). (praetexo). I – Pretexta (manto bordado com púrpura, usado em Roma pelos mais altos magistrados e pelas crianças nascidas livres, até que pudessem vestir a toga uirilis – aos 16 anos mais ou menos). II – Um tipo de manifestação teatral romana, tragédia romana.

probrum,-i, (n.). Ato vergonhoso, conduta ignóbil. Indecência, lascívia, adultério. Vergonha, desgraça, desonra, infâmia. Abuso, insulto, difamação.

proelĭum,-i, (n.). Combate, batalha, luta. Rivalidade.

puella,-ae, (f.). (puellus). Menina, garota, criança (do sexo feminino). Moça. Amada, querida. Mulher nova, esposa jovem.

puer,-ĕri, (m.). Criança (do sexo masculino ou feminino). Menino, garoto. Rapaz, jovem solteiro. Filho. Servo novo, escravo jovem, pajem.

puerpĕra,-ae, (f.). (puer-parĭo). Parturiente.

pumex, pumĭcis, (m./f.). Pedra-pomes. Pedra porosa. Pedra, rocha, rochedo.

quadrantalis, quadrantale. (quadrans). Que contém a quarta parte.

rapĭdus,-a,-um. (rapĭo). Que arrebata, que toma à força, que arrasta violentamente. Rápido, veloz, ligeiro. Impetuoso, precipitado, impaciente.

regĭa,-ae, (f.). (rex). Residência do rei, palácio real. Tenda do rei. Trono, corte real. Reino, realeza. Cidade real, capital. Salão, varanda, pórtico. Basílica.

reticentĭa,-ae, (f.). (reticĕo). Silêncio, ação de silenciar. Pausa no meio do discurso.

rima,-ae, (f.). Fenda, rachadura, fissura, greta. Sulco. Órgão sexual feminino.

riuus,-i, (m.). Pequeno fluxo de água, córrego, riacho, ribeirão. Canal de irrigação, vala. Rego, calha. Corrente, torrente, fluxo. (e riuo flumĭna magna facĕre = supervalorizar uma situação, fazer tempestade em copo d’água).

robur, robŏris, (n.). Madeira muito dura. (Madeira de) carvalho. Objeto feito de madeira dura/carvalho (bancada, assento, lança, dardo, cavalo, arado, etc). Oliveira. Firmeza, vigor, força, rigidez. Poder, autoridade. Cerne, força motriz.

rogus,-i, (m.). Pira, fogueira funerária. Túmulo, sepultura.

rufus,-a,-um. Vermelho, avermelhado, ruivo.

scelus, scelĕris, (n.). Crime, atitude abominável, ato infame. Má qualidade, natureza viciosa. Vilania, atitude de salafrário. Velhaco, patife (adj.). Azar, infelicidade, calamidade, infortúnio. Catástrofe natural.

scopŭlus,-i, (m.). Rocha, rochedo, penedo. Escolho. Dificuldade, perigo.

sera,-ae, (f.). (sero). Barra de madeira (usada para trancar portas). Fechadura, ferrolho.

sidus, sidĕris, (n.). Grupo de estrelas, constelação. Céu, firmamento. Noite. Estrela, astro. Brilho, beleza, ornamento. Orgulho, glória. Estação do ano. Clima, tempo. Tempestade, temporal, tormenta.

sinus,-us, (m.). Curva, cavidade, sinuosidade, concavidade. Rosca, espiral. Prega da parte superior da toga, parte superior de uma vestimenta. Bolso, porta-moeda. Roupa, vestimenta. Seio, peito. Regaço, colo. Esconderijo, asilo. Parte mais íntima, interior, cerne, centro. Baía, enseada, golfo. Ponta de terra que avança sobre o mar. Terreno recurvado, vale. (sinu laxo ferre = ser descuidado, não prestar atenção).

spes,-ei, (f.). Esperança, expectativa, perspectiva. Temor, mau pressentimento, receio.

spontis. Vontade, desejo, voluntariamente, por si mesmo, por sua própria vontade (sponte sua); sponte (abl.)

stabŭlum,-i, (n.). (sto). Residência, domicílio, morada, habitação. Estábulo, estrebaria, cercado. Rebanho, bando, manada. Cabana, albergue, hospedaria, taberna. Lupanar, bordel.

stipes, stipĭtis, (m.). Tronco de árvore, tora, talo, haste. Árvore. Galho, ramo. Imbecil.

sus, suis. (m) Porco.

tergum,-i, (n.). Pele (das costas), dorso, costas. Lombo. Pele, couro, objetos feitos de couro. Face posterior das coisas, retaguarda. Superfície (de águas, por exemplo).

tergus, tergŏris, (n.). Pele, costas. Couro de um tambor, couraça, escudo de couro.

tessĕra,-ae, (f.). Cubo, dado. Peça de mosaico ou marchetaria. Téssera, senha de hospitalidade. Tabuinha com as ordens do exército ou com uma senha. Bilhete de entrada no teatro. Senha para distribuição de alimento.

tribus,-us, (m.). Tribo (divisão inicial do povo romano). Povo, classe pobre, multidão, massa. Classe, categoria.

triquĕtrus,-a,-um. Que tem três ângulos. Da Sicília (seu formato é triangular).

tritĭcum,-i, (n.). Trigo (beneficiado).

usurpatĭo, usurpationis, (f.). (usus-rapĭo). Uso, emprego. Uso ilícito, abuso, usurpação.

vindex, -ĭcis. (m e f) fiador, vingador, protetor.

uir, uiri, (m.). Homem. Marido, esposo. Macho. Indivíduo, pessoa, companheiro, colega. Virilidade. família importante de palavras, com desinências abaixo.

uirga,-ae, (f.). Ramo flexível e delgado, rebento, vergôntea. Vara, chibata. Vara mágica. Caduceu (de Mercúrio). Vara com visgo para apanhar pássaros. Raios.

uirginĭtas, uirginitatis, (f.). (uirgo). Virgindade.

uirgiuendonĭdes. (uirgo-uendo). Vendedor de mulheres jovens.

uirgo, uirgĭnis, (f.). Mulher jovem. Virgem, novo. As Vestais. Diana. A constelação de Virgem.

uirgŭla,-ae, (f.). (uirga). Pequena vara, pequeno traço ou linha.

uiridĭa,-ĭum, (n.). (uirĕo). As plantas (o verde). Jardim, vergel.

uirilĭtas, uirilitatis, (f.). (uir). Virilidade, idade viril. Caráter masculino, sexo masculino.

uirtus, uirtutis, (f.). (uir). Força física do homem, vigor do homem. Coragem, vigor, energia. Qualidades morais: virtude, perfeição, mérito, valor.

uirus,-i, (n.). Suco de plantas. Humor venenoso, veneno, peçonha. Amargor, mau cheiro.

uisceratĭo, uiscerationis, (f.). (uiscus). Distribuição pública de carne. Refeição de carne.

uiscum,-i, (n.). Visco (planta). Visgo.

unguis, unguis, (m.). Unha. Garra, casco, esporão. Objeto em forma de unha.

uulpes, uulpis, (f.). Raposa. Manha, astúcia, dissimulação.

uultus,-us, (m.). Expressão do rosto, fisionomia, rosto, semblante, olhar. Figura, aspecto, aparência. = FORMA, OS.

Verbos

abdo,-is,-ĕre,-dĭdi,-dĭtum. (ab-do). Retirar, afastar. Encobrir, ocultar.

adduco,-is,-ĕre,-duxi,-ductum. (ad-duco). Puxar para si, fazer vir a si, levar consigo. Conduzir, levar a. Contrair, enrugar.

adiuvo,-as,-are,-iuvi,-iutum. (ad-iuuo). Vir em auxílio de, auxiliar, ajudar, favorecer. Sustentar, manter. Animar. Realçar.

aequo,-as,-are,-aui,-atum. Aplainar, igualar, nivelar. Atingir, chegar a.

affĕro, affers,-ferre, attŭli, allatum. (ad-fero). Trazer ou levar. Anunciar, comunicar. Alegar, referir, dizer.

agĭto,-as,-are,-aui,-atum. (ago). Impelir com força, fazer avançar. Agitar. Perseguir, atormentar, censurar. Pensar, refletir.

agnascor,-ĕris,-nasci,-natus sum. (ad-gnascor). Nascer junto, ao lado de. Nascer depois do testamento.

ago,-is,-ĕre, egi, actum. Empurrar para frente, impelir, conduzir à frente. Dirigir-se para. Fazer sair, expulsar. Agir, fazer, ocupar-se de, tratar. Viver, passar a vida. Cumprir um ritual, interpretar, representar um papel.

aio, ais (defectivo). Dizer sim, afirmar. Dizer.

amitto,-is,-ĕre, amisi, amissum. (a-mitto). Deixar escapar ou afastar-se, deixar partir. Perder, abandonar, renunciar.

appeto,-is,-ĕre,-petiui,-petitum. (ad-peto). Procurar aproximar-se de, procurar alcançar. Atacar, assaltar. Desejar pretender. Aproximar-se, chegar.

aspernor,-aris,-ari,-atus sum. (sperno). Afastar, rejeitar, recusar, renegar. Repelir com desprezo

assuesco,-is,-ĕre,-sueui,-suetum. (ad-suesco). Habituar-se a, acostumar a.

attingo,-is,-ĕre,-tĭgi,-tactum. (ad-tango). Tocar em, alcançar, atingir. Confinar com, estar contíguo.

caedo, -is, -ěre, cecidi, caesum. bater, abater, cortar, matar, massacrar, partir, decepar.

carpo,-is,-ĕre, carpsi, carptum. Colher, arrancar. Desenredar, desfiar, separar. Recolher, fruir, gozar, consumir. Censurar, atacar. Percorrer, seguir.

cedo,-is,-ĕre, cessi, cessum. Ir, andar, dar um passo adiante. Tocar a, caber a. Retirar-se, ir-se embora. Ceder a, não resistir. Entrar em acordo. Passar, decorrer. Conceder, entregar.

celo,-as,-are,-aui,-atum. Esconder, ocultar.

coepi, coepisse, coeptum – somente perfectum. Ter começado, principiado. Estabelecer. Começar.

coepto,-as,-are,-aui,-atum. (coepi). Começar, empreender, tentar. Estar no início.

cogo,-is,-ĕre, coegi, coactum. (cum-ago). Levar junto, conduzir juntamente. Reunir em um mesmo lugar, congregar. Condensar, resumir. Conduzir à força, obrigar a reunir. Coagir, forçar, obrigar. Coagular. Fechar a marcha. Concluir, inferir.

committo,-is,-ĕre,-misi,-missum. (cum-mitto). Pôr juntamente, juntar, reunir. Comparar, confrontar. Confiar, entregar. Começar, empreender, travar combate. Cometer uma falta, infringir uma lei. Merecer um castigo, ser culpado.

comprĭmo,-is,-ĕre,-pressi,-pressum. (cum-premo). Comprimir, apertar, contrair. Reter, suspender, conter, reprimir. Guardar, ocultar. Forçar, violentar. Ter prisão de ventre.

concumbo, -is, -ere, -cubui, cubitura: deitar-se

confirmo,-as,-are,-aui,-atum. (cum-firmo). Consolidar, firmar. Restabelecer-se, convalescer, curar-se. Confirmar, ratificar, provar, garantir. Animar, encorajar, persuadir.

coniicĭo,-is,-ĕre,-ieci,-iectum, ou conicĭo, também coicĭo. (cum-iacĭo). Lançar juntamente, lançar em massa, reunir. Lançar, arremessar, atirar. Presumir, calcular, conjeturar, concluir, inferir.

consto,-as,-are,-stĭti,-statum. (cum-sto). Estar seguro, estar firmemente estabelecido. Ser evidente, ser composto de, consistir em. Custar, ser posto à venda, ter o valor de. Existir, subsistir, permanecer, durar. Estar de acordo, em harmonia. Constar.

constupro,-as,-are,-aui,-atum. (cum-stupro). Desonrar, atentar contra o pudor, violar. Manchar, poluir, sujar.

consuesco,-is,-ĕre,-sueui,-suetum. (cum-suesco). Acostumar, habituar. Acostumar-se. Ter relações com. = SOLEO, ASSUESCO

contĕgo,-is,-ĕre,-texi,-tectum. (cum-tego). Cobrir, proteger. Esconder, encobrir, dissimular.

contingo,-is,-ĕre,-tĭgi,-tactum. (cum-tango). Tocar, tocar em, atingir. Chegar, alcançar. Ter relações. Contaminar.

contingo,-is,-ĕre,-tinxi,-tinctum, ou contingŭo. (cum-tingo). Tingir completamente, cobrir de tinta, untar, impregnar.

corripĭo,-is,-ĕre,-ripŭi,-reptum. (cum-rapĭo). Agarrar bruscamente, apoderar-se violentamente. Tomar, agarrar. Reunir, ajuntar, acolher. Reduzir, diminuir, abreviar.

corusco,-as,-are,-aui,-atum. Entrechocar-se. Cintilar, brilhar, luzir. Brandir, mover, agitar, dardejar.

cupĭo,-is,-ĕre,-iui/-ĭi,-ítum. Desejar, ter vontade de, desejar ardentemente, cobiçar. Ter desejos, paixão.

curo,-as,-are,-aui,-atum. (cura). Cuidar, olhar por, tratar, velar. Curar. Governar, dirigir, administrar. Comandar. Fazer por, ter em conta. Vigiar, zelar, proteger.

debĕo,-es,-ere, debŭi, debĭtum. (de-habĕo). Dever (dinheiro ou qualquer outra coisa), ser devedor. Ter obrigação de. Ser forçado a. Estar obrigado a. Ser destinado a.

delinquo,-is,-ĕre,-liqui,-lictum. (de-linquo). Faltar, ausentar-se. Cometer uma falta, delinquir, pecar.

depono,-is,-ĕre,-posŭi,-posĭtum. (de-pono). Pôr no chão, pousar. Depor. Guardar em segurança, depositar, confiar a. Abandonar, largar, renunciar, deixar de lado.

deprĭmo,-is,-ĕre,-pressi,-pressum. (de-premo). Abaixar, fazer descer, enterrar. Submergir. Abater, deprimir, rebaixar. Humilhar, depreciar, restringir.

deridĕo,-es,-ere,-risi,-risum. (de-ridĕo). Rir de, zombar, ridicularizar.

detrăho,-is,-ĕre,-traxi,-tractum. (de-traho). Puxar para baixo, rebaixar. Tirar com violência, com força, arrancar. Denegrir, depreciar, causar mal.

deuŏco,-as,-are,-aui,-atum. (de-uoco). Chamar, fazer descer, fazer vir, atrair, convidar. Conduzir, levar a.

dico, -is, -ere, dixi, dictum: narrar; cantar, celebrar, recitar, predizer; chamar, designar, apelidar; nomear, eleger; fixar, estabelecer; ordenar, avisar.

dilĭgo,-is,-ĕre,-lexi,-lectum. (dis-lego). Amar (por escolha), gostar, distinguir, honrar, considerar.

disco,-is,-ĕre, didĭci. Aprender, estudar. Aprender a conhecer, conhecer, ser informado.

dispăro,-as,-are,-aui,-atum. (dis-par). Separar, dividir.

diuello,-is,-ĕre,-uelli/-uulsi,-uulsum. (dis-uello). Puxar em sentidos diversos, separar à força, rasgar, arrancar, dilacerar. Perturbar. Afastar, separar. (parece não ter o sentido de desvelar.)

do, das, dare, dedi, datum. Dar. Oferecer, apresentar, consagrar, fornecer. Permitir, concordar, admitir, ceder. Provocar, ocasionar. Pôr, colocar. Produzir, emitir. Dizer, expor, proferir. Fixar, representar.

duro,-as,-are,-aui,-atum. (durus). Tornar duro, endurecer, fortificar.Tornar-se insensível, ser cruel. Tornar forte, durar, resistir.

edo, edis, edĕre, edĭdi, edĭtum. (e-do). Fazer sair, publicar, dar à luz. Produzir, causar. Expor, fazer ver. Escolher, nomear, declarar, fazer conhecer oficialmente.

egĕo,-es,-ere, egŭi. Estar na pobreza, na indigência, ser pobre, carecer de. Estar privado de. Procurar, desejar.

emerĕo,-es,-ere,-merŭi,-merĭtum. (e-merĕo). Merecer, obter, conseguir, ganhar. Concluir o serviço militar.

emĭco,-as,-are,-micŭi,-atum. (e-mico). Lançar-se para fora, atirar-se para fora, sair com força, romper, brotar. Aparecer, surgir, irromper, manifestar-se.

eo, is, ire, iui/ĭi, itum. Ir. Dirigir-se, caminhar para, andar. Recorrer, procurar, Passar, transformar-se, correr de, espalhar-se. obs: ver EO como advérbio.

excepto, -as, -are. (ex-capĭo). Retirar a todo instante, recolher habitualmente, recolher, apanhar.

excĭto,-as,-are,-aui,-atum. (ex-cito). Mandar sair, chamar para fora, expulsar. Excitar, provocar, despertar, estimular, animar. Dar, apresentar (testemunhas). Construir, edificar. Fazer brotar, crescer. Assinar, encorajar.

fallo,-is,-ĕre, fefelli, falsum. Enganar, induzir em erro, trair, faltar, falsear. Escapar a, ignorar.

fatĕor,-eris,-eri, fassus sum. (for). Confessar, reconhecer o erro. Manifestar, declarar, proclamar, publicar.

fingo,-is,-ĕre, finxi, fictum. Modelar em barro, modelar, moldar, esculpir. Imaginar, inventar, produzir, criar, fingir. Ajustar, adaptar.

fio, fis, fiěri, factus sum. (passiva de facio) ser feito, ser criado, fazer-se, dar-se; ser nomeado, ser considerado; (com significação própria) tornar-se, acontecer, dar-se, resultar.

flagro,-as,-are,-aui,-atum. Arder, estar em chamas, estar abrasado. Estar dominado por, ser devastado, destruído. Arder de amor.

fleo,-es,-ere, fleui, fletum. Ato físico de chorar, derramar lágrimas. Lamentar, deplorar.

frango,-is,-ĕre, fregi, fractum. Partir, quebrar, romper, rasgar, dilacerar. Violar, infringir. Abater, debilitar. Refrear, reprimir, destruir, arruinar.

gestio, gestionis, (m.). (gero). Ação de dirigir, gestão, administração, gerenciamento.

gestĭo,-is,-ire,-iui/-ĭi,-itum. (gero). Fazer gestos expansivos, emocionados. Desejar ardentemente, estar ansioso por.

gesto,-as,-are,-aui,-atum. (gero). Levar daqui e dali, levar, trazer, transportar em liteira. Estar grávida, trazer consigo. Denunciar, delatar.

impingo,-is,-ĕre,-pegi,-pactum. (in-pango). Enterrar, plantar, pregar. Impingir. Lançar, impelir, atirar.

impono,-is,-ĕre,-posŭi,-posĭtum. (in-pono). Pôr em, dentro, colocar, depositar, sobrepor. Pôr à frente, infligir, impor. Encarregar, confiar. Enganar, iludir.

insĕquor,-ĕris,-sequi,-secutus sum. (in-sequor). Seguir, perseguir. Vir depois, sobrevir, suceder. Atacar, acometer, ferir.

nouo,-as,-are,-aui,-atum. (nouus). Tornar novo, renovar, inovar. Mudar, alterar, inventar.

interficĭo,-is,-ĕre,-feci,-fectum. (inter-facĭo). Privar de, privar da vida, matar, assassinar, massacrar. Aniquilar, destruir, fazer desaparecer.

iudĭco,-as,-are,-aui,-atum. (ius-dico). Julgar, proferir uma sentença. Processar, reclamar, demandar. Declarar, proclamar. Avaliar, estimar, apreciar.

iubĕo,-es,-ere, iussi, iussum. Ordenar, mandar. Sancionar, autorizar, decidir. Convidar a, desejar, levar a. saudar.

iungo,-is,-ĕre, iunxi, iunctum. (iugum). Atrelar, unir aos pares, jungir. Reunir. Continuar, prosseguir, fazer suceder. Acrescentar.

laboro,-as,-are,-aui,-atum. (labor). Trabalhar, esforçar-se. Sofrer, inquietar-se, preocupar-se, estar em dificuldade. Desaparecer, sucumbir. Elaborar, executar. Cultivar.

laedo,-is,-ĕre, laesi, laesum. Bater, ferir. Prejudicar, danificar, ultrajar. Tocar, causar impressão.

lego, -is, -ěre, legi, lectum. Colher, reunir.

libet,-ere, libŭit/libĭtum est. Ter vontade de, agradar, achar bom.

licet,-ere, licŭit/licĭtum est. Ser permitido, poder, ter o direito de.

maerĕo,-es,-ere. Estar triste/aflito, afligir-se. Deplorar, lamentar. Dizer com tristeza.

mando,-as,-are,-aui,-atum. Confiar, entregar, encarregar. Mandar, ordenar. Mandar comunicar.

mando,-is,-ĕre, mandi, mansum. Mascar, mastigar. Devorar, comer com voracidade.

minor,-aris,-ari,-atus sum. Ameaçar, fazer ameaças. Declarar, prometer.

miror,-aris,-ari,-atus sum. Espantar-se, assombrar-se. Admirar, contemplar, olhar com espanto/admiração.

moechor,-aris,-ari. (moechus). Cometer adultério.

monĕo,-es,-ere, monŭi, monĭtum. Fazer pensar, lembrar. Chamar a atenção, advertir. Aconselhar, esclarecer. Instruir, ensinar. Predizer, anunciar, profetizar.

mulcĕo,-es,-ere, mulsi, mulsum. Tocar levemente, acariciar, apalpar, lamber. Abrandar, apaziguar, suavizar, acalmar.

mulco,-as,-are,-aui,-atum. Bater, maltratar. Estragar, deteriorar, danificar.

nescĭo, -is, -ire, -iui/-ĭi, -itum. (ne-scio). Desconhecer, ignorar, não saber.

nouo,-as,-are,-aui,-atum. (nouus). Tornar novo, renovar, inovar. Mudar, alterar, inventar.

obĕo,-is,-ire,-iui/-ĭi,-itum. (ob-eo). Ir ao encontro de, encontrar. Opor-se (ir de encontro a!), ir contra, afrontar. Percorrer, rodear. Empreender, executar. Pôr-se, acabar, perecer, morrer.

occĭdo,-is,-ĕre, occĭdi, occasum. (ob-cado). Cair, desmoronar-se. Pôr-se. Sucumbir, perecer.

occido,-is,-ĕre, occidi, occisum. (ob-caedo). Cortar, fazer em pedaços. Matar, fazer perecer, levar à morte, torturar. Importunar, atormentar.

oportet,-ere, oportŭit. (opus). Ser necessário/preciso, ser apropriado/bom, ser razoável, convir. ~OPORTUNIDADE

oppĭdo. Muito, exageradamente, extremamente. Inteiramente, completamente. Sim, certamente.

porricĭo,-is,-ĕre, porreci/porrexi, porrectum. Estender sobre o altar, oferecer sacrifícios aos deuses. Trazer diante de, apresentar.

posco,-is,-ĕre, poposci. Pedir prementemente, rogar, implorar. Demandar, solicitar, requisitar, precisar. Exigir punição, pedir a rendição. Mendigar. Chamar, exigir a presença. Invocar. Pedir a mão, pedir em casamento.

praemetŭo,-is,-ĕre. (prae-metŭor). Recear antes, temer antecipadamente.

prodo, -is, -ĕre, -dĭdi, -dĭtum. (pro-do). Dar, entregar, pôr à disposição. Produzir, fazer sair, dar à luz, parir. Publicar, relatar, tornar público, propagar. Indicar, eleger, criar. Trair, denunciar, delatar. Desistir, abandonar. Estender, prolongar. Transmitir, legar.

produco,-is,-ĕre,-duxi,-ductum. (pro-duco). Conduzir adiante, fazer avançar, fazer sair. Prolongar, estender. Apresentar, expor, manifestar, desvendar. Expor um escravo à venda. Produzir, criar, educar. Procrastinar, transferir, retardar, adiar. Alongar, prolongar. Pronunciar uma sílaba como longa. Desenvolver, tornar-se grande. Traçar, demarcar.

prosilĭo,-is,-ire,-silŭi/-silĭi/-siliui. (pro-salĭo). Saltar para frente, lançar-se, pular adiante, arremessar-se. Estourar, explodir, quebrar, romper. Correr, acelerar, apressar.

quaero, -is ,-ĕre, quaesiui/quaesĭi, quaesitum/quaestum. Procurar obter, buscar, visar. Obter, adquirir. Notar a ausência de, sentir a falta de. Perguntar, interrogar, desejar saber, informar-se, inquirir. Planejar, estabelecer como meta. Esforçar-se, empenhar-se. Meditar, refletir, ponderar. Exigir, demandar, necessitar. Desejar. Preferir. Investigar judicialmente. = quaeso

quaeso,-is,-ĕre, quaesiui/quaesĭi. (quaero). Procurar obter, buscar ardentemente, visar. Implorar, suplicar, rogar, pedir suplicantemente. (quaeso/quaesumus = por favor, por gentileza). = quaero

queror,-ĕris, queri, questus sum. Queixar-se, reclamar, lastimar-se, lamentar-se, deplorar, gemer, suspirar. Apresentar uma reclamação diante de um tribunal.

reddo,-is,-ĕre, reddĭdi, reddĭtum. (re-do). Dar de volta, devolver, restabelecer, restituir. Consentir, conferir, conceder, entregar, recompensar, gratificar. Desistir, ceder, abandonar, entregar-se, resignar-se, renunciar. Vomitar, expelir. Decretar, estabelecer, pronunciar. Vingar-se, punir, fazer justiça. Traduzir, verter. Repetir, declarar, relatar, narrar, recitar, ensaiar, exercitar. Responder, replicar. Representar, imitar, expressar, assemelhar-se, refletir.

reor, reris, reri, ratus sum. Contar, calcular. Acreditar, pensar, julgar, supor, imaginar, avaliar.

repraesento,-as,-are,-aui,-atum. (re-praesento). Mostrar, exibir, colocar diante de, manifestar. Retratar, representar. Pagar imediatamente, pagar à vista. Fazer imediatamente, executar sem demora.

retundo,-is,-ĕre, re(t)tŭdi, retu(n)sum. (re-tundo). Embotar, tirar o fio de uma faca. Mitigar, enfraquecer, atenuar. Restringir, reprimir, fazer parar.

rumpo,-is,-ĕre, rupi, ruptum. Quebrar, romper, estourar. Lacerar, rasgar, despedaçar, forçar a abertura. Violar, destruir, anular, interromper, suspender. Lançar, soltar.

sapĭo,-is,-ĕre,-ĭi/-iui. Saborear, provar. Ter o gosto/sabor de. Cheirar a, ter o mesmo odor de. Ser inspirado por, imitar. Ser discreto/prudente/sábio, ter discernimento. Saber, conhecer, compreender, entender

saucĭo,-as,-are,-aui,-atum. (saucĭus). Ferir, machucar. Ferir mortalmente, matar. Cavar, escavar, fender, abrir. Podar, cortar, aparar. Ofender, magoar.

secludo,-is,-ĕre,-clusi,-clusum. (se-claudo). Trancar em local separado, isolar. Separar, remover, romper, partir. Excluir, segregar.

sino,-is,-ĕre, siui/sĭi, situm. Pôr, colocar, depositar, estender. Deixar, permitir, conceder, admitir. Desistir, interromper, deixar de fazer. (Sine! = Muito bem! De acordo!; sine modo = se pelo menos).

solĕo,-es,-ere, solĭtus sum. Estar acostumado/habituado, costumar. Ter relações sexuais. = CONSUESCO

sordĕo,-es,-ere, sordŭi. Estar sujo/imundo. Ser baixo/vil/ignóbil/sórdido.

spiro,-as,-are,-aui,-atum. Soprar, exalar. Respirar, inalar. Viver, estar vivo. Ser favorável a, favorecer. Estar inspirado poeticamente. Mostrar, expressar, manifestar. Aspirar, estar ávido por.

stabilĭo,-is,-ire,-iui,-itum. (stabĭlis). Tornar firme/constante/estável. Fixar, estabelecer. Fortalecer, apoiar, sustentar.

tenĕo,-es,-ere, tenŭi, tentum. Segurar, reter, manter, ter. Possuir, ocupar, ser senhor de, obter. Alcançar, atingir. Conservar, guardar, preservar. Durar, persistir.

tempto,-as,-are,-aui,-atum. Tocar, apalpar. Tentar, experimentar, ensaiar. Agitar, atacar, inquietar. Tentar corromper, seduzir.

tollo,-is,-ĕre, sustŭli, sublatum. Erguer, levantar, elevar, apanhar. Levar, transportar, embarcar. Tirar, tomar. Destruir, suprimir, abolir. Lançar, impelir. Exaltar, celebrar. Suportar, sofrer. Tollĕre filĭum: gesto simbólico de “tomar o filho” em reconhecimento da paternidade.

torquĕo,-es,-ere, torsi, tortum. Torcer, fazer o movimento de torção, dar volta. Revolver, fazer rolar. Torcer os membros, torturar, atormentar. Fazer o giro que antecede ao lançamento de uma arma. Experimentar, sondar. Sustentar, suportar.

tuĕor,-eris,-eri, tuĭtus sum/tutus sum. Ver, olhar, examinar, observar. Guardar, proteger, defender, honrar, respeitar. Perceber, descobrir. Alimentar, sustentar.

ualĕo,-es,-ere, ualŭi, ualĭtum. Ser forte, ser vigoroso, ter boa saúde, estar fisicamente bem. Prevalecer, exceder, ser influente. Ter a força, o poder. Valer, ter o valor de.

uegĕo,-es,-ere. Excitar, animar, impelir. Ser ardente, vivo, ser fogoso. 

uescor,-ĕris, uesci. Alimentar-se, nutrir-se, comer. Fartar-se.

uidĕo,-es,-ere, uidi, uisum. Olhar, presenciar, testemunhar. Perceber, compreender. Examinar, meditar. Cuidar, tomar conta, ocupar-se de, reparar.

uincĭo,-is,-ire, uinxi, uinctum. Ligar, atar prender, amarrar, vincular, conter. Prender, aprisionar. Tolher, paralisar. Cativar, seduzir, encantar.

uinco,-is,-ĕre, uici, uictum. Sair vencedor, vencer. Ganhar, triunfar, superar. Convencer, provar, demonstrar.

voluto, -as, -are, -avi, -atum. (freq. de volvo) rolar por várias vezes; revolver no espírito, meditar, discutir, examinar, debater.

volvo, -is, -ěre, volui, volutum. rolar, fazer rolar, fazer dar voltas, revolver; revolver no espírito, refletir, meditar.

usurpo,-as,-are,-aui,-atum. (usus-rapĭo). Tomar posse pelo uso. Apropriar-se de, tomar posse ou conhecimento, usurpar. Fazer uso, empregar, usar, praticar. Designar, denominar.

LATINĬTAS: Uma introdução à língua latina através dos textos: VOLUME ÚNICO: Fábulas mitológicas e esópicas, epigramas, epístolas, elegias, poesia épica, odes, 2ª ed. revista – José Amarante, Salvador, EDUFBA, 2018.

Livro vencedor do PRÊMIO CAPES DE TESE LETRAS E LINGUÍSTICA 2014.

Material didático de uso público. Eu selecionei apenas trechos que me auxiliaram a desenvolver meu LATIM (neste momento me considero de nível intermediário). Recomendo aos interessados em aulas inaugurais acessar o site da iniciativa do Prof. Amarante, discriminado mais abaixo.

PREFÁCIO – VOL. 1 – 1ª ed. (Milton Marques Júnior)

AINDA SE ENSINA LATIM? Eis aí uma pergunta frequente quando alguém sabe que ensino latim. Depois de séculos mostrando sua pujança, o latim é ainda visto com admiração, sendo recorrentes as perguntas mais descabidas com relação a essa língua, cuja importância, muitas vezes, por enfadonho, evitamos explicar. O assunto aqui se impõe – latim, não necessariamente a explicação de sua importância –, tendo em vista a minha participação em uma banca sobre a língua latina.”

Sabemos que nem sempre há uma relação exata e estreita entre ser professor e preocupar-se com a aprendizagem. Amarante demonstra ser esse professor. Esta preocupação revela-se através do método de latim que ele apresenta como um dos produtos de sua tese de doutoramento.

A palavra método me é muito cara por expressar que algo se faz através de um caminho, evidência que nos indica a sua etimologia, proveniente do grego meta, através, entre, conforme, e odos, caminho.”

O desafio do professor é duplo [triplo!]: percorrer um caminho, em seguida ensinar como se percorrer e, por último, mas não por fim, ir além.”

Na vida, em geral, e na do professor, em particular, o que existe é sempre infectum. É sempre aprendizagem.”

Trabalho alentado, digno realmente de um doutorado, tanto que foi aprovado com distinção, mas se alguém tinha alguma dúvida quanto a sua importância, elas foram dirimidas, desde o momento em que ganhou o prêmio CAPES de teses 2014.”

O primeiro volume [da tese] faz a revisitação da história do latim no Brasil, passando pelos métodos empregados, chegando à elaboração de um método próprio; os dois outros volumes são o próprio método em si, a partir de textos, com a gramática fluindo do contato direto com a língua. Dentre os dois volumes que compõem o método, o primeiro aborda fábulas mitológicas e esópicas, epigramas e epístolas; o segundo, elegias, poesia épica e odes.

Como se pode ver, o professor Amarante tomou o cuidado de abarcar o maior número possível de gêneros do latim clássico, incluindo outros latins, não só o costumeiro dos cursos de graduação, fazendo um escalonamento, a partir de textos considerados mais fáceis e, sobretudo, mais palatáveis, até chegar aos mais difíceis, no volume dois, como a atípica épica das Metamorfoses ovidianas e as odes horacianas. O resultado é que, tendo caminhado de acordo com o método, o estudante não terá grandes problemas com Horácio, Virgílio ou Ovídio, tendo em vista que, ao longo do processo, ele foi internalizando a estrutura essencial da língua latina, o que é importante ressaltar. Não se trata de repetir a velha cantilena das declinações ou de verbos decorados, mas de um método cuja base se erige na estrutura do vocábulo e na sua internalização, sem o sacrifício inútil de tentar memorizar listas enormes de casos e flexões verbais. A preocupação sempre deve ser outra. A preocupação com a estilística, pois cada autor tem o seu estilo próprio e, embora na sua estrutura o latim seja o mesmo, cada autor impõe a sua marca pessoal, com determinados usos, que lhes são próprios.”

Conhecendo perfeitamente bem a dificuldade de se aprender uma língua com uma infinidade de documentos escritos, mas sem um registro falado que acompanhe a quantidade e a qualidade, sobretudo, dos documentos escritos, o professor Amarante começa o seu estudo com Higino, esse maravilhoso bibliotecário de Augusto que escreveu o Liber Fabularum e De Astronomia. [único livro completo de Higino que temos – ver mais adiante] Desse modo, o estudante é seduzido pelos textos menos dados a torneios linguísticos e com um assunto sempre envolvente. Após esse início, que reputamos essencial e inteligente, Amarante faz suas incursões no mundo das fábulas de Fedro, terreno não menos atraente para os iniciantes na língua.

Com uma boa quantidade de exercícios e de vocabulário, cuja apresentação vai diminuindo à medida que se avança no estudo da língua, um outro mérito de seu método é o fato de que alguém que resolva estudar sozinho conseguirá ter êxito, caso se aplique.

Com uma tese que deságua num método de latim, o professor Amarante reabre a discussão do ensino de Latim, reabre a reflexão sobre essa língua e evidentemente sobre a sua importância para nós. Muitos há que são professores de latim e seus cultores, poucos há que se interessam verdadeiramente pela discussão de como e por que ela deve ser ensinada. (sic)”

PREFÁCIO – VOL. 2 – 1ª ed. (Patrícia Prata)

Parece, num primeiro momento, inusitado o lançamento de um método de ensino de latim em pleno século XXI e em terras brasileiras: poderíamos nos indagar se ainda se estuda essa língua em nosso país e por que ainda se estuda, já que ela não aparece como disciplina do currículo do ensino fundamental e médio e, nas Universidades, só consta do currículo de alguns cursos, em especial o de Letras. Contudo, observamos hoje no Brasil um avivamento do interesse pelo estudo do latim (diga-se de passagem, das línguas clássicas em geral), e o mais curioso é o que o tem motivado: a possibilidade de ter acesso aos textos latinos no original e, por meio deles, à cultura literária romana que tanto influenciou a nossa ocidental e, em muitos casos, de poder desenvolver pesquisas na área. A motivação não se dá mais apenas, como se poderia pensar, porque o conhecimento do latim auxiliaria o aprendizado da língua portuguesa (o que poderia assegurar um uso mais ‘correto’ de nossa língua)¹ e de sua história, já que o português proveio do latim.”

¹ Motivação mesquinha típica de um Pasquale.

procedeu-se a um levantamento dos textos latinos que circulavam em terras brasileiras, em especial nos primeiros séculos após o descobrimento, tornando-nos possível conhecer o rol das obras e autores latinos costumeiramente lidos e estudados no Brasil e entender o porquê de sua escolha”

o conhecimento gramatical está a serviço do ensino do texto, de sua leitura e tradução, e, consequentemente, também da literatura.”

Interessante que, mesmo recorrendo a autores canônicos, os textos escolhidos, ao contrário, muitas vezes não são considerados canônicos no que diz respeito à representatividade do gênero em livros didáticos, em especial no Brasil. Como é o caso da escolha de passagens do livro Metamorfoses do autor Ovídio como representante do gênero épico, e não, p. ex., a Eneida de Virgílio – essa escolha demonstra coragem de ousar frente a uma tradição já consolidada de textos utilizados em métodos produzidos no Brasil, e possibilita que outros textos sejam lidos e estudados, ampliando, assim, o repertório de autores e obras da Antiguidade romana a que temos acesso e pesquisamos. O gênero elegíaco também é representado por Ovídio, fato também não muito comum, (sic) esperaríamos encontrar elegias de Propércio, ou mesmo de Tibulo. Também chama a atenção a escolha das obras ovidianas, os Amores e os Tristĭa, esta última não muito conhecida e divulgada no Brasil.”

Não podemos deixar de retomar e destacar a importância da feliz escolha metodológica de se trabalhar com textos originais. Esse procedimento faz com que o aluno entre em contato o mais cedo possível com textos não adaptados dos autores latinos, capacitando-o a ler, interpretar e traduzir os textos com maior rigor, e, consequentemente, tornando-o mais habilitado a realizar pesquisas na área.”

O autor teve a possibilidade de aplicar sua proposta metodológica a um privilegiado grupo de professores da UFBA, bem como a algumas turmas regulares de alunos dessa mesma Universidade. Simultaneamente a sua aplicação, o autor procedia a alterações no material.

INTRODUÇÃO: Concebendo uma abordagem para o ensino e a aprendizagem do Latim

Mantivemos exercícios que, à primeira vista, teriam objetivos que não se direcionam à aquisição da competência leitora. Embora as atividades de falar latim ou de escrever em latim possam parecer úteis apenas para um período em que se utilizava a língua em contexto pragmático, essas atividades se mostram oportunas também para o desenvolvimento da leitura. Exercícios dessa natureza, contudo, se em quantidade excessiva, exigem uma quantidade razoável de horas-aula, um luxo de que as diretrizes curriculares atuais nos privam, razão pela qual aparecem em menor número. Os principais exercícios propostos, então, são exercícios de leitura, interpretação e versão para o português.”

Na primeira unidade textual, ainda que os alunos não tenham conhecimento de elementos gramaticais do latim, a eles é indicado um texto para leitura, antes mesmo de qualquer discussão de noções gramaticais. O vocabulário tem, então e inicialmente, a função de, além de atribuir sentidos, explicitar aspectos gramaticais que permitam a leitura. Nas demais lições, cada texto traz elementos gramaticais já conhecidos pelos alunos e novos elementos que se converterão em objeto de estudo na própria unidade ou nas unidades subsequentes. Assim, ao iniciar o trabalho com um texto novo de uma unidade, o aluno deve ter a noção do funcionamento da proposta, pois cada unidade traz um conjunto de aspectos gramaticais já conhecidos, vistos nas unidades anteriores, e introduz novos conteúdos, todos devidamente didatizados no vocabulário, de acordo com as características especiais do vocabulário de que tratamos.”

É importante que os alunos percebam que os textos antigos vêm de uma tradição de edições diversas, umas mais outras menos confiáveis.”

Não se conserva nenhum texto antigo autógrafo; subsistem muito poucos textos tardo-antigos; de muitos autores, alguns assaz importantes, não subsistem manuscritos anteriores ao século XIV, ou até o século XV. Para alguns textos, por vezes importantes, só se conservou um manuscrito, ao passo que, para outros, subsistem centenas deles. Muitos textos de extrema importância estão totalmente perdidos.”

Citroni et al. 2006

os manuscritos que chegaram até nós derivam-se dos originais através de um número desconhecido de cópias intermediárias, e, consequentemente, são de integridade questionável.”

Maas 1958

Em materiais didáticos de latim, é comum que os textos apresentados (quando é o caso) não venham com a indicação da fonte utilizada que restabeleceu o texto. O estudante precisa entender que aquele texto que irá ler foi estabelecido a partir de manuscritos diversos, num trabalho de crítica textual que busca ‘localizar os erros dos copistas, as interpolações posteriores, o estabelecimento das cópias disponíveis, a crítica da proveniência, fixação da data, identificação da origem, busca das fontes’ (FUNARI, 2003, p. 27).”

A seção ‘Salvar como’ apresenta uma lista de palavras, por classe gramatical, que devem ser memorizadas, arquivadas, guardadas. As palavras registradas na seção não aparecem na lista do vocabulário da unidade. Em geral, são palavras com mais de um significado ou com especificidades de uso. Nas unidades subsequentes, certamente elas aparecerão registradas com novos significados. Aqui, o aluno ‘salva a palavra como’, ou seja, guarda o significado adequado ao contexto do texto lido.”

O LATIM E O PORTUGUÊS § Atendendo a demandas de muitos estudantes pela discussão de elementos latinos interessantes para o entendimento de determinados aspectos do português, apresentam-se, nesta seção, elementos comparativos, de diferentes ordens, entre o latim e o português.”

Registro, nesta segunda edição, os meus agradecimentos aos professores de todo o Brasil que nos enviaram suas considerações e propostas de aprimoramento do material. Certamente, esta versão que agora vem publicada revê alguns problemas da primeira edição. Contudo, dada a complexidade de um material didático, não o consideraremos nunca acabado”

UNIDADE A. ASPECTOS HISTÓRICOS DA LÍNGUA E DA LITERATURA LATINAS

Estabelecemos as distinções entre latim clássico e latim vulgar e definimos a modalidade da língua com que iremos trabalhar. Também iremos conhecer as diferentes fases históricas do latim e sobre a formação dos gêneros na Antiguidade.”

embora declarado morto, o latim recusou-se a ser enterrado” Peter Burke, 1993

O caminho: indo-europeu — ítalo-céltico — itálico — latim — línguas românicas

Da mesma forma, podemos chegar a uma outra unidade linguística anterior ao latim, se analisarmos as semelhanças existentes entre o latim e os dois antigos idiomas falados na Península Itálica, o osco e o umbro. Trata-se do que se convencionou chamar de ‘itálico’.”

o latim (…) não se prende diretamente ao primitivo indo-europeu, mas dele está separado por outras unidades linguísticas subsequentes, como o itálico e o ítalo-céltico.”

Para Faria (1970, p. 14-17), em relação à unidade ítalo-céltica, como também não há documentação, a probabilidade de sua existência se deve às comparações e à observação de particularidades comuns à gramática das línguas itálicas (como o latim, o osco e o umbro) e à gramática das línguas célticas (como o bretão, irlandês e o gaulês). Da unidade itálica, ao que se pode concluir, há, apesar de curtos, numerosos textos epigráficos dos seus dialetos: o latim, que nos legou uma vasta literatura; o osco, conhecido através de inscrições, sendo a mais extensa a chamada Tabula Bantina (encontrada em Bântia, na Apúlia); e o umbro, através de moedas e curtas inscrições supérstites, [sobreviventes] além de uma longa epígrafe: as tábuas eguvinas, nas quais há a gravação do ‘ritual dos chamados frates Atiedii, colégio sacerdotal de Igúvio, hoje Gubbio (idem, ibidem).”

Descrição da “Fig. 1 – Árvore genealógica das línguas indo-europeias”: O hipotético indo-europeu deu origem a três grandes famílias que conhecemos também por inferência (o indo-iraniano, o balto-eslávico e aquele que daqui se trata, o ítalo-céltico). Além disso, deu origem às famílias germânica e helênica. Do helênico, só conhecemos uma língua: o grego. Do germânico, três: alemão, holandês e inglês. Do indo-iraniano, derivam o persa e o sânscrito. Do balto-eslávico, o polonês e o russo. Do ÍTALO-CÉLTICO, diretamente duas famílias: o ITÁLICO e o CÉLTICO. O Céltico deu origem ao bretão, ao gaulês e ao irlandês. O ITÁLICO teria originado mais uma família, a latina; além dos idiomas osco e umbro comentados. Do latim, nosso objeto de estudo, nós conhecemos o latim clássico, aquele que ‘morreu’ na Antiguidade; e o latim vulgar, que deu origem a todos os idiomas românicos. Para o romeno, o italiano, o francês e o espanhol a derivação é direta. Para o Português, curiosamente, ainda há mais uma mediação: nossa língua, bem como a galega, vem de uma família ou dialeto prévio que reunia a medula espinhal destas duas: o GALEGO—PORTUGUÊS. Defendo que o termo “idade média” só existe por deficiência de conhecimentos sobre a cultura da Europa após a queda do Império do Ocidente, ignorância essa que se reflete na dificuldade de apurar as mudanças regionais das falas românicas que foram brotando até nascerem os idiomas contemporâneos a nós.

Mas o latim que dará origem às línguas românicas não será o latim clássico, uma língua literária, trabalhada artisticamente pelos grandes escritores que nos legaram uma literatura que até hoje influencia o mundo ocidental. O latim que deu origem às línguas românicas é o chamado latim vulgar, ou o latim falado pelos diversos estratos sociais, em diferentes situações, tempos, lugares, e que não deve ser pensado como uma língua uniforme.” Somos o substrato do substrato do substrato do substrato!

Certamente o latim levado à península ibérica, por ocasião da segunda guerra púnica (contra os cartagineses, de 219 a 201 a.C), não será o mesmo latim das conquistas tardias, como a da Dácia, na atual Romênia, em 106 d.C.”

A designação de latim vulgar (DIEZ, 1836-1844), no singular, é apenas uma convenção para se referir às diferentes formas de latim, opondo-se ao latim literário (e – pensando com Maurer Jr. (O problema do latim vulgar, 1962), talvez pudéssemos afirmar – aos usos extremamente monitorados da língua em situações mais formais).

As fontes de que dispomos para o conhecimento do latim vulgar são as comédias de Plauto (séc. III–II a.C.), os poemas de circunstância de Catulo (séc. I a.C.), algumas cartas de Cícero dirigidas a familiares (séc. I a.C.), inscrições cristãs, feitas sem preocupações literárias, ou outros tipos de inscrições, bilhetes jocosos, o Appendix Probi, uma lista de correções explicitando as formas que poderiam ser consideradas corretas: socrus non socra, speculum non speclum, auris non oricla, por exemplo (CARDOSO, 1997).”

LATIM PRÉ-HISTÓRICO: Falado entre os séculos XI e VII ou VI a.C. A fase é anterior ao aparecimento de documentos escritos. Em meados do século VIII a.C., Roma é fundada.

LATIM PROTO-HISTÓRICO: Aparece nos primeiros documentos escritos. Inscrições: fibula prenestina (séc. VII ou VI a.C.), Vaso de Duenos (séc. IV a.C.)

LATIM ARCAICO: Utilizado entre o séc. III a.C. e o início do séc. I a.C., está presente em antigos textos literários (Névio, Plauto, Ênio, Catão), em epitáfios e textos legais. Inicialmente pobre, de vocabulário reduzido, enriquece-se com o desenvolvimento da literatura e com a influência da cultura helênica. É do início do período uma compilação do código do Direito Romano por uma comissão composta por dez cidadãos (decemviri). Publicada em 451-450 a.C., a lei das Doze Tábuas,¹ de que se conservam fragmentos, era utilizada nas escolas romanas até o período de Cícero e sua influência se estende sobre o pensamento e o estilo literário dos romanos (HARVEY, 1987).

LATIM CLÁSSICO: Séc. I a.C. a I d.C. (…)

LATIM PÓS-CLÁSSICO: Sécs. I a V d.C. A língua começa a perder a pureza e a perfeição do período clássico. Diminui a distância entre a língua literária e a falada. Já se prenuncia a dialetação que dará origem às línguas românicas.

USOS DO LATIM POSTERIORES (…): Os tabeliães utilizaram o latim até o século XII em documentos oficiais; a Igreja toma o latim como sua língua oficial e, até 1961, o uso do idioma era obrigatório na redação dos documentos eclesiásticos e na realização de cultos e cerimônias religiosas;(*) a ciência, até o início do séc. XX, vê no latim uma linguagem universal e na língua foram escritos tratados filosóficos e científicos.(**)

(*) No Vaticano, até nossos dias, os documentos oficiais são emitidos principalmente em latim. Ao que se pode depreender dos documentos disponíveis no site do Vaticano, a língua oficial ainda é o latim, embora só seja utilizada nos documentos oficiais e nos rituais cerimoniais. Até mesmo os caixas eletrônicos do Vaticano oferecem o latim como opção de língua. Em 2003, o Vaticano public[ou] um dicionário com traduções de 13 mil expressões inexistentes no tempo dos romanos da Antiguidade. O seu próprio site pode ser lido completamente em latim (http://www.vatican.va/latin/latin_index.html), além de existir a possibilidade de leitura nas línguas modernas. [https://www.vatican.va/roman_curia/institutions_connected/latinitas/documents/rc_latinitas_20040601_lexicon_it.html]

(**) Como em boa parte da Europa a língua ainda é estudada nas escolas, há traduções de textos modernos para o latim, como os volumes da série Harry Potter: Harrius Potter et Philosophi Lapis (‘Harry Potter e a pedra filosofal’), Harrius Potter et camera secretorum (‘Harry Potter e a câmara secreta’); ou Regulus (O pequeno príncipe), ou, entre tantas outras, Arbor alma (do original em inglês The giving tree, de Shel Silverstein, traduzido para o português, por Fernando Sabino, com o título A árvore generosa). Totalmente na língua são, também, sites com jornais que noticiam em latim (veja, por exemplo, http://ephemeris.alcuinus.net/ ou http://www.scorpiomartianus.com/, com arquivos em áudio de notícias na língua latina) ou sites que proporcionam espaços de interação entre seus membros, interessados em treinar o uso da língua. Veja-se, por exemplo, http://schola.ning.com/. Até mesmo existe uma Wikipedia em latim, a Vicipaedia: http://la.wikipedia.org/wiki/Pagina_prima. No Facebook, a língua latina é uma das opções de língua para a configuração da página.”

¹ Veja meu post de 19/1/21 para fragmentos (dos fragmentos!) em Inglês, https://seclusao.art.blog/2021/01/19/the-12-tables-com-comentarios-de-coleman-norton/.

* * *

Em geral há divergências na definição do período clássico e do período pós-clássico. Quando nos referimos ao fato de que estudaremos o latim ‘clássico’, estamos adotando o mesmo conceito de ‘clássico’ que se registra na abrangência sugerida por Aulo Gélio (Noites Áticas, XIX, 15)

A poesia (carmen para os latinos, com o sentido de composição em verso; o mesmo sentido tinha em latim a palavra poema, tomada do grego) é dividida de acordo com a imitação que se propõe de homens melhores, de homens piores, ou de homens nem melhores nem piores. Em sua divisão, estabelecem-se 3 grandes gêneros: o épico, o lírico e o dramático. No gênero épico, imitam-se as ações dos homens considerados melhores. É o gênero dos grandes heróis e das grandes ações. O gênero dramático, por sua vez, pode apresentar bons caracteres (a tragédia) ou maus caracteres (a comédia). O gênero lírico comporta a imitação de homens iguais a nós, nem melhores, nem piores.”

Entre os romanos, temos a Arte poética de Horácio (conhecida como Epistula ad Pisones), um tratado sobre a poesia. Dirigida aos irmãos Pisões, apresenta alguns preceitos que refletem a Poética aristotélica: ‘Eu o aconselharei a, como imitador ensinado, observar o modelo da vida e dos caracteres e daí colher uma linguagem viva.’

Plauto, por exemplo, seria cronologicamente do período arcaico, mas pensando a partir do critério permanência é um autor clássico; basta observar a influência do teatro plautino na posteridade.”

Os autores da literatura romana irão se dedicar a boa parte dos gêneros desenvolvidos pelos gregos (alguns surgidos antes mesmo dos gregos; a própria fábula, por exemplo, tem origem anterior, provavelmente oriental). Dos clássicos gêneros descritos por Aristóteles, escrevem-se e desenvolvem-se subgêneros. Em alguns casos, o espírito romano trará vieses novos a gêneros já conhecidos. Como criação romana, Quintiliano (séc. I d.C.) cita a sátira: ‘Satura quidem tota nostra est’.”

A partir de 81 a.C., quando ocorre o primeiro pronunciamento de Cícero como orador, começa a chamada fase clássica, com duas épocas distintas: a chamada época de Cícero ou de César, com grandes prosadores num momento de grandes lutas políticas, nos momentos finais do sistema republicano; a outra época é a chamada época de Augusto, com grande desenvolvimento da poesia latina através do surgimento de seus mais expressivos poetas, em momento de apoio oficial à arte poética (CARDOSO, 2003).

Após a morte de Augusto, a literatura começa a dar sinais de perda de sua força. É a época dos imperadores júlio-claudianos (Tibério, Calígula, Cláudio e Nero), que conta ainda com autores que se destacam em sua produção literária. Mas os maiores sinais da pouca vitalidade da literatura ocorrerão no chamado período pos-clássico, a partir da morte de Nero (68 d.C.). Essa época conta com dois períodos: o neo-clássico (de 68 até final do século II) e a época cristã (do final do século II até o século V).”

Segundo Cardoso, a obra Metamorfoses de Apuleio (conhecida como O asno de ouro) é ‘mais um curioso exemplo de narrativa novelística’, também de difícil classificação.”

UNIDADE B. ALFABETO E PRONÚNCIA DO LATIM

Segundo McMurtrie,(*) é consenso entre os especialistas a origem grega do alfabeto adotado pelos povos antigos que habitaram a península da Itália.

(*) McMURTRIE, Douglas. O livro: impressão e fabrico. Trad. Maria Luísa Saavedra Machado. 2 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1982.

O primitivo alfabeto latino não era formado pelas 23 letras utilizadas no período clássico. Não possuía o G, nem o Y e o Z. Nos primeiros documentos escritos, empregava-se o C tanto para representar a oclusiva velar surda /k/ quanto a sua homorgânica sonora /g/. O surgimento do G, para diferenciar as duas oclusivas velares, se dá em função de, posteriormente, acrescentar-se uma pequena barra horizontal à haste inferior do C.” “Como o Z era pouco utilizado, passou a ocupar a última posição no alfabeto.”

O uso da letra K, primitivamente, restringia-se a sua posição antes de A e de consoantes. Praticamente em desuso depois, se manteve utilizada em poucas situações: geralmente em palavras estrangeiras e, especialmente, em abreviaturas, como se sugere para os nomes Caeso abreviado em K. [É nome próprio! Antes eu achava que era queijo!], ou para a palavra calendae ou kalendae (‘calendas’, o 1º dia do mês entre os romanos) abreviada em kal., ou ainda para termos como castra (‘acampamento’), abreviado em KK. Quanto ao Q, manteve-se em latim em antigas inscrições, no contexto antes das vogais o e u, mas o C viria a assumir generalizadamente todas as posições, no lugar do K e do Q, sendo que este último se manteve no grupo qu [que inclusive é a pronúncia de Q].”

Como vimos, o Y e o Z não eram propriamente letras latinas. Usadas para a transcrição de palavras gregas em latim, dada a influência do helenismo em Roma (…)”

As minúsculas surgirão mais tarde com alterações operadas paulatinamente nas maiúsculas, como resultado da tendência, bem natural, dos escribas para escreverem mais fácil e rapidamente do que se poderia fazer com as formas convencionais das letras monumentais.” MAIÚSCULAS não são o Partido dos Trabalhadores mas DÃO TRABALHO!

É no Renascimento que ocorrerá a incorporação dessas letras [J e V] ao alfabeto latino por Pierre de la Ramée (Ramus), daí serem conhecidas por letras ramistas.”

Para se estabelecer as características da pronúncia reconstituída do latim, utilizam-se os seguintes tipos de fontes: as informações diretas dos gramáticos latinos e escritores romanos, como Cícero, Quintiliano, Aulo Gélio, e muitos outros; a grafia das inscrições e dos manuscritos latinos; a métrica latina, principalmente para o estudo da quantidade; a transcrição de palavras latinas em línguas estrangeiras e vice-versa; a pronúncia do latim vulgar e das línguas românicas; o estudo da fonética histórica do latim, antigas etimologias, etc.; a gramática comparada das línguas indo-européias.”

Como ao estudante iniciante é difícil perceber quais vogais são longas ou quais são breves, é costume o uso dos sinais mácron (como em vidēre, indicando que se trata de uma vogal longa) e braquia (como em legĕre, indicando que se trata de uma vogal breve).”

incĭdo, eu caio

incīdo, eu golpeio”

cără, cara, face, rosto

cāră, nome de uma planta”

mălŭm, perigo, risco, desventura

mālŭm, maçã” A mais do que provável razão para se atribuir à maçã a fama de ‘fruto do pecado original’, já que isso não é dito ora alguma no Gênese.

ăvě é um adjunto circunstancial: com a ave, pela ave

ăvē é uma forma verbal do imperativo de avere (estar com boa saúde) e funciona como fórmula de saudação: Bom dia! Passe bem! Até mais!

Conforme veremos, uma vogal pode ser originariamente breve, mas a sílaba onde se encontra pode ser longa.” A verdade é que a visão geral do latim é desencorajante para qualquer um!

Considerando a intensidade, o acento em latim só ocorre até a antepenúltima sílaba, assim como no português. Entretanto, em latim o acento não ocorre na última, como o faz o português. Assim sendo, serão paroxítonos todos os dissílabos.”

Segundo a regra da penúltima sílaba, se a vogal da penúltima sílaba for longa, o acento recairá sobre essa sílaba (vidēre, Neptūnus); se ela for breve, o acento recuará para a antepenúltima (prodĭgus, legěre).

Como não há nenhum sinal para marcar o acento em latim, costumamos marcar a penúltima sílaba quando for breve. Não havendo nenhuma marcação na vogal de penúltima devemos considerá-la longa. É com o tempo e com o contato sistemático com a língua que teremos segurança na definição do acento em uma palavra.”

É sempre breve a sílaba constituída por uma vogal breve, ou por uma vogal breve precedida de uma ou mais consoantes. Ex.: a-la-crĭ-tas (alegria, entusiasmo), re-plĭ-co. Se a sílaba, contudo, terminar por consoante e for seguida imediatamente de outra consoante na sílaba seguinte, embora a vogal seja breve, a sílaba será longa. Ex.:

agěr (campo) e a-gel-lus (campo pequeno)

Nesse caso, embora o ě seja breve em ager e em agellus, a penúltima sílaba em agellus será longa. [mas não no a de ager, isto é, a enquanto sílaba?]”

Há raras exceções de palavras oxítonas, em função de alterações fonéticas, como, por exemplo, palavras que perderam um fonema em seu final: illuc(e) (ali), istac(e) (por aí).”

AUXÍLIO NAS PRONÚNCIAS

VOGAIS

ă: [a] como em “pato”

ē: como em musée (fr.)

ĕ: como em “teto”

ī: como em sheep (ing.)

ĭ: [i] como em “mico”

ō: como em niveau (fr.)

ŏ: como em “toca”

ū: como em goose (ing.)

ŭ: como em “mula”

SEMIVOGAIS

i: [y]

ocorre em: iacěo, jacěo

pronunciar como: praia

u: [w]

ocorre em: pauĭdus, pavĭdus

pronunciar como: quatro

ou como v mesmo, pois ninguém merece – somos ramistas!

CONSOANTES

pronunciam-se da mesma forma que no português as consoantes b, d, f, k, p, q, t

Se for verdade, o sujeitinho cuja vídeo-aula (uídeo-aŭla!) vi no youtube falou merda (em sua aula introdutória, citou BÉ, DÉ, ÉF, QU, TÉ! Se é que ainda não mandou um PÉ (não me recordo) – nota zero! Porém, não sei se confio mesmo nesse LATINĬTAS, pois não avisam das dentais como em deep e titillation, e não como em dia e tio em grande parte das regiões centro-oeste e sudeste do país, como aqui em Brasília entre os não-nordestinos e nem nortistas.

As consoantes geminadas (mm, pp, ll, etc.) devem ser pronunciadas alongadas. Veja que o fato de uma consoante ser simples ou geminada é um traço distintivo no latim:

[se não tiver tato, digo, palato, acaba se complicando!]

ānnŭs (ano) e ānŭs (ânus)”

Os gringos estão ainda mais fŭdīdŭs, já que falam ênnãs!

ATENÇÃO!

No caso das palavras ānŭs (ânus) e ănŭs (mulher velha) a distinção é feita pela duração da vogal /a/.” ã-nus; ános.

Em cŏ (cabeleira) e cōmmă (vírgula), além da distinção pela consoante geminada /mm/, temos a duração da vogal /o/.”

Estou em ,

, of souls

n: [n] como em cone “Em Quintus, deve ser pronunciada com seu valor consonantal, não apenas nazalizando (sic – erro horroroso [rōrōrōso]!) a vogal anterior.”

você está ss? pois eu já estou gritando!

ch: só o c, como em “coca”.

deus eks má quina

assim como no ph = p.

metápora

pilozópia

pilipe

FÁBULAS MITOLÓGICAS

A fábula, ainda tão presente no mundo de hoje, principalmente em edições escolares, tem suas origens remotas na Mesopotâmia, e sua transmissão se dá por testemunhos em textos de uma civilização geralmente considerada a mais antiga da humanidade: a civilização suméria. Como forma de sabedoria popular, portanto distante na forma e no conteúdo das poesias mais elevadas gregas, terá a atribuição de sua invenção justamente a um escravo estrangeiro, Esopo (séc. VI a. C.). O gênero é, pois, de tradição humilde.”

É fato que a narrativa mítica se presentifica na literatura grega desde suas origens, seja em micronarrativas, como encontramos nos poemas homéricos; seja como explicação da origem do cosmos grego, como o fez Hesíodo em sua Teogonia; seja como elemento essencial para a elaboração de peças dramáticas, do qual se serviram os 3 grandes tragediógrafos (Ésquilo, Sófocles e Eurípides). Acrescente-se a isso o papel que o mito desempenhou nas artes plásticas gregas através das cenas mitológicas que foram esculpidas nos frontões e métopas dos templos ou nas inúmeras pinturas em cerâmica.

Com o objetivo de instruir estudantes de Humanidades do mundo antigo, além de poetas e tratadistas, surgem as compilações de mitos, sendo a chamada Biblioteca de Apolodoro, a única que chegou praticamente completa até nossos dias.”

Nesse sentido, veremos, por exemplo, em Higino, alguns aspectos do mito de Hércules que só existem na sua versão, ou ainda ausências de elementos do mito que aparecem em outros mitógrafos.”

UNIDADE UM:

Alcmena (Fabŭlae, XXIX)

HIGINO

Basicamente, o que nos chegou sobre o suposto autor das Fabŭlae nos foi transmitido por Suetônio (De grammatĭcis et rhetorĭbus, XX, 1)

Foi amigo íntimo do poeta Ovídio e de Clódio Licínio, o antigo cônsul e também historiador; este informa que Higino morreu muito pobre e que foi sustentado por sua própria bondade enquanto estava vivo.”

Para Hoyo e Ruiz (2009), não há consenso sobre a veracidade dos dados apresentados por Suetônio. Afirmam, contudo, como certo, o fato da obra ter sido traduzida para o grego em 207 d.C., um fato peculiar na história da literatura latina, uma vez que se trata de um dos poucos exemplos de tradução ao grego de um texto latino; o inverso seria o mais comum.”

Se dessas obras temos apenas notícia ou pequenos fragmentos, chegou completa até nós uma obra de caráter mítico-científico: De astronomĭa. Fato ainda em discussão, a atribuição de uma mesma autoria às Fabŭlae e ao tratado De astronomĭa se dá devido ao fato de se observarem certas semelhanças entre as obras.”

* * *

O BOM ANFITRIÃO QUE À CASA TORNA…

obs: Não estou transcrevendo todos os mácrons e braquias!

Amphitryon maritus erat Alcmenae et suo a domo abĕrat [estava ausente] cum expugnabat Oechalĭam. Iupĭter Amphitryonem simulavit, quia dormire cum Alcmena volebat. Tunc Alcmena Iovem thalămis recepit, quia dolum nesciebat.

Iupĭter, cum in thalamos venit, Alcmenae retulit res gestas quas in Oechalĭa gessit. [realizado] Ea, credens Iovem coniugem esse, cum eo concubuit. Deus tam delectatus cum ea concubuit ut unum diem usurparet, duas noctes congeminaret. Ita Alcmena tam longam noctem admirata est. Ita Alcmenam tam longa nox tetĭgit. [?]

Postea cum verus venit maritus ad domum, minĭme [quase nada] eum curavit [se preocupava] Alcmena, quod iam putabat se coniugem suum vidisse. [ver] Amphitryon in regĭam [palácio] intravit et eam vidit securam. [indiferente] Tunc mirari coepit [começou a estranhar] et queri, [queixou-se] quia uxor eum comĭter [amavelmente] non excepit. [não o recebeu] Marito Alcmena respondit: ‘Iam pridem [antes] venisti et mecum concubuisti et mihi narrasti res gestas in Oechalĭa tuas’.

Alcmena omnes res domi factas dixit. Tunc factum sensit dolum maritus: deus alĭqui fuit pro se. [em seu lugar] Ex qua die cum ea non concubuit. [Nesse dia não consumaram relação] Alcmena, ex Iove compressa, [violentada] pepĕrit [pariu] Herculem.”

(*) “Alcmena, então, ficaria grávida de dois homens: do deus Júpiter, que será o pai de Hércules, e de seu marido, que será o pai de Íficles. Como Hércules será gerado primeiro, ele será chamado, inclusive em Higino, conforme veremos na Unidade II, de primogênito.”

Minha tradução completa:

Anfitrião, marido de Alcmena, deixou seu lar para lutar em Ecália.¹ Zeus se metamorfoseou em Anfitrião para satisfazer oportunamente seu anseio libidinoso de dormir com Alcmena. Alcmena, enganada pela artimanha do deus, recebeu Zeus de bom grado em sua cama e em seus braços, pensando que procedia apenas à virtuosa união do tálamo conjugal.

¹ [Futura Cálcis. Curiosamente, seria destruída por Hércules quando adulto.]

Zeus tanto gozou dessa união que, não só uma, mas duas noites inteiras tomou no ato de a possuir. Isso ele fez com artifício sobrenatural, para que a longa noite não fosse interrompida, transformando a duração normal em seu dobro. Alcmena bem se admirou da longa duração de suas núpcias de boas-vindas a seu esposo guerreiro.

Quando o verdadeiro Anfitrião enfim vitorioso da guerra regressou, vendo que Alcmena não o recebeu da forma apropriada, dando a sua chegacda somenos importância, questionou a indiferença de sua amada. Alcmena assim respondeu, com naturalidade e certo enfado categórico: ‘Ora, se viestes mais cedo e me enlaçaste, celebrando a vitória em Ecália!… Que esperavas agora? O mesmo entusiasmo?’.

Alcmena disse apenas a verdade que vivera. Constatou-se então a verdade maior, para ela e Anfitrião, até então oculta: um deus com ela jazeu na cama, fazendo-se passar por quem não era. Estuprada pelo Rei do Olimpo, o produto da semente daquela dupla noite capciosa seria parido nove meses mais tarde, sendo esta a estória de como o bebê Hércules nasceu.”

GLOSSÁRIO

concubuit: deitar-se

dixit: narrar (além de narrar, contar, o verbo significa cantar, celebrar, recitar, predizer; chamar, designar, apelidar, nomear, eleger; fixar, estabelecer; ordenar, avisar)

LEMBRETES DO PORTUGUÊS

congeminar: multiplicar

congeminar-se: cismar, matutar

Este é o lugar oportuno para citar as 3 principais recomendações com que me deparei em pesquisas que exorbitam este livro do LATINITAS para dicionários, seja para iniciantes ou usuários avançados, com o idioma de partida seja em português ou inglês:

FARIA. Dicionário Escolar Latino-Português (para usuários novatos e avançados)

GLARE. Oxford Latin Dictionary (melhor opção para quem já domina o inglês)

REZENDE & BIANCHET. Dicionário do latim essencial (para consultas breves)

SANTOS SARAIVA. Dicionário latino-português (para usuários avançados)

factum sensit dolum maritus

permutabilidade plena das palavras na frase sem perda de sentido:

factum sensit dolum maritus

maritus factum sensit dolum

factum maritus dolum sensit

dolum sensit factum maritus

maritus sensit factum dolum (melhor para perceber a concordância de sujeito e verbo conector)

Daqui por diante, ao verificar no vocabulário ou no dicionário uma palavra, observe que ela virá no nominativo e no genitivo singular, separados por vírgula:

ALCMENA , ALCMENAE ou ALCMENA , -AE” (detector da declinação)

ATENÇÃO: A palavra nox tem genitivo noctis. Assim, o seu genitivo simplificado não será formado apenas com a terminação –is (nox, -is), pois daríamos a impressão que o genitivo é noxis. Os dicionários costumam enunciar a palavra assim: nox, -ctis.”

QUAL A UTILIDADE DE COLOCAR NOMES PRÓPRIOS EM DICIONÁRIOS? NENHUMA, A NÃO SER QUE A LÍNGUA OS DECLINE! “Percebemos que a palavra Amphitryon é nominativo não por sua terminação, mas por sabermos que é uma palavra da 3ª declinação e, ao conferirmos sua entrada em dicionários, como se vê abaixo, nos certificarmos de que Amphitryon é a forma que antecede a vírgula. Veja:

Amphitryon, Amphitrionis”

MNEMÔNICO ETIMOLOGIA(?) “Puella est secura.” Curiosamente, as pessoas mais secas no tratamento com as outras são-no às vezes por serem mais seguras. Stultus? Sed utilis!

Tempos do infectum são aqueles que exprimem ações não concluídas, não acabadas (presente – eu julgo, pretérito imperfeito – eu julgava e futuro imperfeito – eu julgarei). Os tempos do perfectum, por sua vez, são aqueles que exprimem ações concluídas, acabadas (pretérito perfeito – eu julguei, pretérito mais-que-perfeito – eu julgara ou tinha julgado, futuro perfeito – eu terei julgado).”

Em geral, os dicionários costumam mostrar 5 formas do verbo, conhecidas como tempos primitivos. Por enquanto, vamos nos concentrar em 4 dessas cinco formas.” a terceira posição no dicionário, ou seja, a 2ª terminação à direita da palavra (do verbo) é o infinitivo.

puto, -as, -are, putavi

1. (ego) puto 1ª pessoa do presente do indicativo ou infectum (imperfectivo)

2. 2ª pessoa

3. declinação (1ª) – infinitivo – PUTARE

4. 1ª pessoa do pretérito perfeito (perfectivo)

O 1 e o 4 se fazem necessários pois dão origem a conjugações um tanto diferenciadas. Os verbos do imperfectivo se estruturarão pela partícula –ba–.

humani nihil a me alienum puto

nada humano julgo estranho

Há verbos que são irregulares e que são reconhecidos pela sua forma de infinitivo, não apresentando as terminações em -are, -ere, –ĕre e -ire. É o caso, por exemplo, de verbos como referre, esse e posse.”

Chamamos o verbo no latim pelo seu infinitivo (esse – ser, estar) ou pela primeira pessoa do presente do indicativo (sum – sou, estou). Assim, quando dizemos verbo sum, entendemos tratar-se do verbo ser; da mesma forma ocorre quando dizemos verbo esse. No dicionário, esse verbo aparece assim: sum, es, esse, fui.”

ego sum

tu es

ea est

nos sumus

vos estis

illo(*) sunt

eram

eras

erat

eramus

erātis

erant

fui

fuisti

fuit

fuĭmus

fuistis

fuērunt ou fuēre

possum, potes, posse, potŭi

possum

potes

potest

possumus

potestis

possunt

poteram

poteras

poterat

poterāmus

poterātis

poterant

potui

potuisti

potuit

potuimus

potuistis

potuerunt ou potuēre

(*) CURIOSIDADE

O elo perdido entre a preposição latina e o artigo português:

ĭllu > elo > lo > o

Se observarmos bem algumas palavras de nossa língua em determinados registros, vamos perceber que há ainda certas alternâncias, umas mais outras menos formais, entre pronúncias com b ou v: sobaco/sovaco, vassoura/bassoura, travesseiro/trabesseiro

UNIDADE DOIS:

Hercŭlis athla duodĕcim ab Eurysthĕo imperata (Fabŭlae, XXX)

HIGINO

In infantĭa, dracones duos duabus manĭbus necavit, quos dea Iuno misĕrat, unde poetae primigenĭum dixerunt puĕrum.

1. Leonem Nemeae, quem Luna nutriĕrat in antro amphistŏmo, [caverna de duas entradas] atrotum [invencível] necavit. Postea Hercŭles pellem leonis pro tegumento [capa] habŭit.

2. Hydram Lernae – Typhonis filĭam cum capitĭbus novem [nove cabeças] – ad fontem Lernaeum interfecit [matou]. Hydra tantam vim veneni habŭit. Ea afflatu [bafo] potĕrat homĭnes necare et si persona eam dormientem transiĕrat, vestigĭa personae afflabat [bafejava] et maiori cruciatu [maior sofrimento] interibat [matava]. Postquam hydram Hercŭles interfecit et exinteravit [estripou] et eius felle [em veneno] sagittas suas tinxit. Ităque sagittae Hercŭlis letales erant.

3. Aprum [javali] Erymanthi occidit. [matou]

4. Cervum ferocem in Arcadĭa cum cornĭbus aureis [áureo] vivum in conspectum [em presença] Eurysthei regis adduxit.

5. Aves Stymphalĭdes in insŭla Martis, quae emissis pennis [penas] suis sauciabant, sagittis interfecit.

6. Augeae regis stercus bovile uno die purgavit, maiorem partem Iove adiutore [ajudante]; Iupĭter flumen immisit et totum stercus ablŭit. »

GLOSSÁRIO

necavit: matar

propter : perto, por causa

in + subst. => uso do ablativo

Tendo a crer que esse método não levará a nada – veja só o caráter abstrato e distante do aprendiz: “Acusativo antecedido por preposição § Ao estudarmos as funções dos casos, constatamos que o acusativo é o caso do objeto direto. Observe estes dois exemplos do texto em que as palavras no acusativo exercem funções diferentes”…

O caso ablativo é o caso por excelência do adjunto ou complemento circunstancial, já que, mesmo não regido por preposição, pode assumir essas funções. Mas nem sempre o ablativo sozinho será suficiente para marcar todos os tipos de circunstâncias”

As palavras da 1ª declinação são, em sua grande maioria, femininas. Algumas, contudo, são masculinas: nomes de profissões comuns a pessoas do sexo masculino: nauta, -ae (marinheiro), poeta, -ae (poeta); nomes de pessoas do sexo masculino, como Galba, -ae (Galba); nomes de rios: matrŏna, -ae (Mátrona, rio da Gália, hoje Marne); e os substantivos formados com o auxílio dos sufixos -cola e -gena: agricŏla, -ae (agricultor), incŏla, -ae (habitante), indigěna, -ae (indígena).”

Há, assim, no latim, algumas palavras utilizadas somente no plural (chamadas pluralia tantum).”

Assim como divitiae, são pluralia tantum da 1ª declinação, além de outras, as seguintes palavras: feriae (férias), nuptiae (núpcias), Athenae (Atenas). Veja que, no português, algumas dessas palavras só são, também, utilizadas no plural. Em outras declinações, há também palavras só utilizadas no plural. Elas serão vistas nas lições em que detalharmos cada uma das declinações.”

Palavras especiais em –er da 2ª declinação

Observe a seguinte oração do texto:

Aprum Erymanthi occidit.

(Matou o javali de Erimanto)

A palavra em destaque na oração aparece assim dicionarizada: aper, -pri. Observe que, no exemplo acima, com a palavra no caso acusativo, ocorre a síncope da vogal ‘e’: aprum e não aperum. Veja, agora, duas palavras que têm nominativo em –er e que se comportam de maneira diferente ao serem declinadas.

PUER / APER

(…)

Podemos conferir que, na palavra puer, a vogal e se mantém em todos os casos do singular e do plural. Na palavra aper, por outro lado, ocorre a síncope do e em todos os casos do singular e do plural (exceto no nominativo singular). Em função dessas diferenças na declinação das palavras em –er, os dicionários e vocabulários costumam mostrar no genitivo, além da terminação, uma parte da palavra, indicando que ocorre síncope ali”

É o caso de lenha, no português, que é uma forma singular (oriunda de um neutro plural latino) e mantém uma ideia de plural: uma porção de gravetos ou pedaços de madeira para ser queimada.”

(cont.)

7. Taurum, cum quo Pasiphaa concubuit, ex Creta insula Mycenas vivum adduxit.

8. Diomedem, Thracĭae regem, et equos quattuor eius, qui carnem humanam edebant, cum Abdero famulo interfecit; equorum autem nomĭna: Podargus, Lampon, Xanthus, Dinus.

9. Hippolytam Amazonam, Martis et Otrerae reginae filĭam, cui reginae Amazonis baltĕum detraxit; [arrancou o cinturão] tum Antiopam captivam Thesĕo donavit.

10. Geryonem, Chrysaoris filĭum trimembrem, uno telo interfecit. [matou com uma flecha]

11. Draconem immanem [inumano] Typhonis filĭum, qui mala aurĕa [maçã de ouro] Hesperĭdum servare solĭtus erat, [soía guardar] ad montem Atlantem interfecit, et Eurystheo regi mala attŭlit.

12. Canem Cerbĕrum, Typhonis filĭum, ab infĕris regi in conspectum adduxit.”

(*) “As Hespérides eram as filhas de Héspero que habitavam perto do monte Átlas, num jardim com árvores de pomos de ouro e guardado por um dragão”

UNIDADE TRÊS:

Nessus (Fabŭlae, XXXIV);

Iŏle (Fabŭlae, XXXV)

HIGINO

Quando Hércules foi enviado pelo rei Euristeu até o cão de três cabeças, e Lico, filho de Netuno, acreditou que aquele tinha morrido, quis matar sua esposa Mégara, filha de Creonte, e seus filhos Terímaco e Ofites, e apoderar-se do trono. Hércules aparece e mata Lico, mas, mais tarde, vítima de um ataque de loucura provocado por Juno, matou Mégara e seus próprios filhos. Quando recobrou o seu juízo, solicitou de Apolo que lhe desse uma resposta sobre como devia expiar o crime. Como Apolo não quis oferecer-lhe resposta alguma, Hércules, irado, arrebatou de seu templo o trípode, que depois teve que devolver por ordem de Júpiter. Júpiter também ordenou a Apolo que lhe concedesse a resposta, ainda que não quisesse. Por isso, Hércules foi entregue como escravo por Mercúrio a Ônfale, rainha da Lídia.

Em algumas versões, como em Apolodoro (Bibl., II 5, 5), a morte de Mégara ocorre antes dos 12 trabalhos e teria sido o motivo de Euristeu ter ordenado a Hércules as suas provas. Na versão de Higino e também na de Eurípides (Hérc., 359-435), a matança é posterior às provas.”

Deianira Nessum – Ixionis et Nubis filium – Centaurum rogavit ut se flumen Euhenum transferret. Deianiram sublatam [nas costas, no dorso do minotauro] in flumine ipso violare volŭit. Hercŭles cum intervenisset et Deianira cum fidem eius implorasset, Nessum sagittis confixit. Hercules sagittas hydrae Lernaeae felle tinxerat, itaque quantam vim habebant veneni. Cum Centaurus hoc sciret, [saber] moriens sanguinem suum exceptum Deianirae dedit. Postea Deianirae dixit: ‘Sanguis philtrum [loção] est. Vestem eius perungere sanguinis debes, si maritum ardentem amore vis’ [força]. Centauri verba Deianira credidit et conditum diligenter servavit sanguinem.”

As fake news matam os velhos brochas desde o começo dos tempos…

Hercŭles cum Iŏlen Euryti filiam in coniugium petiisset, virginis pater eum repudiasset, Oechaliam expugnavit. Hercŭles – ut virgo rogaret – parentes eius coram ea interficere velle coepit. Illa animo pertinacior [ânimo firme] videre parentum suorum mortem ante se sustinuit. Postea, Hercŭles Iŏlen captivam ad Deianiram praemisit.”

GLOSSÁRIO

conditum: escondido

coram: em frente de

Júpiter, sabendo por Juno das investidas de Ixião, formou uma nuvem com o aspecto e a forma de Juno. Ixião possuiu a nuvem, acreditando estar com Juno. Daí vem a expressão ‘tomar a nuvem por Juno’. Dessa ‘união’, nasceram os Centauros. O castigo na roda a girar eternamente deveu-se ao fato de que Ixião, mandado de volta à Terra, tinha se gabado de ter dormido com a esposa de Júpiter.”

* * *

Observando as terminações da 3ª declinação, perceberemos que a palavra felle está no caso ablativo singular (com o fel), que a palavra vim está no acusativo singular, assim como a palavra sanguinem.”

Em geral, para sabermos se uma palavra da 3ª declinação é de tema em –i (ou tema sonântico), isolamos, do genitivo plural, o seu radical. Assim, se a palavra é volpes, volpis (raposa), detectamos seu radical (volp-) a partir do genitivo singular. Ao tomarmos o genitivo plural, volpium, e retirarmos o radical, observamos que a palavra é de tema em –i. Num outro caso, princeps, principis, detectamos o radical pelo genitivo singular. Com o genitivo plural sendo principum, retirando o radical, vemos que a palavra não é de tema em –i, mas é de tema consonântico.

Para a leitura dos textos latinos, não é necessário saber se o genitivo plural de uma palavra é em –um ou –ium”

O acusativo plural em –is das palavras masculinas e femininas (substantivos e adjetivos) de temas sonânticos ocorre até o século de Augusto, embora, segundo Faria (1958), a forma em –es já ocorresse desde os fins do século II a.C. Em Virgílio, a palavra feminina puppis apresenta o acusativo singular puppim e o plural puppis.

Algumas palavras que aparentemente não apresentam tema sonântico, como urbs (cidade), mors (morte), gens (família), dos (dote), são fruto de perda da sonante –i– quando precedida de uma consoante oclusiva: urb(i)s; mort(i)s > morts > mors; gent(i)s > gents > gens; dot(i)s > dots > dos. Essas palavras farão, pois, o genitivo plural em –ium (FARIA, 1958).”

Em latim, os tempos imperfectivos do subjuntivo são o presente e o pretérito imperfeito. Quanto ao futuro imperfeito, utilizam-se as mesmas formas tanto para o indicativo quanto para o subjuntivo”

O pretérito imperfeito do subjuntivo terá a raiz dos tempos imperfeitos e é marcado com o morfema –re–(*) em todas as pessoas do singular e do plural. Poderíamos também raciocinar assim: para fazermos o pretérito imperfeito do subjuntivo, consideramos o infinitivo do verbo e a ele acrescentamos os morfemas de pessoa: amarem (amare + m) = se eu amasse.

(*) Aqui também um fenômeno de rotacismo do sufixo –se-. No mais-que-perfeito do subjuntivo, esse sufixo, como veremos, é mantido.”

Observe aqui o uso das formas sincopadas: petiisset por petiviisset e repudiasset por repudiavisset.”

Deianira

(Fabŭlae, XXXVI)

(continuação da unidade III)

Deianira – Oenĕi filia et Hercŭlis uxor – cum vidit Iŏlen – virginem captivam eximiae formae – accedere, timŭit ne se coniugio privaret. Itaque, memor Nessi praecepti – vestem tinctam Centauri sanguine Hercŭli qui ferret – nomine Licham famŭlum misit. Inde paulum, quod in terra decidĕrat et sol attiigit, [vizinho, contíguo] ardere coepit. Quod Deianira ut vidit, dolum sensit: Nessus eam fefellĕrat. Et qui revocaret eum, cui vestem dedĕrat, misit. Vestem Hercŭles iam induĕrat, statimque flagrare coepit. Iovis filius cum se in flumen coniecisset ut ardorem extingueret, maior flamma exibat. Vestem demere autem cum vellet, viscĕra veniebant. Tunc Hercŭles Licham, qui vestem attulĕrat, rotatum in mare iecit. Servus quo loco cecidit, petra surrexit, quam Licham appellamus. Tunc Philoctetes, Poeantis filius, pyram in monte Oetaeo construxit Hercŭli, qui ascendit immortalitatem. Ob beneficium Philocteti Hercŭles arcus et sagittas donavit. Deianira autem ob fa(c)tum Herculis ipsa se interfecit.”

GLOSSÁRIO

affero: trazer // fero: levar

coniicio: lançar

fallo: enganar

flagro: arder, estar em chamas

forma, formae: “pode significar forma, molde, moldura, mas também significa moeda cunhada, moeda, além de significar figura, imagem, representação. No texto desta unidade, o significado é beleza, formosura)”

Lichas: escravo de Hércules

paulum: pequena quantidade

FÁBULAS ESÓPICAS

A conservação da obra de Fedro [compilador de Esopo] é parcial. Dos 5 livros que conhecemos, alguns têm um número muito menor de fábulas que outros. Enquanto os livros II e V têm, respectivamente 8 e 10 fábulas, os livros I, III e IV têm, por sua vez, 31, 19 e 25. Ainda são atribuídas a Fedro, hoje fato já aceito, 32 fábulas de uma compilação do humanista italiano Nicollò Perotti.(*) Essas fábulas, colocadas após o Livro V, aparecem reunidas no Appendix Perottina.

(*) Perotti (1429–1480) escreveu uma das primeiras gramáticas escolares modernas de latim (1473).”

De extensão variada, as fábulas de Fedro podem apresentar a lição de moral ora nos dois primeiros versos (promitio) ora nos dois últimos (epimitio).”

Quanto à forma, Fedro escreve suas fábulas com o mesmo metro utilizado pelos cômicos, o senário jâmbico, formado por 6 pés. Os pés são medidas ou grupos de sílabas de vários tempos.”

fīctīs | iŏcā | rī …… nōs | měmĭně | rīt fā|bŭlīs”

é bom lembrar que nós usamos o gracejo nestas fábulas fictícias”

UNIDADE QUATRO:

Serpens ad fabrum ferrarĭum (IV, 8);

Rana rupta et bos (I, 24);

Canes familĭci (I, 20)

FEDRO

A cidade mais importante da Trácia é Istambul, antiga Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente.”

Alguns dos assuntos das fábulas de Fedro eram já conhecidos e muitos já tinham sido apresentados por Esopo. Mas há também composições originais em sua obra. Apesar de sua inspiração em fábulas gregas e de sua adaptação delas para o latim, Fedro imprime sua originalidade, escrevendo em versos, diferentemente de Esopo, que escreveu suas fábulas em prosa.”

Apesar de publicar num tempo do ‘gosto novo’ que caracteriza esse período (artificialismos na linguagem, exageros), Fedro escreve com a concisão e precisão dos clássicos, num estilo limpo e elegante.”

Na fábula ‘Ranae ad Solem’, as rãs questionam o fato de o Sol querer casar-se, preocupando-se com a possibilidade de o Sol vir a ter filhos e sua morada, o lago, ficar ainda mais seca. Em ‘Lupus et Agnus’, a moral evidencia a crítica ao opressor: ‘Haec propter illos scripta est homĭnes fabŭla / qui fictis causis innocentes opprimunt’

A partir desta unidade do curso, os textos não mais se encontram adaptados. Todas as fábulas de Fedro utilizadas seguem a edição de Les Belles Lettres, cujos textos foram estabelecidos por Alice Brenot. (PHÈDRE. Fables. Texte établi et traduit par Alice Brenot. Sixième tirage. Paris: Les Belles Lettres, 2009baixar e ler 1º se a compreensão do latim estiver difícil!).”

Serpens ad fabrum ferrarium (IV, 8)

Mordaciorem qui inprŏbo dente adpětit,

hoc argumento se describi sentĭat.

In officinam fabri vēnīt vipěra.

Haec cum temtaret si ecqua [alguma] res esset cibi,

limam momordit. Illa contra contŭmax: [orgulhosa]

<Quid me> inquit <stulta, dente captas laeděre

omne adsuevi ferrum quae conroděre

………………………………………………………..?>

Rana rupta et bos (I, 24)

Inops, potentem dum vult imitari, perit.

In prato quondam rana conspexit bovem,

et, tacta invidĭa tantae magnitudinis,

rugosam inflavit pellem. Tum natos suos

interrogavit an bove esset latĭor.

Illi negarunt. Rursus intendit cutem

maiore nisu, et simĭli quaesivit modo

quis maĭor esset. Illi dixerunt bovem.

Novissĭme indignata, dum vult validĭus

inflare sese, rupto iacŭit corpŏre. »

Canes familici [famélico] (I, 20)

Stultum consilĭum non modo effectu caret,

sed ad pernicĭem quoque mortalis devocat. [arrasta]

Corĭum depressum in fluvĭo viderunt canes.

Id ut comesse extractum possent facilĭus,

aquam coepere ebibĕre, sed rupti prius

periere quam, quod petiĕrant, contingĕrent.”

GLOSSÁRIO:

pratum: prado

três prados cheios de trigo em que rondam três tigres felizes…

a preposição in com acusativo dá idéia de movimento em direção a algum lugar, com a idéia de lá ficar; a preposição ad dá ideia de direção a algum lugar”

coepere: começaram

(o verbo é defectivo e aparece dicionarizado apenas com as formas de perfeito: coepi, coepisti, coepisse. Conforme veremos nesta unidade, coepere não é infinitivo, mas uma forma da 3ª pessoa do plural do pretérito perfeito equivalente a coeperunt. No período clássico, usam-se apenas as formas dos tempos perfeitos e supino, conforme veremos, diferentemente do que ocorre no período arcaico)”

depressus: submerso, mergulhado

(também aparece dicionarizada como um adjetivo de 1ª classe – depressus, -a, -um –, mas se trata de um particípio passado do verbo deprĭmo, -is, -ěre, -pressi)”

rupta: arrebentada

(dicionarizada como um adjetivo de 1ª classe – ruptus, -a, -um – arrebentado(a), trata de um particípio passado do verbo rumpo, -is, -ěre, rupi)”

* * *

poderemos ter problemas ao encontrar num texto a palavra itiněris, pois seu nominativo (caso no qual os substantivos aparecem no vocabulário) é iter

SOBRE DECLINAÇÕES E COMO ACHAR CERTAS PALAVRAS IRREGULARES DE TERCEIRA DECLINAÇÃO NO DICIONÁRIO:

radical terminado em: genitivo: resultado: nominativo:

consoante dental dentis -ti desaparece no nom. dens

consoante labial hiemis -i desaparece no nom. hiems

consoante gutural ducis converte-se em –x dux

regis rex

Há um outro grupo de adjetivos em latim que segue a 3ª declinação. São os chamados adjetivos de 2ª classe. Diferentemente dos adjetivos de 1ª classe, que são sempre triformes, os de 2ª classe podem ser triformes, biformes ou uniformes (classificação que se baseia pelo nominativo singular).”

Inops, potentem dum vult imitari, perit.”

(O fraco, querendo imitar o forte, perece.)

Ex 1: acer, acris, acre (masc., fem., neut.)

áspero, cruel

Ex 2: atrox (m, f, n)

GLOSSÁRIO:

fleo: chorar

COMPARATIVO & SUPERLATIVO

Assim como no português, em latim, o adjetivo tem 3 graus: o positivo, o comparativo e o superlativo. No grau positivo, estudado anteriormente, menciona-se uma qualidade sem outra idéia complementar qualquer: bonus (‘bom’); fortis (‘forte’); celer (‘célere’).”

Conforme veremos, o comparativo de igualdade e de inferioridade só se faz em latim analiticamente, por meio de perífrases com advérbios (minus ou tam) mais o adjetivo. Já o comparativo de superioridade pode ser feito analiticamente, com o advérbio magis seguido do adjetivo, e pode ser feito sinteticamente, com os morfemas –ĭor e –ĭus.”

Ex 1: mordaciorem – mais mordaz que. Lembrar que ainda há o sufixo das declinações!

raiz mordax

Ex 2: altioris

Rana lata non erat magis quam bos.”

(A rã não era maior que o boi.)

ABLATIVO DE COMPARAÇÃO: “Rana latior non erat bove (abl. 3ª).”

a. Fons purĭor quam flumen est.

b. Fons purĭor flumine est.”

« Se se usar a partícula de comparação —quam—, o termo comparado fica no mesmo caso do outro termo a que se está comparando. »

Para a formação do grau superlativo dos adjetivos, temos como regra geral o acréscimo do morfema –issim- à raiz do adjetivo. Em seguida, ele se declina como um adjetivo de 1ª classe do tipo bonus, -a, -um. Altus, por exemplo, no grau superlativo, fica altissimus, altissima, altissimum.

Já para os adjetivos terminados em -er, como pauper, a regra será acrescentar o morfema -rim- e decliná-los como um adjetivo de 1ª classe. Assim: pauper ficará pauperrimus, pauperrima, pauperrimum.

Alguns adjetivos terminados em –ĭlis (como facilis, facile: biforme da 3ª declinação) terão como regra o acréscimo do morfema -lim- à raiz da palavra, declinando-se, a partir daí, como um adjetivo de 1ª classe. São os seguintes: facilis, dificilis, similis, dissimilis, gracilis, humilis, a cujos radicais acrescentamos –lĭmus. Facĭlis, por exemplo, ficará assim: facillimus, facillima, facillimum. Os demais adjetivos terminados em –ĭlis seguirão a regra geral: nobilis será nobilissimus, -a, -um; utilis será utilissimus, -a, -um assim como os demais.”

Alguns adjetivos só são utilizados nos graus comparativo e superlativo. Veja alguns deles:

inferĭor, inferius (inferior) infĭmus, -a, -um (ínfimo)

superĭor, superĭus (superior) supremus, -a, -um (supremo)

interĭor, interĭus (interior) intĭmus, -a, -um (íntimo)

prĭor, prĭus (anterior) primus, -a, -um (o primeiro)”

bonus, -a, -um melĭor, melĭus optĭmus, -a, -um

malus, -a, -um peior, peius pessĭmus, -a, -um

magnus, -a, -um maior, maius maximus, -a, -um

parvus, -a, -um minor, minus minĭmus, -a, -um

magnifĭcus magnificentior magnificentissimus, -a, -um

Adjetivos em cujo tema a vogal final vem precedida de outra vogal, como os terminados em -eus, -ius, -uus (idoneus, exiguus, regius), não possuem formas comparativas nem superlativas sintéticas. Usamos, nesses casos, os advérbios magis ou plus para o comparativo; e maxime (maximamente), multum, valde (muito), e outros de significação semelhante, para o superlativo.”

Perfeito sincopado

É comum alguns verbos apresentarem síncopes no tema do perfeito, razão pela qual os dicionários costumam registrar duas formas de perfeito entre os tempos primitivos de certos verbos. Reveja um trecho de uma fábula de Fedro e observe atentamente os pretéritos perfeitos dos verbos interrogare e negare

(…)

Veja como os verbos destacados aparecem dicionarizados: interrogo, -as, -are, interrogavi e nego, -as, -are, negavi.”

VERBO ESSE NO PRESENTE DO MODO SUBJUNTIVO

Analisaremos o verbo esse (sum, -es, esse, fui) separadamente, já que não seguirá a lógica de uso dos sufixos de subjuntivo dos verbos regulares.”

Presente do subjuntivo

sim

sis

sit

simus

sitis

sint

* * *

Da forma datum formamos, pois, o particípio passado datus, data, datum, que se declina como um adjetivo de 1ª classe (tipo bonus, bona, bonum).” isto-não-está-datum

o rrato arrombou a rrã do rrei de rroma

De vitĭis homĭnum (IV, 10) (A ORIGEM DA COLUNA VERTEBRAL!)

Peras [alforje/alforge¹] imposŭit [impôs] Iuppĭter nobis duas;

proprĭis repletam vitĭis post tergum [costas] dedit,

alienis ante pectus suspendit gravem.

Hac re videre nostra mala [dessa vez não é maçã, mas mal mesmo!] non possŭmus;

alĭi simul [assim que os outros] delinquunt, [erram] censores sumus.”

¹ “Etimologia (origem da palavra alforje). Do árabe al-khur, saco levado junto à sela, ao lado.”

GLOSSÁRIO:

cogo: forçar

vulpes: raposa

UNIDADE CINCO:

De vulpe et uva (IV, 3);

Cornu fractum (App. Per., 22);

Vulpes et simius (App. Per., 1).

FEDRO

De vulpe et uva (IV, 3)

Fame coacta vulpes alta in vinĕa

uvam adpetebat, summis saliens virĭbus.

Quam tangĕre ut non potŭit, discedens ait:

<Nondum matura es; nolo acerbam sumĕre.>

Qui facĕre quae non possunt verbis elĕvant [desdenhar no sentido abstrato – grande exemplo de falso cognato! / porém, em outros sentidos pode ser realmente elevar/tirar, física, concretamente.]

adscribĕre hoc debebunt exemplum sibi. »

MORAL DA HISTÓRIA: Ah, nem queria mesmo!

Cornu fractum (Appendix Perotina, 22)

Pastor capellae [de pequenas cabras] cornu bacŭlo fregĕrat;

rogare coepit ne se domĭno proderet.

<Quamuis indigne laesa reticebo tamen; [contudo, embora]

sed res clamabit (ipsa) quid deliquĕris.> »

Embora indignamente ofendida, guardarei silêncio, já que os fatos dirão em alta voz e por si mesmos que delinquiste.

Vulpes et simĭus (Appendix Perotina, 1)

Vulpem rogabat partem caudae simĕus,

contegĕre honeste [cobrir, ocultar dignamente] posset ut nudas nates. [nádegas nuas]

Cui sic maligna: <Longĭor fiat licet, [embora, apesar de]

tamen illam citĕus [de preferência a] per lutum [lodo] et spinas [espinhos] traham

quam tibi particŭlam quamuis [sem dúvida] parvam impartiar.>

Embora longa ela seja, (minha cauda) arrastá-la-ei pelo lodo e por espinhos, antes de compartilhá-la contigo!

GLOSSÁRIO:

adpeto: desejar

clamo: clamar (dizer em voz alta)

cras: amanhã

heri: ontem

Futuro imperfeito (indicativo e subjuntivo) de esse e seus compostos

ego ero

eris

erit

erĭmus

erĭtis

erunt

Certos verbos, em sua conjugação, não apresentam determinadas pessoas, tempos ou modos. São os chamados verbos defectivos.”

amarei: amabo ou amare habeo

Lupus et Agnus [cordeiro] (I, 1)

Ad rivum eundem lupus et agnus venerant

siti compulsi [impelidos pela sede]; superĭor stabat lupus

longeque inferĭor agnus. Tunc fauce [goela] improba

latro [ladrão] incitatus iurgĭi causam intulit.

<Quare>, inquit, <turbulentam fecisti mihi [tornou turva a água que bebo]

aquam bibenti?> Lanĭger contra timens: [temeroso respondeu]

<Qui possum, quaeso, [por favor] facere quod quereris, [de que te queixas] lupe?

A te decurrit [descem] ad meos haustos [goles] liquor.>

Repulsus ille veritatis virĭbus:

<Ante hos sex menses male>, ait, <dixisti mihi.>

Respondit agnus: <Equĭdem [decerto] natus non eram.>

<Pater hercle tuus>, ille inquit, <male dixit mihi>;

atque ita correptum [arrebatar] lacerat [devorar], iniusta nece. [usando uma desculpa]

Haec propter illos scripta est homĭnes fabŭla,

Qui fictis causis innocentes opprimunt.”

UNIDADE SEIS:

Ovis, cervus et lupus (I, 6);

De capris barbatis (IV, 17).

FEDRO

Ovis, cervus et lupus

Fraudator homĭnes cum advocat sponsum imprŏbos,

non rem expedire, sed nos induere expetit.

Ovem rogabat cervus modĭum tritĭci, [beneficiar-se]

lupo sponsore. At illa, praemetŭens dolum:

<Rapĕre atque abire semper adsuevit lupus;

tu de conspectu fugĕre veloci impĕtu.

Ubi vos requĭram, cum dies advenĕrit?>.”

De capris barbatis

Barbam capellae [de capri] cum impetrassent ab Iove,

hirci maerentes indignari coeperunt

quod dignitatem femĭnae aequassent suam.

<Sinĭte,> [concordância, sim] inqŭit, <illas glorĭa vana frui

et usurpare vestri ornatum munĕris,

pares dum non sint vestrum fortitudĭne.>

Hoc argumentum monet ut sustinĕas tibi

habĭtu esse simĭles qui sint virtute impăres.”

GLOSSÁRIO:

aequo: igualar

assuesco: habituar-se

dum: desde que/enquanto durar/até que

habitus: aparência

maerens: triste (lembrar de mareado)

modius: alqueire

múnus: cargo, função

ovis: ovelha; homem estúpido, simplório.

triticum: trigo

(A raiz de usurpação não denota ou conota crime, mas mero uso, diferente de rapio, rapto, p.ex.)

o latim mantém alguns verbos com duplo acusativo: um acusativo que funciona como o que conhecemos como objeto direto e outro acusativo como objeto indireto.”

CUIDADO COM QUEM É SUJEITO ATIVO E PASSIVO!

pueros docere grammaticam

Ovem rogabat cervus modium tritici (quem pede trigo é o veado)

parentes pretium poscere (não são os pais que exigem o preço ou paga; exige-se-lhes)

livrum flagitavi magistrum (solicitei o livro ao professor)

Careo virtute

Auxilio egeo (mar Egeu: o mar sempre necessitado!)

Vescor lacte (bebo leite; mas pode ser usado para comida, nutrição em geral)

Abundo pecunia.

Verbos que em português necessitam em geral “de” ou outro complemento, pelo menos na norma culta.

Hoc argumentum monet ut sustineas tibi habitu esse similes qui sint virtute impares.

Tal argumento demonstra o quanto deves sustentar uma aparência igual à daqueles de que

Este lembra como de quem …

que

 

és diferente em qualidades invisíveis

… virtudes.

caráter

Basicamente o provérbio da mulher de César.

Luminibus orbus

Privado da vista

Dives templum donis

Templo rico em oferendas

Parvo contentus.

Contente com pouco – e não: Tolo contente!! Nesse caso seria parvus contentum.

Verbos no presente do modo imperativo

sine: consinta

sine qua non – consinta que não…?

O sine qua non da filosofia n. é o eterno retorno – consinta que não existe filosofia nietzschiana sem o eterno retorno. = AQUILO SEM O QUE NÃO

Mons parturiens (IV, 24) [Montanha parturiente]

Mons parturibat, gemitus inmanes [espantoso] ciens,

eratque in terris maxĭma expectatĭo.

At ille murem [rato] pepĕrit. Hoc scriptum est tibi,

qui, magna cum minaris, [prometes] extricas nihil.”

prometes grandes coisas mas nada entrega /

Às vezes terremotos anunciam grandes coisas, mas nada sucede de relevo (tum dum!).

Tanto barulho por nada! etc.

Como grandes montanhas cujo parto ou tremor não era hecatombe, mas sim apenas obra dum rato em suas entranhas… tu, ladras e não mordes!

Vulpes ad personam [máscara] tragĭcam (I, 7)

Personam tragĭcam forte vulpes vidĕrat:

<O quanta specĭes> [beleza] inqŭit <cerĕbrum non habet!>

Hoc illis dictum est quibus honorem et glorĭam

fortuna tribŭit, sensum communem abstŭlit.”

A raposa viu casualmente uma máscara de tragédia

Quão bela, e no entanto nada carrega! Inanimada.

O que a sorte dá, o senso comum tira.

Particípio presente

Já que, em português, o particípio presente latino formou adjetivos e substantivos (amante, ouvinte, falante, parturiente, etc.), podemos muitas vezes traduzir o particípio presente como um gerúndio, como no verso acima.”

A voz passiva sintética

Personam tragicam vulpes videt

A raposa vê a máscara da tragédia

Persona tragica a vulpe(*) videtur

A máscara da tragédia é vista pela raposa

(*) Caso ablativo – “A função que tradicionalmente conhecemos como agente da passiva aparece, na oração em latim, no caso ablativo, antecedido por preposição, por se tratar de um ser animado (a raposa).” Caso sem preposição: Iniuriis non moveor tuis (Suas injúrias não me comovem – em português também caberia dizer não comovem a mim). Iniuriis tuis é o ‘agente da passiva’.

Em latim a voz passiva pode ser escrita de forma mais lacônica do que no português, cuja praxe é o contrário (alonga a voz ativa!).

Os verbos depoentes

Chamam-se verbos depoentes aqueles verbos que apresentam terminações de voz passiva, mas que têm sentido ativo.”

verbo depono: abandonar (mesma coisa do port. de-pôr)

No dicionário:

Tempos primitivos do verbo dare (não-depoente):

do, -as, -are, dedi, datum

Tempos primitivos do verbo minari (depoente):

minor, -aris, minari, minatus sum (eu prometi, eu ameacei) – não existe o supino (correlato a datum)

Lembrando que normalmente os infinitivos apresentam sufixo:

-re (voz ativa) dare (dar)

-ri (voz passiva) dari (ser dado)

GLOSSÁRIO:

abdo: esconder

abdômen: provavelmente porque o ventre está destinado a esconder nossas feias tripas.

EPIGRAMAS

O termo epigramma, em grego, significa inscrição. Originariamente, designava qualquer tipo de inscrição, ou seja, referia-se a textos escritos gravados ou pintados sobre objetos votivos, monumentos, estátuas, medalhas, moedas e também sobre monumentos celebrativos ou funerários, com o objetivo de fazer lembrar um acontecimento memorável, uma vida de destaque.” “o epigrama nasce com a característica da brevidade, da concisão. E essa característica se mantém quando adquire status de texto literário.”

Entre os latinos, mantém inicialmente a característica de uma poesia sentimental, subjetiva, herdada da influência helenística, e o tom de poema de ocasião, tendo, entre seus temas, o erotismo, a jocosidade, a polêmica, desenvolvendo-se como um instrumento para a difamação pessoal e a crítica social e até mesmo política.

Utilizado por Ênio (239 a.C–169 a.C) em monumento celebrativo, terá, com Catulo (87 a.C?–54 a.C?), repercussão e status literário e será identificado com o nome de Marcial (38/41 d.C–102/104 d.C).”

Após o Renascimento, contudo, volta a ser apreciado, inicialmente na Europa e depois nas Américas. Seu auge ocorrerá no século XVII, e ainda encontramos poetas que mantêm acesa a chama do gênero”

UNIDADE SETE: EPIGRAMAS – PARTE I – MARCIAL

Nasce Marcial por volta dos anos 38 e 41 d.C, na região conhecida por Hispânia Tarraconense, em um povoado chamado Bílbilis. De família provavelmente não muito modesta, deve ter recebido formação de ótimo nível na própria região da Hispânia (certamente não em Bílbilis, por se tratar de um pequeno povoado). Muda-se para Roma por volta do ano de 64 e aí desenvolverá sua atividade literária em boa parte dos 34 anos em que permaneceu longe de sua terra natal. Será acolhido por Sêneca e, renunciando à possibilidade de carreira no Foro, irá se dedicar à carreira poética. É na Hispânia também que ocorrerá o seu falecimento entre os anos de 102 e 104.”

Da obra de Marcial, chegou até nós uma coletânea que se abre com o Liber de spectaculis, tendo na sequência os livros de epigramas do I ao XII e os livros XIII e XIV (Xenĭa e Apophoreta), apesar de estes dois últimos terem surgido anteriormente ao livro I. Os epigramas apresentam, em sua maioria, entre 2 e 10 versos, sendo encontrados muitos outros que ultrapassam os 20 versos.”

Marcial influenciará autores como Quevedo (Espanha), Bocage (Portugal) e Gregório de Mattos (Brasil).”

Por ocasião da inauguração dos espetáculos no Anfiteatro Flávio, o Coliseu, no ano de 80, sob o domínio de Tito, Marcial publicará o Epigrammăton liber, conhecido por Liber de spectacŭlis. A partir dessa obra, que celebra um acontecimento público de tal dimensão, Marcial receberá de Tito o benefício ius trium liberorum, passando a contar com amparos legais destinados originalmente a progenitores de no mínimo três filhos, o que não era o caso de Marcial.”

Escritos em dísticos elegíacos, serviam para acompanhar os presentes aos amigos (xenĭa, presente em latim) ou para acompanhar os presentes que os convivas levavam para casa (apophoreta, presentes oferecidos aos convivas nos dias das Saturnais).”

Os epigramas utilizados nesta unidade foram os estabelecidos por H.-J. Izaac, conforme edição consultada: MARTIAL. Épigrammes. Tome I. Livres I-VII. Texte établi et traduit par H.-J. Izaac. Quatrième tirage. Paris: Les Belles Lettres, 2003.”

(I, 19)

Si memĭni, [se me lembro] fuěrant tibi quattŭor, Aelia, [Élia, Hélia] dentes:

expŭlit una duos tussis et una duos.

Iam secura potes totis tussire diebus:

nil istic [aí] quod agat tertia tussis habet.”

Agora pode tossir, não tem mais dente pra cair!

(I, 91)

Cum [Já que] tua non edas, carpis mea carmĭna, Laeli. [sobrenome]

Carpěre vel [ou] noli nostra vel ede tua.”

(III, 8)

<Thaida Quintus amat.> <Quam Thaida?> <Thaida luscam.> [Qual Thaís? A Thaís caolha.]

Unum ocŭlum Thais non habet, ille duos.”

(III, 13)

Dum non vis pisces, dum non vis carpěre [não quis destrinchar as escamas] pullos

et plus quam putri, Naevia, parcis apro,

accusas rumpisque cocum, [não quis incomodar nem acusar o cozinheiro] tamquam omnĭa cruda [como se a comida estivesse crua…]

attulěrit.¹ Numquam sic ego crudus ero.” […pois grosso não sou!]

¹ Se ele houvera trazido, verbo affero. Como se ele tivesse trazido uma comida crua da cozinha.

Minha primeira interpretação estava errada: o tanquam muda tudo: “Acusaste e quiseste bater no cozinheiro COMO SE ele tivesse trazido uma comida crua, porém a verdade é que és um grosseirão!”

GLOSSÁRIO:

Taís/Thaida: “Não tem a terminação -em de acusativo singular da 3ª declinação por ser uma palavra grega e seguir as formas gregas de declinação”

crudus: cru (comida) ou grosso(a) (pessoa!)

edas: tornar conhecido

numquam: “Não confundir com nunc, que quer dizer agora, e com nusquam, que quer dizer em nenhuma parte, em nenhuma ocasião, em nada, para nada”

tribus: alerta – 3 declinado!

Numerais

(cont.)

As centenas declinam-se como adjetivos de 1ª classe, no plural. Os ordinais declinam-se todos como adjetivos de primeira classe (primus, -a, -um; secundus, -a, -um; duodevicesĭmus, -a, -um)”

O verbo memĭni

Alguns verbos não apresentam tempos do infectum e/ou a forma do supino. Deixarão de apresentar também as formas derivadas desses tempos. São os verbos defectivos, que já havíamos começado a estudar.”

Comparação com dare no dicionário:

GLOSSÁRIO:

licet = quamuis: ainda que

Introdução ao imperativo negativo

ede: publique

Para dizer no negativo…

A forma em negrito (carpere noli) é uma forma perifrástica de se construir o imperativo negativo dos verbos. Nesse tipo de construção, coloca-se o verbo nolo (não querer) no imperativo (noli) e o verbo principal no infinitivo presente (carpere):

noli carpere: não queira você censurar (não censure)

nolite carpere: não censurem

Frase do epigrama acima:

Carpěre vel noli nostra [carmina] vel ede tua.

(Não censure nossa canção nem publique a tua.)

Vel… …vel…

* * *

I, 32

Non amo te, Sabidi, [Sabidius, nome próprio masculino] nec possum dicere quare:

hoc tantum possum dicere, non amo te.”

IV, 58

In tenebris luges amissum, Galla, maritum [Nas sombras chora teu falecido, Gala]

nam plorare pudet te, puto, Galla, virum. [O chorar viril não devia te envergonhar, Gala]

I, 63

Ut recĭtem tibi nostra rogas epigrammata. Nolo:

non audire, Celer, sed recitare cupis.”

I, 64

Bella es, novĭmus, [conhecemos] et puella, verum est,

et dives, quis enim potest negare?

Sed cum te nimĭum, [excessivamente] Fabulla, laudas,

nec dives neque bella nec puella es.”

II, 7

Declamas belle, causas agis, Attĭce, belle;

historĭas bellas, carmĭna bella facis;

componis belle mimos, epigrammata belle;

bellus grammatĭcus, bellus es astrologus,

et belle cantas et saltas, Attĭce, belle;

bellus es arte lyrae, [lírica, da lira] bellus es arte pilae [de bola – baile?].

Nil bene cum facĭas, facĭas tamen omnĭa belle,

vis dicam quid sis? Magnus es ardalĭo. [intrometido]

Verbos impessoais

São considerados verbos impessoais aqueles cuja ação não é propriamente atribuída a um sujeito animado ou inanimado. Apenas são conjugados na 3ª pessoa do singular e na 3ª do plural. Em função disso, esses verbos aparecem dicionarizados com as formas de 3ª pessoa (-t) e infinitivo. Veja os tempos primitivos do verbo pudere (ter vergonha de)…”

plorare pudet te: tu tens vergonha de chorar / chorar te envergonha

me pudet tui: tenho vergonha de ti

eos infamĭae suae non pudet: eles não têm vergonha de sua infâmia

Os verbos impessoais podem apresentar algumas especificidades, daí a necessidade de, sempre que necessário, consultar um bom dicionário ou uma boa gramática, até que o contato com eles nos textos nos dê segurança em sua leitura.Os famosos verbos de tempo ou de ocorrências naturais (sem sujeito) do português, mas não só (diria que sem dúvida os verbos mais religiosos têm essa tendência): fulget (relampejar), ningit (nevar), pluit (chover), tonat (trovejar), lucescit (amanhecer), vesperascit (entardecer), libet/lubet (agradar, ter vontade de), misĕret (ter compaixão de, compadecer-se de/por), piget (lamentar), paenitet (arrepender-se), licet (ser lícito, ser permitido, caber a), oportet (convir, ser preciso).

UNIDADE OITO: EPIGRAMAS – PARTE II – MARCIAL

(I, 75)

Dimidĭum [metade] donare Lino quam credĕre totum

qui mavolt, [prefere, magis+volo] mavolt perdĕre dimidĭum.

(III, 63)

Cotĭle, bellus homo es: dicunt hoc, Cotĭle, multi.

Audĭo: sed quid sit, dic mihi, bellus homo?

[…]”

(IV, 36)

Cana [branca, grisalha] est barba tibi, nigra est coma: [cabeleira] tinguĕre barbam

non potes – haec causa est – et potes, Ole, comam.

(I, 33)

Amissum non flet [chora] cum sola est Gellĭa patrem,

si quis adest [está presente] iussae [ordenar] prosilĭunt [jorrar] lacrĭmae.

[Não se chora só, pois quem está presente ordena que jorrem as lágrimas…]

Non luget quisquis laudari, Gellĭa, quaerit, [Gélia, não está de luto quem quer que procure ser louvado]

ille dolet vere qui sine teste dolet.[a dor verdadeira é aquela que dói sem testemunhas]

Os elogios precisam de testemunhas, a dor não?! Ou o contrário?

(III, 28)

Auriculam Mario gravĭter miraris olere.

Tu facis hoc: garris, Nestor, in auriculam.

Mário sabe sentir o odor das orelhas; é assim que se faz: Nestor, tagarele muito para elas.

(I, 110)

Scribĕre me querĕris, Velox, epigrammata longa.

Ipse nihil scribis: tu breviora facis.

[Tu, Véloce, te queixas de que eu escrevo epigramas compridos.

Tu mesmo, Véloce, nada escreves: e com isso fazes rápido.] ???

(VI, 90)

Moechum [Devasso] Gellĭa non habet nisi unum.

Turpe [feio, sujo, indecente, vergonhoso] est hoc magis: uxor est duorum.”

1 Quod potĭus est: dimidĭum donare Lino aut credere totum?

O que é melhor: Lino dar metade ou emprestar tudo?

2 Quid de Cotilo dicunt multi?

3 Cur cana est barba Olo?

4 Quid non flet cum sola est Gellia?

5 Quis non luget? Quis dolet vere?

6 Cur iussae prosiliunt lacrimae si quis adest? si quis = …?

7 Cur auricula Mario gravĭter olet?

8 Cur Velox epigrammăta breviora facit?

9 Quot moechos Gellia habet? Quid turpe est magis?

10 Verte epigrammăta lusitane.

  1. Quem prefere dar metade a emprestar tudo prefere perder essa metade.

  2. Porque barba não se pinta.

  3. O que dói de verdade?

  4. Unum. …

  5. Difícil!

LEMBRETE:

amare: amar

amari: ser amado

amavisse: ter amado

ATENÇÃO:

Apesar de o infinitivo perfeito apresentar a desinência –isse, que também ocorre no mais-que-perfeito do subjuntivo (por exemplo, amavissem = se eu tivesse amado), o fato não é motivo de confusão, já que o infinitivo não apresenta desinências pessoais:

amavisse: ter amado

amavissem: se eu tivesse amado”

Derivados de sum

Absum, abes, abesse, afui: estar ausente

Desum, dees, deesse, defui: faltar

Supersum, superes, superesse, superfui: sobreviver, subsistir

Possum, potes, posse, potui: poder

Prosum, prodes, prodesse, profui: ser útil

Subsum, subes, subesse, subfui: estar abaixo

Intersum, interes, interesse, interfui: participar

Insum, ines, inesse, infui: estar dentro

VOLO, NOLO, MALO

Mavolt ou mavult é a 3ª pessoa do presente do indicativo.”

Nos tempos de ação completa (os tempos do perfectum) esses verbos são formados regularmente, a partir do tema do perfeito e as desinências já estudadas.

volo, vis, velle, volui

nolo, non vis, nolle, nolui

malo, mavis, malle, malui

³ “Lembre-se de que utilizamos o imperativo presente de nolo para fazer o imperativo negativo dos outros verbos: noli amare = não queira amar ou não ame.”

VII, 77

Exigis ut nostros donem tibi, Tucca, libellos.

Non facĭam: nam vis vendĕre, non legĕre.

II, 49

Uxorem nolo Telesinam ducĕre: quare?

Moecha [puta] est. Sed puĕris dat Telesina: volo.

Nenhuma esposa agrada Telesina. Por quê?

Porque ela é uma puta. São os solteiros (moços, escravos) que a dão prazer!

I, 57

Qualem, Flacce, velim quaeris nolimque puellam?

nolo nimis facĭlem difficilemque nimis.

Illud quod medĭum est atque inter utrumque probamus:

nec volo quod crucĭat [atormenta] nec volo quod satĭat.

I, 23

Invitas nullum nisi cum quo, Cotta, lavaris

et dant convivam balnĕa [balneário] sola tibi.

Mirabar, quare numquam me, Cotta, vocasses:

Iam scio, me nudum displicuisse tibi.

Só convida para tua casa aqueles com quem te sentirias à vontade nua.

I, 77

Pulchre valet Charinus, et tamen pallet. = Tem valor Carino, tem medo.

Parce bibit Charinus, et tamen pallet. = Bebe pouco Carino, mas tem medo.

Bene concoquit [digere] Charinus, et tamen pallet. = Digere bem Carino, mas tem medo.

Sole utĭtur Charinus, et tamen pallet. =

Tingit cutem Charinus, et tamen pallet. = pinta a pele?…

Cunnum Charinus lingit, et tamen pallet. = Carino chupa bocetas, e também empalidece (tem medo).

I, 83

Os et labra tibi lingit, Manneia, catellus: [filhote, cachorrinho]

Non miror, merdas si libet esse cani.

Teu cãozinho lambee tua boca e teus lábios, Manéia:

Não te admires, cães até merda comem.

II, 88

Nil recĭtas et vis, Mamerce, poeta videri:

quidquid vis esto, dummodo nil recĭtes.

III, 71

Mentula [membro] cum dolĕat puĕro, tibi, Naevole, culus,

non sum divinus, sed scĭo quid facĭas.

Já que (o homem) tem um pênis que coça e tu, Névolo, um cu que dói,

Não tenho dons divinos, mas sei o que fazes.

O imperativo futuro dos verbos

O imperativo futuro se faz em latim morfologicamente. Muitas vezes é de difícil tradução e uma das opções é se traduzir pelo imperativo presente. Observe um exemplo retirado de um dos epigramas:

…quidquid vis esto, dummodo nil recites.

Seja (lá) o que quiser, contanto que nada recite.

IMPERATIVO PRESENTE (esse, ser)

2ª pessoa: es, este

IMPERATIVO FUTURO

2ª p: esto, estote

3ª p: esto, sunto

IMPERATIVOS DIVERSOS

Ex1: dare, datum

IMP. PRESENTE

2ª pessoa: da, date

IMP. FUTURO

2ª pessoa: dato, datote

3ª pessoa: dato, danto

Ex2: tenere (sempre 2ª pessoa para presente, 2ª e 3ª para futuro)

PRESENTE tene, tenete

FUTURO teneto, tenetote / teneto, tenento

Ex3: dicere

PRESENTE dic, dicite

FUTURO dicito, dicitote / dicito, dicunto

Ex4: facere

PRESENTE cape, capite

FUTURO capito, capitote / capito, capiunto

Ex5: audire

PRESENTE audi, audite

FUTURO audito, auditote / audito, audiunto

Concentrar-se em memorizar os significados dos termos abaixo:

atque: e

audio: ouço

breviora: menor que…

causa: —

credere: crer

cum: com

dat: dá

dicunt: dizer

donare: dar

ducere: agradar

duorum: dobro, dois

es: é

et: e

facis: fazes

facilem: fácil

graviter: gravemente, severamente, seriamente

habet: tem (ele/ela)

homo: homem

iam: agora

in: em

legere: ler

longa: larga, comprida

magis: mais

mihi: meu, pronome me.

nam: nem

nihil: nada

nil: não

nisi: só

nolo: não quero

non: não

nostros: os nossos (idéia de coletividade)

nudum: nu, nudez

nullum: nenhum

os: boca

patrem: pai

perdere: perder

potes: podes

probamus: aprovamos

puellam: meninas

pueris: meninos

quaerit: quer saber, pergunta

qualem: de que tipo ou qualidade

quam: como = quomodo

quare: por quê

quereris: queixas-te

scio: sei

scribere: escrever

sed: vós sois

si: se

sine: sem o que não / sem o qual

sola: só, sozinha

tamen: porém, mas

tibi: teu, te, a ti.

totum: tudo

turpe: torpe

valet: vale, valor

vis: queres

unum: um

vocasses: convidaste-me

volo: quero

ut: assim como

utor: uso

uxor: esposa

EPÍSTOLAS

O termo epístola vem do grego epistole, pelo latim epistula. Entre os antigos romanos, significava uma composição poética que se dirigia aos amigos e também aos mecenas. Tratando de variados assuntos (filosóficos, literários, morais, políticos, amorosos, sentimentais), as cartas podem apresentar uma linguagem mais cotidiana, diferentemente dos gêneros poéticos, erigidos em uma linguagem mais trabalhada, mais artística, portanto (MOISÉS, 2004, p. 160). Há, contudo, alguns textos do gênero que, escritos à maneira de epístolas, mantêm elementos da poesia. Na Antiguidade romana, destaca-se a figura de Horácio, com sua Epistula ad Pisones, com os conselhos sobre a arte de fazer poesia a um certo Pisão e a seus filhos, mais tarde traduzida como Ars Poetica, termo que já aparece em

Quintiliano e nos manuscritos horacianos (CITRONI et al., 2006, p. 543).

No gênero epistolar, também na Roma antiga, se aventura Ovídio com Tristia e Ex Ponto, além das Heroides. Entre outros autores do gênero, registram-se: Plínio, o jovem e Sêneca (Epistulae ad Lucilium).

Em Cícero, conhecemos muito da vida política romana do final da República, com suas quase 900 cartas. Segundo Citroni, em relação à Antiguidade são conhecidas as publicações de cartas privadas reais, como as de Cícero, e textos destinados ao público, como os breves tratados filosóficos, científicos ou as composições poéticas. Nas próximas unidades, analisaremos cartas cotidianas de Cícero e cartas filosóficas de Sêneca.”

De Plínio, temos uma coletânea de 10 livros. A partir de sua obra, muito se conhece dos comportamentos, das atitudes, dos valores e excessos da elite social do Império (finais do século I e inícios do século II). Para saber mais, conferir Citroni et al. (2006)”

UNIDADE NOVE: EPÍSTOLAS

Fam. XVI, 13 e XIV, 14

CÍCERO

O primeiro pronunciamento judiciário de Cícero ocorre em 81 a.C, quando ele estava com 25 anos, numa defesa de Quíncio (Pro Quinctio) num processo de espoliação, tendo como opositor Hortênsio, o maior advogado da época (HARVEY, 1987, p. 113).

Filósofo, orador, escritor, advogado e político romano, Cícero nos legou uma obra de considerável extensão e importância documental. Deixa também um acervo considerável de cartas, organizadas em 4 coleções:

Ad Atticum, 68-44 a.C. Publicadas pelo próprio Ático, amigo íntimo de Cícero / 16 livros

Ad Familiares, 62-43 a.C. Provavelmente publicadas por Tirão, liberto de Cícero / 16 livros¹

Ad Quintum Fratrem, 60-54 a.C. / 3 livros

Ad Brutum, 43 a.C. É controversa a autenticidade dessas cartas. Atualmente se aceita a autenticidade da maior parte delas. / 2 livros

¹ CICERÓN. Cartas III – Cartas a los familiares (cartas 1 – 173). Introducción, traducción y notas de José A. Beltrán. Madrid: Editorial Gredos, 2008; ou

CICÉRON. Correspondance. Tome III – Lettres CXXII-CCIV. (55-51 avant J.-C.). Texte établi et traduit par L.-A. Constans. 7e tirage. Paris: Les Belles Lettres, 2002.

Das 864 cartas, 744 foram escritas por Cícero e 90 foram a ele dirigidas. O valor histórico e documental do epistolário de Cícero é inestimável.” “É graças, sobretudo a estas cartas que a última fase da República constitui o período da História da Antiguidade de que possuímos um conhecimento mais aprofundado” Citroni

Tirão foi muito mais que um escravo. A liberdade a Tirão é concedida por Cícero em 54 a.C e, em sinal de gratidão ao seu senhor, adota o seu praenomen e nomen gentile, conforme costume romano, e mantém o próprio nome como cognomen: Marcus Tullius Tiro.”

M. TVLLI CICERONIS EPISTVLARVM AD FAMILIARES

LIBER SEXTVS DECIMVS

Ad Tironem

(Fam., XVI, 13)

Scr. in Cumano IV. Id. a.(u. c.) 701/53

Omnia a te data mihi putabo, si te valentem videro. Summa cura exspectabam adventum Menandri, quem ad te miseram. Cura, si me diligis, ut valeas et, cum te bene confirmaris, ad nos venias. Vale.

A carta que se segue foi escrita no dia 11 de abril de 53 a.C. Nela, Cícero elogia a atividade literária de Tirão.

(Fam., XVI, 14)

Scr. in Cumano III. Id. Apr. a.(u.c.) 701/53.

TVLLIVS TIRONI SAL.

Andricus postridie ad me venit quam exspectaram; itaque habui noctem plenam timoris ac miseriae. Tuis litteris nihilo sum factus certior quomodo te haberes, sed tamen sum recreatus. [Suas cartas não traziam fatos verossímeis, mas serviram para entreter-me] Ego omni delectatione litterisque omnibus careo, quas antequam te videro, attingere non possum. Medico mercedis quantum poscet promitti iubeto: id scripsi ad Ummium.

Audio te animo angi et medicum dicere ex eo te laborare. [Seu médico me falou do seu sofrimento presente] Si me diligis, excita ex somno tuas litteras humanitatemque, propter quam mihi es carissimus. Nunc opus est te animo valere, ut corpore possis. Id cum tua, tum mea causa facias a te peto. Acastum retine, quo commodius tibi ministretur. [Mantenha Acasto por perto para que ele possa lhe servir.] Conserva te mihi. [Não se aflija por mim] Dies promissorum adest, quem etiam repraesentabo, si adveneris. [Melhores dias virão, se você se empenhar em trazê-los] Etiam atque etiam vale.”

GLOSSÁRIO

adest: esta-aí

attingo: ocupar-se

careo: perder ou não ter

confirmo: venço a doença (com+firmar, eNFeRMidade de mnemônico)

cura: metafisicamente relevante (vd. Ser e Tempo): inquietação, ansiedade

curo: idem port.

diligo: estimo

excito: acordo!

III Idus h. VI = 10 de abril

III Idus (III Idus = 3 dias antes dos idos do mês correspondente – no caso de abril, os idos são em 13); nesta carta o remetente não informa o mês, convicto de que não será necessário.

h. VI = hora sexta ou meio-dia. “(o dia romano era dividido em 12 horas, contadas do nascer do sol até o crepúsculo. Para medir as horas, podiam utilizar relógios de sol e, não muito comum, relógios de água. Referiam-se às horas por numerais ordinais: hora prima, hora sexta. A hora sexta marcava o meio-dia. A noite era dividida em 4 partes, que se chamavam vigilia e que tinham duração diferente, a depender da época do ano)”

laboro: sofro

merces: salário (mnemônico: mercês… sua senhoria, vossa mercê… os outros que tratamos com respeito são ou o patrão ou aqueles de quem podemos auferir $lucros$)

ministro: servir

opus est: é necessário

repraesento: realizo imediatamente

sal. = salutat

Scr. a.u.c. 701. = scripta ab urbe conditia 701, ou seja, escrita no ano 701 depois de fundada a cidade. A data mais aceita para a fundação de Roma é 753 a.C.

si: QUANDO (! LEMBRETE !)

Vale: Adeus (imperativo do verbo valeo – estar bem de saúde, passar bem – utilizado como interjeição nas despedidas ou nos finais de cartas)

4ª DECLINAÇÃO

Pertencem à 4ª declinação nomes masculinos e femininos que terminam em -us no nominativo (fructus, -us) e alguns nomes neutros que terminam, no nominativo, em -u (genu, -us). Os neutros do plural têm os três casos iguais em –ua (nom. voc. e acus.).”

São neutras (raríssimas) as palavras genu (joelho), cornu (chifre), gelu (gelo, geada).”

ATENÇÃO:

Lembre-se de que não devemos nos basear na terminação do nominativo para sabermos a declinação a que pertence uma palavra. Veja, por exemplo, o nominativo em –us, que pode ser da 2ª, 3ª ou 4ª declinações.”

GLOSSÁRIO:

frango: quebrar

5ª DECLINAÇÃO

Ex: dies (praticamente todas as outras palavras da 5ª são femininas, ao contrário desta – MAS ATENÇÃO: dies só é masculino quando significar 24h, o dia cheio, e não o dia claro ou dia figurado, p.ex., ‘tal dia está chegando’! Além disso, o dia de 24h se feminiza quando a palavra é composta de uma preposição+die: antedie(m), postdie(m), addie(m) nom/gen)

dies diei

nominativo genitivo

Res e dies são os dois únicos nomes de flexões completas na 5ª declinação; os outros nomes, geralmente, não possuem plural”

ATENÇÃO:

Assim como a 4ª declinação se assemelha, em alguns casos, à 2ª declinação, o mesmo ocorre com a 5ª declinação em relação à 3ª.”

VOZ PASSIVA SINTÉTICA

Confira o quadro com as desinências de pessoa e de número (DPN) da voz ativa e da voz passiva:”

Acastum retine, quo commodius tibi ministretur. – ministretur, voz passiva da 3ª.

Para a formação do que conhecemos como agente da passiva, o caso latino mais adequado é o ablativo, antecedido ou não por preposição”

GLOSSÁRIO:

cinis: defunto

in: até

medicina: remédio

scelus: crime

A coordenação dos tempos (consecutĭo tempŏrum)

Em latim, o tempo de uma subordinada no subjuntivo será determinado pelo tempo do verbo da oração principal. Chamamos a isso de consecutiio temporum (ligação apropriada dos tempos ou coordenação dos tempos). A regra geral indicada abaixo pode ser considerada para se entender o uso do subjuntivo na coordenação dos tempos, embora uma ou outra especificidade possa ocorrer, fazendo com que recorramos a alguma gramática para entender um ou outro uso específico.

Opto ut scribat, ut scripserit. : Desejo que ele escreva ou tenha escrito.

Optabo ut scribat, ut scripserit. : Desejarei que ele escreva ou tenha escrito.

Optaveram ut scriberet. : Tinha desejado que ele escrevesse.

Optaveram ut scripsisset. : Tinha desejado que ele tivesse escrito.

Philosophi ignorabant quam pulchra esset [era] virtus : Os filósofos não sabiam quão bela é a virtude.

Cura, si me diligis, ut valeas… : Se gostas de mim, cuida para que estejas bem… ???

Observe que a forma verbal cura é presente do imperativo.” CUIDA, MENINO!

É só pensar na forma de condicional aceita em espanhol: Creo que estuviese/estuviera bien.

O calendário romano

Numa carta da Antiguidade, nos deparamos com algumas marcações temporais que exigem uma certa atenção para que consigamos associá-las aos marcos temporais atuais. No início da carta de Cícero vista nesta unidade, observamos a abreviatura “Scr. a.u.c 701” (scripta ab urbe condĭta 701, ou seja, escrita no ano 701 depois de fundada a cidade). Nesse caso, considera-se, como vimos, a data mais aceita para a fundação de Roma: 753 a.C.”

Kalendae (calendas) – é o primeiro dia do mês (daí a palavra calendário)

Nonae – (nonos) podia ser o 5º ou o 7º dia, a depender do mês (o dia que correspondia, tradicionalmente, à fase lunar de quarto crescente)

Idus – (idos) dependendo do mês, podia ser o 13º ou o 15º dia (tradicionalmente, o dia de lua cheia)

Nonos no 5º dia e Idos ao 13º dia – Janeiro, fevereiro, abril, junho, agosto, setembro, novembro e dezembro.

Nonos no 7º dia e Idos ao 15º dia – Março, maio, julho e outubro.”

Convenção romana dos nomes

Catarina Gaspar (2010, p. 153-178), analisa obras dos gramáticos latinos (grammatici latini) e, a partir delas, estabelece algumas notas sobre a onomástica romana. Eis as suas conclusões:

O praenomen é quase sempre definido como o elemento onomástico que precede o nomen. A sua representação sob a forma de abreviaturas também é transmitida pela maioria dos gramáticos. É interessante verificarmos que algumas das abreviaturas indicadas, para os praenomina mais comuns, são bem conhecidas nos textos epigráficos; contudo, outras não são comuns nos textos epigráficos que hoje conhecemos, como por exemplo, a abreviatura de PM para Pompeius (esta forma aparece quase sempre abreviada como POMP).

Quanto ao nomen, é ponto comum na sua definição a sua ligação à família. Nos séculos I a.C. e I d.C., encontramos uma noção de família genética: pertencem à mesma família todos os que partilham o sangue de um antepassado comum […]. A palavra familia era utilizada em alguns casos com um significado mais alargado, como equivalente a gens (…) [h]á a partilha de espaço e de cargos importantes na estrutura social, política e religiosa da cidade.”

(*) “Para uma visão e discussão do conceito de gens romana veja-se C.J. Smith, The Roman Clan. The Gens form Ancient Ideology to Modern Anthropology, Cambridge, 2006.”

Os cognomina são definidos pela maioria dos autores como os nomes que individualizavam a pessoa, isto é, de acordo com o seu uso clássico, que implicava que a sua transmissão de pai para filhos não fosse regular e a sua escolha fosse bastante variável.” “Kajanto (Onomastic Studies in the Early Christian Inscriptions of Rome and Carthage, 1963) refere a tendência para a transmissão dos cognomes de pais para filhos como um traço característico da onomástica na epigrafia cristã.”

O uso do agnomen tem raízes no Oriente, tendo começado a ser utilizado no Ocidente a partir da época imperial. Inicialmente, não terá existido muita diferença entre o uso do agnomen e o uso de dois nomes ou cognomes, segundo Kajanto. Os gramáticos latinos referem-no sempre como um nome que é adicionado ao cognomen, extrinsecus. Muitos autores realçam ainda o facto de este não ser um elemento tão comum como os outros três, nos antropônimos romanos, pois era geralmente indicado por causa de um feito relevante — notável ou vergonhoso.”

* * *

Senta que lá vem história…

No início de 58, Clódio apresenta aos comícios populares um projeto de lei que condena ao exílio os responsáveis pela execução de cidadãos romanos sem julgamento. A proposta visa claramente a Cícero, mentor do combate à conjura de Catilina e da punição dos seus cúmplices.

Cícero procura apoio junto dos cidadãos mais influentes, mas todos o aconselham a deixar Roma voluntariamente, para evitar o derramamento de sangue. Nestas circunstâncias, parte para o exílio. Na seqüência da aprovação da lei, a sua mansão no Palatino é saqueada e destruída. Clódio manifesta o desejo de erigir, no seu lugar, um templo à Liberdade. Para transformar o exílio voluntário de Cícero num ato de força jurídica, leva à aprovação outra lei que considera ilegal a decisão do senado, proíbe, sob pena de morte, a concessão de asilo ao exilado num raio de 400 milhas de Roma e, finalmente, inibe a revisão e a revogação destas deliberações.

Cícero parte de Brundísio, no extremo sul da península itálica, para a Macedônia e de lá, em finais de novembro, para Dirráquio. As cartas desta altura mostram o desgosto do afastamento da pátria, da família e dos amigos (Att. 3.4).”

Durante a ausência de Cícero, são várias as tentativas dos seus aliados para o fazerem voltar a Roma. Na sessão de 1º de junho de 58, a que Clódio não assiste, o senado aprova o seu regresso, por proposta de Nínio, um tribuno da plebe, mas o decreto é vetado por outro tribuno chamado Élio Liga. Em outubro, o tribuno Séstio prepara um novo projeto de lei, logo vetado por outro tribuno. Na primeira sessão de 57, a 1º de janeiro portanto, o cônsul Lêntulo fala do regresso de Cícero e é apoiado pelo colega Metelo.”

LXXXVII – AD ATTICVM.

(Att., III, 26).

Scr. Dyrrachi medio fere Ian. a. 697/57.

Litterae mihi a Q. [de Quinto] fratre cum s. c. [senatus-consultum] quod de me est factum allatae sunt [foi trazida – allatae ganha a declinação singular de litterae, mas o verbo da passiva permanece no plural]. Mihi in animo est legum lationem [de uma lei] expectare et, si obtrectabitur, utar auctoritate senatus [recorrerei à autoridade do senado] et potius [de preferência] vita quam patria carebo. Tu, quaeso, festina [se apressar] ad nos venire.

LXXXIX – AD ATTICVM.

(Att., III, 27).

Scr. Dyrrachi in. m. Febr. 697/57.

Ex tuis litteris, ex re ipsa nos funditus [inteiramente] perisse [ter perdido] video. Te oro [te oro, te rogo] ut quibus in rebus tui mei indigebunt [indigente] nostris miseriis ne desis [não abandonasse]. Ego te, ut scribis, cito [rápido] videbo.

A voz passiva analítica

A voz passiva analítica (aplicada aos verbos nos tempos do perfectum: pretérito perfeito, pretérito mais-que-perfeito e futuro perfeito) é feita através do particípio passado do verbo principal acompanhado do verbo auxiliar sum.

scripta est

Ao falante do português parece evidente escrita está, afinal é essa a tradução letra a letra. Porém dada a característica da voz passiva analítica, significa foi escrita. O francês constrói alguns de seus passados com base nesse sistema de regras.

Litterae … allatae sunt.

Uma carta … foi trazida (para mim)

cum s.c. quod de me est factum.

com um decreto do senado que foi emitido sobre mim ou sobre mim que fôra emitido

Recapitulação do subjuntivo do verbo ser:

amatus sum: eu fui amado

amati sumus: nós fomos amados

amatus eram: eu fôra amado / eu tinha sido amado

amatus ero: eu terei sido amado

Lembre-se:

Sou amado em latim diz-se amor, com a terminação -or da passiva sintética.”

Ou nunca use na passiva – mais fácil! Me amam.

GLOSSÁRIO

alea: jogo de dados

clarus: dentre outros, possui o sentido de famoso. clarus poeta

deleo, deletum: destruir

VOCABULÁRIO RELEVANTE DA UNIDADE 9:

a

ad

animo

atque

audio

bene

careo

causa

certior

cito

corpore

cum

cura

dicere

dies

ego

et

ex

exspecto

facias

haberes

habui

ipsa

itaque

legum

mihi

miseram

noctem

non

nunc

omni

omnia

opus est

patria

perisse

plenam

poscet

possum

potius

promitti

propter

quam

quem

re

retine

scripsi

sed

senatus

si

tamen

timor

valentem

venias

videro

ut

utar (?)

UNIDADE DEZ:

Epistulae ad Lucilium (I, 1)

SÊNECA

Lúcio Aneu Sêneca, o Filósofo, era filho de Sêneca, o Antigo, ou Sêneca, o Retórico. Nasceu em Córdova, na Espanha, provavelmente entre os anos de 4 e 1 a.C. Foi um intelectual de grande prestígio por ocasião dos principados de Calígula e de Cláudio. Tendo sido preceptor de Nero, foi uma das principais figuras intelectuais também em seu governo.

Sabemos de sua vida tanto através de suas próprias obras, quanto a partir das obras de seu pai, além dos relatos sobre sua atividade pública em Tácito e em Suetônio e Cássio Díon.

Ainda pequeno, Sêneca se dirige a Roma, como era de costume, para continuar seus estudos gramaticais e retóricos, mas seu interesse maior foi a Filosofia. Conta-se que Sêneca, já autor de obras filosóficas e científicas, teria atraído a inveja de Calígula, por seus dotes como orador no senado. Sêneca, então, se afasta da advocacia.

Por acusação de adultério com Livila, irmã mais nova de Nero, já com Cláudio no poder, o senado o condena à morte, mas o imperador o obriga a se exilar. Sêneca, tendo perdido um filho, se dirige à Córsega, em 41 d.C. e por lá fica por oito anos. Durante o exílio, escreve a Consolatĭo ad Helvĭam matrem, com o objetivo de confortar sua mãe pela dor da separação. Escreve também a Consolatĭo ad Polibĭum, numa tentativa de conseguir de Políbio, um liberto poderoso da côrte de Cláudio, o apoio para que ele regressasse do exílio. Com a morte de uma irmã de Políbio, a escrita de uma obra consolatória dedicada a ele se convertia num excelente momento para o pedido de apoio.

Retorna do exílio em 49 d.C., por insistência de Agripina, para ser preceptor de Nero. Mais tarde, em 65, o imperador o obrigará a se matar por conta de ser considerado cúmplice na conspiração de Pisão. O fracasso da revolta fará com que sejam condenados à morte tanto Sêneca quanto o seu sobrinho Lucano, o autor do poema épico De bello civili, conhecido como Farsália, sobre a guerra civil entre César e Pompeu.”

Obras sobreviventes:

De providentia

Dedicada a Lucílio, é um tratado que desfaz a ideia de que a providência divina é a causa das desventuras que atingem o homem bom.

De constantia sapientis

Obra filosófica dedicada a um funcionário equestre chamado Aneu Sereno, caracterizado como simpatizante do epicurismo.

De tranquilitate animi

Também dedicada a Sereno, aqui já mais conhecedor do estoicismo.

De otio

Uma defesa do direito do sábio de viver uma vida retirada das obrigações civis e a dedicar-se à pura contemplação.

De ira

Dedicada a seu irmão Novato, foi escrita logo após a morte de Calígula. Trata sobre a ira e seus efeitos e sobre educar os jovens para evitála.

(…)

De consolatione ad Marciam

Dirige-se à filha do historiador Cremúcio Cordo, consolando-a pela perda de um filho.

(…)

De clementia

Obra de filosofia política, relacionada à sua função como conselheiro de Nero, a quem dedica a obra.

De beneficiis

Tratado dedicado a seu amigo Ebúcio Liberal que apresenta duras críticas ao comportamento tirânico dos monarcas.

(…)

Epistulae ad Lucilium (extratos à frente)

Considerada a obra-prima de Sêneca enquanto filósofo. É composta por 124 cartas dirigidas a seu amigo Lucílio, a quem Sêneca vai ensinando elementos da filosofia estóica. Discute-se, ainda, se seriam cartas autênticas e que deveriam ser adaptadas para publicação ou se se trata de um uso do gênero para a escrita de tratados literários e filosóficos.

Tragédias Hercules furens, Troades, Medea, Phaedra, Oedipus, Phoenissae, Agamemnon, Thyestes; Hercules Oetaeus Octavia (Pseudo-Sêneca)

(…)

Apokolokyntosis

Escrita em prosa e verso, numa espécie de satyra anippeae, trata-se de um panfleto político mordaz, ironizando a morte e a divinização de Cláudio, a quem Sêneca bajulou em De consolatione ad Polybium.

(…)

Como veremos, algumas das sentenças famosas de Sêneca direcionadas a Lucílio são conhecidas e bem-difundidas até hoje.”

L. ANNAEI SENECAE AD LVCILIVM EPISTVLAE, I, 1

I. SENECA LVCILIO SVO SALVTEM

[1] Ita fac, mi Lucili: vindica te tibi, et tempus, quod adhuc [até aqui] aut auferebatur aut subripiebatur aut excidebat, collige et serva [lembre-se e atente-se]. Persuade tibi hoc sic esse ut scribo: quaedam tempora [algum tempo] eripiuntur nobis, quaedam subducuntur, quaedam effluunt. [se esvai] Turpissima tamen est iactura, [gasto, dispêndio – fatura, hehe!] quae per neglegentiam fit. Et si volveris attendere, magna pars vitae elabitur male agentibus, maxima nihil agentibus, tota vita aliud agentibus. [toda a vida regido por outros]

[2] Quem mihi dabis, qui aliquod pretium [algum preço] tempori ponat, qui diem aestimet, qui intellegat se cotidie mori? In hoc [Sobre isso] enim fallimur, quod mortem prospicimus; magna pars eius [grande parte dela] iam praeterit. [Excede] Quicquid aetatis [tempo de vida] retro est mors tenet. Fac ergo, mi Lucili, quod facere te scribis, omnes horas complectere [apodere-se de todas as horas – carpe diem]. Sic fiet ut minus ex crastino pendeas, si hodierno manum inieceris.

 

[3] Dum differtur, vita transcurrit. Omnia, Lucili, aliena sunt, tempus tantum nostrum est. In huius [genitivo de hic] rei unius fugacis ac lubricae [escorregadio – lubricidade – coisa de gente molhadinha!] possessionem natura nos misit, ex qua [da qual] expellit quicumque vult. Et tanta stultitia mortalium est ut quae minima et vilissima sunt, certe reparabilia, imputari sibi, cum impetravere, patiantur; nemo se iudicet quicquam [algo] debere, qui tempus accepit, cum interim [no entanto] hoc unum est quod ne gratus quidem [seguramente] potest reddere. [citar, replicar]

[4] Interrogabis fortasse [talvez, por acaso] quid ego faciam qui tibi ista praecipio. Fatebor ingenue: [Declarado com sinceridade] quod apud luxuriosum sed diligentem evenit, ratio mihi constat [concorda] impensae. Non possum me dicere nihil perdere, sed quid perdam et quare et quemadmodum [como – palavra grande só pra meter medo, mesmo que ut] dicam; causas paupertatis meae reddam, sed evenit mihi quod plerisque, non suo vitio, ad inopiam [miserável] redactis: omnes ignoscunt, nemo succurrit.

[5] Quid ergo est? Non puto pauperem cui, quantulumcumque [por menor que, tão pequeno que…] superest, sat est [é bastante]. Tu tamen malo serves tua, et bono tempore incipies. Nam, ut visum est maioribus nostris, ‘sera parsimonia in fundo est’.(*) Non enim tantum minimum in imo, sed pessimum remanet. Vale.

(*) Hesíodo [parcimônia do que há no fundo é coisa vã – o ébrio que economiza a borra do vinho não engana nem a si mesmo]Não faz cera, vai ficar tarde. Sera = tarde

Não é engraçado que o agente seja aquele que sofre a ação?

GLOSSÁRIO:

ignotum: tanto desculpado quanto a raiz de ignorado. Aquele que se desculpa não nos pode mais fazer mal?

mi: “o pronome possessivo meus, mea, meum, além de significar meu, minha significa, junto a nomes de pessoas e a pronomes pessoais, querido, amigo, que me é caro”

Amigo, …” qualquer estranho na rua

Meu amigo, …” Aí sim tem meu carinho!

O paulista é muito afetuoso: Fala, meu! Fala, querido!

plerusque: abundante

O GENITIVO PARTITIVO

Na epístola desta unidade, Sêneca faz uso da seguinte construção:

magna pars vitae elabitur male agentibus…

(…grande parte da vida escapa aos que agem mal…)”

grande parte” como subconjunto de “vida”.

O VERBO FIO (TORNAR-SE, SER FEITO)

Turpissima tamen est iactura quae per neglegentiam fit.” (se produz)

Sic fiet ut minus ex crastino pendeas…

Fiat!

fio, fis, fiěri, factus sum: (passiva de facio) ser feito, ser criado, fazer-se, dar-se; ser nomeado, ser considerado; (com significação própria) tornar-se, acontecer, dar-se, resultar”

(lembrete: o infinitivo é o terceiro termo dicionarizado.)

(cont.)

neque = nec

neve = neu = et ne

velim nolim…: queira ou não…

Com verbos no indicativo, uma conjunção pode ter um valor diferente do que ela tem com verbos no subjuntivo: ut, por exemplo, com indicativo é conjunção temporal (logo que) ou explicativa (como); com subjuntivo pode ser: uma conjunção integrante (que, que não), ou final (para que), ou consecutiva (que, de tal maneira que), ou ainda concessiva (ainda que).

Algumas conjunções são também advérbios, por exemplo, ut, ne, ubi.”

QUE LÍNGUA DES(GRAM)ENT(A)[TICA]]! “Sempre que preciso, você poderá consultar a seção Apêndice deste material, em que sistematizamos os aspectos gramaticais mais complexos que estamos estudando.” É, meu amigo, vou precisar bastante!

L. ANNAEI SENECAE AD LVCILIVM EPISTVLAE, I, VI

VI. SENECA LVCILIO SVO SALVTEM

[1] Intellego, Lucili, non emendari me tantum sed transfigurari. Nec hoc promitto iam aut spero, [ao menos espero] nihil in me superesse, quod mutandum sit. Quidni multa habeam, quae debeant colligi, quae extenuari, quae attolli? [elevar] [Por que eu não teria muitas coisas em mim, tanto dignas de censura quanto de elogio?] Et hoc ipsum argumentum est in melius translati animi, quod vitia sua, quae adhuc ignorabat, videt. Quibusdam aegris gratulatio fit, cum ipsi aegros se esse senserunt.

[2] Cuperem [Eu desejaria] itaque tecum [contigo] communicare tam subitam mutationem mei; tunc amicitiae nostrae certiorem fiduciam habere coepissem, [nossa firme amizade começaria] illius verae, quam non spes, [esperança] non timor, non utilitatis suae cura [busca] divellit, [dilacera] illius, cum qua homines moriuntur, pro qua moriuntur.

[3] Multos tibi dabo, qui non amico, sed amicitia caruerint. [carecer] Hoc non potest accidere, cum animos in societatem honesta cupiendi par voluntas trahit. Quidni non possit? [E por que não?] Sciunt enim ipsos omnia habere communia, et quidem magis adversa.

[4] Concipere animo non potes, quantum momenti adferre mihi singulos dies videam. ‘Mitte’ inquis ‘et nobis ista’ quae tam efficacia expertus es. Ego vero omnia in te cupio transfundere, [transmitir] et in hoc aliquid gaudeo discere, ut doceam. Nec me ulla res delectabit, licet sit eximia et salutaris, quam mihi uni sciturus sum. Si cum hac exceptione detur sapientia, ut illam inclusam [naquela limitação] teneam nec enuntiem, reiciam. Nullius boni sine socio iucunda possessio est.

[5] Mittam itaque ipsos tibi libros et ne multum operae inpendas, dum passim profutura sectaris, imponam notas, ut ad ipsa protinus, [desde já] quae probo et miror, accedas. Plus tamen tibi et viva vox et convictus [não é convicto, mas convivência!] quam oratio proderit. In rem praesentem [Pessoalmente,] venias oportet, primum, quia homines amplius oculis quam auribus credunt; deinde, quia longum iter est per praecepta, breve et efficax per exempla.

[6] Zenonem Cleanthes [estóico, discípulo de Zenão] non expressisset, si tantummodo audisset; [se apenas escutasse] vitae eius interfuit, [participei, compartilhei] secreta perspexit, observavit illum, an ex formula sua viveret. Platon et Aristoteles et omnis in diversum itura [e todos os que vieram e ainda virão depois deles] sapientium turba plus ex moribus quam ex verbis Socratis traxit;¹ Metrodorum et Hermarchum et Polyaenum [Metrodoro, Hermarco e Polieno] magnos viros non schola Epicuri sed contubernium [camaradagem] fecit. Nec in hoc te accerso [chamar] tantum, ut proficias, sed ut prosis; plurimum enim alter alteri [um ao outro] conferemus.²

¹ [Até ou já Platão e Aristóteles interpretaram e discordaram entre si acerca de muitos dos ensinamentos de Sócrates, pois se atinham a seus modos, não a suas palavras, o que não está mal.]

² [Não é preciso ser epicurista para seguir certos preceitos do epicurismo, nem ser estóico para seguir preceitos corretos do estoicismo; tudo tem sua medida, etc.]

[7] Interim quoniam diurnam tibi mercedulam debeo, quid me hodie apud Hecatonem [Hecatão, estóico] delectaverit dicam. ‘Quaeris’ inquit ‘vid profecerim? Amicus esse mihi coepi.’ Multum profecit; numquam erit solus. Scito hunc amicum omnibus esse. Vale.”

esperança espezinhada

à procura do que procurar

agora vejo que estava cego!

Conservação de raízes gerúndias no português:

morituro (homem morituro = homem que está para morrer);

nascituro (bebê nascituro = bebê que está para nascer).”

Essa turba e essa caterva maldita de filósofos!

VOCABULÁRIO BÁSICO DA UNIDADE:

accedas

accepit

adhuc

aetatis

aliena

aliquod

animos

apud

audisset

auferebatur

aut

causas

certe

certiorem

coepi/coepissem

constat

credunt

cum

cuperem [desejar]

cura

dabis/dabo

debeo

deinde [depois]

dicere

diem/dies

discěre [aprender] DISCENTE

doceam/doceo [ensinar] DOCENTE

eripiuntur [jogado fora, desperdiçado]

fac/faciam

fit [fazer-se]

habeam

homines

horas

iam

impetravere

interim

ita [então] = itaque

iter

iudicet [judiciar, julgar; adjudicar: atribuir publicamente, dizer a justiça…]

longum

manus

mi

mihi

minus

misit [(ele) enviou]

mitte

mori

mortem

nam

nobis

oportet [(ele) deve]

oratio

par

pars

patiantur [sofrer]

per

perděre

plus

potest

pro

probo

puto

quaeris

quare

quia

ratio

reddere

rei

sciunt [(eles) sabem]

scribo

senserunt [sentido]

serva [ministra, ministrar]

si

sibi

sic

socius [companhia]

spero

spes

tam

tamen

tantum

te

teneam/tenet

tibi

timor

tota

turpissima

vale

venias

verae

vero

videt [ver no sentido de compreender]

viros [os homens, os machos, os varões]

vitio

volueris

voluntas

vox

ut

vult

ELEGIAS

A elegia é uma forma literária do gênero lírico e tem origem controversa. Acredita-se que tenha surgido no Oriente, uma vez que era cantada com acompanhamento do som da flauta, um instrumento que deve ter sido proveniente da Ásia (CARDOSO, 2003, p. 69).

Apesar de seu longo percurso literário na Grécia, chegou até nós muito pouco da elegia helenística. O que conhecemos dela é por meio de fragmentos e por via indireta. Propércio, por exemplo, um dos cultivadores da elegia em Roma, credita parte de sua inspiração aos gregos Filetas de Cós e Calímaco (séc. III a.C.)”

Para os gregos e romanos antigos, a característica maior da elegia era a sua composição formal, em versos que chamamos de dísticos elegíacos. Segundo Oliva Neto (1996, p. 34), ‘a designação era formal, sem vínculo necessário entre gênero e assunto, que, assim como no epigrama, era variado’.”

Pouco conhecemos da produção dos primeiros autores elegíacos (Licínio Calvo, Varrão de Átax e Cornélio Galo). De Catulo, chegaram até nós algumas elegias, muitas das quais se situam entre epigrama e elegia. Como nos diz Oliva Neto, ‘não é sempre fácil saber se é um longo epigrama ou uma elegia breve’. Os nomes de Tibulo e de Propércio, autores dos quais nos chegou um número significativo de elegias, nos remetem imediatamente ao gênero. Ainda se destaca o nome de Ovídio, que se aventurou em diversos tipos de composição poética.

Segundo Massaud Moisés (1974/2004, p. 138), ‘após um interregno milenar, ao fim da Idade Média, a poesia elegíaca é ressuscitada por Villon, Jorge Manrique e Petrarca, tendo retornado à circulação, no século XVI, devido ao classicismo, influenciando poetas de diversas línguas.”

UNIDADE ONZE:

Elegia (I, 7)

PROPÉRCIO

PROPERTIUS. Elegies. Edited and translated by G.P. Goold. Cambridge/Massachusetts/ London/England: Harvard University Press, 2006.

Escreveu 4 livros de elegias, cuja cronologia é desconhecida: i) uma coletânea dedicada a Cíntia, um nome fictício provavelmente decorrente de uma experiência amorosa. Cíntia é, nas elegias de Propércio, como uma das jovens mulheres inteligentes, elegantes e de espírito independente que atraem a atenção dos possíveis amantes nas altas-rodas de Roma; ii) uma coletânea já mais extensa, sob a influência de Mecenas; iii) uma coletânea que apresenta, além da despedida de Cíntia, temas cívicos, discussões sobre poesia e aspectos morais de natureza diversa; iv) um quarto livro com composições de tema religioso e sobre a história romana, além de novas elegias amorosas.”

[A] influência de Calímaco se faz presente, numa aceitação dos gêneros menores, sem a rigidez da grande poesia (a épica). No texto que vamos ler nesta unidade, Propércio estabelece sua meta em relação às escolhas poéticas, dirigindo-se ao autor da Tebaida, um poema épico anterior à Eneida de Virgílio, e explicitando suas preferências.”

Dum tibi Cadmeae [Cadméia, povoado tebaido] dicuntur, Pontĭce, Thebae

armaque fraternae tristia militĭae,

atque, ita sim felix, primo contendis Homero

(sint modo fata tuis mollia [favorável, flexível] carminĭbus),

nos, ut consuemus, [consuetudinário – estar acostumado a] nostros agitamus [dedicamo-nos a] amores,

atque alĭquid [algo] duram [duro, a se queixar] quaerĭmus in domĭnam; [dona, amante]

nec tantum ingenĭo quantum servire dolori

cogor [premido, obrigado] et aetatis tempora dura queri.

hic mihi conterĭtur vitae modus, haec mea famast

hinc cupio [querer] nomen carmĭnis ire mei.”

¹ “Em textos em verso, o e- da forma verbal est pode ser elidido, por questões de métrica (fama est).

GLOSSÁRIO:

eo, is, ire, ivi ou ĭi, itum: caminhar, andar, marchar, espalhar-se.

! peguinha abaixo !

quaerĭmus: buscamos (do verbo quaero, -is, -ere, quaesivi ou quaesii, quaesitum ou quaestum, que significa procurar, buscar): outro sinônimo de cura – etimologia do quest saxão

queri: lamentar (do verbo depoente queror, -eris, queri, questus sum, que significa lastimar, lamentar, queixar-se judicialmente, daí querela: queixa, reclamação, acusação)

mnemônico: mulher: procuramos e depois nos lamentamos.

Tecnicamente, existe sim, sim! Ita.

TABELA DE DECLINAÇÃO PRONOMINAL

MAIS GLOSSÁRIO:

calamus: pena de escrever, do cálamo.

deridere: ser escarnecido

disparare : partior (depoente) : dividir

rima: fenda, racha

soleo, -es, -ere, solitus sum: ter por costume, estar habituado

Família do ALIQUIS:

RETORNO AO TEXTO:

nec tantum ingenĭo quantum servire dolori

cogor et aetatis tempora dura queri”

(sou obrigado a servir não tanto à minha inspiração

como à minha dor, e a lamentar os dias penosos de minha juventude)

…cupio nomen carmĭnis ire mei”

(…desejo de meus versos a fama espalhar-se) ou

(…desejo que a fama de meus versos se espalhe)

Oração principal: cupio

Oração infinitiva: nomen carminis ire mei”

REVISÃO DA UNIDADE

Os pronomes em geral apresentam formas especiais de declinação em alguns casos, principalmente no nominativo singular. Veja o caso de hic, haec, hoc, sem as habituais terminações –us, –a, –um de nominativo masculino, nominativo feminino e nominativo neutro. O mesmo ocorre com o pronome aliquis, aliqua, aliquid.”

Dos 6 casos latinos, um deles é considerado o caso lexicogênico do português, ou seja, o caso que deu origem aos nomes de nossa língua. Trata-se do caso acusativo.” “Vimos, por exemplo, o pronome aliquis, que está na forma masculina do caso nominativo. Seu acusativo masculino é aliquem. Qual das 2 formas você acredita que nos deu o pronome indefinido alguém?”

Na passagem do latim para o português, observamos duas regras que podem auxiliar numa busca de resposta: as consoantes surdas simples intervocálicas passam a suas sonoras equivalentes (-q- -g-) e a vogal postônica não-final cai (aliquem aliguem alguém).”

O acusativo sujeito da oração infinitiva é uma construção muito empregada no latim. Em português, embora ocorra com maior freqüência uma oração desenvolvida, temos também esse tipo de construção: Eu vi Sônia fazer o exercício, em que Sônia fazer o exercício é uma oração que funciona como objeto direto do verbo ver (eu vi algo), no infinitivo (equivale a Eu vi que Sônia fez o exercício). Alguns verbos permitem essa dupla construção em português (os causativos: mandar, deixar, fazer,…; e os sensitivos: ver, ouvir,…), outros, não.”

Propércio, I, 7, 21-26

[…]

tum me non humilem [humilde, não humilhar – falso cognato] mirabere [admirar, depoente]¹ saepe poetam, [= a imodéstia é admirável no poeta?]

tunc ego Romanis praeferar ingeniis.

nec poterunt iuvenes nostro reticere sepulcro [silenciar/silêncio sepulcral]

ardoris nostri magne poeta, iaces.’

tu cave nostra tuo contemnas [acautela-te de desprezar ou de teu desprezo pela nossa…] carmina fastu: [por orgulho]

saepe venit magno faenore [juro, -n] tardus Amor.”

¹ Macete: mir- de mirror, admirar-se no espelho.

Vocabulário importante da unidade:

aetatis

agitamus

alĭquid

atque

cogor : coagido

cupio : mnemônico: cupido

dicuntur : cantado

haec

hic

hinc

mollia : mole, FLEXÍVEL

nec

nomen

poterunt

quaerĭmus

queri

saepe : freqüentemente

sim/sint : deixar

tum : então

tunc

UNIDADE DOZE:

Elegia (III, 18 | = IV 12)

SULPÍCIA

(Corpus Tibullianum)

Pouco sabemos sobre a vida do poeta oriundo do Lácio, Álbio Tibulo. Deve ter nascido entre os anos de 55 a 50 a.C., e a data provável de sua morte se situa em 19 a.C. (pouco depois de Virgílio).

Consegue-se acompanhar alguns fatos de sua vida através da relação que manteve com M. Valério Messala Corvino,(*) um nobre e poderoso amigo e seu protetor.

(*) Messala participou como combatente da causa republicana em Filipos, embora tenha se aliado, posteriomente, a Marco Antônio e, em seguida, a Otávio, o futuro Augusto. A batalha de Filipos (42 a.C) ocorreu entre as forças do triunvirato formado por Otávio, Marco Antônio e Lépido e as forças republicanas, que tinham como líderes os principais envolvidos no assassinato de Júlio César. Nessa batalha, Bruto e Cássio perdem a vida, e suas tropas perdem a batalha.”

Acredita-se serem de sua autoria dois livros de elegias, havendo um terceiro que, na época do Humanismo, recebeu uma divisão em Livro III e Livro IV, com composições heterogêneas em uma coletânea que se conhece por Corpus Tibullianum.

É praticamente consensual que as curtas elegias em que a voz feminina de Sulpícia fala (el. 13-18 do livro III) sejam da autoria da própria Sulpícia, uma sobrinha de Messala, que, tendo ficado órfã, foi por ele acolhida e protegida. Sulpícia era neta de Sérvio Sulpício Rufo, um jurista famoso, amigo e correspondente de Cícero.”

Elegia (III, 18)

Ne tibi sim, mea lux, aeque [justamente] iam fervĭda [ardente] cura [nesse contexto, tormentos do amor]

ac viděor paucos ante fuisse dies,

si quicquam tota commisi [conmitto, committo, começar] stulta iuventa,

se eu, insensata que sou, cometi alguma burrice…

cuius me fatěar [confesso, vb. depoente] paenituisse magis,

da qual confesso ter me arrependido (mais que de qualquer outra fase da vida)…

hesterna quam te solum quod nocte [na noite passada] reliqui, [abandonada]

ardorem cupiens dissimulare meum.”

GLOSSÁRIO:

amasius: tanto amante quanto amado (que confusão!)

amata: sempre a amada (e pelo que entendi feminino, já que a mulher era uma ‘coisa’ na antiguidade e não se concebia o masculino também como objeto)

poetria: poetisa

Pronome indefinido (quisquam, quaequam, quidquam e quicquam ou quodquam)

O pronome quisquam deriva-se, como veremos mais à frente, do interrogativo-indefinido quis. Significa alguém, alguma coisa, algum, com valor de substantivo. É geralmente usado em frases negativas. Declina-se quis, e a forma enclítica –quam permanece invariável.”

Pronome relativo (qui, quae, quod)

Esse pronome aparece dicionarizado como um adjetivo de primeira classe, com o nominativo masculino (qui), o nominativo feminino (quae) e o nominativo neutro (quod).”

GLOSSÁRIO:

opertus: escondido (falso cognato do caralho!)

opertet: é preciso

Pronome anafórico (is, ea, id)

O pronome is, ea, id tem valor anafórico (ele, ela, o, a, lhe) e também antecede o relativo: o, a, aquele, aquela, aquilo (que).”

DIC (português!)

tugúrio: cabana

Visita vineam.

Vinde visitar a vinha (Salmos)

Amittit merito proprium [is] qui alienum adpetit.

(Phaed.)

Perde merecidamente o próprio [aquele] que cobiça o alheio

amitto: perder sua metade

GLOSSÁRIO:

vetus: antigo, arcaico

sinus: peito

sino dourado BLÉM-BLÉM

sinusite deveria ser inflamação no peito!

Infinitivo perfeito ativo

A partir do radical do perfeito (amav-), formamos o infinitivo perfeito ativo com a desinência –isse. Assim: amavisse (ter amado). No texto desta unidade, a partir do verbo sum, es, esse, fui, temos o infinitivo perfeito fuisse:

…ac viděor paucos ante fuisse dies…

(…como parecia ter sido há poucos dias…)

No mesmo texto, vimos, a partir do verbo impessoal paenitet, paenitui, o infinitivo perfeito paenituisse:

…me fatěar paenituisse magis…”

* * *

Do pronome relativo qui, quae, quod (que, o qual, quem), temos em português uma forma derivada do genitivo cuius. Trata-se do relativo cujo, que praticamente desapareceu da língua oral, permanecendo em textos escritos formais.”

Elegia 20, III

(Corpus Tibullianum)

Rumor ait [afirma] crebro [amiúde] nostram peccare puellam:

nunc ego me surdis auribus esse velim [volo]. [gostaria de pôr-me surdo às maledicências]

Crimina [injúria] non haec sunt nostro sine facta dolore:

quid miserum torques, [atormenta] rumor acerbe [cruel]? Tace. [Cala]

Moral da história: fica caladinho, irmão!

UNIDADE TREZE:

Amores (III, 14)

OVÍDIO

Sabemos sobre a vida de Ovídio através de seus próprios textos, especialmente através de uma elegia dos Tristia (Cantos Tristes), escrita durante seu exílio.(*) Na elegia IV, 10, Ovídio, numa espécie de autobiografia, busca se defender e nos deixa registros sobre sua própria vida.

(*) … Apesar de não supor a confiscação dos bens, esta relegatio tornava-se um duro castigo, porquanto obrigava o poeta a residir num lugar de clima rigoroso, quase incivilizado, habitado por bárbaros que de romanos só tinham o nome, banhado por águas insalubres. [atual Romênia]

Como muitos outros escritores contemporâneos seus, Ovídio, apesar de ter iniciado a magistratura, irá se dedicar ao ofício da poesia, desiludindo seu pai.”

Segundo Citroni, é admitido no círculo dos literatos que se reuniam em torno de Messala Corvino, podendo, dessa forma, entrar em contato e se relacionar com muitos poetas de seu tempo, como Horácio, Tibulo e Propércio. Virgílio, segundo nos conta o próprio Ovídio, só o conhecera de vista (Vergilium vidi tantum).”

O caráter multifacetado de Ovídio é demonstrado pela produção das seguintes obras:

Amores: coletânea de elegias em 3 livros (a primeira edição, não-conservada, teve 5 livros). O poeta-amante, nessas elegias, canta a paixão por Corina, uma antiga poetisa lírica grega.

Heroides: 21 epístolas poéticas, escritas em dísticos elegíacos, de heroínas famosas que escrevem a seus amados após terem sido, por eles, abandonadas: de Dido a Enéias, de Medéia a Jasão, de Ariadne a Teseu, e assim por diante, incluindo até mesmo uma figura não-retirada de mitos, a poetisa Safo, que escreve a Faón.

Ars amatoria: um tratado em dísticos elegíacos, <construído espirituosamente sobre os módulos do poema didascálico ‘sério’> (CITRONI et al., 2006, p. 592), em que a relação de amor se converte em objeto de ensino técnico (ars). Provavelmente por conta dessa obra Ovídio será exilado por Augusto para a longínqua cidade de Tomos (atual Constança, na Romênia).

Medicamina faciei feminae (Cosméticos da beleza feminina): trata-se de um livro de didática elegíaca com o ensinamento de truques para disfarçar qualquer tipo de defeito ou para melhorar o aspecto exterior. Desse poema, são supérstites apenas os cem primeiros versos.

Remedia amoris (Remédios contra o amor): trata-se de um pequeno poema que objetiva ensinar a pessoa amada a curar-se da paixão.

Metamorfoses: buscando um novo rumo para a épica, Ovídio compõe um poema de difícil classificação. Escrito em hexâmetros e com feições épicas (com invocação, proposição e narração), as Metamorfoses são um longo poema de 15 livros em que são narradas cerca de 250 histórias mitológicas que envolvem algum tipo de transformação. Segundo o próprio Ovídio, nos Tristia (Cantos Tristes), seu poema, por conta do exílio em Tomos, ficou sem a revisão que gostaria de fazer.

Fastos: escrito em dísticos elegíacos, trata-se da explicação da origem das festividades religiosas, um calendário do ano litúrgico romano. Nos Tristia (II, 549-552), Ovídio diz ter escrito 6 livros e outros tantos dos Fastos.

Tristia (Cantos Tristes): 5 livros de poesia elegíaca da época do exílio, enviados a Roma. Seus destinatários, evidentemente, não são identificados, exceto a sua esposa, que pode ser reconhecida claramente. (…)

Epistulae ex Ponto (Cartas do Ponto): obra composta de 3 livros (e um 4º, póstumo) de cartas poéticas (epístolas elegíacas), com a explicitação do nome do destinatário, numa tentativa de persuadir seus amigos a intercederem por ele. [Algo extremamente comum entre os poetas antigos, por sinal.]

Ovídio ainda escreveu Ibis (uma espécie de poesia como arma, em tom agressivo), Halieutica (pequeno poema didático sobre peixes e a pesca) e, provavelmente, uma Medea (de que nos restam apenas 2 versos).

OVID. Heroides – Amores. Translated by Grant Showerman and revised by G.P. Goold. Cambridge, Massachusetts, London: Harvard University Press, 1977.

Non ego, ne pecces, cum sis formosa, recuso,

sed ne sit misero scire necesse mihi;

nec te nostra iubet fieri censura pudicam,

sed tamen, ut temptes [tentar] dissimulare, rogat.

Non peccat, quaecumque potest peccasse negare,

solaque famosam culpa professa facit.

Quis furor est, quae nocte latent, in luce fateri,

et quae clam [ocultamente] facias facta referre palam? [publicamente]

Ignoto meretrix corpus iunctura Quiriti

opposĭta popŭlum summovet ante sera; [fechadura]

tu tua prostitues [exposta] famae peccata sinistrae

commissi [crime] perăges indiciumque tui?

Sit tibi mens melior, saltem[-]ve [ue: ou; saltem: ao menos] imitare pudicas,

teque probam, quamuis [quando muito] non eris, esse putem.”

GLOSSÁRIO:

iunctura: que está para unir (do verbo iungo, -is, -ere, iunxi, iunctum: unir. Do tema do supino se forma o particípio futuro: iuncturus, -a, -um: que está para unir) [juntura, conjuntura]

opposita: colocada (diante) (particípio passado do verbo oppono, -is, –ere, posŭi, -positum: colocar diante, formado pela preposição ob, diante de, e pelo verbo pono)

submovet: afasta (do verbo submoveo ou summoveo, -es, -ere, -movi, -motum: afastar, formado pela preposição de acusativo e ablativo sub + verbo moveo)

Dupla negação

No início da elegia que traduzimos nesta unidade, ocorre uma dupla negação. Veja:

Non ego, ne pecces, cum sis formosa, recuso”

(Já que és formosa, não me oponho a que me traias) CUCK!

Em eu não me oponho a que não me traias, entende-se, em latim, eu não me oponho a que me traias, de forma que a dupla negação, aqui, se lê como uma afirmação.(*)

(*) Paulo Sérgio de Vasconcellos, em sua Sintaxe do Período Subordinado Latino (2013), apresenta exemplos, a partir de Plauto, Ovídio, Cícero, Catulo e Petrônio, de dupla negação que continua negando. Para ele, ‘a presença, na língua popular, desde Plauto, da dupla negação que continua negando mostra que a dupla negação das línguas românicas não é uma criação nova: estava no latim desde muito cedo e, de quando em quando, aparece nos textos que a nós nos chegaram.’ (p. 57)”

Verbo sum

No texto desta unidade, em alguns versos, o verbo sum aparece nos tempos do subjuntivo:

Non ego, ne pecces, cum sis formosa, recuso,

sed ne sit misero scire necesse mihi;

(Já que sejas formosa, eu não me oponho a que me traias

mas que não seja necessário a mim, desgraçado, ter conhecimento)

…sit tibi mens melior, saltemue imitare pudicas,

teque probam, quamuis non eris, esse putem.

(A ti seja uma mente melhor, ou ao menos imita as pudicas

e logo, ainda que não fores, que eu te repute virtuosa)

quando muito não o sejas, tenha a aparência.

A enclítica –ve (ou)

A enclítica –ve é uma conjunção coordenativa, unindo termos equivalentes. Também é coordenativa a conjunção vel (‘ou’). Outra conjunção coordenativa já muito vista por nós é a conjunção et (‘e’). Devemos ter atenção ao analisar textos, verificando se essas conjunções (vel e et) unem termos equivalentes. Quando isso não ocorre, trata-se na verdade de advérbios: et (‘até’, ‘também’) e vel (‘até’, ‘também’, ‘talvez’).”

Pronome interrogativo

Origem do nosso ‘né’? De qualquer modo, até o japonês possui um mecanismo muito similar em sua gramática ou oralidade.

Verbos semidepoentes

Já estudamos e aprendemos a reconhecer um verbo depoente: verbo que apresenta terminações de voz passiva, mas que tem sentido ativo. Conforme vimos, são verbos que originalmente apresentavam terminações de ativa e de passiva e que abandonaram as formas ativas, passando as formas passivas a assumir o sentido ativo. Um verbo depoente é reconhecido nos vocabulários e dicionários por apresentar as terminações de passiva, diferentemente dos demais verbos, que apresentam as terminações de ativa. Os semidepoentes são verbos que têm, nos tempos de ação inacabada (infectum), as formas ativas, seguindo, nos tempos de ação acabada (perfectum), a conjugação dos depoentes.”

Diferentemente dos depoentes, que são em maior número, os semidepoentes são poucos, mas podem também ser identificados em dicionários: audĕo, -es, -ere, ausus sum (ousar); fido, fidis, fidĕre, fisus sum (fiar-se); gaudĕo, -es, -ere, gavisus sum (regozijar-se); solĕo, -es, -ere, solitus sum (estar habituado).

O verbo fieri (‘tornar-se’), apesar de se apresentar à maneira dos semidepoentes, possui algumas particularidades, funcionando, por exemplo, como passiva de facere (‘ser feito’, ‘ser criado’), razão pela qual costuma ser incluído entre os irregulares.

nec te nostra iubet fiĕri censura pudicam

(nem a nossa censura ordena tu te tornares pudica/que tu te tornes pudica)”

Particípio futuro

.. ignoto meretrix corpus iunctura Quiriti

(… a meretriz que está para unir o corpo ao desconhecido cidadão romano…)

Concordando com meretrix (feminina da 3ª) está a forma iunctura (forma feminina do particípio futuro iuncturus, -a, -um, do verbo iungo, -is, –ere, iunxi, iunctum, que significa unir, daí o particípio futuro ser traduzido por que está para unir).”

Elegia III, 14 (Ovídio, Amores)

Tunc amo, tunc odi frustra quod amare necesse est;

tunc ego, sed tecum, mortuus esse velim!

Nil equĭdem inquiram, nec quae celare [calar] parabis

insequar, et falli muneris instar [como; analogamente a] erit.

Si tamen in media [meio ou duvidoso] deprensa tenebere culpa,

et fuerint oculis probra [traição] videnda [que será vista] meis,

quae bene visa mihi fuerint, bene visa negato

concedent verbis lumina nostra tuis.

Prona tibi vinci cupientem vincere palma est,

sit modo [contanto que (neste contexto)] ‘non feci!’ dicere lingua memor.

Cum tibi contingat verbis superare duobus,

etsi [ainda que] non causa, iudice [julgar, julgamento] vince tuo!”

GLOSSÁRIO:

moecha: mulher adúltera

VOCABULÁRIO ESSENCIAL

-que

amo

ante

bene

causa

concedent

contingat

cum

cupientem

dicere

duobus

facit/facias/feci

famae

fateri

fiĕri : a ser feito, a se tornar

furor

ignoto

in

iubet : ordena

latent

luce

lumina

media

mens

mihi

misĕro

modo

munĕris

nec

necesse

negare

nocte

ocŭlis

parabis

popŭlum

potest

putem

quis

rogat

scire : saber

sed

si

sis/fuĕrint/sit/esse/eris – sis sit fui, foi

sola

superare

tamen

tunc

velim : volo, subj.

verbis

vince

ut

UNIDADE CATORZE:

Tristĭa (I, 7)

OVÍDIO

Na elegia escolhida para esta unidade, Ovídio lamenta não ter podido revisar as suas Metamorfoses (Carmina mutatas hominum dicentia formas) e sugere alguns versos que podem ser colocados no frontispício do primeiro livro da obra, advertindo o leitor quanto a [seu] caráter inacabado.”

OVIDE. Tristes. Texte établi et traduit par Jacques André. Quatrième tirage. Paris: Les Belles Lettres, 2008.

Tristia (I, 7)

Grata tua est pietas, sed carmina maior imago [memória]

Sunt mea quae mando qualiacumque legas,

Carmina mutatas hominum dicentia formas,

Infelix domini [autor] quod fuga rupit opus.

Haec ego discedens, sicut bene multa meorum,

Ipse mea posui maestus [muito aflito] in igne manu;

Utque cremasse suum fertur sub stipite [tição] natum

Thestias, et melior matre fuisse soror,

Sic ego non meritos, mecum peritura, libellos

Imposui [impor] rapidis, viscera nostra [vísceras ou nossas criações], rogis, [piras ou túmulos]

Vel quod eram Musas, ut crimina [pretextos, neste contexto] nostra, perosus, [avesso a]

Vel quod adhuc crescens et rude carmen erat.

Quae quoniam non sunt penitus [completamente] sublata, [removido, destruído, tollo] sed extant

Pluribus exemplis scripta fuisse reor [eu acho] –,

Nunc precor ut vivant et non ignava [preguiçosa, insegura] legentem [leitor]

Otia delectent admoneantque mei.

Nec tamen illa legi poterunt patienter ab ullo,

Nesciet his summam si quis abesse manum;

Ablatum [arrancar à força] mediis opus est incudibus [bigornas, peso] illud

Defuit [Falta] et scriptis ultima lima [retoque] meis,

Et veniam pro laude peto, laudatus abunde, [suficientemente]

Non fastiditus si tibi, lector, ero. [Fazer o possível para não desprezar o leitor]

Hos quoque sex versus, in prima fronte libelli

Si praeponendos esse putabis, habe:

Orba parente suo quicumque volumina tangis,

His saltem vestra detur