HEINE, HEIN?

7 de dezembro de 2017 a 14 de janeiro de 2018 – trabalho depois interrompido por 5 anos e meio.

ANTECEDENTES

Um dia hão de dizer que Heine e eu fomos de longe os primeiros artistas da língua alemã – numa distância incomensurável de tudo o que simples alemães fizeram com ela.”

Nietzsche

Walter Benjamin e Elias Canetti, que parecem ter dado ouvidos a Kraus, passaram batido por Heine.”

Ler um dia seu Quadros de Viagem, a magnum opus; mas também Cartas de Helgoland (pelo visto ainda sem versão portuguesa).

Heine foi o antídoto para a poesia oceânica de Victor Hugo.”

“‘O poeta impecável’ Théophile Gautier, ‘mago perfeito das letras francesas’, não foi apenas amigo de H., mas um tributário confesso de sua obra.”

Álvares de Azevedo (…) Sua pequena obra-prima, ‘Namoro a Cavalo’, escrita presumivelmente em 1851, é de nítida inspiração heineana.”

Jamais um Proteu tomou tantas formas, jamais o Deus da Índia passou sua alma divina numa série tão longa de avatares.”

Gérard de Nerval, seu amigo íntimo e primeiro tradutor francês.

Quem adora a arte como sua divindade e também dirige preces ao seu bel-prazer à natureza, ultraja tanto a arte quanto a natureza.”

Ludwig Börne, poeta contemporâneo e desafeto – ou talvez seja palavra muito forte, pois quando um não quer, dois não brigam – de H. que será ainda bastante citado.

E se o bom Deus quiser me fazer totalmente feliz, que me conceda a alegria de ver, nessas árvores, cerca de 6 ou 7 de meus inimigos enforcados. – De coração comovido hei de perdoar, antes de suas mortes, todas as infâmias que me infligiram em vida – sim, temos que perdoar nossos inimigos, mas não antes de serem enforcados.¹ – Perdão, amor e compaixão.”

¹ Se contradiz a meio caminho, mas tudo bem.

OS GRANADEIROS (tradução minha)

À França rumavam dois granadeiros,

que na Rússia haviam sido prisioneiros.

E quando chegaram no território alemão,

Sentiram-se como degolados.

Lá ouviram ambos as más novas:

Que a França fôra derrotada.

O grande exército vencido e aniquilado,

E o Imperador, o Imperador aprisionado.

Lá choraram juntos os granadeiros

Suas indignantes misérias.

Um diz: Como dói em mim,

Como ardem minhas velhas feridas.

O outro diz: Já era a Canção,

Também eu quero perecer contigo,

Mas tenho mulher e filho em casa,

Que sem mim não se sustêm.

Que me importa mulher, que me importa filho,

Eu levo comigo desejos melhores,

Deixai-os mendigar, quando estiverem famintos,

Meu Imperador, meu Imperador aprisionado!

Concede-me, irmão, um favor:

Agora, quando eu sucumbir,

Leva meu cadáver contigo até a França,

Enterra-me em solo francês.

A medalha de honra em faixa vermelha

Deves tu sobre meu coração depositar;

Na mão deixa-me a pederneira,

E afivela em mim a espada.

Quero descansar e ressoar no silêncio,

Como uma sentinela, na lápide,

Até um dia ouvir canhonadas,

E relinchos da Cavalaria.

Então meu Imperador cavalgará sobre meu túmulo,

Várias lâminas tilintam e incendem;

É aí que me ergo da cova, armado,

Para o Imperador, para o Imperador defender.

UM OCEANO DE ADMIRADORES

Resenhador anônimo contemporâneo ao poeta:

A poesia deve agir como a – religião.”

revelam-se como os piores e mais lamentáveis aqueles poemas onde o autor se faz de delicado ao extremo e suspirante, especialmente nas canções de amor.”

quanto menos ele honra a finalidade da poesia, tanto mais tem compreendido e considerado a essência da mesma.”

O autor utilizou a linguagem da canção popular alemã na maioria de seus poemas. Em todos impera aquele tom popular que os adeptos artificiais da empolação convencional ridicularizam como simplório, e que em sua verdadeira simplicidade só pode ser atingido pelos grandes poetas.” “Goethe mirou um alvo completamente diverso; ele deu à canção popular um colorido para o chazinho da tarde.” “não podemos nos admirar o bastante pelo fato de não termos encontrado nas canções populares de H. a matéria ou eco de qualquer canção alemã já existente”

A mera burguesia, a mera humanidade é o elemento único que vive na poesia de H.”

NAS ASAS DA CANÇÃO

Por séculos afora,

Inertes no infinito,

Estrelas se entreolham

No amor irresolvido.

A língua em que murmuram

É rica e muito bela

Filólogo nenhum

Jamais há de entendê-la

Porem tenho-a aprendido

Em teoria e prática

A face em que eu orbito

Serviu-me de gramática.”

* * *

Corto minh’alma ao meio;

Assopro-te a metade,

Te abraço, então seremos

Corpo e alma de verdade.”

* * *

Com roupinhas de domingo,

Filistinos fazem festa;

Tal cabritos, dão pulinhos,

Passeando na floresta.

Eu, porém, cubro as janelas

Com a mais negra cortina;

Sob a luz do dia ou velas,

Grei de espectros me azucrina.”

* * *

Se nos casarmos no papel,

Então vão todos te invejar:

Hás de passar a leite e mel

Os dias de papo pro ar.

Quando tiveres teus chiliques,

Prometo que não vou chiar;

Porém meus versos não critiques,

Que aí vou me divorciar!”

DONA CLARA

(…)

<Os mosquitos, cavaleiro,

Me picaram no ínterim,

Tenho raiva dessa praga

Como do judeu chinfrim.>

(…)

<Mas me diz: teu coração

Balançou mesmo por mim?>

<Não duvides meu senhor,

Por Jesus, juro que sim,

Ele a que os judeus tratantes

E velhacos deram fim.>

<Deixa o Cristo para lá

E os judeus, minha rolinha.

Olha só como balançam

Suave os lírios na colina.>

(…)

<Não há uma gota falsa

De sangue dentro de mim;

Meu amor, não sou da raça

De Judá, nem sou muslim.>

<Deixa os mouros para lá

E os judeus, amada minha;

Vamos nos aconchegar

Entre os ramos de alecrim.>

E fez pra filha do alcaide

O mais delicado ninho;

Foi sucinto na palavra,

Mas prolixo no carinho.

(…)

<Creio que estão me chamando!

Meu querido, diz enfim:

Qual a graça do teu nome?

Não o escondas de mim.>

(…)

<Meu amor, deu-me o destino

Uma estirpe primorosa,

Eu sou filho do Rabino

Israel de Zaragoza.>”

* * *

Nossa amizade agora cresce

A cada dia e nunca pára;

Virei alguém que se enraivece,

Estou ficando a tua cara.”

* * *

Por qual das duas se apaixona

Meu coração que o amor balança?

A mãe tem ares de madona,

A filha é uma linda criança.

Ver essas formas graciosas,

Tão inocentes, que delícia!

Mas quem resiste àqueles olhos

Que sabem ler toda a malícia?

Meu coração parece, assim,

O amigo cinza e sem ação

Ante dois montes de capim:

Não sabe qual sua ração.”

* * *

A cartinha que me escreves

Não me abala a alegria;

Para dizer que o amor já era,

Escreveste em demasia.

Doze folhas manuscritas,

Com letrinha de notário!

Quem deseja a despedida

Não se dá tanto ao trabalho.”

MUITO ALÉM DE TOCQUEVILLE

Justamente eu tive que editar anais políticos, comunicar assuntos da hora, panfletar desejos revolucionários, acender paixões, dar petelecos incessantes no nariz do pobre Zé Povinho alemão, a fim de que acordasse de seu saudável sono de gigante… Óbvio que nada mais consegui do que provocar um leve espirro no gigantesco roncador, e de forma alguma despertá-lo… Também puxei-lhe com força o travesseiro, mas ele o endireitou com a mão trôpega de sono… Desesperançado, quis um dia incendiar sua touca de dormir, que, no entanto, de tão empapada com o suor dos pensamentos não produziu nada mais do que fumaça… e o Zé Povinho, dormindo, sorriu.

(…) Ah, se eu apenas soubesse onde repousar minha cabeça. Na Alemanha é impossível. A todo momento, um policial viria sacudir-me para verificar se estou mesmo dormindo; só de pensar nisso já me estraga todo prazer. Mas afinal, para onde ir? De novo ao sul? (…) Ficaram tão azedas quanto os limões as ditas laranjas douradas. [referência à Áustria] (…) Ou devo ir para o norte? Talvez ao nordeste? Ah! os ursos polares estão mais perigosos do que nunca, desde que foram civilizados e passaram a usar luvas glacé. Ou devo voltar à diabólica Inglaterra, onde não fui enforcado in effigie mas onde tampouco quero viver em pessoa? Deviam pagar para a gente morar lá, e, ao invés disso, a estada na Inglaterra custa o dobro dos demais lugares. Nunca mais quero pôr os pés nesse desprezível país, onde as máquinas são como homens e os homens gesticulam como máquinas. Que zumbem e silenciam tão assustadoramente. Quando fui apresentado ao enorme governante, e esse inglês de araque permaneceu imóvel na minha frente sem falar uma palavra por vários minutos, passou-me involuntariamente pela cabeça olhar as suas costas, para averiguar se haviam esquecido de dar corda no maquinário. Que a ilha de Helgoland esteja sob o domínio inglês já me é fatal o suficiente. Às vezes imagino sentir o cheiro daquele tédio que os filhos de Albion exalam em todo lugar. De fato, cada inglês emana um certo gás, o mortífero veneno do tédio, que observei com meus próprios olhos, não na Inglaterra onde todo o ar está dele impregnado, mas nas terras do sul, por onde o inglês vagueia solitário, e onde a auréola de melancolia que circunda sua cabeça torna-se bastante nítida no ensolarado ar azul. Os ingleses acreditam que seu denso tédio seja um produto territorial, e para escapar do mesmo, viajam por todos os países, entediando-se em todos os lugares e voltando para casa com um diary of an ennuyé. Parece o caso do soldado que caiu no sono: os companheiros besuntaram-lhe as narinas com excremento; quando acordou percebeu que a guarita cheirava mal, e saiu; mas não tardou a voltar, dizendo que lá fora também fedia, que o mundo inteiro cheirava mal.

Um amigo meu, que voltou recentemente da França, me assegurou que os ingleses viajam pelo continente por desespero da pesada culinária de sua pátria; nas tables d’hôte se vêem os gordos bretões engolindo somente vol-au-vent, crème, supréme, ragout, gelées e outras iguarias arejadas, e com aquele apetite colossal que treinaram em casa com a massa de roastbeefs e o plum pudding [pudim de ameixa] de Yorkshire, levando à ruína qualquer dono de restaurante. (…) Enquanto rimos da frivolidade com que observam as curiosidades e galerias de arte, talvez sejam eles que nos enganam, e o seu sorriso não passe, assim, de uma astuta camuflagem de suas intenções gastronômicas?

Mas por melhor que seja sua própria cozinha, a França não anda lá muito bem das pernas (…) Os atuais detentores do poder são os mesmos imbecis que tiveram suas cabeças cortadas há 50 anos... Do que adiantou? Levantaram do túmulo, e o seu governo está mais tolo do que antes, pois[,] quando os deixaram sair do reino dos mortos para a luz do dia, a maioria colocou, na pressa, a melhor cabeça que estava à mão, e com isso ocorreram desacertos irremediáveis: a cabeça, amiúde, não combina com o tronco e com o coração que ali dentro assombra. Muitos deles, conforme a própria razão espalha nas tribunas, têm cabeças cuja sabedoria admiramos, mas que, no entanto, se deixam logo conduzir pelos corações incorrigíveis aos atos mais estúpidos… É a terrível contradição – entre pensamento e emoção, princípio e paixão, palavra e ação – desses revenants!

Ou devo ir para a América, essa imensa penitenciária da liberdade, onde os grilhões invisíveis me apertariam ainda mais dolorosamente que os visíveis lá de casa, e onde o mais repugnante dos tiranos, a plebe, exerce sua rude dominação? Tu sabes o que penso desse país amaldiçoado, que outrora amava, quando ainda não o conhecia… E, não obstante, devo louvá-lo por obrigação do métier… Ó caríssimos camponeses alemães, ide para a América! Lá não há príncipes nem nobres, todos os homens são iguais, são um único caipira… Com exceção, é claro, de alguns milhões que têm a pele negra ou marrom, e que são tratados como cachorros. A escravidão, que foi abolida na maior parte dos estados, não me repulsa propriamente tanto quanto a brutalidade com que tratam os negros e mulatos livres. Também aqueles que em mínimo grau descendem de um negro – ainda que não tragam na cor da pele o sinal da descendência, mas tão-somente nos traços do rosto – terão de suportar as piores ofensas, ofensas estas que irão nos parecer até fantasiosas na Europa. Ao mesmo tempo, esses americanos têm o seu cristianismo em grande conta, e são os mais ávidos freqüentadores de igrejas. Tal hipocrisia aprenderam com os ingleses que, aliás, lhes deixaram suas piores qualidades. A utilidade mundana é, no fundo, a sua religião, e o dinheiro é seu Deus, seu Deus único e todo-poderoso. Naturalmente que um coração nobre poderá lamuriar-se em silêncio contra o egoísmo e a injustiça generalizadas. Mas se quiser de fato combatê-los, espera-o o martírio que ultrapassa todos os conceitos europeus. Creio que foi em Nova York onde um pregador evangélico indignou-se tanto com a judiação dos homens de cor que, desafiando o cruel preconceito, casou sua própria filha com um negro. Tão logo esse ato verdadeiramente cristão tornou-se público, o povo invadiu a casa do pregador, que somente através da fuga evitou sua morte; a casa, porém, foi arrasada, e a filha, a pobre vítima, caiu nas garras do populacho, para satisfazer-lhes a fúria. She was lynched, isto é, foi completamente despida, banhada em piche, rolada sobre os edredons rasgados e, nessa viscosa cobertura de penas, humilhada e arrastada por toda a cidade…

Ó liberdade, és um sonho ruim!”

O MANIFESTO ANTI-HEGELIANO-SEMITA DO MAIOR DE TODOS OS JUDEUS

Os judeus deveriam se consolar com facilidade por terem perdido Jerusalém e o Templo e o tabernáculo e os talheres dourados e as jóias de Salomão… Essa perda é mínima em comparação com a Bíblia, esse tesouro indestrutível que conseguiram salvar. Se não me engano, foi Maomé que chamou os judeus de o <Povo do Livro>, um nome que até os dias de hoje perdura no Oriente e que é profundamente representativo. Um livro é sua pátria, sua propriedade, seu senhor, seu azar e sorte. Eles vivem nos pacíficos limites desse livro, ali exercem sua cidadania inalienável, ali não podem ser perseguidos, desprezados, ali são fortes e dignos de inveja. Imersos na leitura desse livro, muito pouco notaram das mudanças que ocorreram ao seu redor, no mundo real; povos surgiram e desapareceram, Estados floresceram às alturas e feneceram, revoluções assolaram o planeta… Porém eles, os judeus, estavam inclinados sobre o seu livro, e nada perceberam da selvagem caçada do tempo que grassava sobre suas cabeças. Assim como o profeta do Oriente os denominou o <Povo do Livro>, o profeta do Ocidente, em sua Filosofia da História, os chamou de o <Povo do Espírito>. Desde o mais remoto início, como observamos no Pentateuco, os judeus professam a sua inclinação ao abstrato, e toda sua religião não passa de um tipo de dialética, através da qual a matéria é separada do espírito, e o Absoluto é somente reconhecido na forma exclusiva do espírito. Que posição assustadoramente isolada não tiveram que assumir entre os povos da Antiguidade, que se dedicavam aos mais alegres serviços da natureza, compreendendo o espírito muito mais como manifestação, em símbolo e imagem, na matéria! Que terrível oposição não ergueram, portanto, contra o colorido Egito que coalhava de hieróglifos, contra a Fenícia dos grandes templos de prazer de Astarte, ou mesmo contra a bela pecadora, a adorável, doce-perfumosa Babilônia, e por último, até mesmo contra a Grécia, a florescente terra natal da arte!

(…) Moisés deu ao espírito, por assim dizer, as paliçadas materiais contra a invasão dos povos vizinhos: ao redor do campo onde semeara o espírito, plantou a áspera lei cerimonial e um egocêntrico sentimento de nacionalidade, como uma protetora cerca de espinhos. (…) eis que surge Jesus Cristo e derruba a lei cerimonial, que doravante nenhuma importância terá, proclamando também a sentença de morte sobre a nacionalidade judaica… (…) Foi uma grande demanda emancipatória, resolvida, contudo, de forma bem mais generosa que as atuais na Saxônia e Hannover… (…)

…e a humanidade toda, desde então, aspira in imitationem Christi à mortificação do corpo e à suprassensível entrada no espírito absoluto

Quando voltará a harmonia? Quando irá o mundo se curar dessa ânsia por espiritualização, o insano erro através do qual tanto a alma como o corpo adoeceram? Um grande antídoto reside no movimento político e na arte. Napoleão e Goethe atuaram com precisão. Aquele, por ter obrigado os povos a admitirem todos os tipos de movimentos saudáveis ao corpo; este, por nos ter tornado de novo receptíveis à arte grega e criado obras de peso, nas quais podemos nos agarrar como nas estátuas de mármore dos deuses, para não afundarmos no mar enevoado do espírito absoluto…”

O HOMEM ETERNO DE HEINE, O ANIMAL MORAL

Eu creio poder afirmar que a moralidade independe do dogma e da legislação, ela é inteiramente um produto do saudável sentimento humano, e a moralidade verdadeira, a razão do coração, irá perdurar eternamente, mesmo que o Estado e a Igreja venham abaixo.

Gostaria que tivéssemos uma outra palavra para isso que chamamos aqui de moralidade [Sittlichkeit]. Poderíamos ser levados a entender a moralidade como produto dos costumes [Sitte]. Os povos latinos vêem-se na mesma arapuca, ao tirarem sua morale de mores. (…) Existe, assim, um costume indiano, um chinês, um costume cristão, mas só existe uma única moralidade humana. Esta talvez não se deixe apreender em um conceito, e a lei da moralidade, que denominamos moral, não passa de uma brincadeira dialética. A moralidade se revela nas ações, e somente nos motivos destas, não em suas formas e cores, reside o significado moral. (…)

(…) As palavras mais estranhas do Novo Testamento são para mim as desta passagem do Evangelho de S. João, 16:12-13: <Ainda tenho muito que voz dizer, mas vós não o podeis suportar agora. Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir.> (…)

Uma certa ambigüidade mística predomina em todo o N.T. Uma astuta digressão, não um sistema, são as palavras: <Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus>. Do mesmo modo, quando perguntam a Cristo <és o rei dos judeus?> a resposta é evasiva. Assim também quando se indaga se ele seria o Filho de Deus. Maomé se mostra muito mais aberto e categórico. Quando lhe perguntaram algo semelhante, respondeu: <Deus não tem filhos>.

(…) Se aparecer um Salvador agora, não terá mais que se deixar crucificar para divulgar a sua doutrina com impacto... Basta que simplesmente mande imprimi-la e anuncie o livrinho nos classificados do Allgemeine Zeitung, a 6 cruzados por linha. (…) Que fonte revigorante para todos os sofredores foi o sangue que escorreu no Gólgota!… Esse sangue respingou nos brancos deuses de mármore da Grécia, que adoeceram de um horror interior e nunca mais se recuperaram! A maioria, naturalmente, já carregava a peste dentro de si, e o susto tão somente apressou-lhes a morte. Primeiro morreu Pã.”

[Nota do tradutor] Pustkuchen, Johann Friedrich Willhelm (1793-1834): escritor e clérigo protestante; ficou conhecido por sua continuação do romance Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe, sob o pseudônimo Glanzow. Quando teve a identidade revelada, foi impiedosamente ridicularizado pelo autor da obra.”

DE NOVO A BÍBLIA, A NATUREZA, A ARTE E UMA PITADA DE CULINÁRIA

Na Bíblia não aparece qualquer vestígio de arte; o estilo é o de um bloco de notas, no qual o espírito absoluto, como se não tivesse qualquer auxílio individual, registra os acontecimentos do dia, quase com aquela mesma fidelidade aos fatos que usamos para escrever nossos bilhetes. Sobre esse estilo não se pode emitir qualquer juízo, apenas constatar o efeito sobre nossas emoções, e não se desconcertaram pouco os gramáticos gregos, quando tiveram que definir em conceitos convencionais muitas das belezas flagrantes da Bíblia. Longino fala de sublime. Estetas mais recentes, de ingenuidade. Ah! (…) Apenas em um único escritor sinto algo que me lembra o estilo sem mediações da Bíblia. É Shakespeare. Também nele irrompe às vezes a palavra com aquela assombrosa nudez que nos assusta e estremece; nas obras shakespearianas vemos às vezes a verdade encarnada sem as roupagens da arte. Mas isso só acontece em alguns momentos; o gênio da arte, sentindo talvez a sua impotência, delega, por um momento, sua tarefa à natureza, para depois reafirmar com ciúme ainda maior o seu domínio sobre a criação plástica e o divertido encadeamento do drama. Shak. é judeu e grego ao mesmo tempo, ou melhor, nele os dois elementos, o espiritualismo e a arte, se interpenetraram, plenos de conciliação, desdobrando-se num todo mais elevado.

(…) <Com o Espírito Santo se dá o mesmo que com o terceiro cavalo, quando a gente viaja pelo Correio Expresso; é preciso sempre pagar por ele, mas a gente nunca vê o tal cavalo.>

(…) enquanto eu debatia com o prussiano a Santíssima Trindade, lá embaixo, o holandês explicava como se diferencia o bacalhau do Labberdan e do stockfish; que seriam no fundo a mesmíssima coisa.”

SOBREVIVÊNCIA DE UMA VOCAÇÃO EXTEMPORÂNEA

Os poetas, desde o triunfo da Igreja Cristã, formaram sempre uma comunidade silenciosa, onde a alegria no culto das antigas imagens e a rejubilante fé nos deuses se disseminam de geração em geração, na tradição dos cantos sagrados…

(…) O mundo não permanece no cessar-fogo inerte, mas na mais estéril circulação. Outrora, quando era jovem e inexperiente, acreditava que, na guerra de libertação da humanidade, ainda que os combatentes isolados perecessem, a grande causa venceria no final… E eu estremeço com estes belos versos de Byron: <As ondas vão uma atrás da outra, mas o mar segue adiante>.

Ah! Quando se observa por mais tempo essas manifestações da natureza, percebe-se que o mar que avança, volta de novo ao leito anterior num ciclo determinado, e mais tarde avança de novo, com a mesma violência, buscando recuperar o terreno perdido, e por fim, pusilânime, parte em retirada como antes, e embora repita esse jogo continuadamente, nunca vai adiante… Também a humanidade move-se pelas leis do fluxo e refluxo, e quem sabe no mundo do espírito a Lua também exerça a sua influência sideral.”

ESPARTANOS E HOLANDESES

Assim como os espartanos preservavam seus filhos da embriaguez, mostrando-lhes um hilota bêbado como exemplo a se evitar, deveríamos fornecer às nossas instituições de ensino um holandês, para que a sua apática e inerte natureza de peixe provocasse nas crianças o horror à sobriedade. E deveras, a sobriedade holandesa é um vício bem mais mortífero que a embriaguez dos hilotas. Gostaria de quebrar a cara de Mynheer…”

INEXISTÊNCIA DA VIDA EXTRA-TERRESTRE

Mas não há nenhum outro mundo habitado, como sonham alguns, tão só esferas cintilantes de pedra, ermas e estéreis,

Elas não caem por não saberem onde cair.”

A FARSA FRANCESA

Os cabelos de prata que eu vira esvoaçar majestosamente nos ombros de Lafayette, herói de dois mundos, transformaram-se, ao observá-los mais de perto, numa peruca marrom que cobria miseravelmente um crânio estreito. E até mesmo o cão Medor, que visitei no pátio do Louvre e que, guardado sob bandeiras tricolores e troféus, comeu tranqüilo a ração que lhe dei: não era de forma alguma o verdadeiro cachorro, mas uma besta corriqueira que se apropriara da glória alheia, como é muito usual entre os franceses, e que, assim como tantos outros, explorava a fama da Revolução de Julho…

Pobre povo! Pobre cão, eles!

(…) Em julho de 1830 conquistou a vitória para aquela burguesia que valia tão pouco quanto a nobreza que substituiu, e com o mesmo egoísmo… (…) Mas acreditai: quando soar novamente o sino da intempérie e o povo tomar em armas, desta vez ele lutará em causa própria e exigirá o soldo merecido. Desta vez, o verdadeiro Medor há de receber as honras e a ração… (…)

Mas cala-te, coração, tu te expões em demasia.”

* * *

UMA GAIVOTA

meus poemas repulsivos não são alimento para a rude multidão.”

AS GARRAFAS PELO CHÃO

Solitário, este imbecil contempla a cama.”

* * *

GÊNIO OU APENAS UM ARISTOCRATA INSOLENTE?

um certo desdém, como o que se encontra em homens que se acham superiores à posição que ocupam, mas que duvidam do reconhecimento alheio. Não era aquela majestade recôndita que podemos encontrar na face de um rei ou de um gênio, que se ocultam incógnitos entre a multidão; era decerto aquela insolência revolucionária, um tanto titânica, que se nota no rosto de qualquer pretendente. A sua atuação, os seus movimentos, o seu andar tinham um quê de segurança, de certeza, de caráter. Os homens extraordinários estarão banhados da irradiação de seu espírito? Nossas emoções pressentirão a glória que nós, com os olhos do corpo, não podemos ver? A intempérie moral, em tais homens extraordinários, atuaria talvez eletricamente nos temperamentos jovens e sensíveis que deles se aproximam, como a tempestade real influi nos gatos?”

Dieffenbach, quando estudávamos em Bonn, onde quer que ele pegasse um gato ou um cachorro, logo lhe cortava o rabo, por puro prazer de cortar, o que muito nos irritava, porque os bichos gemiam insuportavelmente, mas depois perdoamos por ele ter, graças a esse prazer de talhar, se tornado o maior cirurgião da Alemanha”

O enigmático “Jean Paul” dos séc. XVIII-XIX: (*) “Pseudônimo de Johann Paul Friedrich Richter (1763-1825), um dos escritores mais populares e bizarros de seu tempo; anticlássico sem, contudo, identificar-se com os românticos, foi autor de romances labirínticos que uniam o sentimentalismo mais açucarado ao grotesco e o fantástico; tanto Heine quanto Börne apreciavam seu estilo e foram por ele influenciados. Passou os últimos 20 anos de sua vida em Bayreuth.”

<Börne não sabe escrever, como tampouco eu ou Jean Paul.> Rahel entendia o escrever como o calmo ordenamento, ou seja, a redação do pensamento, a concatenação lógica dos elementos da oração, em resumo, aquela arte da construção do período que ela tão entusiasticamente admirava em Goethe quanto em seu marido [Varnhagen von Ense], e sobre a qual tínhamos então, quase que diariamente, as discussões mais frutíferas.” “ela nutria uma grande admiração por aqueles serenos escultores da palavra que sabem manipular, libertos da alma gestante, todo o seu pensar, sentir e observar como se estes fossem uma determinada substância, moldando-os plasticamente.” “Quero apenas salientar que para se escrever prosa bem-acabada é necessário se ter também, entre outras coisas, o domínio das formas métricas. Sem essa maestria, falta ao prosador um certo ritmo, fogem-lhe construções de palavra, expressões, cesuras e frases que só no discurso metrificado são admissíveis, e surgem dissonâncias que ferem os poucos ouvidos mais sensíveis.”

Curioso! Se à distância ouvimos falar de uma cidade, onde habita este ou aquele homem ilustre, obrigatoriamente pensamos que ele seja o centro da cidade, que até os telhados estejam pintados com a cor de sua celebridade. Que surpresa não é então, quando chegamos a essa cidade, desejosos de encontrar o ilustre homem, e precisamos perder tanto tempo perguntando por ele, até encontrá-lo no meio da multidão!”

Quando cozinheiras se encontram, falam sobre seus patrões; quando escritores alemães se encontram, falam sobre seus editores.”

Como amei esse homem até o 18 de Brumário, e ainda lhe fui devotado até a Paz de Campo Formio, mas quando subiu os degraus do trono foi descendo cada vez mais fundo em valor; e poder-se-ia dizer que ele despencou da escada vermelha!”

Börne

(*) “Konstablerwache: praça em Frankfurt, que em 1833 foi tomada por estudantes revolucionários, planejando explodir o Parlamento alemão.”

UM HOMEM & SUAS COISAS: Discurso sobre a Censura

Agora eu tenho a maior preocupação que, na minha estupidez, eu venha [a] escrever além da conta, e tenha que fugir repentinamente – como haverei de empacotar, na correria, todas essas xícaras e o bule? (…) Na pressa eles poderiam se quebrar e, de modo algum, quero deixá-los para trás. Sim, nós homens somos bichos estranhos! O mesmo homem que coloca em jogo a calma e alegria de viver, ou até mesmo a própria vida, para afirmar sua liberdade de expressão, não quer perder algumas xícaras, e se torna um escravo silencioso para preservar um bule de chá. (…) Chego até a acreditar que o vendedor de porcelanas era um agente austríaco, e que Metternich teria me entulhado de louças para me domesticar. Sim, sim, por isso custou tão pouco, por isso aquele homem era tão convincente. Ah! O açucareiro com a felicidade conjugal foi uma isca tão docinha! (…) Quando se usam meios inteligentes contra mim, eu nunca me enraiveço; só a estupidez e a burrice me são insuportáveis.”

Börne

INIMIZADES METAFÍSICAS

Seu rancor contra Goethe talvez também tenha tido um começo local; eu disse começo e não causa; pois ainda que a circunstância de ambos terem nascido em Frankfurt tenha inicialmente atraído a atenção de Börne a Goethe, o ódio que se inflamou dentro dele contra esse homem, e ardeu cada vez mais impetuosamente, foi só a conseqüência necessária de uma diferença arraizada profundamente na natureza de ambos. Aqui não age uma maledicência mesquinha, mas uma repugnância desinteressada que obedece às pulsões inatas, uma disputa que é tão antiga quanto o mundo, que se manifesta em toda a história da humanidade, e que irrompeu com maior nitidez no duelo que o espiritualismo judaico travou contra o prazer de viver helênico, um duelo que ainda não foi decidido, e que talvez nunca termine: o pequeno nazareno odiava o grande grego, que ainda por cima era um deus heleno.”

Eu digo nazarena, para não utilizar o termo <judeu> ou <cristão>, conquanto ambas as expressões sejam sinônimas para mim, e não sejam usadas para definir uma crença mas um temperamento. <Judeus> e <cristãos> são para mim palavras com significados coincidentes, em oposição a <helenos>, nome que tampouco uso para denominar um determinado povo, mas um direcionamento do espírito e um modo de ver, inato e igualmente ensinado. (…) Desse modo, havia helenos em famílias de pregadores alemães, e judeus que nasceram em Atenas e que talvez descendessem de Teseu. A barba não faz o judeu, ou a trança não faz o cristão, poder-se-ia dizer aqui com razão.”

os nazarenos têm, algumas vezes, um certo bom humor saltitante, uma certa vivacidade cômica de esquilo, até amavelmente obstinada, e doce, e também brilhante, mas à qual logo sucede um turvamento do ânimo; falta-lhes a majestade da satisfação que só encontramos nos deuses conscientes.”

* * *

Ah, que alívio! Enfim eu levo

No Hades uma vida boa!

Vou me embebedar do Letes

Pra esquecer minha patroa.”

ROSA VELHA

(…)

Um pelinho piniquento

Na verruga me atrapalha –

Filha, vá para um convento,

Ou te apruma com navalha.”

O cão ainda abana o rabo, mas morde quem lhe estende a mão.”

judaísmo: doença hereditária e milenar”

Será que o Tempo, deus eterno, um dia

Há de livrar-nos da moléstia escura

Que os pais vão transmitindo para os filhos?

E os netos – hão de ter saúde e tino?”

O conteúdo que um poema encarna

Jamais surgiu num estalar de dedos;

Se demiurgos não criam do nada,

Ah, muito menos os mortais aedos.

(…)

Somente pelo esforço do <poeta>

É que matéria é valorizada.”

* * *

SINFONIA “SATÂNICA”

O sr. Adam, pelo que sei, esteve na Noruega, mas duvido que lá algum feiticeiro conhecedor das runas lhe tenha ensinado aquela cristalina melodia, da qual só se ousa tocar 10 variações, existindo uma 11ª que pode provocar um grande malefício: caso tocada, a natureza inteira entra em comoção, os rochedos e montanhas começam a dançar, e as casas dançam e, dentro, as mesas e cadeiras dançam; o avô puxa a avó para dançar; o cachorro, a gata; e até o bebê pula do berço e dança.”

(*) “Gaetano Vestris (1729-1808): bailarino e mímico italiano que fez carreira na França, vindo a ser mestre de dança de Luís XVI; tão célebre em sua época que teria dito: <só existem três grandes homens na Europa – o Rei da Prússia, Voltaire e eu>; vários de seus filhos tornaram-se bailarinos famosos, entre eles o bastardo Auguste Vestris, que herdou do pai o título de <le dieu de la danse>.”

CONTREDENSE

Não posso deixar de mencionar que a igreja cristã, que acolheu em seu regaço todas as artes e tirou proveito delas, não conseguiu, todavia, fazer nada com a dança, descartando e condenando-a. A dança talvez lembrasse por demais os ofícios religiosos dos pagãos, tanto dos pagãos romanos quanto dos germanos e celtas, cujos deuses migraram para aqueles seres élficos aos quais a crença popular atribui uma miraculosa mania de dançar.” “A dança é maldita, como diz uma piedosa canção popular da Bretanha, desde que a filha de Herodias dançou para o iníquo rei que mandou matar João para lhe agradar. <Quando se vê uma dança, acrescenta o cantor, deves pensar na cabeça sanguinolenta do Batista na baixela, e o desejo demoníaco não poderá seduzir a tua alma!> Quando se reflete com maior profundidade sobre a dança na Académie Royale de Musique, ela aparece como uma tentativa de cristianizar essa arte notoriamente pagã, e o balé francês cheira quase à igreja galicana, quando não ao jansenismo, como todas as manifestações artísticas da grande época de Luís XIV. (…) De fato, a forma e a essência do balé francês são castas, mas os olhos das dançarinas fazem ao passo mais pudico um comentário assaz pecaminoso, e seus sorrisos dissolutos estão em permanente contradição com seus pés. Vemos o contrário com as chamadas danças nacionais, que prefiro mil vezes ao balé da grande ópera. As danças nacionais são freqüentemente sensuais em demasia, quase grosseiras em suas formas, como por exemplo a indiana, mas a sagrada seriedade na face dos dançarinos moraliza essas danças e até as eleva a um culto.”

Um grande dançarino não precisa ser virtuoso”

— Vestris, Gaetano

LIBERTÉ DO POPULACHO / in FEMME FATALE

Essa monotonia infindável está começando a me entediar, e não entendo como um homem pode suportá-la por muito tempo. As mulheres, entendo muito bem. Para elas, desfilar a aparência é o essencial. Os preparativos para o baile, a escolha do vestido, o ato de se vestir, de ser penteada, o sorriso da prova frente ao espelho, em resumo, o brilho e a coqueteria lhes são o principal, e lhes proporcionam o mais deleitoso divertimento. Mas para nós, homens, que democraticamente usamos fraques e sapatos negros (os insuportáveis sapatos!), uma soirée é, para nós, apenas uma fonte inesgotável de tédio misturada com alguns copos de leite de amêndoa e suco de framboesa. Da nobre música, eu não quero nem falar.” “Ninguém deseja mais entreter o outro, e esse egoísmo se manifesta também na dança da sociedade atual.”

Nem sei como devo expressar a tristeza que me assola, quando, nos locais públicos de entretenimento, especialmente no período do Carnaval, observo o povo dançando. Uma música estridente, clamorosa e exagerada acompanha uma dança que em maior ou menor grau assemelha-se ao cancã. E ouço aqui a pergunta: o que é o cancã? Deus do céu, como dar ao Allgemeine Zeitung uma definição do cancã?! Ora: o cancã é uma dança que nunca é dançada na fina sociedade, mas tão-somente em danceterias infames, onde aquele que o dança, ou aquela, é invariavelmente preso por um agente policial e conduzido até a porta.”

Heinrich Heine, 1842 [!!]

os dançarinos sabem, através de variados entrechats irônicos e gesticulações exageradas, manifestar seus pensamentos proscritos, e assim o velamento aparece ainda mais indecoroso do que a própria nudez. Em minha opinião, não é de muita serventia à moralidade que o governo intervenha na dança do povo com tanto armamento; o proibido é o que mais docemente atrai, e o sofisticado, não raro espirituoso, subterfúgio à censura tem conseqüências ainda mais funestas do que a brutalidade autorizada. Essa vigilância sobre o prazer popular caracteriza, aliás, a situação das coisas por aqui e mostra o quanto avançaram os franceses na liberdade.”

Eis que os deuses da paixão

Urram, fazem fuzuê

Dentro do meu coração

Pra Rainha Pomaré

Não a tal do Taiti –

Essa já catequizaram –

Digo aquela, tão bonita

E danada de selvagem.

Duas vezes por semana,

No Mabille² a dama empolga

Os seus súditos, dançando

O cancã, também a polca.

Todo passo é majestoso,

Seus requebros, que beleza!

Das canelas ao pescoço,

Cada palmo é uma princesa –

Ela dança – e em comoção,

Deuses fazem fuzuê

Dentro do meu coração,

Pra Rainha Pomaré!”

¹ Codinome da puta-de-luxo e bailarina Élise-Rosita Sergent (1824-46): “ficou célebre pela dança sensual que estreou no Mabille; segundo o escritor e jornalista Alfred Delvau, sua fama declinou subitamente por ter ousado apresentar a polca no teatro do Palais Royal, ocasião em que foi <abominavelmente vaiada> Depois de sua morte, ganhou muitas homenagens póstumas, na forma de poemas e biografias: “morreu de tuberculose, antes de completar os 22 anos de idade. [É A PRÓPRIA: A DAMA DAS CAMÉLIAS!] Seu nome artístico foi emprestado de uma personalidade da época, a rainha taitiana Pomare IV, também conhecida como Aimata (<comedora de olhos>); convertida [do canibalismo] ao cristianismo por missionários protestantes ingleses, entrou em conflito com a França ao recusar o protetorado francês (Guerra Franco-Taitiana, 1844-46); [Fico admirado com os motivos de jardim-de-infância para os conflitos europeus do séc. XIX! Mas não deveria, a essa altura do campeonato!] o nome dinástico Pomare, usado por 5 governantes taitianos, significa <noite de tosse> (po = <noite>, mare = <tosse>), tendo sido adotado pelo unificador e primeiro rei do Taiti, Tarahoi Vairaatoa (1742-1803), em homenagem à filha mais velha, morta de tuberculose.” A arte real copiou a realidade.

² Praça parisiense de onde teria vindo o cancan.

HIPNOSE, HIGH NO(i)SE

Juan de Flandres

Ela dança. E como gira o corpo!

Cada membro se contorce solto!

Esvoaça – o que será que a impele

Desejar se desprender da pele?

Ela dança. E quando se revira

Num pé só, e pára, e enfim respira,

Braços estirados para o chão –

Protegei, ó Deus, minha razão!

Ela dança. A tal coreografia

Que teria a filha de Herodias

Feito para o rei judeu Herodes,

Tanto ardeu nos olhos dela a morte.

Ela dança. Eu fico alucinado!

O que queres em sinal de agrado?

Tu sorris? Soldados, em revista!

Tragam-me a cabeça do Batista!”

Herodias ou Salomé? Capitu traiu?!

O velório foi sem pompa, e acabou antes do horário.”

No cortejo, só teu cão, e o fiel cabeleireiro.”

Ó rainha dos insultos, vomitaram em tua coroa”

* * *

Uma Filosofia da História: impossível na Antiguidade. Somente o tempo de hoje tem materiais para isso: Vico, Herder, Bossuet – Creio que os filósofos ainda terão de esperar mil anos antes que possam comprovar o organismo da história [nem então] – até lá penso que só isso é presumível: por fundamental considero: a natureza humana e as relações (solo, clima, tradições, guerra, necessidades imprevisíveis e incalculáveis), ambas em seu conflito ou aliança contra o fundo da história, encontram sempre a sua assinatura no espírito, e a idéia, pela qual se deixam representar, age novamente como terceiro sobre elas; isso é fundamentalmente o caso nos nossos dias, também na idade média.”

Os mais altos rebentos do espírito alemão: filosofia e canção – O tempo acabou, com ele a calma idílica, a Alemanha foi impelida ao movimento – o pensamento não é mais desinteressado, em seu mundo abstrato despenca a crua circunstância – A locomotiva das estradas de ferro estremece nosso sentimento, e assim nenhuma canção consegue alvorecer; a fumaça escorraça o pássaro canoro e o fedor dos lampiões a gás empesteia a perfumosa noite enluarada.”

Não compreendemos as ruínas antes de nos tornarmos ruínas nós mesmos”

Essa confissão de que o futuro pertence aos comunistas, eu a faço no tom de enorme medo e preocupação, e esse tom, ah!, não é nenhuma máscara! De fato, somente com horror e susto é que penso no tempo em que esses iconoclastas escuros irão tomar o poder: com seus punhos brutos hão de arrebentar as estátuas de mármore do meu mundo de arte tão querido, esfacelar todas aquelas fantásticas quinquilharias que os poetas tanto amam; derrubar o meu bosque de louros e plantar batatas no lugar; os lírios que não fiam nem trabalham e, no entanto, estão vestidos tão belos como o Rei Salomão, hão de ser arrancados do solo da sociedade, se não quiserem pegar na roca; os rouxinóis, cantores inúteis, hão de ser afugentados, e o meu Livro das Canções será usado, ah!, para embrulhar café ou o rapé das velhotas do futuro – Ah! tudo isso eu prevejo, e uma tristeza indizível se apodera de mim quando penso no declínio com o qual os meus poemas e toda a velha ordem do mundo estão ameaçados pelos comunistas” Tem razão, Heinrich Heine! Não precisamos de bosques de louros, só de batatas!

Eu sou cristão – comprova a certidão “Ich bin ein Christ – wie es im Kirchenbuche”

Que Deus vos dane e mande para o inferno! A cortesia eu devo a meus parentes.”

LENDA DE CASTELO

Em Berlim, lá no dossel

De um castelo medieval,

Vê-se dama e um corcel

Em satisfação carnal.

Dizem que a dita seria

A ilustríssima senhora

Mãe da nossa dinastia;

E que a porra¹ inda vigora.

Sim, de fato, o traço humano

Nela mal se faz notar!

Num monarca prussiano

Predomina o cavalar.

A conversação grosseira,

Os relinchos na risada,

Raciocínio de cocheira –

Asno em cada polegada!

Tu, ó mais jovem rebento,²

És o único cristão;

Pelo bom comportamento,

Não serás um garanhão.”

¹ Aqui tem o sentido de arma de tortura medieval.

² Frederico Guilherme IV

Eu frito ovinhos de formiga

Para comermos de manhã;

Depois eu vou herdar, querida,

Punzins-de-freira¹ da mamã.”

¹ Bolinhos-de-chuva

MORFINA

(…)

Dormir é bom – morrer, melhor –, contudo,

O que eu prefiro: nunca ter nascido.”

O DEUS APOLO

(…)

Canta o jovem louro e toca

Lira delicadamente;

Na freirinha a música provoca

Um calor sem precedente.

O sinal da cruz a freira faz;

Um, dois, três sinais da cruz;

O sinal, contudo, é ineficaz

Ao prazer que a dor produz.”

Marguerite Porète, O Espelho das Almas Simples e Aniquiladas (livro de bruxa)

(*) “Mohel: homem judeu habilitado à prática do Brit milah (circuncisão).”

(*) “Livre-espírito: corrente de misticismo radical com tendências anômicas que se disseminou em várias regiões da Europa, entre os séc. XII e XV, englobando os amalricianos, joaquimitas, valdenses e outros, como a Irmandade do Livre-Espírito, surgida na Renânia, Suábia e Países Baixos, no século XIII, e à qual os beguinos foram associados.”

tão bom quanto morrer pela pátria é ser feliz”

DOIS CAVALEIROS

Krapulinski e Maukaratski,

Dois polacos da Polônia,

Lutam contra a tirania

De Moscou com acrimônia.

(…)

Tal qual Pátroclo e Aquiles,

Alexandre e Hefestião,

Eles são grandes amigos,

Trocam beijos de montão!

(…)

Sim, os dois têm muitos trajes,

Um pra cada cerimônia –

Duas calças e camisas

Que trouxeram da Polônia.”

REI DAVI

Déspota – da vida se despede

Rindo, pois bem sabe o que sucede:

O desmando vai trocar de mão,

Não acaba nunca a servidão.”

AGORA AONDE?

(…)

De fato a guerra se acabou,

Mas não as côrtes marciais,

E aquilo que escreveste outrora,

Dizem, não vai deixar-te em paz.

(…)

Entristecido olho pra cima

Acena-me um montão de estrelas;

Contudo eu não encontro a minha,

Em canto algum consigo vê-la.”

O REI MOURO

(…)

Ela diz: <Boabdil el Chico,¹

Alegra-te amado meu,

Que no abismo da desgraça

Já verdeja o teu laurel.

Não somente o coroado

De vitórias triunfante,

Protegido por aquela

Deusa cega, é que obtém

Glória, mas também o filho

Do infortúnio, derrubado

Pela sorte, sobrevive

Para sempre na memória>.”

¹ Apelido do último rei mouro derrotado e expulso pela monarquia espanhola em 1492.

* * *

ROMANCE ZERO

ME INSURJO CONTRA HEGEL, ESSE PAGÃO!

os panteístas na verdade não passam de ateus envergonhados, que temem menos a coisa do que a sombra que ela projeta na parede, do que o nome. (…) só duas formas de governo, a monarquia absolutista e a república, suportam a crítica da razão ou da experiência; deve-se escolher uma delas; toda a mixórdia que há entre as duas é falsa, insustentável e funesta. Do mesmo modo surgiu a concepção na Alemanha de que se deve escolher entre religião e filosofia, entre o dogma revelado da crença e a última conseqüência da razão, entre o absoluto Deus da Bíblia e o ateísmo.

(…) Não brinquei com nenhum simbolismo nem abjurei a minha razão por completo. Não reneguei nada, nem sequer meus velhos deuses pagãos, dos quais me afastei decerto, mas separando-me com amor e amizade.”

MISERÊ

(…)

Mora nas alturas o dinheiro,

Mas adora adulador rasteiro.

(…)

O preço do pão subiu e muito,

Mas abrir a boca inda é gratuito –

Canta, pois, o cão de algum mecenas

Para te entupir de guloseimas!”

O APAGADO

(…)

Aflige-me a preocupação – Demora a tal ressurreição?

(…)

o que mais quer este meu corpo é uma mulher.

Deve ser loira, de olho azul,

Linda e suave como a luz

Da lua – só a duras penas

Agüento o sol dessas morenas.”

EFEMÉRIDE

Missa alguma irão cantar,

Nem Kadisch irão dizer,

Nada dito e nem cantado

Para mim, quando eu morrer.”

Historinhas de polaco

Que escancaram o riso teu,

Toda noite eu te contava

No dialeto dos judeus.”

Preocupação é como bolha de sabão:

o ruim é quando estoura

Mas dá nada, não!

AMIGOS & DINHEIRO

Brilhando o Sol-Felicidade,

As moscas dançam à vontade.

Os meus amigos me elogiam,

Com eles sempre compartilho

A carne boa do churrasco

E até meu último centavo.

Sumiu a sorte e o meu dinheiro

Vai com o amigo derradeiro;

Na escuridão, a moscaria

Não dança mais com alegria;

Foram-se as moscas e amizades

De braços com a felicidade.”

LEGADO

(…)

Cristão eu lego aos inimigos

Dádivas de agradecimento.

Aos meus fiéis opositores

Eu deixo as pragas e doenças,

A minha coleção de dores,

Moléstias e deficiências.

Recebam ainda aquela cólica,

Mordendo feito uma torquês, [fórceps]

Pedras no rim e as hemorróidas,

Que inflamam no final do mês.

As minhas cãibras e gastrite,

Hérnias de disco e convulsões –

Darei de herança tudo aquilo

Que usufruí em diversões.”

O HOMISLOBO

Israel, que a bruxa má

Metamorfoseou em cão.

(…)

Mas na sexta-feira à tarde,

Nos minutos do crepúsculo,

Cai o encanto, e aquele cão

Recupera a humanidade.

(…)

<Meu amado, hoje ninguém

Vai fumar, porque é Schabat>

(…)

[MASTER CHEF BC]

Cholent, divinal centelha

Filha que nasceu no Elísio!

Assim cantaria Schiller,

Se provasse esse petisco.

Cholent é o manjar dos Céus,

Foi o próprio Deus Senhor

Que passou para Moisés

A receita no Sinai [SENAI!]

(…)

Cholent, ambrosia koscher

Do Deus uno e verdadeiro,

É o maná do paraíso,

E, com ele comparado,

É tão só uma porcaria

Dos diabos a ambrosia

Que na Grécia os simulacros

Do Capeta compartilham.”

MIMI [a gata]

(…)

De instrumentos não carecem,

São sua própria viola e flauta,

As narinas são trompetes,

Os bigodes, sua pauta.”

Berlioz, Le soirée de l’orchèstre

(*) “Capriccio: do italiano = <movimento súbito>, <capricho>; provavelmente de capro (<bode>); tipo de composição musical caracterizada por uma certa liberdade de realização.” Caprichou, hein?!

* * *

Enfim, lei. Nunca fui, nem o cargo me consentia ser propagandista da abolição, mas confesso que senti grande prazer quando soube da votação final do Senado e da sanção da Regente. Estava na rua do Ouvidor, onde a agitação era grande e a alegria geral. (…) Ainda bem que acabamos com isto. Era tempo. Embora queimemos todas as leis, decretos e avisos, não poderemos acabar com os atos particulares, escrituras e inventários, nem apagar a instituição da história, ou até da poesia. A poesia falará dela, particularmente naqueles versos de Heine [Navio Negreiro]

Machado de Assis, Memorial de Aires (13-05-1908)

DAS SKLAVENSCHIFF

I

Der Superkargo Mynheer van Koek

Sitzt rechnend in seiner Kajüte;

Er kalkuliert der Ladung Betrag

Und die probabeln Profite.

<Der gummi ist gut, der Pfeffer ist gut,

Dreihundert Säche und Fässer;

Ich habe Goldstaub und Elfenbein –

Die schwarze Ware ist besser.

Sechshundert Neger tausche ich ein

Spottwohlfeil am Senegalflusse.

Das Fleisch ist hart, die Sehnen sind stramm,

Wie Eisen vom besten Gusse.

Ich hab zum Tausche Branntewein,

Glasperlen und Stahlzeug gegeben;

Gewinne daran achthundert Prozent,

Bleibt mir die Hälfte am Leben.

Bleiben mir Neger dreihundert nur

Im Hafen von Rio-Janeiro,

Zahlt dort mir hundert Dukaten per Stück

Das Haus Gonzales Perreiro.>

Da plötzlich wird Mynheer van Koek

Aus seinen Gedanken gerissen;

Der Schiffschirurgius tritt herein,

Der Doktor van der Smissen.

Das ist eine klapperdürre Figur,

Die Nase voll roter Warzen –

<Nun, Wasserfeldscherer>, ruft van Koek,

<Wie geht’s meinen lieben Schwarzen?>

Der Doktor dankt der Nachfrage und spricht:

<Ich bin zu melden gekommen,

Dass heute nacht die Sterblichkeit

Bedeutend zugenommen.

Im Durchschnitt starben täglich zwei,

Doch heute starben sieben,

Vier Männer, drei Frauen – Ich hab den Verlust

Sogleich in die Kladde geschrieben.

Ich inspizierte Leichen genau;

Denn diese Schelme stellen

Sich manchmal tot, damit man sie

Hinabwirft in die Wellen.

Ich nahm den Toten die Eisen ab;

Und wie ich gewöhnlich tue,

Ich liess die Leichen wefen ins Meer

Des Morgens in der Fruhe.

Es schossen alsbald hervor aus der Flut

Haifische, ganze Heere,

Sie lieben so sehr das Negerfleisch;

Das sind meine Pensionäre.

Sie folgten unseres Schiffes Spur,

Seit wir verlassen die Küste;

Die Bestein wittern den Leichengeruch

Mit schnupperndem Frassgelüste.

Es ist possierlich anzusehn,

Wie sie nach den Toten schnappen!

Die fasst den Kopf, die fasst das Bein,

Die andern schlucken die Lappen.

Ist alles verschlungen, dann tummeln sie sich

Vernügt um des Schiffes Planken

Und glotzen mich an, als wollten sie

Sich für das Frühstück bedanken.>

Doch seufzend fällt ihm in die Red’

Van Koek: <Wie kann ich lindern

Das Übel? wie kann ich die Progression

Der Sterblichkeit verhindern?>

Der Doktor erwidert: <Durch eigne Schuld

Sind viele Schwarze gestorben;

Ihr schlechter Odem hat die Luft

Im Schiffsraum so sehr verdorben.

Auch starben viele durch Melancholie,

Dieweil sie sich tödlich langweilen;

Durch etwas Luft, Musik und Tanz

Lässt sich die Krankheit heilen.>

Da ruft van Koek: <Ein guter Rat!

Mein teurer Wasserfeldscherer

Ist klug wie Aristoteles,

Des Alexanders Lehrer.

Der Präsident der Sozietät

Der Tulpenveredlung im Delfte

Ist sehr gescheit, doch hat er nicht

Von Eurem Verstande die Hälfte.

Musik! Musik! Die Schwarzen soll’n

Hier auf dem Verdecke tanzen.

Und wer sich beim Hopsen nicht amüsiert,

Den soll die Peitsche kuranzen.>

II

Hoch aus dem blauen Himmelszelt

Viel tausend Sterne schauen,

Sehnsüchtig glänzend, gross und klug,

Wie Augen von schönone Frauen.

Sie blacken hinunter in das Meer,

Das weithin überzogen

Mit phosphorstrahlendem Purpurduft;

Wollüstig girren die Wogen.

Kein Segel flatter am Sklavenschiff,

Es liegt wie abgetakelt;

Doch schimmern Laternen auf dem Verdeck,

Wo Tanzmusik spektakelt.

Die Fiedel streicht der Steuermann,

Der Koch, der spielt die Flöte,

Ein Schiffsjung’ schlägt die Trommel dazu,

Der Doktor blast die Trompete.

Wohl hundert Neger, Männer und Fraun,

Sie jauchzen und hopsen und kreisen

Wie toll herum; bei jedem Sprung

Takmässig klirren die Eisen.

Sie stampfen den Boden mit tobender Lust,

Und Manche schwarze Schöne

Umschlinge wollüstig den nackten Genoss –

Dazwischen ächzende Töne

Der Büttel ist Maître des plaisirs,

Und hat mit Peitschenhieben

Die lässigen Tanzen stimuliert,

Zum Frohasinn angetrieben.

Und Dideldundei und Schnedderedeng!

Der Lärm lockt aus den Tiefen

Die Ungetüme der Wasserwelt

Die dort blödsinnig schliefen.

Schlaftrunken kommen geschwommen heran

Haifische, viele hundert

Sie glotzen nach dem Schiff hinauf,

Sie sind verdutzt, verwundert.

Sie merken, dass die Frühstückstund’

Noch nicht gekommen, un gähnen,

Aufsperrend den Rachen; die Kiefer sind

Bepflanzt mit Sägezähnen.

Und Dideldundei und Schnedderedeng –

Es nehmen kein Ende die Tänze.

Die Haifische baissen vir Ungeduld

Sich selber in die Schwänze.

Ich glaube, sie lieben nicht die Musik,

Wie viele von ihrem Gelichter.

<Trau keener Bestie, die nicht liebt

Musik!> sagt Albions grosser Dichter.

Und Dideldundei und Schnedderedeng –

Die Tänze nehmen kein Ende.

Am Fockmast steht Mynheer van Koek

Und faltet betend die Händer:

<Un Christi willen verschone, o Herr,

Das Leben der Schwarzen Sünder!

Erzürnten sie dich, so weisst du ja,

Sie sind so dumm wie die Rinder.

Verschone ihr Leben um Christi will’n

Der für uns alle gestorben!

Denn bleiben mir nicht dreihundert Stück,

So ist mein Geschäft verdorben.>

* * *

Eu sei que o mundo está repleto

De vício, ignorância, intriga;

Mas já me acostumei, confesso,

A rastejar nesta pocilga.

A máquina do mundo não

Há de pegar-me pra moer –

Só saio em rara ocasião,

E fico em casa com prazer.

Me deixa aqui! Minha mulher

Tagarelando é um licor;

Nos olhos dela, e onde quer

Que vejo, enxergo só amor.

Saúde e um pouco de dinheiro,

Senhor, é tudo que eu te rogo!

Quero com minha companheira

Viver feliz no status quo!”

Uma esfinge de verdade

Não difere da mulher;

Faz-se de frivolidade

A leoa quando quer.

Escuríssima a charada

Dessa esfinge. Nem o tal

Filho-esposo de Jocasta

Decifrava uma igual.

Mas por sorte, o boudoir

Ignora a própria senha;

Se algum dia adivinhar –

Este mundo se desgrenha.”

DESPEDIDA

(…)

Sei que não foi por descaro

Pelo riso em tua cara;

No teu cérebro as lembranças

Ficam onde não alcanças.

Passar bem! – Nem acreditas

Como dói a despedida.

Deus te conserve a alegria

E a cabeça bem vazia!”

Por que se arrasta miserável

O justo carregando a cruz,

Enquanto, impune, em seu cavalo,

Desfila o ímpio de arcabuz?

De quem é a culpa? Jeová

Talvez ele não seja assim tão forte?

Ou será Ele o responsável

Por todo o nosso azar e sorte?

E perguntamos o porquê,

Até que súbito – afinal –

Nos calam com a pá de cal –

Isto é resposta que se dê?”

RATOS RETIRANTES

(…)

1000 kilômetros se arrastam

Os famintos, sem repasto;

Caminhando sobre espinhos

E através dos torvelinhos.

Enfrentando as serranias,

Mar revolto e calmarias;

Uns se afogam, os demais

Nunca olham para trás.

Com focinhos sorrateiros

Fuçam esses companheiros;

A cabeça é sempre igual –

Corte zero, radical.

São vermelhos, têm horror

Dos que crêem no Criador.

Não batizam filho algum,

E a mulher é um bem comum.

Rataiada epicuréia –

Só pensa em pão com geléia;

E renega, quando come,

A imortalidade do homem.

Rato bárbaro e moderno,

Não há gato nem inferno

Que afugente; e sem sustento,

Quer ruir o fundamento.

Arre! Os ratos retirantes

Não estão nada distantes!

Já se escuta o burburinho

Dos roedores a caminho.

Ai de nós! Eles já estão

Se apinhando no portão!

Vereadores e prefeito

Gesticulam contrafeitos.

Soam alto os campanários;

Fazem fila os voluntários:

Vão lutar pela cidade

E a privada propriedade.

Hoje, as preces, meus diletos,

Não vos salvam, nem decretos

Ou disparos de canhão

Vos garantem proteção.

Com floreios de oratória

Não se enfeita esta história.

Silogismo não engana

Uma esperta ratazana.

Quem tem fome filosofa

Com torresmos e farofa

E, dialética, argumenta:

Carne assada com polenta.

Caladinho, o bacalhau

Fala mais ao radical

Que os discursos do Sr.

Quintiliano ou Mirabeau.”

Terrível mal faz à saúde

A nossa Terra, não te iludas;

Tudo que cresce belo e forte,

Aqui, caminha para a morte.

Serão espectros da loucura,

Que vão subindo nas alturas,

Calados, para engravidar

Com sêmen venenoso o ar?

Flores-meninas que, tão logo

Se desabrocham para o sol

Apaixonado, são colhidas,

Por lâmina cruel, da vida.

Heróis, montados no alazão,

Sucumbem a tiros de canhão;

Assanham-se pela coroa

De louro os sapos na lagoa.

Do que brilhava com orgulho

Hoje nem sombra nem barulho;

Em desespero, o gênio parte

Ao meio a lira de sua arte.

Estrelas é que são espertas!

Da Terra nunca chegam perto;

Ocultas em lugar seguro,

Brilham incólumes no escuro.

Felicidade e calmaria

Elas jamais arriscariam,

Para compartilhar conosco

Miséria e todo esse desgosto –”

Pra qualquer lugar do mundo

Que fores, no âmago profundo,

Jaz meu espírito zelota,

Em sonhos, dando cambalhota.

Escutas esta melodia?

Ele é quem toca! – E, de alegria,

Uma pulguinha, em teu decote,

Rebola e dá muito pinote.”

A FLOR DE LÓTUS

Sim, nós dois somos deveras

Um casal muito esquisito;

A mulher é ruim das pernas,

Seu amante é paralítico.

Uma gata que lamenta,

Um doente pra cachorro;

Assim pelo que aparenta

Ambos têm juízo torto.

Ela pôs em sua cabeça

Que é uma flor nenúfar-branca;

Pálido, seu homem pensa

Ser lunífera carranca.

Nas idéias se contentam,

Mas em tudo o que se apraz

Entre a alma e a vestimenta

Vão ficando para trás!

No luar, a flor de lótus

Desabrocha – mas que pena –

Ao invés de um jorro forte

E vital, dão-lhe um poema!”

Sim, temo que te prejudique,

Minha criança delicada,

Tu disputares a largada

Do Grande Prêmio de Afrodite.

Concordo que seja melhor

Tu escolheres um sujeito

Doente para amante, feito

Eu que somente inspiro dó.”

* * *

Depois de ter desferido os golpes mais mortais no significado da poesia romântica na Alemanha, de novo penetrou em mim uma nostalgia infinita pela flor azul na terra encantada do romantismo, e agarrei o alaúde enfeitiçado e cantei uma canção, na qual me entreguei a todos os amáveis exageros, a toda enluarada embriaguez, a toda florescente loucura de rouxinol que tanto amei outrora. Eu sei, foi <o último canto silvestre livre do romantismo>, e fui seu último poeta: comigo se encerra a velha escola lírica dos alemães, enquanto, ao mesmo tempo, a nova escola, a poesia moderna alemã, era por mim inaugurada. Essa dupla relevância há de me ser reconhecida pelos historiadores literários da Alemanha.

Confissões, 1854.”

POEMA-SÍNTESE

No sonho de uma noite de verão,

Onde, ao luar, em branca decadência,

Viam-se os restos – a recordação

Dos tempos de esplendor da Renascença,

(…)

O tempo – ai! – a sífilis pior –

Roubou-lhes a elegância do nariz.

Deitado num sarcófago de mármore,

Intacto, a destacar-se entre as ruínas,

Vê-se, não menos íntegro, o cadáver

De um homem com feições alexandrinas –

(…)

Todo o fulgor do Olimpo em uma leva

De deuses, na tertúlia costumeira;

E, próximo, o casal Adão e Eva –

Pudicos, com folhinhas de figueira.

Ali se via Tróia incendiada,

Helena, Páris e também Heitor;

Judite e Holofernes (sem a espada),

Aarão junto a Moisés, Libertador.

(…)

Ao lado, vinha o burro de Balaão

(A besta que falava maravilhas),

Também se via a prova de Abraão,

E Lot embriagado pelas filhas.

Dava pra ver a dança de Herodias

E a fronte do Batista na bandeja;

O inferno, o Demo e, bem nas cercanias,

A <Pedra> que sustenta a Santa Igreja.

Viam-se ali, talhados com buril,

As artimanhas do deus Jove, o tal

Que como cisne a Leda seduziu,

E a Dânae, como chuva de metal.

Diana, junto às ninfas, no mister

Da caça, e cães dilacerando o intruso;

Hércules, travestido de mulher,

Trabalha com a roca, lãs e o fuso.

Não longe, na montanha do Sinai,

Vê-se Israel entre os rebanhos seus;

No templo, o Deus menino é que se sai

Melhor ao discutir com fariseus.

Contrários justapostos numa pedra:

Da Hélade, o prazer; e da Judéia,

A idéia-Deus! E os dois a hera enreda

Nos arabescos da verdosa teia.

Sublime! Enquanto olhava com espanto

O monumento, em sonho, me dei conta

Que o morto, no sarcófago, era um tanto

Familiar – sou eu que ali desponta!

E em frente ao túmulo, deu na veneta

De enraizar-se flor muito esquisita

(Pétalas cor de enxofre e violeta)

Que de um amor indômito palpita.

O povo a nomeou flor da paixão,

E crê que lá no Gólgota nasceu,

Quando morreu na cruz, pra salvação

Do mundo, o filho único de Deus.

Dizem que a planta dá um testemunho

De sangue, e aquela ferramentaria,

Que sói o algoz usar de próprio punho,

No cálice da flor se enxergaria.

Sim, todos os petrechos da Paixão

Estavam lá – a sala de tortura

Chibata, espinhos pra coroação,

Martelo, pregos e a madeira dura.

A flor cresceu defronte ao mausoléu,

E sobre o meu cadáver se recurva –

Calada, me envolveu no escuro véu,

Me beija, e chora feito uma viúva.

(…)

Não nos falamos, mas meu coração

Ouviu o que calaste – para o amor,

Silêncio é um puro e vívido botão;

Na fala, a língua fica sem pudor.

Ah, como o tal silêncio é linguarudo!

E nada de metáfora gongórica [afetada]

Sem folhas de figueira, ele diz tudo,

Sem métrica e figuras de retórica.

Diálogo insonoro! E quem diria

Que, nesse lero-lero silencioso,

As horas se entretêm na fantasia

Urdida em fios de arrepio e gozo?

O que falamos? Que pergunta estéril!

No escuro, o que discursa um pirilampo?

O riacho, o que murmura sempre sério?

O que sussurra a brisa pelo campo?

Pepitas, o que falam na batéia?

Acaso exala a rosa algum assunto?

Assim, não se pergunte o que proseia,

Ao plenilúnio, a flor com seu defunto!

(…)

Na pedra, assombra a antiga briga hirsuta

De crenças, entre soco e pontapés? –

Agreste, o grito do deus Pã disputa

A láurea contra a Bíblia de Moisés.

A luta não tem fim, pois, na verdade,

O vero odeia o belo e, mais ou menos,

Sempre estará cindida a humanidade

Em dois partidos – bárbaros e helenos.

Mas como os termos de baixo calão

Se esgotam antes do que os desatinos,

Zurrou sozinho o burro de Balaão,

Sobrepujando os santos e divinos!

Ó, como dói – i, ó! – i, ó! – o ouvido!

Quase me deixa doido a horrível grei

De ornejos desse bicho empedernido –

Por fim, soltei um grito – e despertei.”

* * *

ESBOÇOS DE UMA BIOGRAFIA

(*) “Os cerca de 200 judeus de Düsseldorf gozavam o privilégio de viver numa das poucas cidades alemãs onde não eram confinados em gueto. Através da ocupação francesa, seriam ainda beneficiados com a emancipação – anulada, no entanto, quando o Ducado de Berg passou à jurisdição da Prússia, em 1815.”

(*) “Freqüentaria em seguida o liceu preparatório para o renomado Ginásio de Düsseldorf – com muitos clérigos franceses no corpo docente –, onde veio a estudar de 1810 a 1814, aprendendo francês com o severo abade Jean Baptiste Daulnoy [talvez venha daí sua obsessão pela <cabeça do Batista>!], cujas aulas de métrica e prosódia o deixariam para sempre traumatizado:

<Negou-me qualquer sentido para a poesia, e me chamava de bárbaro da Floresta de Teutoburgo. […] Era um refinamento de crueldade que ultrapassava até as torturas da Paixão do Messias, e que nem mesmo ele teria tolerado impassível. Deus me perdoe – eu praguejei contra Deus, contra o mundo, contra os opressores estrangeiros que queriam nos impingir a sua métrica, e por pouco não me tornei um devorador de franceses. Eu teria morrido pela França, mas fazer versos em francês nunca mais!>

Betty Heine, imaginando para o filho uma carreira de grande financista, na esteira dos Rothschild de Frankfurt, planejava seus estudos meticulosamente, fazendo-o aprender <outros idiomas, especialmente inglês, geografia, contabilidade> e até filosofia kantiana, o que lhe rendeu uma repressão do pai:

<Tua mãe te faz estudar Filosofia com o reitor Schallmeyer. Isso é coisa dela. Eu, de minha parte, não gosto de Filosofia, pois é mera superstição, e sou um comerciante, preciso de minha cabeça para os negócios. Podes filosofar o quanto quiseres, mas peço que não fales em público aquilo que pensas, pois irias me prejudicar os negócios, caso meus clientes soubessem que tenho um filho que não crê em Deus; os judeus, principalmente, não comprariam mais velveteens de mim, e são pessoas honestas, pagam pontualmente e também têm o direito de manter a religião. Sou teu pai e, portanto, mais velho do que tu, e mais experiente; assim deves crer em mim quando digo que o ateísmo é um grande pecado.>

(*) “o bloqueio marítimo contra a Inglaterra prejudicou seriamente os negócios do pai Samson Heine. Antes mesmo de receber o certificado de conclusão do colégio, Harry foi enviado à Escola Comercial de Vahrenkampf e, em seguida, a Frankfurt, para ingressar na atividade mercantil. Não tendo, contudo, despertado o interesse do primeiro empregador, os pais resolveram confiá-lo ao mais bem-sucedido membro da família, o banqueiro Salomon Heine, em Hamburgo.” “Após a derrota definitiva de Bonaparte em Waterloo, a Santa Aliança entre as monarquias da Rússia, Áustria e Prússia, sob a regência do príncipe von Metternich, blindava o continente contra possíveis rasgos liberais. No Congresso de Viena, em 1815, havia sido criada a Confederação Alemã, composta por 39 Estados, sob a hegemonia dos impérios austríaco e prussiano. § Salomon Heine não custou a perceber a inaptidão do sobrinho para os negócios.”

(*) “Como se não bastasse a inépcia empresarial, Harry ainda inventou de se apaixonar pela prima Amália – um amor não-correspondido, mas que estimulou o tio a bancar-lhe o estudo de Direito para bem longe do lugar. [!] Em setembro de 1819, dirigiu-se a Bonn, onde deu início a um tumultuado período universitário, que incluiu a Universidade de Göttingen – onde envolveu-se num duelo, acabando suspenso por um semestre e expulso da cidade – e a Universidade de Berlim.”

(*) “O ano de 1819 foi especialmente traumático na vida de Heine: seu pai entrou em bancarrota e a Alemanha foi varrida pela primeira onda de violência antissemita da Era Moderna – as <Arruaças Hep! Hep!> –, que, iniciadas em Würzburg por estudantes e artesãos, se espalharam rapidamente pela Confederação Germânica, atingindo a Holanda, Dinamarca e Finlândia. [nunca a Suíça!]

(*) “O movimento romântico, em que pesem as exceções, descambou para a nostalgia medieval e o reacionarismo místico. Friedrich von Schlegel, um dos mais arrojados e criativos do grupo de Iena, converteu-se ao catolicismo em 1808, mudando-se para Viena, onde passou a redigir memorandos para o príncipe von Metternich. (…) E ainda que o septuagenário Goethe surpreendesse com o erotismo de seu Divã Ocidento-oriental, era todavia, alvo crescente do moralismo biedermeier e dos ataques das jovens gerações, ressentidas com seu alheamento político.” TRISTE FIM, E NADA DE QUARESMA.

(*) “Freqüentou o curso Filosofia da História do Mundo, de Hegel, o mais influente pensador da época, com quem teria contato pessoal; instruiu-se da Antiguidade Clássica com o renomado filólogo Friedrich August Wolf, e assistiu às aulas do jovem lingüista Franz Bopp sobre a poesia indiana, tão em voga nessa época.”

(*) “No ano seguinte, recebeu finalmente o título de Doctor Juris, e tomou uma decisão da qual logo se arrependeria: tornar-se cristão no intuito de ampliar seu leque de opções profissionais. Foi batizado por um pastor evangélico em 28 de junho de 1825, recebendo o nome de Christian Johann Heinrich Heine, nome que jamais divulgou – nem sequer parcialmente – ou permitiu que publicassem, continuando a assinar somente <H. Heine>. O <bilhete de entrada na cultura européia>, como definiu a certidão de batismo, mostrou-se- inútil. Em carta a Moses Moser, desabafou:

<Agora sou odiado por cristãos e judeus. Muito me arrependo de ter me batizado; não vejo no que isso me beneficiou; pelo contrário, desde então só tenho azar – Mas cala-te, és demasiadamente esclarecido para não sorrires disso.>

(*) “Publicado em 1827, o Livro das Canções levaria, no entanto, alguns anos para atingir a enorme popularidade que faria Walter Benjamin considerá-lo um dos 3 últimos livros de poesia a ter impacto no Ocidente, ao lado do Ossian (1765), de MacPherson, e das Flores do Mal (1857), de Baudelaire. Um êxito ainda mais abrangente devido às melodias de Schubert, Schumann, Mendelsohn, Brahms, Grieg, Hugo Wolf, Silcher e tantos outros, que fizeram de Heine um capítulo à parte da história da música: estima-se em cerca de 10 mil as composições feitas a partir de seus poemas, extraídos principalmente da sua primeira e mais famosa coletânea; somente o <Du bist wie eine Blume> viria a ser musicado 451 vezes.” “A capital conservadora e católica Baviera não era o local mais adequado para um judeu com a pecha de jacobino e ateu. Ainda assim, Heine alimentava a esperança de ser nomeado professor extraordinário na Universidade de Munique, por intermédio de seu conterrâneo Eduard von Schenk, então ministro da Cultura, no governo do rei Ludwig I. Em Munique, ele receberia a visita de um jovem admirador, o desconhecido Robert Schumann, então com 18 anos, que mais tarde iria musicar 46 de seus poemas, destacando-se especialmente no ciclo Dichterliebe Op. 48, sobre 16 poemas do <Intermezzo Lírico>.”

(*) “Este, já informado de que não seria nomeado professor em Munique, e interpretando a afronta como parte da conspiração católico-conservadora que abortou sua carreira acadêmica, respondeu, em <Os Banhos de Lucca>, com uma desmontagem arrasadora da poesia e caráter de seu oponente, fazendo ainda alusões – o que ultrapassava em muito as raias do tolerável na época – à homossexualidade de Platen. O escândalo foi gigantesco!

<Depois de uma batalha eu sou a placidez em pessoa, como Napoleão, que sempre se comovia quando, depois da vitória, cavalgava pelo campo de batalha. O pobre Platen! C’est la guerre! Não valia nenhum torneio de zombarias, mas sim a guerra de destruição em massa [isso já existia?]; e apesar de toda a ponderação ainda não posso vislumbrar as conseqüências do meu livro.>

E estas não tardaram, desfavoráveis a ambos. O conde von Platen, coberto de vergonha, buscou refúgio na Itália, onde, em 1835, viria a falecer envenenado numa desastrada automedicação, após escapar a uma epidemia de cólera em Nápoles, onde havia se radicado, inspirando mais tarde o personagem Gustav von Aschenbach, da novela Morte em Veneza de Thomas Mann – escritor, aliás, que admirava os dois poetas. Heine, por sua vez, perdeu vários amigos na polêmica, vendo se fecharem as últimas portas que lhe restavam na Alemanha, o que apressaria a sua ida para a França.”

Em Paris, freqüentou a casa do poderoso barão James de Rothschild, banqueiro que estabilizou as finanças do governo de Luís Filipe, e inspirou a célebre frase de Heine: <Pois o Dinheiro é o Deus do nosso tempo e Rothschild é seu profeta>.”

(*) “No meio musical, conviveu, entre outros, com Rossini, Franz Liszt, Giacomo Meyerbeer, Hector Berlioz e Frédéric Chopin – a quem chamou de <poeta do som>. Em Paris, daria acolhida ao jovem Richard Wagner, que se inspirou em obras suas para escrever o argumento de duas de suas óperas – O Navio Fantasma e Tannhäuser –, uma dívida que fez questão de omitir, quando já era o autor declarado do libelo O Judaísmo na Música, publicado anonimamente em 1850, onde afirmava, entre outras, que o judeu não é capaz, <quer por sua aparência externa, quer por sua linguagem, e muito menos por sua canção, de se comunicar artisticamente conosco>.”

Na arte eu sou supernaturalista. Creio que o artista não pode descobrir todos os seus tipos na natureza, mas que os mais notáveis lhe são revelados, por assim dizer, na alma, como simbólica inata de idéias inatas. Um esteta recente (Carl Friedrich von Rumohr), que escreveu Investigações Italianas, tentou fazer o velho princípio da Imitação da Natureza de novo plausível, ao afirmar: o artista plástico deveria encontrar seus tipos na natureza. Esse esteta, ao erigir uma tal premissa maior para as artes plásticas, não pensou em uma das mais primordiais, ou seja, a arquitetura, cujos tipos imaginamos retroativamente nas ramagens da floresta e nas grutas do penhasco, mas que decerto não encontramos lá primeiramente. Não achavam-se na natureza exterior, mas na alma humana.”

André Breton, Manifesto Surrealista

(*) “Não era o único a escrever sobre os acontecimentos políticos e sociais da França para o público alemão. A dura repressão que se seguiu às revoluções malogradas nos territórios da Confederação Germânica, Itália e Polônia, principalmente, levou milhares de refugiados políticos a Paris, contribuindo para o incremento populacional da cidade, que logo atingiria a cifra de 900 mil habitantes. A porcentagem de alemães não era inexpressiva: calcula-se que pelo menos 60 mil vivessem na metrópole francesa, muitos dos quais conspirando por uma revolução republicana em seu país de origem.”

(*) “Heine jamais revidou publicamente as agressões, o que só fez aumentar o rancor de seu adversário. Após a morte de Börne, em 1837, o poeta dedicou um livro inteiro para um balanço final, onde esmiuçou, com a irreverência costumeira, os pontos de vista, fazendo uma defesa enfática da autonomia da arte, e onde lançou a sua famosa distinção dos homens em <helenos> e <nazarenos>, que seria mais tarde aproveitada por Friedrich Nietzsche.”

(*) “O acerto de contas com Strauss, ocorrido em Paris, no dia 7 de setembro de 1841, não teria, porém, sérias conseqüências para Heine: saiu-se com um tiro de raspão na coxa e casado na igreja católica de Saint-Sulpice com Augustine Crescence Mirat, a bela jovem grisette [jovem sedutora de classe baixa] que ele havia conhecido na Passage de Panoramas, em 1834. Vivia com ela, desde então, num relacionamento ardente e conturbado que ele resolveu oficializar, uma semana antes do duelo, para assegurá-la financeiramente, na eventualidade de sua morte.” “Crescence era uma mulher simplória, temperamental, gastadeira e sem a menor vocação doméstica – um <Vesúvio [desastre] do lar>, segundo Heine. O poeta, que não suportava seu nome verdadeiro, a chamava de Mathilde, para os alemães, e Juliette, para os franceses. Ela não desconfiava da ascendência judaica do companheiro e nem tinha noção exata de sua fama literária, o que era motivo de riso por parte dos amigos de Heine, mas muito o enternecia: <Ela me ama da forma mais pessoal, e a crítica não tem nada a ver com isso!>. Seu inseparável bichinho de estimação, o papagaio Cocotte, era alvo constante do ciúme e irritação de Heine, que, sofrendo de hipersensibilidade auditiva, chegou a atentar contra a vida do pássaro, para em seguida lhe comprar outro. Mathilde sobreviveria ao marido em 27 anos, vindo a falecer, sem nunca ter casado novamente, em 1883, no dia da morte do marido, e rodeada por 60 papagaios.”

Sobre Madame de Staël, De l’Allemagne (1813): “Esse livro sempre me causou impressão um tanto cômica quanto irritante. Aí vejo uma mulher apaixonada com toda a sua turbulência, vejo como esse furacão de saias assola nossa tranqüila Alemanha, como em todo lugar exclama encantada: que silêncio refrescante me envolve aqui! Ela estava queimando na França e veio à Alemanha para se refrescar entre nós. O hálito casto de nossos poetas fez-lhe tão bem nos seios ardentes e ensolarados! Observou nossos filósofos como se fossem diferentes sabores de sorvete, e lambeu Kant como um sorvete de baunilha, Fichte como um de pistache, Schelling como um de arlequim! […] A boa dama viu em nós apenas o que queria ver: uma enevoada terra de espíritos, onde homens incorpóreos, pura virtude, vagueiam por campos nevados, divagando sobre ética e metafísica!”

(*) “No ano seguinte, publicaria na mesma revista, <Da Alemanha desde Lutero>, oferecendo um panorama do pensamento alemão até Hegel, no que é, provavelmente, a mais saborosa e instigante obra de vulgarização filosófica já escrita.” “O momento era mais do que oportuno para um balanço geral: Goethe, o Júpiter das Letras alemãs, havia morrido em março de 1832, pedindo <mais luz!>; e <o grande Hegel, o maior filósofo que a Alemanha produziu desde Leibniz>, 3 meses antes, numa epidemia de cólera, suspirando desconsolado – <só um homem me entendeu, e mesmo ele, não>.

Heine, que havia previsto com alguns anos de antecedência o fim de um período das artes, reafirmou sua posição, partindo para um violento ataque contra a Escola Romântica de seu antigo mestre August von Schlegel. Ele, que havia se arrependido do batismo em 1825, declarava-se então – tal como o faria mais tarde o judeu Ossip Mandelstam – programaticamente <protestante>, frisando que a Revolução era <a grande filha da Reforma>. Numa época em que o gosto por temas medievais havia tornado chic a conversão ao catolicismo, e até impulsionava tentativas de se reverter a secularização do Estado francês, Heine apontava as diferenças fundamentais por trás da atitude romântica em cada um dos lados do Reno:

<A maioria olhou para os túmulos do passado tão-só no intuito de escolher uma fantasia interessante para o carnaval. A moda do gótico, na França, não passou justamente de uma moda, servindo apenas para aumentar o gozo do presente. Deixava-se ondular os cabelos medievalmente compridos, e na mais furtiva observação do barbeiro de que não combinavam com a roupa, mandava-se cortá-los curtos, com todas as idéias medievais que lhe estavam atreladas. Ah! na Alemanha é diferente. Talvez porque lá a Idade Média não está, como entre vós, totalmente morta e apodrecida. A Idade Média alemã não jaz assassinada na cova, mas é reavivada de vez em quando por um fantasma perverso, e adentra em nosso meio à luz do dia, e suga a vida vermelha de nosso peito… Ah! não vedes como a Alemanha é tão pálida e triste? Especialmente a juventude alemã, que até [há] pouco tempo vibrava de entusiasmo? (…) o povo alemão é ele próprio aquele erudito doutor Fausto, é ele próprio aquele espiritualista que através do espírito compreendeu a insuficiência do espírito e clama por prazeres materiais e devolve à carne os seus direitos (…) Por pouco não me dirijo a ele [Goethe] em grego; mas quando percebi que ele compreendia o alemão, contei-lhe – em alemão – que as ameixas no caminho entre Iena e Weimar eram muito saborosas. Logo eu que durante tantas noites de inverno havia remoído o que dizer de sublime e profundo a Goethe quando o visse. E quando finalmente o vi, disse-lhe que as ameixas da Saxônia eram muito saborosas. E Goethe sorriu. Sorriu com os mesmos lábios com os quais beijara outrora Leda, Europa, Dânae, Semele e tantas outras princesas ou ninfas comuns – Les dieux s’en vont. Goethe está morto. (…) o brilho rosa na poesia de Novalis não é a cor da saúde mas da tísica (…) a incandescência púrpura nas ‘peças fantásticas’ de Hoffmann não é a chama do gênio mas da febre (…) a poesia não seria talvez uma doença dos homens, como a pérola, que no fundo não passa da matéria mórbida da qual a pobre ostra padece?>

Nós medimos a terra, pesamos as forças da natureza, calculamos os meios da indústria, e eis que descobrimos que este mundo é grande o bastante; que ele oferece a todos espaço suficiente para cada um construir a cabana de sua felicidade; que este mundo pode alimentar a todos nós adequadamente, se todos trabalharmos, e uns não quiserem viver às custas dos outros; e que não precisamos encaminhar as classes mais populares e pobres para o Céu.”

Que os saint-simonistas se retirem talvez seja muito útil à doutrina. Ela cairá em mãos mais sábias. Especialmente a parte política, a teoria da propriedade, que haverá de ser melhor (sic) elaborada. No que me toca, eu só me interesso mesmo pelas idéias religiosas, que só precisam ser pronunciadas para mais cedo ou mais tarde entrarem na vida.”

<Grandes filósofos alemães, que por acaso lancem o olhar sobre estas folhas, irão dar de ombros elegantemente acerca da forma miserável de tudo o que dou a público aqui. Mas queiram eles levar em conta que o pouco que digo é completamente claro e inteligível, enquanto as suas obras, ainda que tão fundamentadas, incomensuravelmente fundamentadas, tão profundas, estupendamente profundas, são incompreensíveis. Do que vale ao povo o celeiro para o qual não tem a chave? O povo está faminto de saber, e agradece o pedacinho de pão do espírito que partilho com ele honestamente.>

A dissertação trouxe algumas das passagens mais brilhantes do humor heineano, sem ofuscar, todavia, o embasamento teórico e a pertinência de seus argumentos acerca da igreja católica, Reforma, Lutero, Descartes, Locke, Leibniz, Spinoza, Molière, Voltaire, Lessing, Kant, Goethe, Fichte, Schelling e Hegel; idéias que são ainda capazes não só de instruir e entreter o leitor contemporâneo como também de surprendê-lo (sic) através de sua agudeza e originalidade, fazendo-o lamentar que o autor não tenha vivido para discorrer sobre Nietzsche, Heidegger, Wittgenstein, Adorno e Walter Benjamin:

<Lutero não compreendeu que a idéia do cristianismo, a negação da sensualidade, era por demais contrária à natureza humana para ser totalmente realizável na vida; não compreendeu que o catolicismo era, por assim dizer, uma concordata entre Deus e o Diabo, ou seja, entre espírito e matéria, através da qual a monarquia absoluta do espírito era proclamada em teoria, mas a matéria colocada em posição de exercer na prática todos os seus direitos anulados.>

Lutero criou a língua alemã. Isso aconteceu quando traduziu a Bíblia.”

Purusha irá de novo se casar com Prakriti. Foi através de sua violenta separação, tão engenhosamente narrada no mito indiano, que surgiu o grande dilaceramento do mundo, o mal.”

Não lutamos pelos direitos humanos do povo, mas pelos direitos divinos do homem. Nisso, e ainda em algumas outras coisas, nos distinguimos dos homens da Revolução. (…) Reivindicais trajes simples, costumes abnegados e prazeres sem tempero; nós, pelo contrário, reivindicamos néctar e ambrosia, mantos púrpuras (sic), perfumes caros, volúpia e esplendor, dança sorridente de ninfas, música e comédias.”

No momento em que uma religião requer ajuda da filosofia, seu declínio é inevitável. Ela busca defender-se e vai tagarelando cada vez mais fundo na ruína. A religião, como todo absolutismo, não deve se justificar. Prometeu é acorrentado no rochedo por uma violência calada.”

Ainda que Immanuel Kant, esse grande destruidor no reino dos pensamentos, tenha superado em muito a Maximilian Robespierre no terrorismo, ele compartilha algumas semelhanças com este, o que nos obriga a uma comparação dos dois homens. Primeiro, encontramos em ambos aquela honestidade inclemente, cortante, sóbria e sem poesia. (…) No mais alto grau, porém, mostra-se em ambos o tipo pequeno-burguês – a natureza os destinara a pesar café e açúcar, mas o destino quis que pesassem outras coisas, e colocou, na balança de um, um rei, e, na do outro, um Deus… E eles deram o peso correto!”

Devido à secura de suas abstrações, a filosofia kantiana foi muito prejudicial às belas-artes e letras. Por sorte, ela não se intrometeu na gastronomia.”

É uma circunstância característica, que a filosofia de Fichte tenha sofrido sempre com a sátira. Vi certa vez uma caricatura que representava um ganso fichteano. Ele tinha um fígado tão grande que já não sabia mais se ele era ganso ou fígado. Na barriga estava escrito: Eu = Eu.”

A filosofia alemã é um assunto importante e que diz respeito a toda a humanidade, e só as gerações futuras poderão decidir se haveremos de ser criticados ou louvados por termos elaborado nossa filosofia primeiro do que nossa Revolução. Parece-me que um povo metódico como o nosso precisava começar pela Reforma, e só a partir daí ocupar-se com a filosofia; e somente depois da consumação desta última, passar para a Revolução política. [grande falha!] Acho a ordem bastante razoável. As cabeças, que a filosofia usou para raciocinar, a Revolução poderá depois decepar para o que bem entender. Mas a filosofia jamais poderia ter, se a Revolução tivesse precedido, usado as cabeças que esta decepou.”

O pensamento vai à frente da ação, como o raio do trovão. O trovão alemão é sem dúvida alemão e não muito ágil, e vem se formando devagar; mas ele virá, e quando vós o escutardes troar, como nunca antes troou na história do mundo, sabereis então que ele finalmente atingiu o seu alvo. […] Um drama há de ser encenado na Alemanha que fará a Revolução Francesa parecer um idílio inofensivo.”

<Eu recomendo-lhe essa obra porque contém a quintessência das intenções e esperanças da bagagem com a qual nos ocupamos. Ao mesmo tempo, o produto heineano é uma obra-prima em relação ao estilo e descrição. Heine é a grande cabeça entre os conspiradores.>

Clemens von Metternich

(…) As medidas, contudo, não deixariam de afetar financeiramente o poeta, que, vivendo com uma coquete nada parcimoniosa, e com problemas de saúde cada vez mais constantes, se viu forçado a recorrer à ajuda <familionária> do tio, para usarmos aqui uma de suas palavras-valise; aquela que Fraud dissecou em O chiste e sua relação com o inconsciente. Graças à intercessão de seu irmão Maximilian e do compositor Giacomo Meyerbeer, passou a receber uma pensão de Salomon Heine em 1839.”

Tranqüilizai-vos, jamais entregarei o Reino aos franceses, pelo simples motivo de que o Reno me pertence.”

(*) “Em maio de 1842, a cidade de Hamburgo foi devastada durante 4 dias por um terrível incêndio que destruiu 1/3 do centro antigo, cerca de 1200 prédios, deixando mais de 20 mil pessoas desabrigadas. A catástrofe consumiu todos os documentos relativos à infância e adolescência de Heine (…) A viagem transcorreu sem incidentes, apesar das seqüelas que a doença já lhe trouxera: estava cego de um olho e com dificuldades para andar.”

(*) “O poeta não errou em seu prognóstico: o épico-satírico Alemanha. Um Conto de Inverno é hoje considerado o ápice da poesia política alemã da primeira metade do séc. XIX.”

De tudo, em pessoas, que aqui eu deixo, a herança heineana é a que mais me aflige. Como gostaria de colocá-lo em minha bagagem.”

Marx

(*) “Atribulações bem maiores vieram com a morte de Salomon Heine, naquele mesmo ano: o patriarca partiu sem mencionar em testamento a pensão do sobrinho. As discussões de Heine com o primo Carl Heine azedaram-se depressa, devido às condições inaceitáveis que este impôs para prosseguir no pagamento. O compositor Meyerbeer foi mais uma vez chamado a interceder, e até o jovem advogado Ferdinand Lassalle, futuro fundador da Social-Democracia alemã, atuaria nessa controvérsia familiar que durou até o início de 1847, contribuindo bastante para piorar o já debilitado estado de saúde do poeta.

Muito se tem discutido sobre a natureza da enfermidade que começou a atormentá-lo desde a juventude. O diagnóstico da época, e que o poeta transformaria num expressivo topos poético em sua obra tardia, apontou inequìvocamente para a sífilis. Especialistas posteriores aventaram, sem que nunca se descartasse a doença venérea, outras hipóteses, como tuberculose com subseqüente meningoencefalite, esclerose múltipla, polioencefalite crônica, porfiria aguda intermitente, e até envenenamento por chumbo.” Curioso paralelo com o prontuário de Nie.

O grande Aristófanes do universo, o Aristófanes do Céu, quis demonstrar com toda clareza ao pequeno terráqueo chamado de Aristófanes alemão, como os mais divertidos sarcasmos deste não passam de gracejos sofríveis em comparação com os seus, e o quão deploràvelmente atrás devo ficar, no humor, na zombaria colossal.”

O Deus dileto, que me tortura tão cruel[mente], hei de denunciar à Sociedade Protetora dos Animais.”

(*) “Prostrado numa pilha de colchões, forçado a levantar com o dedo a pálpebra do único olho que lhe restara, recebendo doses cada vez mais fortes de morfina para suportar as dores, continuou a trabalhar incansàvelmente, com o auxílio de secretários, revisando traduções de suas obras, escrevendo cartas, recebendo visitas do mundo inteiro, e, principalmente, compondo os poemas que integrariam sua terceira e mais densa coletânea de poesia – Romanzero –, publicada em 1851. Dividida em 3 livros – <Histórias>, <Lamentações> e <Melodias Hebraicas> –, a obra reunia poemas predominantemente longos, onde a temática judaica se sobressaía ao lado de uma variedade impressionante de cenários, períodos e personagens históricos – o Egito antigo, a Pérsia clássica, a Índia dos marajás, a Paris das grisettes, Hernan Cortez, Montezuma, a Alemanha medieval, Ricardo Coração de Leão, a Espanha da Reconquista, os poetas Firdusi e Jaufre Rudels, exilados poloneses etc.”

(*) “As notícias de que o poeta estaria à beira da morte e as especulações em torno de sua <conversão> ajudaram a alavancar a vendagem do livro, que em apenas 2 meses esgotou 4 edições.”

Não estou cego, infelizmente, como os pais costumam estar para com seus amados pimpolhos. Conheço muito bem os seus defeitos. Meus novos poemas não têm a perfeição artística, nem a intelectualidade interior, nem a força ondulante de meus poemas antigos, mas as matérias são mais atrativas, mais coloridas, e talvez o tratamento também os faça mais acessíveis às multidões, o que poderá proporcionar-lhes sucesso e popularidade duradoura.”

(*) “Em seu último ano de vida, Heine ainda arranjou tempo e <espírito> para uma paixão platônica por uma jovem de 20 anos, envolta numa névoa de mistificações e pseudônimos, que intrigariam os pesquisadores por muito tempo.

Camille Selden, aliás Elise Krinitz, aliás Johanna Christiana Müller, teria se apresentado com o nome de Margareth, em 19 de junho de 1855, para entregar uma encomenda do compositor vienense Johann von Püttlingen, ou, conforme outra versão mais prosaica, atendendo a um anúncio de jornal para leitora e secretária. Ficou imortalizada na literatura com o carinhoso apelido que Heine lhe deu – Mouche (mosca). Mathilde parece ter tolerado o capricho irrealizável de seu esposo moribundo, continuando a merecer todas as suas juras de amor e preocupações.

Mas foi a Mouche que Heine dedicou seu derradeiro poema: um feérico e exuberante retrospecto de sua vida, que talvez leve um leitor de Machado de Assis a suspeitar se o poema não teria inspirado a cena inicial de Memórias Póstumas de Brás Cubas.”

(*) “Nos Estados Unidos – somente lá –, circula a informação bem-intencionada de que o nome original do poeta seria Chaim ben Shimshon. Não há qualquer evidência histórica que a comprove nem indício qualquer de sua plausibilidade.

Já os nazistas, não podendo dispensar <A Lorelei> de um poeta judeu-alemão, propagaram falsamente que o seu verdadeiro nome seria Chaim Bückerburg. (…) O sobrenome <Heine> não passaria de uma transliteração para o alemão da palavra hebraica chajim = vida.

Harry, Heinrich e Henri, por sua vez, são variações de um mesmo nome germânico – Heimrich – que significa: Senhor do Lar.

Se tivesse nascido num país de língua portuguesa, Heine poderia muito bem ter se chamado Henrique Vidal (ou Vital).”

(*) “Em suas Memórias inacabadas, o poeta ironizou o fato de os franceses nunca terem conseguido pronunciar seu nome corretamente. O <Heinrich> (leia-se <RÁIN-[rrr]rirrr>) foi imediatamente substituído por <Henri> (<an-RÍ>); mas o sobrenome <Heine> (<RÁI-nê>), continuaria um problema que nem mesmo um acento na primeira sílaba, adotado nos cartões de visita, pôde resolver: <Para a maioria meu nome é M. Enri Enn, que muitos aglutinam num Enrienne; alguns me chamavam Monsieur Un rien>.

Sr. Um nada.”

Passiflora incarnata.

GLOSSÁRIO:

(PT) bornal: saco com suprimentos; cu; puta.

duft: fragrância

erzürnen: enfurecer

falten: dobrar

gähnen: bocejar

Haifisch: tubarão

Heer: exército, tropa

Himmelszelt: firmamento, abóbada celeste

hopsen: saltitar

Kiefer: presas

klapperdürre: só pele-e-osso, acabado

klirren: batida surda do ferro

Leichengeruch: odor cadavérico

lindern: aliviar

schlucken: tentar engolir

seufzend: aos suspiros, lamurioso

Stahlzeug: material feito de aço

Sterblichkeit: mortalidade

stramm: firme, justo, tenso

Sünder: pecador, desgraçado = SINNER

Ungetüm: monstro

verderben: corromper

verschlungen: complicado

ELOGIO DE LA ANCIANIDAD O DEL ARTE DE CONSERVARSE BUENO (Epístolas morales a Lucilio) – Séneca, trad. Jaime Bofill. Folio ed., 2007 (Colección Grandes Ideas).

Anotações e transcrições feitas entre 15/07/2016 e 19/10/2016. Da Ciudad de México e Brasília.

Elogio de la Ancianidad corresponde a los cap. I-III de Cartas Morales a Lucilio (tomo I)”

* * *

Como que uma autojustificação oportuna desse meu AquiAgora: “Créeme Lucilio, resérvate para ti mismo y el tempo que hasta hoy te han estado tomando, te han estado robando o que te ha huido, recógelo y aprovéchalo.”

trabalho vaidades doenças trânsito maquiagem

a maior parte da vida a passamos entregados ao mal; outra parte, e não minguada, sem fazer nada, e toda a vida fazendo o que não devêramos fazer.”

Quem sabe um dia chega o hoje.

deixa só eu pagar esse bolsista

perder esta conta

ser um herói-dos-outros e não de-mim-mesmo!

CAPESlocksista o CANTO MACROSCÓPICO DO MICROCHIP.

Toda a porção de nossa vida que fica para trás de nós pertence ao domínio da morte.”

Frankenstein esculpidor de relógios.

Quiçá perguntes-me que faço eu que ando repartindo conselhos.”

radiopejorativo

Los hippies imbéciles; no tienen un cuerpo

Mesmero sempre o mesmo

peso sempre um peso desconto %

a raiva do caixa longe dólar perto rima com inferno

aperto 1 desperto 2 A.M.

O Wikipedianesco pé-dantesco

Às vezes algumas culturas não sentem o mau hálito

não há nem B nem sê

A uruca de Pachuca

Os bem-intencionados e suas risadas pouco produtivas

O EternO DesobedIente nO Vácuo Preenchido pelo Frio desta época

quando eu era mais burro eu era mais (inteli)gente

meu amigo dick cionário

por lo tanto, ergo sum

para lo poco, no sé aun

bajo doom barroom

3,14URO mais de 10 reais menos de 9 Stephen Hawkings

a cura épica do anti-estróina boina &u,Demonista e Irene

Já passou o tempo contado dos reis

eu não tenho nenhuma vaca, sou um pobre

nada que ver con viejos, ahn?

* * *

não andas vagando e não te empenhas em mudar de lugar. Estas mutações são de alma enferma.”

quem se afana se rouba, roubado não é achado então é desesperado, não-aguardado, não-guardado, muito exposto às vicissitudes. Quem não espera sempre se(ba)lança.

muito af8 muito assí2 mucho ha sido ácido com amigos

esta é a base do sentimentir

Atenção, porém, para que esta leitura de muitos volumes e muitos autores não tenha algo de caprichoso e inconstante. Precisas se demorar em certas mentalidades, e nutrir-se delas, se queres alcançar proveito que possa permanecer assentado em tua alma. Quem está em todo lugar não está em parte alguma.

não é assimilado pelo corpo o alimento que se vomita logo que penetra no estômago. Nada tão nocivo à saúde quanto sempre trocar os remédios.”

S

EL

O C

ILA D

E QUAL

IDADE

NOTÍ

VAG

A

Fumar não é o Rubinho mas desacelera…

basta que tenhas o que podes ler” So, so!

Lês sempre autores consagrados, e se alguma vez te vier a vontade de te distraíres em outro, volta aos primeiros.”

depois de ter percorrido um sem-número de pensamentos, escolhe um a fim de comandá-lo aquele dia.”

THE GAME IS ON: ETERNAL RECURRENCE OF THE MOST TRAGIC UNCONSCIOUS

Spock, a Cerveja Universal

Observa-me do passado ou eu te devoro.

Perfeições virtuais letra&jogabilidade redondas como um homo-e-lette.

Te pone un desafio hermoso, vamos muchacho

Amar la gente judía y mercadera, por ejemplo.

Usar a camisa da Argentina na Avenida Paulista – level Hard.

Aquele familiar imbecil que pode te parar, o Tio T. TILT

oh mon lit(etature)

A ARTE DE TUITAR FORA DA INTERNET

piupiupiu purple-urina

o fan roda o ídolo age culposo.

afiliação ao partido da aflição

* * *

encontrei em Epicuro – já que costumo passar também para os campos inimigos, não como desertor, mas como explorador –” Richinhas d’época.

Se tens alguém por amigo e nele não confias tanto como em ti mesmo, te equivocas gravemente e não alcanças o conhecimento necessário da força da verdadeira amizade.”

o [recomendável] preceito de Teofrasto”: só julgar depois de amar, e amar depois de julgar também.

alguns ensinaram a enganar temendo ser enganados e com suas suspeitas acabam por dar azo à infidelidade.”

(I) Alguns contam ao primeiro que encontrarem aquilo que só a um amigo se deve confiar, e descarregam sobre qualquer amigo o que puderem fisgar de seus âmagos; (II) outros, pelo contrário, afogariam qualquer segredo em si, desconfiados até da própria sombra.” “ambas são posturas viciosas: tanto confiar em todo mundo quanto não confiar em ninguém, ainda que eu diga que a primeira é algo mais nobre e a segunda mais segura.”

Sempre que eu esvazio o copo, encho de novo. Punição grega?

Alguns se refugiam de tal maneira em rincões sombrios que têm por turvo tudo o que está à luz.” Pompônio

Enfim, na 4ª carta, a revelação de que Lucílio é um velho, como Sêneca: “temos o autoritarismo dos anciãos e os defeitos dos rapazes, e não só dos rapazes, mas até dos meninos: aqueles se assustam com coisas leves; estes, com coisas falsas; nós, com umas e com outras.”

A maioria flutua miseravelmente entre o temor da morte e os tormentos da vida, sem querer viver nem saber morrer.”

e de coisa alguma é tão fácil sofrer a perda como daquela que, uma vez perdida não pode ser recuperada.”

Vinde a MIM Muriçocas in Mexico

Não confie na calma de hoje: o mar se revira e engole os navios no mesmo lugar em que eles tinham folgado naquela mesma manhã.”

todo aquele que menospreza sua vida é senhor da tua. Lembra-te dos exemplos daqueles que foram mortos em insídias domésticas…” A insígnia da insigne insídia.

Por que te enganas a ti mesmo e não te dás conta até agora do perigo que sempre estiveste correndo? Eu te digo que desde que nasceste caminhas para a morte.”

Através daquela janela tá faltando ele, e a saudade da queda tá doendo em mim…

Para nos livrarmos da fome e da sede não precisamos andar assediando o umbral do poderoso, não é mister suportar grandes desdéns, nem desonrosas proteções, nem se aventurar pelos mares, nem matraquear por aí. O que a Natureza reclama é acessível e fácil de achar.” Este (dito!) aqui envelheceu um tanto…

P. 18: “Foge do rústico desasseio, dos cabelos em desordem, da barba mal-cuidada, de declarar teu ódio às jóias, de fazer-te a cama no chão, e de qualquer outra coisa que persiga o prestígio por falsos caminhos” ?!

O filósofo como o babaca que se importa demais com o juízo alheio: “Qué acontecería si comenzásemos a separarnos de las usanzas corrientes en los hombres? Bien que sea distinto nuestro interior, pero nuestro exterior tiene que mostrarse concorde con el del pueblo. Que no sea manchada nuestra toga, pero que no resplandezca; no debemos poseer platería incrustada con cinceladas de oro macizo, aunque no debemos tener por cierto indicio de frugalidad la carencia de oro y plata.”

O ponto que torna Sêneca e eu irreconciliáveis: “A filosofia exige frugalidade, mas não castigo.” Quem é você para dizer isso, seu Aloísio de Outros Tempos?

he encontrado en nuestro Hecatón que el fin de los deseos significa igualmente el fin de los temores.” Y de la vida.

Viajamos já querendo estar de volta.

o temor segue à esperança. Não me maravilha que seja deste modo, já que ambos são próprios a uma alma carente de resolução, angustiada ante o porvir.”

As feras fogem dos perigos que vêem, e quando já fugiram estão tranquilas: nós nos atormentamos pelo futuro e pelo passado.” “Não há ninguém que seja desgraçado só pelas coisas presentes.”

O próprio fato de enxergar os próprios defeitos, antes ignorados, já é uma amostra de que a alma melhorou.”

e me gozo aprendendo para poder logo ensinar.”

Hecato de Rodes: <Me perguntas que progresso realizei? Comecei a ser amigo de mim mesmo.>

pronto te confessarei minha fraqueza: nunca da turba volto com o mesmo temperamento com o que a ela havia acudido.”

Mas nada existe de tão prejudicial aos bons costumes que o comparecimento a espetáculos, já que aí, por meio dos prazeres, os vícios penetram mais facilmente em nós.”

agora já não são jogos, antes verdadeiros homicídios”

Pela manhã os homens são colocados ante ossos e leões; ao meio-dia, ante os espectadores.”

O espetáculo é interrompido: <Enquanto isso, para não ficarmos sem fazer nada, que afoguem homens.>

Guarda-te que a vanglória de fazer notório o teu talento não te decida a te apresentares ante o público a fim de ler ou dissertar; coisa que te deixaria fazer se pudesses oferecer uma mercadoria adequada a esta gente, nas ninguém pode entender-te. Talvez só poderás ganhar um ou dois, e terás que formá-los para que te entendam.”

CONSELHO SAÍDO DO FORNO: Age como se sempre fôra este o teu último ano na CAPES. E, como foi no Gisno, tu só queres uma coisa: fechar com chave de ouro. Ah, sim, claro: teus nervos têm limite, não te forces tanto! não-professor e não-efetivo… muita coisa ainda pode mudar na sua esquematizada existência…

Quando não estou pesado, os outros estão, então que diferença faz? Eu nunca terei essa ataraxia cotidiana típica do advogado boêmio e bom filho e namorado Miguel Jesús Rodriguez, então só posso tentar ajeitar meu pé para não ser arrancado pela próxima mina – meu trabalho e meu ócio são ambos batalhas campais. Aqui, em Fortaleza, Rio, Brasília, França ou Belém, estaria sempre igual… No hiatus!

Poderia escrever um livro sobre como conviver com cada um: Pablo, João, Ione, Graça, Davi, Renato, Diogo, crente 1, crente 2, moralista 3, porra-louca 4… D.E. Deixa estar. Ou Deus explodiu, escapou, evadiu? Com quem mais tenho que conviver: médicos, farmacêuticos, ar condicionados, anti-tabagistas, revistas de corredores de elite, Bolsonaros marombados… Conselheiros que dirão: “nossa, como seu último texto está reclamão!”… Laughing and coughing and sleeping… let’s see how life fucks me within my own superiority dreams…

Assinado O Homem de um Leitor Só

Sou dolente

Saiba que o homem tão a coberto se acha sob palha como sob o ouro.”

É necessário servir à filosofia se queremos alcançar nossa verdadeira liberdade. Não será retardado por ela quem se submeta em doação total, será liberado sem tardança, já que o próprio servir à filosofia significa ser livre.”

o sábio não sente necessidade de nada, mas lhe fazem falta muitas coisas; enquanto que o néscio, ao contrário, não sente necessidade de nada, afinal não sabe servir-se de coisa nenhuma, mas lhe fazem falta todas as coisas.”

Crisipo

Se uma enfermidade, ou um inimigo, lhe corta uma mão; se um azar lhe arranca um olho, ou dois olhos, sentir-se-á satisfeito com os membros que lhe fiquem, e com um corpo amputado e diminuído se sentirá tão gozoso como havia se sentido com um corpo íntegro; mas os membros pelos quais não suspira que lhe faltam, preferiria, em verdade, que não lhe faltassem.”

sofre pacientemente a perda do amigo. O sábio, em verdade, jamais carecerá de amigo, já que tem em seu poder o podê-lo substituir.”

Em nossos filhos rende maiores frutos a adolescência, mas possui mais encantos a infância.”

O sábio basta a si mesmo para viver feliz, mas não para sobreviver.”

por muito que se baste a si mesmo, deseja ter um amigo, um vizinho, um camarada.”

Gera grande prazer não só o costume de uma amizade antiga e firme, como também o começo e a aquisição de outra nova.”

Qual será a vida do sábio se, falto de amigos, se encontra sozinho em uma nação estrangeira? Fica em companhia de si mesmo.”

Toda nescidade sofre do fastio de si mesma.”

o amor pode ser definido como uma amizade enlouquecida”

Para o artista, é mais doce pintar que haver pintado” Atalo

Com o escrever parece ser o exato contrário…

É coisa de outros quanto possam obter teus desejos”

Não é teu o que fez teu a fortuna” Lucílio

<Não pode ser venturoso quem não crê sê-lo.> Epicuro

Que te importa qual seja em realidade tua situação, se a ti te parece má?” Solução: apenas te creias venturoso.

por que transmito tão belas palavras de Epicuro com preferência às dos nossos? Mas por que razão crês que estas frases são de Epicuro e não de domínio público? Quantos poetas não disseram coisas que deveriam ter sido ditas pelos filósofos? Não me referirei aos trágicos nem a nossos dramas, uma vez que estes últimos importam alguma gravidade e ocupam um lugar intermediário entre as comédias e as tragédias. Quantos versos eloqüentíssimos dormem em nós mesmos! Quantas palavras mais dignas de ser declamadas com coturno que de pés descalços!”

Caída sua pátria, perdidos os olhos e a esposa, tendo escapado dos apuros com vida só ele, e apesar de tudo contente, do incêndio generalizado, Estilbão foi perguntado por Demétrio, aquele a quem chamaram Poliorcetes, devido ao número de cidades que destruiu, se havia perdido algo [Ou: Necessitas algo? – O imperador a Diógenes O Cínico]; e o filósofo contestou: Todos os meus bens estão em mim.”

Enquanto o homem buscar uma parte dele fora de si mesmo, cairá sob a escravidão da fortuna.”

a amizade tem para nós uma doçura inata.”

Já que nenhuma sabedoria pode apagar nossas imperfeições naturais, o que aparece congenitamente inscrito em nós, a arte pode suavizar, mas não extirpar. Alguns, e mesmo dentre os mais firmes, não podem comparecer ante o povo sem suar; tal qual sói acontecer aos que estão fatigados e aos acalorados; a outros, do ponto em que tomam a palavra seus joelhos tremem; a outros, batem os dentes, trava-se-lhes a língua, não podem separar os lábios. Dessas coisas não nos podem proteger nem as lições nem a prática, pois nelas a Natureza nos revela seu império; elas se manifestam mesmo nos de ânimo mais resolvido. Entre elas devemos contar também o rubor, que se difunde pelo rosto até dos mais veneráveis varões. É certo que resulta mais perceptível nos jovens, que possuem mais calor natural e um rosto mais delicado.”

Certos dentre a massa nunca são tão temíveis senão quando ruborizam, como se com o rubor tivessem se livrado de toda a vergonha. Sila, quando o sangue lhe subia à cabeça, mostrava-se sempre mais violento. Ninguém, nesse sentido, foi mais impressionável que Pompeu, que nunca pôde ver-se ante vários sem ruborizar, especialmente numa assembléia. Recordo que Fabiano, introduzido no Senado como testemunha, ruborizou, e este rubor lhe caía admiravelmente. Ele não advém da timidez de caráter, mas da novidade da coisa, que aos não-acostumados, quando não os faz vacilar, comove-os se são a isso inclinados por compleição natural, pois enquanto alguns têm o sangue calmo, outros o têm excitável e movediço de forma que facilmente aflui ao rosto.”

Os atores, imitadores das paixões, que expressam o medo e o temor, que representam a tristeza, na hora de simular a vergonha acodem ao procedimento de baixar a cabeça, falar em voz baixa, fixar os olhos deprimidos no chão. Mas não podem fazer nascer o rubor, já que ele nem se evita nem se provoca.”

É mister escolher e ter sempre diante de nossos olhos algum homem virtuoso, a fim de viver como se nos vira e de olhar como se ele nos contemplasse.”

Epicuro

Mas quem? Pedro Jabur, Antonádia? Anti-exemplos (Gegenbeispiele): Aloísio, Thomas Edson, Igor, Bruce, Judeuzinho – o norte, sul, leste e oeste dos perdidos – Os 5 pecam por insipidez e excesso simultaneamente, seja em caráter político, moral, religioso, científico ou até mesmo artístico (ALERTAS VIVOS PARA MIM MESMO, AINDA QUE MUITOS DESTES, EM MEU COTIDIANO, JÁ ESTEJAM MORTOS).¹

¹ [Nota de 2022] Todos, agora, efetivamente. Mesmo de vista só corro o risco de me deparar com um, que não abre a boca nem para piar, entretanto.

Uma grande parte dos pecados se evitaria se os pecadores tivessem testemunhas.” (Davi)

Ó, tão feliz é aquele que nos faz melhorar, não só com sua presença, mas também com sua mera recordação!” “Quem de tal sorte possa venerar, de tal sorte será venerado. Escolhe Catão; mas se te parece muito rígido, fica com Lilio (?) [p. 41], varão de espírito benigno.”

(?) Provavelmente Lílio em Português. O mais célebre personagem histórico com este nome no Wikipédia é posterior a Sêneca, e não há desambiguação. É difícil encontrar qualquer informação sobre este Lílio na internet.

Nunca é tão valorosa a fruta como quando amadureceu; o maior encanto da infância está no seu fim”

O mais voluptuoso em todo prazer se guarda para o final.”

ninguém é tão velho que não possa aguardar mais um dia.”

a vida, o conjunto da qual consta de círculos, os menores encerrados nos maiores.” “eis aqui por que Heráclito, a quem por seu estilo se concedeu o apelido de ‘o Obscuro’, disse que ‘um dia se parece com todos’.”

A SABEDORIA É DE DOMÍNIO PÚBLICO, MAS NINGUÉM QUER “COMPRAR”: “Ora, que temos a ver com um estranho? Sinto como meu aquilo que for verdadeiro. Persisto em infiltrar-te idéias de Epicuro, a fim de que todos que juram seguir as palavras do mestre, sem atendê-las na verdade, mas somente pensando no nome do mestre, saibam que as grandes sentenças pertencem a todos.”

Más numerosas son, Lucilio, las cosas que nos asustan que las que verdaderamente nos atormentan, pues a menudo nos hace sufrir más la aprensión que la realidad.”

nós, os estóicos, andamos dizendo que todas aquelas coisas que nos arrancam gemidos e lamentos são leves e depreciáveis”

O que te recomendo é que não te faças desgraçado antes do tempo, já que talvez não cheguem nunca aqueles males que tiveste por iminentes”

Ou exageramos nossa dor, ou no-la forjamos, ou no0la antecipamos.”

Estou careca de saber que há quem ria debaixo de açoites e há quem gema por um simples bofetão.”

Outorga-me apenas que, cada vez que te rodeiem para te persuadir que és desgraçado, não faças tu caso do que escutas” Fora o Gardenismo! Tu não podes merecer o que nem os mais dignos que tu obtiveram! Essa é tua culpa!

Por que tem de compadecer-se de mim essa gente? Que é tanto que os faz tremer, que os faz temer até entrar em contato comigo, como se a tribulação fosse contagiosa? Há em minha tribulação algum mal, ou pode essa coisa ser mais mal-vista que má em si mesma? (…) quando minhas angústias têm um fundamento real ou são fantásticas? (…) ou nos atormentamos pelas coisas presentes, ou pelas futuras, ou por umas e por outras. (…) se teu corpo goza de liberdade e de saúde e não sentes o aguilhão de injúria alguma, veremos o que acontece amanhã, já que por hoje não sentimos nenhuma inquietude.”

nunca pomos em discussão as coisas que nos inspiram temor, não as submetemos a exame algum”

alarme falso” “os males quiméricos alarmam mais”

não existem temores tão perniciosos e irremediáveis como os terrores pânicos, já que os outros nos arrebatam a reflexão, mas os primeiros a própria razão.” Razão e reflexão para Sêneca:

DILEMA DO ANSIOSO: “Quantos males caíram sobre nós, sem que os aguardássemos! Quantos que eram esperados e jamais chegaram! E ainda que deva vir um mal, não vejo por que precisamos sair a seu encontro!”

Às vezes o espírito se forja imagens falsas; ou empresta o pior sentido a uma palavra duvidosa, ou converte em mais grave do que realmente era uma ofensa recebida, enquanto medita, não sobre a ira que dominava o ofensor, mas em até onde alcançava seu poder.”

Pondera, então, a esperança e o medo, e sempre que o resultado for duvidoso inclina-te ao mais favorável.”

a cicuta fez grande a Sócrates”

a fealdade que significa a prontidão dos homens em a cvada dia se erigirem novos fundamentos, em conceber a cada vez novas e inéditas esperanças, mesmo na hora da morte. (…) tu verás anciãos ainda dispostos à intriga política (…) Haveria algo mais vergonhoso que um ancião que começa a viver?”

É mister que nos comportemos, não como aquele que tem que viver para o corpo, mas como aquele que não pode viver sem o corpo. Um amor excessivo a este nos inquieta com temores, nos carrega de afãs, nos expõe a afrontas.”

os motivos de temor, os quais podem ser de 3 sortes: [orgulho ferido; saúde depredada; pança vazia]”

Os males naturais, a miséria e a doença, entram silenciosamente, sem nos infundir terror algum aos olhos e ouvidos; mas a outra calamidade mostra um aparato bem pomposo”

Imagina agora o pau que atravessa o homem, saindo-lhe pela boca, e os membros esquartejados por carros que arrancam em direções distintas, e aquela túnica impregnada e tecida de materiais inflamáveis (…) das coisas que subjugam e dominam nossas almas, as mais eficazes são as que chegam com maior espetáculo”

Quando foste à Sicília, cruzaste o mar. Um piloto temerário menosprezou as ameaças do Austro, o vento que alvoroça ou revolve o mar da Sicília, e no lugar de singrar até a margem esquerda, se dirigiu àquela na qual a vizinhança de Caribdis agita o mar. (…) aquela região tristemente famosa por seus abismos vorazes.”

Quando fugimos de algo, de fato o acusamos.”

ante o que anda desnudo de riquezas o bandido passa ao largo, e mesmo o caminho infestado de ladrões é tranqüilo para o pobre.”

é de se temer que o receio à inveja nos faça cair em menosprezo; que não querendo pisar, façamo-nos bons para sermos pisados.”

Que outra coisa fez Catão senão vociderar e lançar gritos inúteis quando, arrastado pelas mãos do povo, coberto de cusparadas, foi expulso do Fórum, ou quando foi conduzido do Senado à prisão?”

esta é de Epicuro, ou de Metrodoro, ou de qualquer outro daquela fornada. Que importa quem a disse?”

Já que é coisa néscia, querido Lucílio, e, no todo, bem pouco adequada a um homem instruído ocupar-se em exercitar os músculos e alargar o pescoço e reforçar o peito; por muita fortuna que possas ter na empresa de engordar-te, nunca poderás igualar as forças de um boi corpulento nem chegarás a ter seu peso.”

Primeiramente os exercícios, que pelo esforço que exigem esgotam o espírito e tornam-no inábil para a atenção e os estudos sérios; depois, uma alimentação abundante faz da inteligência obtusa.”

homens que repartem seu tempo entre o óleo e o vinho e têm o dia por bem-aplicado quando suaram o suficiente, e para reparar o líquido que desta forma perderam haviam ingerido, previamente, em jejum, muita bebida para que penetrasse no fundo. [???] Beber e suar constitui a vida dos que padecem de mal de coração. [?] Há exercícios breves e fáceis que cansam o corpo com presteza e nos economizam tempo, que é o que se precisa ter em conta: corridas, o movimento das mãos com algum peso, o salto, seja de altura, seja de extensão, seja aquele que podemos chamar <salio> [sacerdote de Marte] ou, menos decorosamente, <salto del fulón> [intraduzível]; adota de quaisquer destes exercícios um uso simples e fácil. Faça o que fizeres, volta logo do corpo à alma; exercita-a de dia e de noite; um trabalho modesto basta para alimentá-la. Nem o frio nem o calor, nem a velhice, podem te impedir este exercício; cultiva, pois então, esta riqueza que os anos vão melhorando. Não te peço que estejas sempre com a cara nos livros ou nas lutas; é mister dar à alma algum descanso que sem dissipá-la a distenda. O estar deitado tranqüiliza o corpo, mas não impede o estudo; permite ler, ditar, falar, escutar, coisas que nem o caminhar a pé nos impede.” Sentar mesmo é que é ruim.

não faltará quem te meça os passos e regule o movimento de tua boca ao comer, e chegarão tão longe quanto permitam sua paciência e tua credulidade.”

Quem disse essas palavras? O mesmo de antes.”

Que vida crês tu que é tida por néscia? (…) a nossa, a quem se algo pudesse satisfazer já estaria satisfeita.”

Quem vai por um caminho encontra um termo; o andar fora do caminho não conhece acabamento.”

A frugalidade não é mais que uma pobreza voluntária. Abandona semelhantes desculpas: <Ainda não tenho o suficiente; assim que alcançar tal soma me entregarei por inteiro à filosofia.>

Quebrar a tela do celular pode ser difícil justamente para aquele que o tenta com afinco…

À Gardene: “Preferirias, pois, à pobreza que sacia, a riqueza que nos faz famintos?”

Mas como sair desse ciclo vicioso? Por onde quiseres. Pensa em quantas temeridades incoerreste por amor ao dinheiro, quantos trabalhos suportaste por amor às honras! Bem podes tentar algo pelo ócio; por outro lado, em meio aos afãs do governo das províncias e das magistraturas, envelhecerás entre o tumulto e a agitação sempre renovados, que nenhuma temperança poderá evitar, nem suavidade alguma no viver. E que acontecerá se lhe permites a ela crescer ainda mais? Quanto mais se avizinha aos êxitos, tanto mais se avizinha aos temores.”

<A própria altura aturde os topos.> Se queres saber em que livro se o disse, te comunicarei que foi no que leva por título Prometeu. Com esta frase, quis significar que os saguões estão expostos às tempestades.” “Mecenas foi homem de gênio, que teria podido oferecer a Roma um grande modelo de eloqüência se não tivesse sido enervado pela felicidade, que pode-se dizer que o castrou.”

Primeiro, antes de considerar o quê comes e bebes, deves considerar com quem comos e bebes, pois comer e beber sem um amigo é viver como os leões e os lobos.”

Epicuro

O homem atarefado e agoniado por seus bens não achará mal pior do que crer seus amigos aqueles de quem de fato não é um amigo; do que crer que suas boas ações lhe servem para ganhar os corações, quando, na verdade, muitos o odeiam mais à medida que mais lhe devem. Uma dívida pequena faz um devedor; uma dívida importante faz um inimigo.”

a constante igualdade do homem consigo mesmo”

ninguém tem formado um propósito; e se o tem, nele não persevera, antes o renega, e não para mudar de meta, mas para voltar, depois à mesma de antes, à mesma que havia abandonado e espinafrado. (…) Os homens não sabem o que querem, só o momento em que querem.”

Oh, quando chegará o dia em que ninguém mentirá para lisonjeá-lo!”

Quem conheceria hoje a Idomeneu se Epicuro não houvesse tratado dele em suas cartas? O mais profundo esquecimento apagou o nome de todos aqueles magnatas e sátrapas, e ainda o do mesmo rei do qual Idomeneu recebera o poder.” “Profundamente nos cobrirá o alto-mar dos séculos, poucos gênios assomarão a cabeça por cima das águas” Para anotações pessoais consultar Os Segredos da Mosca em data próxima.

A diferença entre professores de educação básica de uma escolinha no cafundó e austeros analistas, assistentes, técnicos e auxiliares em C&T uma ilustre autarquia federal é que os primeiros sabem que “não fazem nada de importante, i.e., talvez algo de suma importância, que não passa, não obstante, de sua obrigação.”

Qual é a diferença entre alguém que ama um idioma e alguém que ama idiomas? Agora que estão na mesma sala aprendendo, nenhuma.

eu te prometo, Lucílio: eu gozarei do favor da posteridade, terei o privilégio de remover da deriva, junto com o meu nome, o de outros.”

deseos deoses

Eu creio que na filosofia tem-se que tentar aquilo que se fez no Senado: se alguém expõe um parecer que me agrada parcialmente, faço com que a proposição seja dividida em partes e sigo a que me parece mais aceitável.”

O ventre não escuta ordens: reclama, exige. Mas não é um credor molesto; com pouca coisa se o despacha enquanto se o dá o que é devido, não aquilo que poderias dar.”

tens de desatar, antes que romper, o nó que desgraçadamente enredaste, porém, se não houver maneira, rompa-o.”

Não existe ninguém tão covarde que não prefira cair de uma vez a estar sempre frustrado.”

Contenta-te com os negócios em que te embaraçaste. Não te enredes em outros novos.” Estou precisando muito seguir este aforismo.

amam os frutos das misérias enquanto que detestam as misérias.”

Todo mundo sai da vida como se acabasse de entrar nela.”

Epicuro

Que coisa pode existir de mais vergonhosa do que sentir-se inquieto no próprio umbral da maior segurança?”

As minas dos metais pobres são superficiais; as dos metais mais ricos são aquelas cujas veias se escondem no mais profundo, mas recompensam com mais generosidade aos que as escavam com constância.”

o prazer é um declive pelo qual deslizamos até a dor se não nos armamos de comedimento.”

É mister proceder como se sempre se tivesse vivido já bastante.”

náusea da náusea, náusea de não ter náusea

Sócrates dissertou no cárcere, e havendo-lhe alguém oferecido a fuga, não quis sair, preferiu permanecer ali para fazer os homens perderem o temor a 2 coisas gravíssimas: a morte e o cárcere.”

Repara na nossa época, de cuja moleza e languidez nos lamentamos.” Parece que não há limite para o nível de languidez de uma época.

Me atarão. E daí? É que porventura ando desatado? Eis que a Natureza nos ata à pesadez do corpo.”

Não sou tão torpe como para seguir agora a música de Epicuro, acrescentando que são vãos os temores do Inferno, que nem Íxion gira com sua roda, nem Sísifo empurra a pedra com seus ombros, nem é possível que umas entranhas renasçam continuamente para ser devoradas. Não há alguém tão menino que tema o Cérbero, as trevas e os fantasmas que só consistem de ossos descarnados.” Não se trata somente de aproveitar o dia, mas saber que o ajuste de contas inexiste.

É desonroso dizer uma coisa e sentir outra. E ainda mais escrever uma coisa e sentir outra!”

até quando crescemos, nossa vida decresce. Perdemos a infância, depois a mocidade, depois a juventude. Até o dia de ontem, todo o tempo passado está morto e mesmo o próprio dia de hoje nós repartimos com a morte.”

A morte não vem toda de uma vez: aquela que nos leva é a última morte.”

Lucílio

É tanta a imprudência e a loucura dos homens que alguns deles se vêem forçados a morrer por temor à morte.”

O homem sábio e forte não tem que fugir da vida, e sim saber sair dela.”

Alguns sentem o desânimo por terem de ver e fazer sempre as mesmas coisas; não é um ódio, antes um aborrecimento da vida, no qual caímos empurrados pela própria filosofia quando andamos dizendo: <Até quando as mesmas coisas? Despertar e dormir, ter apetite e saciar-se, ter frio, ter calor. Não há nada que acabe, antes pode-se dizer que todas as coisas da Natureza ficam enlaçadas, fogem, perseguem-se. A noite empurra o dia, o dia a noite, o verão termina no outono, o outono é espoliado pelo inverno, o qual é empurrado pela primavera (…) Nem faço nada novo nem vejo nada novo, isto também produz náuseas.> Existem homens que não encontram a vida amarga, mas supérflua.”

não somente os atos de amanhã nos podem causar dano, como também os de ontem.”

o [desmemoriado] rico Calvino Sabino (…) tramou este expeditivo¹ procedimento: empregou uma grande quantidade na compra de escravos, um que soubesse Homero de cabeça; outro, Hesíodo, e outros 9, um para cada poeta lírico.”

¹ Ora, nada há de eficaz nisso: será que na época o escravo era mais barato que a própria obra? De toda maneira, que adianta que um saiba Homero, se é ele que sabe e não quem quer saber, considerando o problema da perspectiva de quem quer saber?

Santílio Quadrato, um mordaz crítico de ricos néscios e, é escusado acrescentar, grande adulador deles, e, coisa que sói ir junta também, um belo companheiro para contar piadas, persuadiu este mesmo Calvino Sabino aprocurar gramáticas e dicionários. Sabino, havendo-o contestado que cada um de seus escravos lhe custava 100 mil sestércios, aquele respondeu: <Por menos, teria comprado eu outros tantos manuscritos.>”¹

¹ Eis a resposta à dúvida acima: mesmo que o valor do escravo fosse tão baixo, o dos textos não era tampouco nada alto!

O mesmo Santílio o aconselhou a se dedicar à luta, apesar de ser o rico um homem pálido, enfermiço e débil. Depois da resposta de Sabino: <E poderia eu fazê-lo, se mal me sustento de pé?>, disse-lhe: <Não o digas! Não vês quantos escravos robustíssimos possuis?> O bom senso não se compra nem se toma emprestado, e se se vendesse, creio que não acharia comprador. Em compensação, a insensatez encontra todo dia partidários.”

nunca se disse o bastante aquilo que nunca seria o bastante compreendido. A alguns basta mostrar-lhes remédios, a outros é mister impor-lhes à força.”

GLOSSÁRIO:

afrenta: afronta = AGRAVIO

desgana: tédio; inapetência; falta de aplicação.

pellejo: odre; casca; pele.

pendiente: rampa, declive; calha; brinco; que não foi resolvido.

poner hitos: demarcar; compactar.

postreto: último, final

rastrojo: palha

S&S EM 3 ATOS

SIMULACROS & SIMULAÇÃO 1.0

Jean Baudrillard – Ed. Relógio D’Água, omite-se o tradutor.

subtítulo imaginário:

A TROCAÇÃO SIMBÓLICA E A MORTE – DO LUTADOR DE M&MA

HISTÓRIA

P. 17: “a pretexto de preservar o original, se proíbe o acesso de visitantes às grutas de Lascaux [aí lascô], mas que se construiu a réplica exata a 500m de distância, para que todos possam vê-las (dá-se uma olhadela à gruta autêntica pelo postigo e depois visita-se o todo reconstruído).”

toda a ciência e a técnica se mobilizaram recentemente para salvar a múmia de Ramsés II, depois de a terem deixado apodrecer durante algumas dezenas de anos no fundo de um museu. O Ocidente foi tomado de pânico, perante a idéia de não poder salvar o que a ordem simbólica tinha sabido conservar durante 40 séculos, mas longe do olhar e da luz. Ramsés não significa nada para nós, apenas a múmia é de um valor incalculável, pois é ela que garante que a acumulação tem um sentido.” “Estamos fascinados com Ramsés como os cristãos da Renascença estavam com os índios da América, esses seres (humanos?) que nunca tinham conhecido a palavra de Cristo.” “Então das 2 1: ou se admitia que essa lei não era universal ou se exterminavam os índios para apagar as provas. (…) Deste modo terá bastado exumar Ramsés para o exterminar ao museificar”

COMUNISMO

a esquerda dá muito bem conta de si própria e faz espontaneamente o trabalho da direita.”

Todas as hipóteses de manipulação são reversíveis num torniquete sem fim.”

Makarius, A estratégia da catástrofe (em francês)

Com o esgotamento da esfera política, o presidente torna-se cada vez mais parecido com esse manequim de poder que é o chefe nas sociedades primitivas (Clastres).”

Por uma ironia é da morte do social que surgirá o socialismo, como é da morte de Deus que surgem as religiões.” Deus morreu, e finalmente obedeceu-o o judeu.

Acabou o valor de uso ou o prestígio do automóvel (use menos gasolina, cuide da sua segurança, ultrapassou a velocidade, etc.), ao qual as características dos automóveis fingem adaptar-se. É pelo mesmo deslizar do <direito> de voto para <dever> eleitoral que se assinala o desinvestimento da esfera política.” Ter carro é uma boa idéia, o ruim é ter o carro!

Pp. 51-2: “Que sentido teve esta guerra, e a sua evolução não terá sido a de consolidar o fim da história no acontecimento histórico fulminante e decisivo da nossa época? Por que motivo esta guerra tão dura, tão longa, tão feroz, se dissipou de um dia para o outro como por encanto? Por que esta derrota americana (o maior revés da história dos EUA) não teve qualquer repercussão interna na América? (…) Nada aconteceu.” “normalização das relações Pequim-Washington: era isso a questão fulcral da guerra do Veitname e os EUA abandonaram o Veit. mas ganharam a guerra.”

Desassinei CartaCapital e nada mudou…

Os comunistas atacam os socialistas como se quisessem quebrar a união da esquerda. Dão crédito à idéia de que estas resistências viriam de uma exigência política mais radical. De fato, é porque não querem o poder. [Paradigma PCO] Mas não o querem nesta conjuntura, desfavorável para a esquerda em geral, ou desfavorável para eles no interior da União da Esquerda – ou já não o querem por definição? Quando Berlinguer declara: <Não há que ter medo de ver os comunistas tomar o poder na Itália>, isto significa ao mesmo tempo:

  • que não há que ter medo porque os comunistas, se chegarem ao poder, não mudarão nada ao seu mecanismo capitalista fundamental;

  • que não existe qualquer risco de eles alguma vez chegarem ao poder (pela razão de eles não o quererem);

  • e mesmo se o alcançarem nunca farão mais que exercê-lo por procuração;

  • que, de fato, o poder, o verdadeiro poder, já não existe e portanto não há qualquer risco de que alguém o tome ou o retome;

  • mais ainda: eu, Berlinguer, não tenho medo de ver os comunistas tomar o poder na Itália – o que pode parecer evidente mas não tanto como isso já que

  • isso pode querer dizer o contrário (não é preciso psicanálise para tal): tenho medo de ver os comunistas tomar o poder (e existem boas razões para isso, mesmo para um comunista).

Tudo isto é verdade simultaneamente. (…)

E esta lógica não é nem de um partido nem de outro. Ela atravessa todos os discursos independentemente da sua vontade.”

só o capital goza, dizia Lyotard, antes de pensar a partir de agora que nós gozamos no capital.”

O poder pode encarnar a sua própria morte para reencontrar um vislumbre de existência: os Kennedy morriam por terem ainda uma dimensão política. Os outros, Johnson, Nixon, Ford, não tiveram direito senão a atentados-fantoches, a assassínios simulados.”

CINEMA

#semiofftopic Chinatown, Os Três Dias do Condor (Three Days of The Condor), Barry Lyndon, 1900, Os Homens do Presidente (All The President’s Man), Last Picture Show, China Syndrome, “Mulholland Drive, the masterpiece of David Lynch”, Dr. Mabuse (jetrotal), Nosferatu, Nashville.

RESCALDO DAS RECOMENDAÇÕES:

Guépard [The Leopard] (1); Senso [Sedução da Carne] (2).

(1) retrato da aristocracia decadente;

(2) quando affairs internacionais afetam na política interna.

Diretor: Visconti, Luchino

Filme relacionado: Sunset Boulevard (Crepúsculo dos Deuses) (1950)

Fala-se de voltar a fazer filmes mudos, melhores, sem dúvida também eles que os da época. Ergue-se uma geração de filmes que são, para os que conhecemos, o que o andróide é para o homem: artefatos maravilhosos, sem falhas, simulacros geniais aos quais não falta senão o imaginário, e esta alucinação própria que faz o cinema. A maior parte dos que vemos hoje [1980!] (os melhores) são já dessa categoria. Barry Lindon é o melhor exemplo: nunca se fez melhor, nunca se fará melhor… em quê?”

Prazer cool, frio, nem sequer estético no sentido rigoroso do termo: prazer funcional, prazer equacional, prazer de maquinação.”

Em Visconti há sentido, história, uma retórica sensual, tempos mortos, um jogo apaixonado, não só nos conteúdos históricos mas na encenação. Nada disto em Kubrick, que manobra o seu filme como um jogo de xadrez, que faz da história um cenário operacional.”

Já desconfiava da notoriedade sobre-comum de Sergio Leone

O cinema plagia-se, recopia-se, refaz os seus clássicos, retroativa os mitos originais, refaz o mudo mais perfeito que o mudo de origem, etc.: tudo isto é lógico, o cinema está fascinado consigo próprio como objeto perdido, tal como está (e nós estamos) fascinado(s) pelo real como real em dissipação.”

A “economicidade” do discurso é, então, boa? – Prof. Marco Aurélio, CEUB

HOLOCAUSTO

A televisão. Verdadeira solução final para a historicidade de todo o acontecimento. O esquecimento, o aniquilamento alcança assim, por fim, a sua dimensão estética (…) a partir de agora <toda a gente sabe>, toda a gente vibrou e choramingou perante a exterminação – indício certo de que <isso> nunca mais ocorrerá. (…) não ocorrerá de fato nunca mais porque desde sempre tem vindo (…) E querem-nos fazer crer que a televisão vai levantar a hipoteca de Auschwitz fazendo irradiar uma tomada de consciência coletiva”

O RESTO

As pessoas têm vontade de tomar tudo, pilhar tudo, comer tudo, manipular tudo. Ver, decifrar, aprender não as afeta. (…) Nunca esperam esse fascínio ativo, destruidor, resposta brutal e original”

O próprio cenário da cidade subterrânea – versão chinesa [X-Men; Teenage Mutant] de enterro das estruturas – é ingênuo.”

Nós éramos uma cultura da violência libertadora (a racionalidade). (…) Uma outra violência completamente diferente que não sabemos analisar aparece hoje: violência implosiva “Esta violência é-nos ininteligível porque todo o nosso imaginário está centrado na lógica dos sistemas em expansão.” “Os sistemas estelares também não deixam de existir, uma vez dissipada sua energia de radiação” “Deve-se evitar tomar a implosão por um processo negativo, inerte, regressivo, como a língua no-lo impõe ao exaltar os termos opostos de evolução, de revolução. (…) O Maio de 68 foi sem dúvida uma primeira reação violenta à saturação social (…) de resto em contradição com a ideologia dos próprios participantes, que pensavam ir mais longe no domínio do social (…) esta implosão tem conseqüências mais sérias que a própria revolução.”

Talvez hoje notássemos a diferença entre os homens se todos andassem com uniformes iguais. Mas como estão, individualizados, são não as vestimentas, é lógico, mas a carne e o espírito todos iguais.

Un livre, ma oeuvre!, appellé « Provérbios de Cila ou Sentenças de Caribde », avec tous mes jeux de mots de ces derniers ans au blog!

Ninguém se suicida pelo passado vergonhoso que tem nas costas; mas pelo futuro vergonhoso que sabe que terá.

a pornografia é ficção hipertrofiada de sexo consumido na sua irrisão, para a sua irrisão, espetáculo coletivo da inanidade do sexo na sua assunção barroca”

Uma sociedade de que o sexo fosse banido e só houvesse clones de clones de clones da última geração de humanos nascidos sexuadamente.

ser filho de si próprio é ainda ser o filho de alguém”

O homem é o câncer do homem.

Ballard, Crash

Philip Dick, Simulacres

Spinrad, Jack Barron ou L’éternité

Brunner, Stand on Zanzibar

(póst. a este livro) Viviane Forrester, O horror econômico (~20% nos favoritos: google books)

P. 173: “Os animais não têm inconsciente, porque têm um território. Os homens não têm um inconsciente senão desde que já não têm território. O território e as metamorfoses foram-lhes tiradas ao mesmo tempo – o inconsciente é a estrutura individual de luto onde se volta a representar, sem cessar e sem esperança, esta perda – os animais são a sua nostalgia.” [negrito meu]

SOBRE BAUDRILLARD: Seria preciso uma 3ª perspectiva. A 1ª é ele mesmo; a 2ª a “wikipedianesca”: que ele é um pensamento datado, tão incorreto quanto as escolas anteriores e as próximas, pertencente aos pós-estruturalistas, como um quadrinho na sucessão imagética do gibi. E então… sejamos IMPARCIAIS? Eis que o câmbio engancha e trava na troca de march…ops!

Eu sou um dado de 6 lados e você só acessa uma face…

O ISMO DO TERROR

E em seguida virá o CAOSISMO

O ACASISMO

O CONTINGENCIALISMO

A violência teórica é o único recurso que nos resta.”

niilismo chapa branca como a névoa

um niilista na conferência da UnaSul

tudo vermelho

Lipovetski, A Era do Vazio

Sexo e morte são os dois grandes temas reconhecidos pela sua capacidade de desencadear a ambivalência e o riso. (…) por que nos rimos? Só nos rimos da reversibilidade das coisas, e o sexo e a morte são figuras eminentemente reversíveis.”

Todo o real é residual, e tudo o que é residual está destinado a repetir-se indefinidamente no fantasmal.”

Mas quando tudo é recalcado já nada o é. Não estamos longe desse ponto absoluto do recalcamento (…) ponto de saturação crítica (…) então as energias já não têm de ser libertadas, gastas, economizadas, produzidas: é o próprio conceito de energia que se volatilizará por si próprio. (…) É preciso levar ao consumo insensato da energia para lhe exterminar o conceito. É preciso chegar ao recalcamento máximo (…) Quando o último litro de energia tiver sido consumido (pelo último ecologista), quando o último indígena tiver sido analisado (pelo último etnólogo), (…) quando a última fantasia tiver sido elucidada pelo último analista (…) dar-nos-emos conta de que esta gigantesca espiral da energia e da produção é apenas uma metafísica do resto e será resolvida de repente”

S&S REVISITED CONTRA O HOMEM QUE CONTRARIOU A DIALÉTICA [entreato]

Simulacra & Stimulation

estimulaxante

I can’t retreat all this meat from my teeth.

Reluctant as though you(r) may be…

trance&dance

transe&dane-se

The east, at least.

viragem voraz

virose rosa as a rose

whip! zás-trás

la vie en… zéro

varo a noite vingada

da traição armada

inútil escapar da fenda

There in the sun a dead start,

cogumelo rosa venenoso de Hiroshimario

postumo póst-humor, pós-tumor

* * *

aos-cílios de cuscuzteio para a mulher mulamanca máquiada

com quiabo

et laquê

o’melet’e me be an egg!

Eu sou Bill Microsoft, ou Windows Gate? Todos os portões se abrem, mas um vírus entra em Tróia. Juíndous do Mundo MicroSolar. Ploft! Versão Final 0.0

O dia que o mais miserável banguela chinês será mais rico que todas as ações da Nike. Corre atrás do tênis!

sou dinâmica e velocidade tão puras que inerciam… Na vida do artista tudo é glacial e nunca muda.

O futuro do mundo é um grande Já(la)pão. Do mundo, i.e., deste mundo. Velho e negativo. Fraturado e sorridente; e, pensando bem, não há engraxates, e os sapatos permanecem limpos! Ah, deixa eu me esticar na minha quase-cama…

uh, a garota tem cílios

man também tem cílios

se eu não tivesse olhos eu não veria os cílios

os filhos das filhas

só o cego extirpa sua própria linhagemfamília

sou cego no sossego?

ou morcego das noites atribuladas sigo na agitação dos mares broncos?

rumo a novos continentes negrotons

trabalho demente do operário trabalho elementar do operário trabalho demente do elemento trabalho de mão de mente do erário demento ele mente

O capitalismo irá acabar quando eu todos os meus livros resolver queimar retardado a fazer elucubrações braçais embaraçosas

poços viçosos de muita angústia

preto poço do conhecimento

A fala é uma falta, a escrita é uma estria. A cirurgia foi um sucesso, a marca é atroz e produz orgulho, será mostrada e demonstrada para todo o sempre no corpo anti-perene do ser-sendo comendo e sendo comido devorado pelas próprias estrias magnetiquespirituais subliminares de primeira plana. Chama que arde poética sem cicatrizar nem ferir morais preexistentes e quentes.

Doidivanitas subsolus

O papel do dólar não deixa nunquinha de ser uma expressão assaz irônica!

O nada do papel & o papel do nada

a flutuação e afogamento das moedas veladas pelos fardas-pretas

* * *

SIMULACRA & SIMULATION (S&S 2.0)

Anotações de 31/01/16 a 14/10/16

Tradução inglesa de Sheila Faria Glaser – an effort to fulfill the trilogy of the 2015 Baudrillard&Deleuze-thematic posts on this blog! A linguistical and comparative work, also. Maria de Costa Pereira havia sido a tradutora portuguesa que lemos acima!

DIC:

shred: pedaço; rasgo; traço.

Overwhelming versatility of desire in Deleuze, an enigmatic reversal that brings desire ‘revolutionary in itself, and as if involuntarily, wanting what it wants’, to desire its own repression and to invest in paranoid and fascist systems? A malign torsion that returns this revolution of desire to the same fundamental ambiguity as the other, the historical revolution.”

this fable has now come full circle for us, and possesses nothing but the discrete charm of 2nd order simulacra.”

It is all of metaphysics that is lost.”

it is genetic miniaturization that is the dimension of simulation.” “The real no longer needs to be rational, because it no longer measures itself against either an ideal or negative instance.” “Never will again the real have the chance to produce itself” “the orbital recurrence of models and the simulated generation of differences.”

One can see that the iconoclasts, whom one accuses of disdaining and negating images, were those who accorded them their true value, in contrast to the iconolaters [who – oh! – arrive so late!] who only saw reflections in them and were content to venerate a filigree God.”

This was the approach of the Jesuits, who founded their politics on the virtual disappearance of God and on the worldly and spectacular manipulation of consciences – the evanescence of God in the epiphany of power – the end of transcendence.

Whereas representation attempts to absorb simulation by interpreting it as a false representation, simulation envelops the whole edifice of representation itself as a simulacrum.” “no longer a Last Judgement to separate the false from the true, the real from its artificial resurrection, as everything is already dead and resurrected in advance.”

Carlos Castaneda, The Teachings of Don Juan: A Yaqui Way of Knowledge & the 2 sequences…

They no longer walk, but they go jogging, etc.”

O conceito de eterno no que tem limite ou de contível ou contável no que na verdade não tem fim: transfinito. Conceito meramente pós-euclidiano?

Sinu-site não vai, vai no papel mesmo!

I lea(r)n (fr)on(n) you

FLÁVIO & OS ECO-CHATOS DO ÚLTIMO BARRIL DE PETRODÓLARES: “it is the social itself that is organized along the lines of a disaster-movie script.” Dois idiotas bebendo no bar.

TRANS-TRANSLATION

META-TRANS-ACTION

TRANS-ITO

TRANS-CADO EM CASA

UMA TRANSMA ELABORADA

Sou imanentossexual!

Saturno Toguro Sartori Saqueio fumo e trago anéis de Saturno. Disco platinado. Efeito foguesfumaçado mato italiano cópia do renasço.

the only weapon of power is to reinject the referential everywhere, to persuade us of the reality of the social, of the gravity of the economy and the finalities of production. To this end it prefers the discourse of crisis, but also, why not? that of desire. ‘Take your desires for reality!’ can be understood as the ultimate slogan of power since in a non-referential world even the confusion of the reality principle and the principle of desire is less dangerous than contagious and hyperreality [here we are now, entertain us].” Nothing is real but pain now… Donnez-moi mon pain. bagueta baqueta é a lights out of tie tá?! QUE DEDÊ! Sai, R.! Beleuze… Paraneud & eud. Para n’ode to victory zero.

Quem eu estou lendo mesmo??? “Capital was the first to play at deterrence (…) deterritorialization (…) exterminating all use value, all real equivalence of production and wealth (…) disastrous spiral”

Mansão Engendrar de Amigos Imaginados

What every society looks for in continuing to produce, and to overproduce, is to restore the real that escapes it.”

Maquinaquiavel

Quem procura a crise na verdade assume a roupagem da crise da procuração. Eu escrevo é para esquecer, se eu escrevesse para lembrar este blog seria mínimo. E bem polido.

in a society that cannot terminate its mourning.”

Madil Boo Rousseff

the new presidents are nothing but caricatures and fake film” Não há um segundo Collor, macaco marionete do poder. Oozaru de cauda cortada.

annual annulation

Nirvanaxon “Nixon arrived at the goal of power: to be taken seriously enough to be denounced, and liquidated.”

Ford is immunized by his impotence, which infuriates him.” which in fury eats him

Bill Clinton paga a conta do clitóris não perfeitamente redondo ou elíptico ou branco ou limpo. Pagar boquete para o homem mais poderoso do mundo – todos os canais de TV e audiência chupando, na verdade, o sêmen e o gérmen da Terra – parece conosco mesmo, foi menos que uma compulsão ao auto-sexoral. …An(d) oral(B)for all…

before all the breakfasts…

legitimate mating

Então fica entalada na garganta a pergunta: Monica Lewinsky engoliu ou não a porra toda? Bill gozou? Hillary já se masturbou pensando nisso, imaginando a cena? Cada americano agiu na cabecinha da secretária – em nome de todos, ela não podia recusar.

Um homem da sua posição não pode…”

Não pode ser um homem.

Tem que ser um manequim, sem pau…

Para que não cheguem a quebrar o pau…

E especular sobre a impotência e a infelicidade do sonho americano…

No Texas e aposentado, Bush pode ser o depravado…

Que situação chata! superação da crise…

&fall

fomentou a fome no mundo, já dizia Mastruz.

TRANSCAMAERATURA

FhC é um coxinho, porque todas as suas viúvas são coxinhas.

a typical ideal American Family, California home, 3 garages, 5 children, assured social and professional status, decorative housewife, upper-middle-class standing. In a way it is this statistical perfection that dooms it to death, it is, as in ancient sacrifices, chosen in order to be glorified and to die beneath the flames of the medium, a modern fatum. Because heavenly fire no longer falls on corrupted cities, it is the camera lens that, like a laser, comes to pierce lived reality in order to put it to death. ‘The Louds: simply a family who agreed to deliver themselves into the hands of television, and to die by it’, the director will say.” “sacrificial spectacle offered to 20,000,000 Americans.”

You no longer watch TV, it is TV that watches you” “A switch from the panoptic mechanism of surveillance (Discipline and Punish) to a system of deterrence, in which the distinction between the passive and the active is abolished.”

YOU are the model!” “YOU are the majority!”

We are no longer in the society of the spectacle, of which the situationists spoke, nor in the specific kinds of alienation and repression that it implied.”

That discourse ‘circulates’ is to be taken literally: that is, it no longer goes from one point to another, but it traverses a cycle that without distinction includes the positions of transmitter and receiver, now unlocatable as such.”

power is something that circulates and whose source can no longer be located” “an endless reversion that is also the end of power in its classical definition.” “one can always ask of the traditional holders of power where they get their power from. Who made you duke? The king. Who made you king? God. Only God no longer answers. But to the question: who made you a psychoanalyst? the analyst can well reply: You.

power is resolved in perfect manipulation.”

HORIZON AT DUSK:Anti-Copernican revolution: no transcendental instance either of the sun or of the luminous sources of power and knowledge – everything comes from the people and everything returns to them.”

dissolution of TV in life, dissolution of life in TV – indiscernible chemical solution”

a collapse of the 2 traditional poles into each other: implosion (…) That is where simulation begins.

Atomic war, like the Trojan War, will not take place”

EGG-SMASHING… A SALAD OF IDEAS

A vida ou o DNA, qual é o preeminente?

A balança do terror é o terror da balança.

Um reality show com a Família Silva não daria muito certo…

Quem te fez Deus? Meu procurador, o mendigo.

Pra infelicidade das bandas punk, nada sucederá…

A sacola plástica tampouco irá nos assassinar…

Mas O PNB armamentista sem hesitar se multiplicará…

Daqui, na selva, até o extra-civilizado Japão – o jornalista é o único bobinho crente no final das contas. O resto pode se entregar à flutuação dos juros e ao sexo de cada dia; é o que conta no último dia do mês: estar com tudo em dia.

changed, change the world

(chan)ta(ge)m d(o) (mundo)

No longer can any revolt, any story be deployed according to its own logic because it risks annihilation.” “Because if the law, with its aura of transgressions, if order, with its aura of violence, still taps a perverse imaginary, the norm fixes, fascinates, stupefies, and makes every imaginary involute.” “The vertigo of a world without <<f>>laws.”

all bombs are clean”

misfortunes are even more numerous (…) But, subtly, they no longer have any meaning, they are no longer anything but the duplex effect of simulation at the summit.”

A bomba. A ilha. A bomba. Um mundo. Deterrência. A song. Uma música. Uma música… Estouro d’Os Tímpanos.

all ‘newsreel’ footage thus gives the sinister impression of kitsch, of retro and porno at the same time – doubtless everyone knows this, and no one really accepts it. The reality of simulation is unbearable – crueler than Artaud’s Theater of Cruelty.”

precisely only the Americans, as they did in Hiroshima, have a right to this ‘use value’ of the bomb: all of those who have acquired it since will be deterred from using it by the very fact of possessing it.” “Responsibility, control, censure, self-deterrence always grow more rapidly than the forces or the weapons at our disposal: this is the secret of the social order.” “the whole myth of the total and revolutionary strike crumbles at the very moment when the means are available – but alas precisely because those means are available. Therein lies the whole process of deterrence.”

Energies freeze in their own fire, they deter themselves.”

The illusion would be to congratulate oneself on this ‘awareness of history on the part of cinema’, as one congratulated oneself on the ‘entrance of politics into the university’.” “at least there was history, at least there was violence (albeit fascist) (…) this void, the leukemia of history and of politics

it is naïve to conclude that the evocation of fascism signals a current renewal of fascism (…) it is for this reason that fascism can again become fascinating in its filtered cruelty”

History is a strong myth, perhaps, along with the unconscious, the last great myth.”

Fascism itself, the mystery of its appearance and of its collective energy, with which no interpretation has been able to come to grips (neither the Marxist one of political manipulation by dominant classes, nor the Reichian one of the sexual repression of the masses, nor the Deleuzian one of despotic paranoia)”

Harrisburg is a sort of 2nd-order simulation. There is certainly a chain reaction somewhere, and we will perhaps die of it, but this chain reaction is never that of the nuclear, it is that of simulacra, and of the simulation where all the energy of the real is effectively swallowed” “an explosion is always a promise, it is our hope: (…) the whole world waits for something to blow up” “unhappiness is when there is no nuclear spectacle (Hiroshima is over) (…) substantial food for our messianic libido.” “But that is precisely what will never happen. No more energy in its spectacular and pathetic form – all the romanticism of the explosion which had so much charm, being at the same time that of revolution – but the cold energy of the simulacrum and of its distillation in homeopathic doses in the cold system of information.” “In the film, also, real fusion would be a bad argument: the film would regress to the level of a disaster movie – weak by definition (China Syndrome, 1979)”

in its inspired moments, it is God who through his cataclysms unknots the equilibrium of terror in which humans are imprisoned. Closer to us, this is what terrorism is occupied with as well: making real palpable violence surface in opposition to the invisible violence of security.”

the Molochian joy of filming the sacrificial joy of so many millions spent, of such a holocaust of means”

the war in Vietnam ‘in itself’ perhaps in fact never happened, it is a dream, a baroque dream of napalm and of the tropics” “perhaps waiting for nothing but consecration by a superfilm” “this is the brutal quality of this film – not being rotten with the moral psychology of war.”

clownish effect in overdrive”

how is such a horror possible?”

if the Americans (seemingly) lost the other one, they certainly won this one. Apocalypse Now is a global victory.”

the film is a phase of this war without end”

One has not understood nothing, neither about the war nor about cinema, if one has not grasped the reversibility of both destruction and production, of the immanence of a thing in its very revolution, of the organic metabolism of all the technologies.”

Simulados & Liaisons

Sila und siLa

careforbde the entrance

Homecaribde medical centre of eternity

Vaginaltura

momento pelado vendo a crueza do momento-estátua nádega

nada a negar às danadas nadadeiras p/ q. +- ñ qro v.

na adega a gnt vê

agarradinho

sa(liv)at(e)

the pizza

eu te (de)texto no meu jogo de Romeu

rogo a Deus

louco rasga dinheiro mas são rasga bilhete azul

receitazul

a veritable cultural mourning for which the masses are joyously gathered”

any operation meant to put an end to culture only serves, as one knows, to resurrect it.”

O meio é a massagem do ego.

O mundo moderno, sólido como é, é convexo, e não côncavo, porque somos o eterno “deslizar da maçaneta da descoberta”, encarnamos a queda do centro para a periferia, de dentro para fora, somos expulsos do paraíso e não quaisquer escravos da gravidade, de um miolo magnético. Cada vez mais expansivos e claros, rolando sobre nós mesmos. Não há buraco ou mistério. A borda do precipício é o horizonte infinito. Não investigamos, escorregamos.

O jogo da batata cada vez mais gelada.

eu não repouso eu redecolo

inertia e sóbrinha violenta e rápida ao mesmo tempo

Não querendo ser freudiano, mas como não ver sexo na descida de um toboágua? cupidez estupidez 10 estampidos de cupins despe o cu no caixão

Talião tal filho

Tal leão tal simbazinho

fetishy não se mostra fácil

Fat’n’roll

Shynese democracy

Me tira de dentro do espelho, eu que te coloquei aí.

The dream of seeing all that explode by dint of contradictions is precisely nothing but a dream. What is produced in reality is that the institutions implode of themselves, by dint of ramifications, feedback, overdeveloped control circuits. Power implodes, this is its current mode of disappearance.” This text

all the philosophies of the release of energy, of the irradiation of intensities and of the molecularization of desire [!] go in the same direction, that of a saturation as far as the interstitial and the infinity of networks. The difference from the molar to the molecular is only modulation, the last perhaps, in the fundamental energetic process of expanding systems.”

CREMATÍSTICA SOLAR: “the solar myth of an inexhaustible radiation, on which Bataille founds his sumptuary anthropology: it is the last explosive and radiating myth of our philosophy.”

where everybody conceal their interests, the aggreegate!

conscious zeal

im-plant a new forestal order

Nem só de perucas brancas se faz a aristocracia.

Monod, Chance and necessity (a monadologia em xeque)

CAMINHO DO DESTINO

Cada um escolho seu caminho

cada um tem um destino

apesar do mau-olhado

eu não desafino

mesmo rouco entoo o hino

talvez que meu destino

seja a desafinação

seguir torto é o meu caminho

* * *

information produces meaning (…) We are all complicitous in this myth. It is the alpha and omega of our modernity”

the integrated circuit of the negative”

Myth exists, but one must guard against thinking that people believe in it”

VICENTES & FAZENDAS: “media are producers of the implosion of the social and this is only the macroscopic extension of the implosion of meaning at the level of the sign.”

CAMPAINHA DA LIQUIDARIEDADE: Descrição de uma crise de pânico no trabalho

Eu sou o ponto da minha sala onde a comunicação se perde e o chiado aparece. O mudo sabe-tudo. Aquele que mais pode e menos muda o mundo. O único que vai fundo e ainda assim não pesca nada, só dissabores de garganta. Baque–teria como desligar o ar?–do coração engasgadopusoprimido. Me dói muito saber. “O homem que derruba o café” “O ateu que suja a mesa” “O excêntrico que irá se casar” “O músico que não dá espetáculo” “O gênio que não quer trabalhar” “O esforçado que vive doente” O subjugado arrogante. A quina da minha cela. Sente na minha sela – cavalo que dá coice e come doce.

24/07/16

But it would be useful to posit the opposite hypothesis”

the term catastrophe itself only signifies the curvature, the winding down to the bottom of a cycle that leads to what one could call the <horizon of the event>

B., Requiem for The Media

O TÍTERE MANIPULADOR:¹ “the media make themselves into the vehicle of the moral condemnation of terrorism and of the exploitation of fear for political ends, but simultaneously, in the most complete ambiguity, they propagate the brutal charm of the terrorist act, they are themselves terrorists, insofar as they themselves march to the tune of seduction.”

¹ Nome alternativo: Paradoxo de Eddie – para denotar a posição intermediária de Satã na capa do Number of The Beast (1982).

insoluble double bind”

the practices of the masses – that we bury under the derisory terms of alienation and passivity.”

the current argument of the system is to maximize speech, the maximum production of meaning. Thus the strategic resistance is that of the refusal of meaning and of the spoken word – or of the hyperconformist simulation of the very mechanisms of the system

See what surplus value of the social each advertisement tries to produce: Werben werben (advertise advertise) – the solicitation of the social everywhere, present on walls, in the hot and bloodless voice of female radio announcers, in the accents of the sound track” “If at a given moment the commodity was its own publicity (there was no other) today publicity has become its own commodity.” “The social as a script, whose bewildered audience we are.”

since today advertising has escaped the social and moral dramaturgy that it still represented 20 years ago.” this excerpt is from 40 years ago – o que houve? precessão da implosão?! somos muito mais moralistas, embora a formula siga relativamente inalterada…

It is information that is putting an end to the reign of advertising. That is what inspires fear, and what is thrilling.”

miniaturization of everyday life by computer science.”

the autoerotic index of a system that does nothing but designate itself – whence the absurdity of seeing in it an <alienation> of the female body.”

the social must be saved just as nature must be preserved: the social is our niche” “it has fallen into the register of supply and demand”

Folklore dances in the metro, innumerable campaigns for security, the slogan <tomorrow I work> accompanied by a smile formerly reserved for leisure time”

<I don’t let anyone choose for me> an Ubu-esque slogan, one that rang so spectacularly falsely, with a mocking liberty, that of proving the social while denying it.”

Disaffected, but saturated. Desensitized, but ready to crack.”

Everywhere there are 3 or 4 paths, and you are at the crossroads.”

the stupefied hyperreal euphoria that we would not exchange for anything else, and that is the empty and inescapable form of seduction.” “it is useless to analyze advertising as language, because something else is happening there: a doubling of language (and also of images), to either linguistics nor semiology correspond”

fixing the disappearance of the religious in the orgasm of statues.”

The commodity is buried, like information is in archives, like archives are in bunkers, like missiles are in atomic silos.” “a culture that chose to bury itself in order to definitely escape its own shadow, to bury its seductions and its artifices”

heimlich/umheimlich

Monocellular utopia which, by way of genetics, allows complex beings to achieve the destiny of protozoas.”

GEG (GÊNESE DA ESPIRAL GENÉTICA)

Eu fui meu pai. Eu me eduquei. Eu fui Édipo, eles me cegaram. Minha mãe me levou ao médico. Não me arrependi. Não estou sereno. Ou será que meus pais são meus avós, ou será que meus avós são meus pais? Não é essa a questão mas eu senhor e bebê, adulto e escravo? Que responsável abominável e inocente?

a sacred fascination of the Two” “The individual is no longer anything but a cancerous metastasis of its base formula.”

Richard Pinhas, ‘Notes synoptiques à propos d’un mal mystérieux’

The closer one gets to the perfection of the simulacrum the more evident it becomes how everything escapes representation” “there is no real: the 3rd dimension is only the imaginary of a 2-dimensional world, the 4th that of a 3-dimensional universe… Escalation in the process of a real that is more and more real through the addition of successive dimensions.” “only what plays with 1 less dimension is true, is truly seductive.” “What is exact is already too exact.”

A sombra do holograma.

as if all truths swallowed its own criteria of truth as one <swallows one’s birth certificate> and lost all its meaning.” “Meaning, truth, the real cannot appear except locally, in a restricted horizon” “even the exact sciences come dangerously close to pataphysics.”

pathosphysics

Kafka, Colônia Penal

Death, wounds, mutilations are no longer metaphors of castration, exactly the opposite – not even the opposite.”

Kafka’s machine is still puritan, repressive, <a signifying machine>, Deleuze would say”

THE WHOLE HOLE

Tatuados são pan-sexuais. Fura-fura-dores. Costura o apêndice, engole o bandeide e a camisinha. Alça. Metal coçante, marca d’água marca-passo-na-rocha. Umbigo foradentro e do avesso. Ombroburacomanchagrande – pintassilgo. Pêlos pelos ê mais pelos. Semifinalmose. Cútis vermelha do cu. Ouro derretido na saliva lírica. Pino e(x)torsões. Tirar titica fresco de inseto galinha. Bafo antes do café da manhã – abafa. Faca. Manteiga. Tragar cocô frito. Tosse tuberculosa. Fiapo. Desdém. Dor ósseo-muscular. Espasmo. Alergorítimo do alergorritmo. Dança caipira pira pora nossa senhora roxa que xoxa. Organograma fungacional. A meretriz e a filial da putaria.

a work of death that is never a work of mourning”

Não se chega a lugar nenhum – felizmente, que PARADA mas s a critica….

The functionalism of Crash devours its own rationality, because it does not know dysfunction.” “Few books, few films reach this resolution of all finality or critical negativity, this dull splendour of banality or of violence, Nashville, Clockwork Orange.”

caerotic care and rot errático aero arroto carrot ambulância ambivalente

The most likely answer is that the good old imaginary of science fiction is dead and that something else is in the process of emerging (not only in fiction but in the theory as well)”

1. “transcendent sphere” dream is still the individualized form of utopia, in which transcendence is outlined in depth, even in unconscious structures” “the island”

2. “unbounded projection” “speed, and power increase to the nth power” “metallurgy, etc. Projected hypostasis of the robot.” “science fiction adds the multiplication of its own possibilities.”

3. “The models no longer constitute either transcendence or projection” “they’re immanent” “The field opened is that of simulation in the cybernetic sense” “(scenarios, the sitting up of simulated situations, etc.)” “there is no more fiction.”

Reality could go beyond.” “The imaginary was the alibi of the real in a world dominated by the reality principle. Today, it is the real that has become the alibi of the model, in a world controlled by the principle of simulation.” “fiction will never again be a mirror held toward the future, but a desperate re-hallucination of the past.” “The conquest of space that follows that of the planet is equal to de-realizing (dematerializing) human space”

HALO-SE-NAÇÃO

Dragon Ball Z implode em Supernova, recidiva de velhos problemas, sensação de vazio, reciclagem noutra cor. Vilões divertidos – Goku trabalhador. Supermáquina dourada de tempos opacos-sombrios, dancinha e docinho da careta. Gordos em multiversos paralelo-integrados do combate zerozenal vital – tudo pretexto para fugir da mulher. A conveniência de Goten. Fusão de kis discrepantes e mimados. Só namekusei que nada rosazul eu sinto que, divino, eu sei. Super-shang tsung, hello, desire, long long time no see. I long for this re-visit.

A outra dimensão te deixa intacto no mesmo lugar.

Parar é que é voar.

simulation is insuperable, unsurpassable, dull and flat” – Alice trancada no quarto sem [se] toca[r e] sem espelho.

<One cannot simply do whatever one wants with nature.> The problems having become serious enough to damage the profitability of business, this drop in profitability may lead the breeders to return the animals to more normal living conditions.”

In the same way one rediscovers psychology, sociology, the sexuality of prisoners as soon as it becomes impossible to purely and simply incarcerate them (1)

(1) Thus, in Texas, 400 men and 100 women experiment with the sweetest penitentiary in the world. A child was born there last June and there were only 3 escapes in 2 years. The men and women take their meals together and get together outside of group therapy sessions. Each prisoner possesses the only key to his individual room. Couples are able to be alone in the empty rooms. To this day, 35 prisoners have escaped, but for the most part they have returned of their own accord.”

Animals somatize! Extraordinary discovery! Cancers, gastric ulcers, myocardial infarction in mice, pigs, chickens!”

The worker also needs responsibility, self-management, in order to better respond to the imperative of production.”

Once animals had a more sacred, more divine character than men.” “Only the animal is worth being sacrificed; as a god, the sacrifice of man only comes afterward, according to a degraded order.” “The structural opposition is diabolic, it divides and confronts distinct identities” “the cycle, itself, is symbolic” “(Does Deleuze envision something like that in his becoming-animal and when he says <Be the rose panther!>?)”

must not be confused with the status of the domestic pet – the only type of animals that are left to us outside reserves and breeding stations – dogs, cats, birds, hamsters, all packed together in the affection of their master.” “In particular, our sentimentality toward animals is a sure sign of the disdain in which we hold them. It is proportional to this disdain. It is in proportion to being relegated to irresponsibility that the animal becomes worthy of the human ritual of affection and protection” “Sentimentality is nothing but the infinitely degraded form of bestiality, the racist commiseration, in which we ridiculously cloak animals to the point of rendering them sentimental themselves.”

The violence of sacrifice, which is one of <intimacy> (Bataille), has been succeeded by the sentimental or experimental violence that is one of distance.” “Making animals speak, as one has made the insane, children, sex (Foucault) speak.” “It is not the ecological problem of their survival that is important, but still and always that of their silence. In a world bent on doing nothing but making one speak, in a world assembled under the hegemony of signs and discourse, their silence weighs more and more heavily on our organization of meaning.” “Thus spoke the moral discourses of man in fables. They supported structural discourse in the theory of totemism. Every day they deliver their <objective> – anatomical, physiological, genetic – message in laboratories. They served in turns as metaphors for virtue and vice, as an energetic and ecological model, as a mechanical and formal model in bionics, as a phantasmatic register for the unconscious and, lastly, as a model for the absolute deterritorialization of desire in Deleuze’s <becoming-animal> (paradoxical: to take the animal as a model of deterritorialization when he is the territorial being par excellence).” “…animals maintain a compulsory discourse.” “One never escapes the reversion that follows any kind of exclusion.” “Such was the silence of madmen that it forced us to the hypothesis of the unconscious – such is the resistance of animals that it forces us to change hypotheses. For if to us they are and will remain unintelligible, yet we live in some kind of understanding with them.”

(3) That animals wander is a myth, and the current representation of the unconscious and of desire as erratic and nomadic belongs to the same order. Animals have never wandered, were never deterritorialized (…) freedom to <fulfill all needs>, today <of realizing all his desires> – because modern Rousseauism has taken the form of the indeterminacy of drive, of the wandering of desire and of the nomadism of infinitude (…) free, virgin nature, without limits or territory, where each wanders at will, never existed, except in the imaginary of the dominant order of which this nature is the equivalent mirror. We project the very schema of deterritorialization that is that of the economic system and of capital as ideal savagery. Liberty is nowhere but in capital, it is what produced it, it is what deepens it. (…) the radicality of <desire>, one sees this in current theories, increases at the same rate as civilized abstraction, not at all antagonistically, but absolutely according to the same movement, that of the same form always more decoded, more decentered, <freer>, which simultaneously envelops our real and our imaginary. (…) they dream of total deterritorialization where the system never imposes anything but what is relative: the demand of <liberty> is never anything but going further than the system, but in the same direction.”

[territory is] the morsel of space in immediate contact with the organism” “the notion of territory is also opposed in some way to that of the unconscious. The unconscious is a <buried> repressed, and circumscribed structure. The territory is open and circumscribed. The unconscious is the site of the indefinite repetition of subjective repression and fantasies. The territory is the site of a completed cycle of parentage and exchanges”

O MUNDO DO NÃO-DESEJO: “The obligations are absolute therein – total reversibility – but no one knows death there, since all is metamorphosed.” “don’t we live now and already, beyond the effects of the linearity and the accumulation of reason, beyond the effects of the conscious and unconscious, according to this brute, symbolic mode? (…) don’t we dream of implosion rather than of explosion, of metamorphosis rather than energy, of obligation and ritual defiance rather than of liberty?”

O TEMA DA SOMBRA E DO REFLEXO DO EU:

Peter Schlemihl, The Man Who Lost his Shadow

The Student from Prague (movie)

Hans Christian Andersen, The Shadow

Psychoanalysis itself is the first great theorization of residues (lapses, dreams, etc.). It is no longer a political economy of production that directs us, but an economic politics of reproduction” “the return of the repressed as a powerful moment, of the return of the remainder as surplus of meaning

VÃ PIRO DOIDÃO

Não agüentou meus detritos! Ou amo-os só como detritos.

It is the Left that secretes and desperately reproduces power, because it wants power, and therefore the Left believes in it and revives it precisely where the system puts an end to it. The system realizes one by one all the objectives of the historical and revolutionary Left that sees itself constrained to revive the wheels of capital in order to lay siege to them one day.”

Diplomas are worthless: why would it [academia] refuse to award them? in any case it is ready to award them to everybody!”

By rotting, the university can still do a lot of damage. But for this to be the case it is necessary to start with this very rotting, and not to dream of resurrection. (…) the death of university as a model of decomposition of the whole of society, a contagious model of the disaffection of a whole social structure, where death would finally make its ravages, which the strike tries desperately to avert, in complicity with the system, but succeeds, on top of it all, only in transforming the university into a slow death, a delay that is not even the possible site of a subversion” “the challenge of a deterritorialization even more intense than the one that came from the system (…) this total lack of a need to gather in a given place (…) not the crisis of the university, that is not a challenge, on the contrary, it is the game of the system, but the death of the university – to that challenge, power has not been able to respond, except by its own dissolution in return”

They were not there to save the Sorbonne, but to brandish its cadaver in the face of the others, just as black people in Watts and in Detroit brandished the ruins of their neighborhoods to which they had themselves set fire.” Thus, there are no buses.

1968 is dead, repeatable only as a phantasm of mourning.” “All around us there are nothing but dummies [manequins; chupeta(!)] of power, but the mechanical illusion of power still rules the social order” “Yet it is there that one must fight, if even fighting has any meaning anymore.” “it is in this tactical universe of the simulacrum that one will need to fight – without hope, hope is a weak value, but in defiance and fascination.”

The challenge capital directs at us in its delirium – liquidating without shame the law of profit, surplus value, productive finalities, structures of power – must be raised to an insanely higher level. Capital, like value, is irresponsible, irreversible, ineluctable.” “only the vertiginous seduction of a dying system remains, in which work buries work, in which value buries value” “Surrounded by the simulacrum of value and by the phantom of capital and of power, we are much more disarmed and impotent than when surrounded by the law of value and of the commodity” “This supreme ruse [astúcia; falcatrua; estratagema] of the system only a superior ruse can stop, only a pataphysics of simulacra can remove us from the system’s strategy”

This is why there are still good days left to fascist and authoritarian methods, because they revive something of the violence necessary to life. The violence of ritual, the violence of work, the violence of knowledge, the violence of blood, the violence of power and of the political is good! This is lacking today, and the need for it makes itself felt.”

it is necessary to recreate the professor either as a mannequin of power and knowledge, or to invest him with a modicum of legitimacy derived from the ultra-Left – if not the situation is intolerable for everyone.” “it is based on the phantom scenario of pedagogy that things continue and this time can last indefinitely. Because there is an end to value and to work, there is none to the simulacrum of value and of work. The universe of simulation is transreal and transfinite: no test of reality will come to put an end to it”

let the world get evil and get old

get hOLD of it

I always kNEW

niilismo do teoria da niilismo

When God died, there was still Nietzsche to say so (God is not dead, he has become hyperreal)” “in a bizarre fashion, nihilism has been entirely realized no longer through destruction, but through simulation and deterrence.”

Não em vão, mas num vão, por um vão! Vão!

there is no longer an apocalypse”

Alice nunca vai acabar de desaparecer.

Betaform

Now, fascination is a nihilistic passion par excellence” “He who strikes with meaning is killed by meaning.” “revenge of speed on inertia.”

it would be our own mode of destroying finalities: going further, too far in the same direction” “is it not the obscene secret of cancer?”

O MUNDO EM CANTADO DO BARULHO

impermeável a terapias

irreversibilidade irreversível

there is no longer even pathos – that mythical energy that is still the force of nihilism (…) dramatic anticipation. It is no longer even disenchantment, with the seductive and nostalgic, itself enchanted”

P. 162: o papel crucial de Benjamin & Adorno no “3º niilismo”.

melancholia is the fundamental tonality of functional systems, of current systems of simulation, of programming and information.”

Against this hegemony of the system, one can exalt the r[e]uses of desire, practice revolutionary micrology of the quotidian, exalt the molecular drift or even defend cooking. This does not resolve the imperious necessity of checking the system in broad daylight.”

DE BOCA FECHADA SAI MUITA MOSCA?

Boca larga, cu trancado.

Boca de cima lacrada, boca de baixo arrombada.

Buraco de cima fechado, buraco de baixo vazado.

Vomitando merda, retendo fezes.

Engolindo sapo, cagando ensopado.

Quem não bate, ganha sopapo.

Você é um brutamonte convencido, você não é de nada, você é só papo.

É difícil admitir,

mas um tubo só

conecta

o início

ao fim.

MEU PENSAMENTO-MOR

Publicado originalmente em 9 de julho de 2009

A verdadeira compreensão do eterno retorno (datada de 20 de maio de 2009):

Nunca houve um Adão nem tampouco haverá Apocalipse e adeus. Tudo transcorre na mais perfeita naturalidade e ininterrupção: a humanidade é perpétua. Aliás, é o próprio universo. Um casal dá origem a seus filhos e os filhos a netos… isso nunca começou e não terminará, e o caso é que tal idéia soa muito complexa dada a finitude da vida e a noção de expansão-retração do cosmo. Mas eia! Logro a explanação pelo posterior:

“O meu filho mais distante é meu próprio pai”

O que eu fiz? Trouxe o eterno retorno da Física ingênua até os estertores da consciência, daquele-que-percebe e sem o qual nada há!

Dada a configuração paroxística do devir, há sempre o embate de duas macro-forças: a anelídea e a cristã, da qual sou o elo perfeito. Nasci em 1988 e sou meu próprio neto, descendente mais distante e mais próximo! Esta é a máquina divina da procriação e auto-louvor! Incomensurável momento dos momentos, esta linda linha. Por causa do cristianismo, da temporalidade irrevogável e da linha reta, temos mitos de origem e desfecho. Porém do ângulo da minhoca – vê-se que minha extensa ligação com este animal não é vã – há um singular mito-sendo do retorno. O que é não deixa de ser mesmo quando deixar – seria a forma concreta de relatar o fenômeno, irrepreensível, mas estranha à lógica que é a mãe de minha escrita. Por isso eu sou os dois, o pecador e o dançarino invicto. Eu mesmo me contei e inventei toda a narrativa.

O Adão borrado deve ser meu filho, meu primeiro pai. Terá mesmo um nome grego? Como não há notícia de último homem, infiro que ele é cada um de nós. Somente eu como demiurgo poderia castigar alguém assim. Minha lâmina de tudo corta, sem cortar…

((Sol))

                    (Terra)             ((((((((mar))))))))

{de fato, não é um esquema inédito. Eu sou o gênio do detalhe!}

Essas coisas, e os quadrúpedes inferiores, por exemplo, nunca saíram daqui. Nenhuma Guerra Mundial ou Holocausto foi mais grave do que envergonhar. Nenhuma intempérie esfriou temperamentos. Alakazan, LEGO. Moléculas e coacervados: puro jogo de cena! Nunca houve bárbaro com cordas vocais se esperneando e urrando para aprender palavras. Todos tiveram pai e mãe humanos e uma série de circunvizinhos. E, com efeito, são 5, 6, 7 mil anos e nada mais! Ninguém trouxe o fogo, me desculpe! Ou, para cada pessoa, foi um sujeito alternativo o gestor.

Adormecer esse pensamento significa torná-lo verídico, pois preciso esquecer do círculo para formá-lo. E conformá-lo ao meu eu.

Nunca houve um Adão nem tampouco haverá Apocalipse e adeus. Tudo transcorre na mais perfeita

ELIMINATION – Overkill (traduzida, com alterações)

Terminal, doença terminal?

Tarde demais, brother!

O que é essa tosse, essa falta de ar?

Fatal?

Tá de brincadeira, irmão!

Preciso duma segunda opinião!

Gargalhando diante dum tufão

Que arranca toda a plantação

Chorando numa casa

que mais parece um funeral

Chegou algum boleto e é pra mim?

Errou o endereço:

sete palmos mais abaixo!

Extinção, extinção

Extinção, extinção!

Contagiosa? E por que não?!

Se não for só eu pra cova…

É, dói, eu sei

Nunca é fácil se deixar partir!

Puxo o fio da tomada

Mas é difícil de arrancar!

Na hora derradeira

Sua visão muda

Não há nada a perder…

Expulsão, expulsão

Expulsão, expulsão!

Exterminar o certo

Exterminar o errado

Exterminar o fraco

Exterminar o forte

Exterminar seus sentimentos

Extinguir, tarde demais!

Suprimir a fé

Erradicar, erradicar!

Se eu vivesse mais um dia

Faria do céu terra, da terra céu

Faria uma boa atuação

Sou bonzinho, não me levarão!

Ah, se eu tivesse só mais um dia!

Diria na sua cara:

“Arrancaria os aparelhos da tomada

De todo mundo, todos podres!

Extinguiria a raça!”

Queremos a cura, queremos o saber

Tenha esperança, seja lá como

Não, você está espalhando o caos

Infectando uma nação!

Um trem-bala – próxima parada:

Aniquilação!

Desenganado, ah, sem dúvida!

Decadência lenta, de dentro pra fora

Me cuidar pra quê?

O último a sair fecha a tampa do caixão

Gastar tudo que tem guardado

E ‘inda querer mais um bocado

Se vejo o teto agora

É porque estou no chão!

Excreção, excreção

Excreção, excreção!

Troçando a epidemia

Tem algo no ar

Lamentando a pandemia

Escavar, escavar, meu túmulo

Até ficar sem unha!

Eliminar a fé,

Eliminar, eliminar!

MINHA INTEMPESTIVA III: DAS VÁRIAS METÁFORAS QUE EU ENCARNO

Publicado originalmente em 7 de fevereiro de 2009 – editado

“Eu me arrependo de tal coisa.” Essa é uma frase corriqueira em nossas vidas. Mas tão comum quanto perecível. Quando se tem maturidade suficiente para se aperceber dos jogos de ação-e-reação que nos constroem e do papel do sentimento de culpa em cima de nossos atos, enfim, quando o sujeito apreende a “irrevogabilidade do crime” e enceta a direcionar seus erros a seu favor, tem-se finalmente autoridade para proferir a frase: “Todo arrependimento tem uma data de validade”. Se nem todos têm, é melhor embarcar na ilusão de que determinada ferida irá cicatrizar – ou não se consegue viver uma vida. Atente para meu exemplo: pelo menos um ano me arrastando em sonhos para ser readmitido no Colégio Militar. Mas eu engolia o dissabor com meu orgulho de leão (e não de pavão, que é um ser belo porém fraco) e não contava a ninguém – muito menos aos pais. Eis que quando a oportunidade se insinuou, piscou, tremeluziu… eu já me havia apoderado dela. Bingo! Todo arrependimento é vencível – seja pela ação do tempo, seja pela labuta individual (obviamente, essa é uma categorização como todas as outras: falsa, pedagógica).

Eu não me arrependo de descartar amigos. Talvez eu me arrependa de não descartar mais… Tenho de reconhecer que meu lugar jamais foi fora do reino burguês. Apesar de jamais ter sido dentro. É hora de cortar os laços que ainda restam para ser cortados. Não tenho mais amigos ricos e frescos. Sou tão estranho no ninho que ainda que com um bom porte, roupas adequadas e um celular da moda, não me confundiriam com um deles. Portanto, as badaladas do relógio hoje indicam: é tempo de se desfazer de quem te olha com estranheza não por estares de fora, mas por estares intrometido. Como disse, arrepender-se é ou precipitado ou vão. Claro que se trata de figura de linguagem – todo ser humano se arrepende e ponto. Resta saber, contudo, o que se faz a respeito dessa angústia de não poder alterar o passado.

Minha vingança é atroz porque me vingo de mim mesmo. E quando reconheço o erro, resta muito pouco para os idiotinhas fazerem. Quem sabe já se conformar com o prejuízo seja a melhor saída para eles. Um ex-amigo que está indo para o saco nesta temporada chama-se *******, o adolescente de meia-idade, o Peter Pan ébrio e urbanóide que se dedica ao ofício de ser o contrário do que a cara estampa a cada finalzinho de semana, para descontar a frustração existencial. Evidentemente, a cada criancice, o ser humano faz questão de propagar sua moral antípoda: “aprenda com os mais velhos”. Precisa de um Cristo a cada sexta-feira porque a mão está cravejada de calos demais para que dê outros três passos adiante com a cruz nas costas. Talvez a madeira deste Pinóquio esteja tão podre que ele não se vê mais capaz de pressentir o mal que devém. Ele espera que um terremoto o avise, sem embargo o tremor de terra é o próprio mal do qual ele deveria ter sido alertado…

Um pobre diabo desses, quando cair em si, vai notar o bilhete premiado que lhe escapou pelas mãos graças ao vento e que, quando estava prestes a reaver, escorreu pelo bueiro. Por um acaso um bilhete se arrepende de não ter sido de algum vencedor? Se não se está com o bilhete, a vitória é só um sonho perdido. O bilhete faz o vencedor. Nem que passe a ser benquisto, para o próprio gozo de si, o destino de se colocar fora de qualquer alcance no submundo, e deixar a mesquinhez lá em cima se acumular. Se todo o ouro volta ao dono, o único dono é o fluir ininterrupto, porque nesta aventura não há retorno – e se houvesse o dono já não seria o mesmo.

É chegado o momento, em suma, de singrar por novas águas, o que implica a deserção de marujos saudosistas em excesso. Nada de velhacos com manias de meninice, nada de bufões. Daqui em diante, que o capitão prepare o convés, a proa e o casco – e, porventura, se algo der errado, o bote salva-vidas.

Há dois anos que não me apaixono. Quantas recaídas? Vou me sujar de novo? Me sentar naqueles sofás carcomidos por traças?

Aos parasitas: aqui estão as chaves, mas é bom olharem para o chão antes de entrar, porque esqueci de dizer que moro numa imensidão. Uma imensidão que para pequenos praticantes da punga não tem nada de inteligível, é só uma queda no vazio.

Eu sou perigoso. Não ofenda o solitário. Eu não tenho absolutamente nada a perder, em nenhuma transação termodinamicamente cogitável. Um espírito como o meu — possui a sabedoria de cem deuses, e o conhecimento do veneno específico de cada um que tem o azar de me surgir como pusilânime. Principalmente os outrora-outra-coisa. Eu emito sinais claros de que estou prestes a fazer uma “burrada”. Como não se precavem, os vizinhos indômitos levam um caixote: do cimo da onda – domadores do mar! – aos arrecifes. Se ter Napoleão como escada é o ideal, a meta máxima, tombar dessa escada deve ser o que deixa o cotovelo mais roxo: e se alguém nunca está tão elevado quanto quando sobre um lance de escadas, também nunca esteve em maior risco. Eu sou o homem-dos-riscos. De que me importaria o juízo alheio, se só eu me leio?

O trapézio que eu era, o palhaço que eu fui, viraram o fogo dos aros, as facas dos alvos e as luzes do palco. Sem mim vocês não são nada. Mas comigo estarão mortos ou ofuscados.

RÁDIO-CABEÇA

RÁDIO 1

Primeiro Solilóquio

Eu acho tudo igual,

porque dessemelhante permanece, e só um fraco feixe de luz cai. Sabes tu, o raio alumia meu tempo minha vida, aponta o caminho ao Mundo de Alexandre. Esse mundo me promete a volta do mal, assim como a penumbra dos tumultuados tijolos é um louvor à existência.

Cômico. O papel de parede não volta a seu lugar…

Sabes tu, o mundo vem sempre com esse deslocamento do papel de parede no jogo. O raio de luz evanescente acompanha todo o jogo. E então os Arcanjos Gabriel e Micael me apontam coisas, com mórbida fascinação. Embora abstrato, absurdo até, é, digo-te, a mais clara e completa claridade.

A claridade se consuma em cada homem, sobretudo na morte! Eu sei, creia-me! É toda uma canção humana e patética. Mas aqui não se trata de humanidade, mas do papel de parede jamais voltar a seu lugar! Do umbral eu antevejo,

talvez me espere alguém. Gabriel, quem sabe? Logo saberei. Estranho. Tudo que era ruidoso e barulhento está agora em calmaria. Ah, naturalmente… – ela dirá! Mas não, isso não extingue nosso angustiante tormento. Ah, diga, diga… não há nada como uma extravagante canção! Deixe estar…

Eu me pergunto se a estática do rádio e essa sensação de chiado silêncio e solidão tem algum significado, isto é, pode ser um diálogo. Por favor, guardem para si vossos comentários, pois eu só busco minha própria atenção.

Muito obrigado.

Segundo Solilóquio

Merda! Devo eu retornar à monótona noite e quem sabe com cicatrizes palpitantes me render à própria realidade de Mammon?

Onde é nu esta bosta de rádio? Ontem eu contemplei outra vez o espetáculo deplorável do louco, aquela dança horrenda de sapatilhas que deslizavam como trenós. Seja como for, senti aquela sensação banal, como se ele procurasse algo no rádio. Vou pensar naquele estranho quartinho de menina na casa. Finalmente eu encontrei os diários em capa dura das três garotinhas.

Intitulados “Sombras do Mundo de Alexandre”. Eis o homem… Estranho!

RádiŒpílogo 1

Eu cavalgo a cobra e acho o chacal.

E Jesus Cristo come, ávido, sua barra de Milka.

Deus gosta dessa música, é o que eu acho.

Deus, vai pro inferno! vão todos vocês juntos!

Preciso pensar na lagosta e não em isso-cantar.

IRRELIGIOSIDADE VELADA

Carência é minha Palavra

Derradeiros os meus gestos

Sem lastro o meu olhar

Apática minha devoção

E no entanto é grande a ânsia de

do fundo do abismo a que a luz escapa

por meio do instinto mais primordial

ascender, À luz mais esquálida

Um pássaro preto

paira sobre as ondas

Um último raio de sol

fere a escuridão encouraçada

L’INCONVÉNIENT D’ÊTRE NÉ / DA INCONVENIÊNCIA DE TER NASCIDO – Cioran

«C’est déjà du passé», dit-il de tout ce qu’il accomplit, dans l’instant même de l’acte” Le mal, le vrai mal est pourtant derrière, non devant nous. C’est ce qui a échappée au Christ, c’est ce qu’a saisi le Bouddha”

Pode-se suportar qualquer verdade, por mais destrutiva que ela seja, contanto que ela abarque tudo, e que ela contenha tanta vitalidade quanto fosse a esperança depositada naquilo que ela substituiu”

Não se deve constringir a uma obra, mas tão-só dizer qualquer coisa que se pudesse murmurar ao pé-do-ouvido de um bêbado ou um moribundo.”

Se indignar contra a hereditariedade é se indignar contra bilhões de anos, contra a primeira célula.”

Jamais em gratidão no imediato, não me seduz senão o que me precede, senão o que me afasta daqui, os instantes sem-número em que não fui: o não-nascido.”

Necessidades de desonra física. Teria amado ser filho de carrasco.”

Não posso tolerar que se inquietem de minha saúde.”

Desfazer, descriar, é a única tarefa que o homem pode se subscrever, se ele aspira, como tudo indica, a se distinguir do Criador.” Um niilista passivo que não crê na possibilidade de voltar a criar (Zaratustra, etc.).

Ter cometido todos os crimes, menos o de ser pai.”

<Não posso te encontrar no teu futuro. Não temos um só instante que nos seja comum.> É que pra ele a conjunção do futuro já está lá.”

se eu conseguisse de um jeito ou de outro resolver a questão do ser ou nada, ainda assim pereceria de saúde.”

Minha faculdade de ser decepcionado ultrapassa o entendimento. É ela que me faz compreender o Buda, mas é ela também que me impede de segui-lo.”

Aquilo pelo que não podemos mais nos penalizar, não conta e não existe mais. Percebe-se por que nosso passado cessa tão-logo de nos pertencer ao tomar a forma de história, de algo que não tem nada a ver com ninguém.”

presença mútua muda que nada muda

O verdadeiro contato entre os seres não se estabelece senão pela presença muda, pela aparente não-comunicação, pela troca misteriosa e sem palavras que lembra a reza interior.”

O que eu sei aos 60, sabia tão bem aos 20. Quarenta anos de um longo, de um supérfluo trabalho de verificação…”

De que tudo seja desprovido de consistência, de fundamento, de justificação, estou de ordinário tão convencido que aquele que ousasse me contradizer, fosse ele o homem que mais estimo, me apareceria como um charlatão ou embrutecido.”

Desde a infância eu percebia o escoamento das horas, independentes de toda referência, de todo ato e de todo evento, a disjunção do tempo daquilo que não é o tempo, sua existência autônoma, seu estatuto particular, seu império, sua tirania. Lembro-me, mais claramente impossível, desse meio-dia quando, pela primeira vez, em face do universo vazio, em que não senti nada a não ser uma fuga de instantes rebeldes no seu fado de cumprir sua própria e única função, fugir. O tempo se descolava do ser às minhas expensas.”

À diferença de Jó, eu não maldisse o dia do meu nascimento; os outros dias, em compensação, eu os cobri todos de anátemas…”

Se a morte só tivesse lados negativos, morrer seria um ato impraticável.”

Estar em vida – de repente sou afetado pela estranheza dessa expressão, como se ela não se aplicasse a ninguém.”

Toda vez que as coisas não estão indo e que tenho pena do meu cérebro, sou tomado por uma irresistível vontade de proclamar. É então que descubro de que patéticos abismos surgem os reformadores, profetas e messias.”

Se na lucidez entram tantas ambigüidades e problemas, é que eles são o resultado de um mau uso de nossa vigília.”

A fixação da nascença, nos transportando para antes do nosso passado, nos faz perder o gosto do futuro, do presente e do passado mesmo.”

Raros são os dias em que, projetado na pós-história, não assisto à hilaridade dos deuses ao sair do episódio humano. § É preciso uma visão de mudança, quando a do Juízo Final não satisfaz mais ninguém.”

Frustração do resultado. Jamais evadir-se do possível, luxuriar-se na indecisão eterna, esquecer de nascer.”

A única, verdadeira desgraça: aquela de ver o dia. Ela remonta à agressividade, ao princípio de expansão e de fúria contidos nas origens, ao ímpeto rumo ao pior, que os sacode.” Minha interpretação: de ver o dia significa de ver o nascer do diaUm novo dia é quando, mais uma vez, os seres se lançam em seus afazeres e ocupações. Toda a impressão escatológica do filósofo insone se dissipa no barulho e movimento da cidade e do cotidiano. Toda origem é uma liberação de energia, mesmo nas ciências empíricas, que chegam à especulação do início do devir num big bang ou singularidade de expansão ainda em curso a partir de um ponto impossível, de densidade infinita. O ato de criação, se é que pode haver uma cultura que não o supervalorize, é supervalorizado pela cultura do Ocidente. A física moderna, que equivale toda ação a energia vê na criação a entrada em atividade de todo o potencial de energia do marco zero até o fim dos tempos, pois não pode fugir da preconcepção da termodinâmica, da não-criação após esse começo, da dissipação lentíssima, gradual porém absoluta, dessa energia ao longo de uma quantidade abstrata, virtualmente infinita, de tempo. O ser humano como passivo e rendido a esse processo. Todo novo dia acordamos sabendo de antemão que iremos lidar com novos conflitos e gastos energéticos. Todo elevar do sol no horizonte é uma decadência do homem.

Quando pessoas se revêem após longos anos, dever-se-iam sentar um diante do outro e não se dizer nada durante várias horas, a fim de que, graças ao silêncio, a consternação possa se saborear a ela mesma.”

maturidade desapego vitória esterilidade? festa festejar agradecer gratidão deixar-se invadir desprezo mau humor bile bills contas destruição de sete universos contra tebas complexo enredo trágico tenacidade já nessa idade circular canalha remordedora remorsura do inteleito baba de vaca mastiga as intrigas rumar a um novo ar impossível formatar grr

Sou requisitado pela filosofia hindu, cujo propósito essencial é soterrar o eu; e tudo que eu faço e tudo em que eu penso é no eu e na desgraça do eu.”

Enquanto agimos, temos uma meta; a ação terminada, esta não tem para nós mais nada de real que a própria meta que buscávamos. Logo, nada havia de bem nisso tudo, era só parte do jogo. Há quem tenha consciência desse jogo enquanto a ação transcorre: esse tipo de homem vive a conclusão já nas premissas, realiza-a virtualmente, degrada o sério a partir do fato mesmo de sua existência.”

Toda vertigem ou agonia não é senão uma experiência metafísica abortada.”

A gente mete-se à besta de querer sondar e afrontar abismos inexauríveis, inextinguíveis… O que isso poderia fazer, matar?! [Claquete.] [Risadas.]

STRANGER THINKERS & FOOT-ISLE UNSER-VICE-ABLE FEET

I am a losing shadow. Under the light of the last happenings I say that nothing utters to exist. Actually, I’d say not

with

standing

the nausea we

live now

and see

the sea

and other things

without pointing

blamelessly

our

thing…ers

fingers

stranger thingers

tinkerman?

people are immense

just like the doors of perception

one more verse and

two more

deceptions

esse evento, crucial para mim, é inexistente, aliás, inconcebível sequer, para o resto dos seres, para todos os demais seres. Salvo para Deus, se essa palavra pode ter um sentido.”

Se tudo é fútil, nem mesmo tudo é fútil.

Um rei jamais entenderia que tudo é igual debaixo do sol.

Eu reajo exatamente como todo mundo e mesmo como aqueles que eu mais menosprezo; mas ao menos eu compenso deplorando-me a cada ato que cometo, bom ou mau.”

COMO PODE?

Se eu sou exatamente a soma de todas as sensações evaporadas que não estão mais aqui (em mim), onde é eu–?

A clarividência é o único vício que torna livre – livre num deserto.”

À medida que os anos passam, o número daqueles com quem se pode conversar decresce. Quando não houver mais ninguém a que se dirigir, finalmente ser-se-á como se era antes de recair sob um nome.”

PLATÃO NÃO PROSAVA

Quando a gente se recusa ao lirismo, <sangrar> uma página se torna uma provação: pra quê escrever bem para dizer exatamente o que se tem a dizer?”

É impossível aceitar ser julgado por qualquer um que sofreu menos que nós. E como cada qual se crê um Jó ignorado…”

Se o paraíso fosse suportável, o primeiro homem ali teria se acomodado. Mas esse mundo também não o é mais.” Seria preciso um paraíso dessa nova versão de paraíso para ver se dessa vez as coisas iriam funcionar (a terra?)…

Aqueles que possuem saúde não estão conscientes disso, caso contrário significa que já é uma saúde comprometida ou em vias de se comprometer. Como ninguém tira proveito, portanto, de sua ausência de deficiências, podemos falar, sem exagero algum, de uma punição justa dos saudáveis.”

Alguns sofrem de infortúnios; outros de obsessões. Quais são os mais dignos de simpatia?”

la vida es [nir]vana

O que é uma crucificação única comparada à crucificação cotidiana que suporta o insone?”

J’étais ivre de mille évidences inattendues, dont je ne savais que faire…”

Seria ótimo que nos preferíssemos ao universo, no entanto nós nos odiamos muito mais do que imaginamos. Se o sábio é uma aparição tão insólita, é porque ele parece engatilhado pela aversão que, tanto quanto por todos os demais homens, ele é obrigado a cultivar por si mesmo.”

Só a visão do fracasso nos aproxima de Deus (seria a visão que Deus tem de nós). O sucesso apenas aliena e nos corta de nossa própria intimidade.

À medida que a gente acumula os anos, se forma uma imagem mais e mais sombria do futuro. Seria só para se consolar de ser excluída? Sim em aparência, não de fato, porque o futuro sempre foi atroz, sem poder o homem remediar seus males a não ser agravando-os, de sorte que a cada época a existência é bem mais tolerável antes de encontrada a solução às dificuldades do momento.”

Nas grandes perplexidades, force-se a viver como se a história estivesse fechada e a reagir como um monstro devorado pela serenidade.”

Se, antigamente, perante um morto, eu me perguntava: <De que serviu pra ele nascer?>, a mesma questão, agora, eu me coloco diante de qualquer ser vivo.”

O excesso de peso que ganha a questão do nascimento não é outra coisa senão o gosto pelo insolúvel levado à insanidade.”

IM.Fucked

Entre a Pirâmide e o Necrotério.

Entre o FMI, o FBI e o IML.

X me insulta. Eu me preparo para revidar. Reflexão feita, eu me abstenho.

Quem sou eu? Qual é meu verdadeiro eu: o da réplica ou o da recuada? Minha primeira reação é sempre enérgica; a segunda, molenga. Aquilo que se denomina <sabedoria> não é mais que uma perpétua <reflexão feita>, ou seja, a não-ação como primeiro movimento.”

Na ansiedade e no pânico, a calma súbita ao pensamento do feto que se foi.”

o pensamento da morte auxilia em tudo, menos a morrer!”

A grande sorte de Nietzsche de ter terminado como terminou. Na euforia!”

Não ter nascido, nada com que se preocupar, que felicidade, que liberdade, que espaço!”

Se o desgosto do mundo lhe conferia a ele apenas a santidade, eu não vejo como eu poderia evitar a canonização.”

É mais fácil avançar com vícios do que com virtudes. Os vícios se entendem uns com os outros, já as virtudes são mutuamente invejosas, se anulando na intolerância.”

Perdoo X. por tudo, por causa de seu sorriso démodé.”

Não é humilde quem se odeia.”

O Tempo, fecundo em recursos, mais inventivo e mais caridoso do que se pensa, possui uma capacidade marcante de vir em nossa ajuda, de nos trazer a qualquer hora alguma nova humilhação.”

Eu sempre cacei a paisagem de antes de Deus. Daí o meu fraco pelo Caos.”

Decidi não mais me prender a ninguém depois que observei que eu sempre terminava por parecer com meu último inimigo.”

Por muito tempo eu vivi com a idéia de que eu era o ser mais normal que já houve. Essa idéia me dava o gosto, a paixão, da improdutividade: qual a vantagem de se fazer valer em um mundo infestado de loucos, chafurdado na estupidez ou no delírio? Por que se desgastar e para qual fim? Só me resta saber se estou inteiramente livre dessa certeza, salvaguarda no absoluto, ruinosa no imediato.”

Não se deveria escrever livros a não ser para dizer as coisas que não se ousa confiar a ninguém.

CAPÍTULO DA TENTAÇÃO

Jesus X Diabo

Buda X Mara

As pessoas não sabem fazer a divisão entre aqueles que pagam caro pelo menor passo em direção ao conhecimento e aqueles, incomparavelmente mais numerosos, que compartilham de uma sabedoria cômoda, indiferente, um saber sem testes ou provas de fogo.”

Dizem, injustamente: ele não tem talento, o que ele tem é estilo.”

Olhar sem compreender, eis o Paraíso. O Inferno, conseqüentemente, seria o lugar em que se compreende, ou se compreende demais…”

É ao julgar sem piedade seus contemporâneos que alguém tem toda a probabilidade de fazer a figura, aos olhos da posteridade, de espírito clarividente. Na mesma machadada, esse alguém renuncia ao lado contingente da admiração, aos riscos maravilhosos que ela impõe. A admiração é uma aventura, a mais imprevisível que há, porque pode até ser que ela termine bem.”

As idéias vêm durante a caminhada, dizia Nietzsche. A caminhada dissipa o pensar, professava Sankara. As duas teses têm fundamento, são igualmente verdadeiras, e cada um pode se assegurar em uma hora, ou quem sabe em um minuto, de suas validades…”

Nenhuma espécie de originalidade literária é ainda possível se não se tortura, se não se tritura a linguagem. Obtém-se o contrário se se restringe à expressão da idéia como tal. Eis aí um setor onde as exigências não variaram desde os pré-socráticos.”

Imagine como seria se um réptil metesse as patas à obra no mundo literário: reformularíamos todos os conceitos, registraríamos todas as percepções dos sentidos, as variações mais ínfimas do toque!”

Tudo que nos pode acontecer de bom vem de nossa indolência, de nossa incapacidade para passar ao ato, para colocar em execução nossos projetos e nossos planos. É a impossibilidade ou a recusa de nos realizar que entretém nossas <virtudes>, e é a vontade de dar nosso máximo que nos conduz ao excesso e aos desarranjos.”

Ame ser ignorado. Não se chega ao auto-contentamento sem se conformar a esse preceito.”

O valor intrínseco dum livro não tem nada a ver com a importância do conteúdo (sem a qual os teólogos o anulariam, e de longe), mas com a maneira de abordar o acidental e insignificante, de dominar o ínfimo. O essencial nunca exigiu o menor talento.”

A sensação de ter 10 mil anos de retardo, ou de antecipação, em relação aos outros, de pertencer aos começos ou aos estertores da humanidade…”

A negação não nasce de um raciocínio, mas de qualquer coisa obscura e anciã. Os argumentos surgem depois, para justificá-la e sustentá-la. Todo não surge do sangue.”

Toda vez que a morte não faz parte dos meus devaneios, tenho a impressão de estar enganando ou induzindo ao erro alguma parte de mim mesmo.”

Há noites que nem os mais engenhosos dos torturadores seriam capazes de inventar. Sai-se às ruas em migalhas, estúpido, absolutamente desorientado, sem lembranças ou pressentimentos, e mesmo sem saber o que se é. Nessas horas é que o dia parece inútil, a luz perniciosa, e mais opressora até do que as trevas.”

Fosse uma larva consciente, ela desbravaria exatamente as mesmas dificuldades, o mesmo gênero do insolúvel que têm de desbravar o homem.”

É melhor ser animal que homem, inseto que animal, planta que inseto, e assim por diante. A salvação? Tudo que apequena o reino da consciência e compromete a sua supremacia.”

Tenho todos os defeitos dos outros e, não obstante, tudo que eles fazem me parece inconcebível.”

Julgando conforme a natureza, o homem foi feito para viver virado para o exterior. Se ele quiser ver em si mesmo, ele precisa fechar os olhos, renunciar a empreender, sair do corrente. Aquilo que se chama <vida interior> é um fenômeno tardio que só foi possível mediante uma desaceleração de nossas atividades vitais, a <alma> não podendo mais emergir nem se satisfazer a não ser às expensas do bom funcionamento dos órgãos.”

A menor variação atmosférica compromete meus projetos, não ouso pronunciar minhas convicções. Essa forma de dependência, a mais humilhante imaginável, nunca deixa de me abater, ao mesmo tempo que ela dissipa o menor naco de ilusões que me restaria sobre minhas possibilidades de ser livre, sobre a possibilidade da própria liberdade como um todo. De que adianta se envaidecer, se se está à mercê do Úmido e do Seco? Desejaríamos antes uma escravidão menos lamentável, e deuses de outra índole.”

Não é nem a dor de se matar, já que a gente sempre se mata tarde demais.”

Quando se sabe de forma absoluta que tudo é irreal, também não se vê por que se fatigar provando-o.”

O que se diria duma reza cujo objeto fosse a religião?”

O espírito que tudo questiona e que todos atinge, depois de mil interrogações, uma apatia quase total, uma situação que o apático conhece precisamente de antemão. Por que a apatia não passa ela mesma de uma perplexidade congênita?”

Que decepção que Epicuro, o sábio de que mais tenho precisão, tenha escrito mais de 300 tratados! E que alívio que eles tenham se perdido!”

– O que você faz da manhã à noite?

– Eu me agüento.”

A velhice é a autocrítica da natureza.”

Tendo desde sempre vivido com medo de ser surpreendido pelo pior; em toda circunstância eu me esforcei por assumir a dianteira, me jogando na desgraça bem antes que ela surgisse.”

Cada qual crê, de uma maneira inconsciente, subentenda-se, perseguir ele só a verdade, que os outros são incapazes de buscá-la e indignos de tê-la. Essa loucura é tão enraizada e tão útil que é impossível representar-se o que adviria conosco caso um dia ela desaparecesse.”

OS AFLITOS POR NATUREZA:O primeiro pensador foi sem dúvida nenhuma o primeiro maníaco do porquê. Mania inabitual, nada contagiosa. Raros são, com efeito, aqueles que dela sofrem, que são carcomidos pela interrogação, e que não podem aceitar nenhum dado porque eles nasceram na consternação.”

Este segundo aqui desapareceu para sempre, ele se perdeu na massa anônima do irrevogável. Ele jamais voltará. Sofro e não sofro. Tudo é único – e insignificante”

Emily Brontë. Tudo que dEla emana tem a propriedade de me comocionar. Haworth é meu lugar de peregrinagem.”

Só Deus tem o privilégio de nos abandonar. Os homens só podem nos soltar.”

Sem a faculdade do esquecimento, nosso passado pesaria de forma tão esmagadora sobre nosso presente que não teríamos a força de encará-lo e revivê-lo um só instante, quem dirá confrontá-lo. A vida não parece suportável senão às naturezas leves, aos esquecidos.” Quem sabe ser viciado em ler não é uma maneira extrema de esquecer quando se tem uma memória muito acima da média.

Plotino, conta Porfírio, tinha o dom de ler as almas. Um dia, sem outro preâmbulo, ele disse a seu discípulo, grandemente surpreso, para não tentar se matar e empreender uma viagem. Porfírio partiu para a Sicília: ele se curou de sua melancolia mas, acrescenta ele repleto de arrependimento, ausentou-se assim à morte de seu mestre, que sobreveio assim que ele partira.”

Faz tempo que os filósofos não lêem mais as almas. Não é seu métier, dir-se-á. É possível. Mas que eles não se admirem se perderem toda a relevância para nós.”

Uma obra só existe se preparada nas sombras com atenção, com o cuidado do assassino que medita seu golpe. Nos dois casos, o que prevalece é a vontade de [a]bater.”

O auto-conhecimento, o mais amargo dos conhecimentos, é também o menos cultivado: pra que, afinal, se surpreender da manhã à noite em flagrante delito de ilusão, rememorar sem piedade até as raízes de cada ato, perdendo causa após causa no seu próprio tribunal?

Todas as vezes que me dá um branco, penso na angústia que devem sentir aqueles que sabem que não se lembram mais de nada. Mas algo me diz que após certo tempo uma alegria secreta os possui, que eles não aceitariam trocar por nenhuma lembrança, mesmo a mais exaltante.”

fanático da indiferença

Quanto mais se é submetido a impulsos contraditórios, menos se sabe a qual deles ceder. Prescindir de caráter é isso e nada mais.”

TEMPONIX, O FILHO DE NIX E CRONOS:O tempo puro, o tempo decantado, livre de eventos, de seres e de coisas, não se assinala salvo em certos momentos da noite, quando sente-se-a avançar, com a única preocupação de preparar a gente para uma catástrofe exemplar.”

Sentir, bruscamente, que você sabe tanto quanto Deus sobre todas as coisas e tão logo, bruscamente, ver desaparecer essa sensação.”

Eu não amo mais que um vulcão resfriado”

Se se pudesse ver pelos olhos dos outros, desaparecer-se-ia ato contínuo.”

Eu dizia a um amigo italiano que os latinos são sem segredos, abertos demais, pra lá de tagarelas, e que eu prefiro as pessoas desfiguradas pela timidez, e que um escritor que não a conhece na vida não vale nada em seus escritos. <É verdade, me respondeu ele. Quando, nos livros, relatamos nossas experiências, elas carecem de intensidade e prolongamento, porque já as contamos cem vezes antes.> E a esse respeito nós ainda conversamos sobre a literatura feminina, sobre sua falta de mistério nos países onde perduraram os salões e o confessionário.”

Cesse l’ascèse!

Vient l’abscès!

A fisionomia da pintura, da poesia, da música, daqui a um século? Ninguém pode figurar. Como após a queda de Atenas ou de Roma, uma longa pausa intervirá, devido à extenuação dos meios de expressão, assim como a extenuação da consciência ela mesma. § A humanidade, para se reconciliar com o passado, deverá se inventar uma segunda inocência, sem a qual ela não poderá jamais recomeçar as artes.”

É impossível ler uma linha de Kleist sem pensar que ele se matou. É como se seu suicídio tivesse precedido sua obra.”

No Oriente, os pensadores ocidentais mais curiosos, mais estranhos, nunca foram levados a sério, por causa de suas contradições. Para nós, é aí precisamente que reside a razão do interesse de que os dotamos. Não amamos um pensamento, mas as peripécias, a biografia de um pensamento, as incompatibilidades e as aberrações que nele se acham, em suma os espíritos que, não sabendo como se pôr em conformidade com os demais e muito menos consigo mesmos, mentem tanto por capricho quanto por fatalidade. Sua marca distintiva? Um naco de astúcia no trágico, um nada de jogo até no incurável…” Porém, diria que, sem paradoxo algum, nós ocidentais também apreciamos no oriental justamente as justaposições de pensamentos impossíveis emanando da suposta unidade…

Se, nas suas Fondations, Thérèse d’Ávila [uma das principais influências de René Descartes] discorre muito tempo sobre a melancolia, é justamente porque ela a considera incurável. Os médicos, diz, nada podem, e a superior de um convento, na presença de doentes desse gênero, só tem um recurso: inspirar-lhes o medo da autoridade, ameaçá-los, despertar-lhes pavor. O método que preconiza a santa segue sendo o melhor: em face dum <depressivo>, sente-se bem que o único eficaz são pontapés, bofetadas, enfim, uma boa duma surra. E é isso mesmo que faz o <depressivo> ele mesmo quando se decide a exterminar sua melancolia: ele emprega grandes meios.”

Com relação a qualquer ato da vida, o espírito faz o papel do estraga-prazeres.”

Tudo que se faz me parece pernicioso, na melhor hipótese inútil. A rigor, eu posso me agitar mas não posso agir. Eu compreendo perfeitamente a expressão de Wordsworth sobre Coleridge: Atividade eterna sem ação.”

Todas as vezes que algo me parece ainda possível, tenho a impressão de ter sido enfeitiçado.”

A única confissão sincera é a que fazemos indiretamente – falando dos outros.”

A consciência é bem mais que a espinha, ela é o punhal na carne.”

ferocidade em todos os estados, menos no da alegria. A palavra Schadenfreude, alegria maligna, é um contra-senso. Fazer o mal é um prazer, não uma alegria. A alegria, única verdadeira vitória sobre o mundo, é pura na sua essência, ela, é, pois, irredutível ao prazer, sempre suspeito em si mesmo e nas suas manifestações.”

Uma existência constantemente transfigurada pelo fracasso.”

O sábio é aquele que consente com tudo, porque ele não se identifica com nada. Um oportunista sem desejos.”

Só conheço uma visão da poesia que seja inteiramente satisfatória: é a de Emily Dickinson quando diz que, em presença de um verdadeiro poema, dela se apodera um tal frio que ela tem a impressão de que nenhum fogo poderá reaquecê-la.”

O grande erro da natureza foi não ter sabido se confinar a um só reino. Ao lado do vegetal, tudo parece inoportuno, mal-vindo. O sol devia ter desdenhado o advento do primeiro inseto, e se mudado assim que irrompera o chimpanzé.”

Se, à medida que se envelhece, a gente escava mais e mais o próprio passado em detrimento dos <problemas> [supostamente o presente, aquilo que vige ainda diante de nós], é sem dúvida porque é muito mais fácil remoer lembranças do que idéias.”

Os últimos a quem perdoamos a infidelidade para conosco são aqueles que decepcionamos.”

<Eu já era Profeta, nos adverte Maomé, quando Adão estava ainda entre a água e a argila.>

… Quando alguém não tem o orgulho de ter podido fundar uma religião – ou ao menos de arruinar uma – como é que se ousa mostrar à luz do dia?”

Só se pode ruminar sobre a eternidade estirado num leito. Não foi ela durante um período considerável a principal preocupação dos Orientais? Não supervalorizam eles a posição horizontal?

Assim que se deita, o tempo pára de se desbordar, e de contar. A história é um produto de uma canalha vertical.

Enquanto animal vertical que é, o homem deveria adquirir o hábito de olhar diante de si, não somente para o espaço mas também para o tempo. A que lamentável origem não remonta o Devir!”

Todo misantropo, por mais sincero que seja, lembra por momentos aquele velho poeta imobilizado em seu leito e completamente esquecido, quem, furioso contra seus contemporâneos, decretara que não mais desejava receber qualquer um. Sua mulher, por caridade, chama-o de tempos em tempos à porta.”

Uma obra está terminada quando não se a pode melhorar, conquanto se a reconheça como insuficiente e incompleta. O autor já se esforçou tanto, encontra-se de tal forma excedido e nos seus limites, que não tem mais a coragem de mexer numa só vírgula, por mais indispensável ou supérflua que ela seja ao texto, numa milésima revisão. O que decide do grau de completude duma obra não é de forma alguma uma exigência da arte ou da verdade, mas tão-só a fadiga, e, ainda mais, o desgosto.”

Atenção ao contraste: ao passo que exige-se um simulacro de invenção da menor frase que se deve escrever, basta um pouquinho só de atenção para entrar num texto, mesmo que difícil. Bosquejar um simples cartão-postal se aproxima mais duma atividade criativa que ler a Fenomenologia do Espírito.”

O budismo designa a cólera <mancha do espírito>; o maniqueísmo, <raiz da árvore da morte>. Eu sei. Mas do que isso me serve?”

Ela me era completamente indiferente. Pensando, de repente, depois de tantos anos, que, acontecesse o que acontecesse, eu não a veria de novo, faltou pouco para eu ter um troço. Não compreendemos o que é a morte se não lembramos, de supetão, da figura de alguém que nada significou para nós.”

À medida que a arte se afunda no impasse, os artistas se multiplicam. Essa anomalia cessa, enquanto anomalia, se se considera que a arte, em vias de desaparecimento, agora é ao mesmo tempo impossível e fácil.”

Ninguém é responsável por aquilo que é e nem mesmo por aquilo que faz. Isso está na cara e todo mundo nisso mais ou menos convém. Por que então exaltar ou denegrir? Porque existir equivale a avaliar, a emitir julgamentos, e também porque a abstenção, quando não se trata de efeito da apatia ou covardia, demanda um trabalho que ninguém deseja assumir.”

Toda forma de ódio, mesmo direcionada ao bem, traz consigo alguma comoção mental.”

Os pensamentos menos impuros são aqueles que surgem entre as nossas preocupações, nos intervalos de tédio, nesses instantes de luxo que se auto-oferece nossa miséria.”

As dores imaginárias são de longe as mais reais, uma vez que delas temos necessidade constante e as inventamos porque não teriam meios de acontecer jamais.”

Se é próprio do sábio o não fazer nada inútil, ninguém me ultrapassará em sabedoria: eu não me rebaixo nem mesmo às coisas úteis.”

É impossível imaginar um animal degradado, um sub-animal.”

Se pudéssemos ter nascido antes do homem!”

Devo confessar que não menosprezo todos esses séculos nos quais não se ocuparam doutra coisa que chegar a uma definição de Deus.”

A maneira mais eficaz de se subtrair de um abatimento motivado ou gratuito é pegar um dicionário, de preferência de uma língua que se conhece, mas pouco, e procurar várias palavras, desde que sejam palavras que, com certeza, nunca vamos utilizar na vida.”

Traduzir antes de ler, um novo ofício. Vagas abertas!

Enquanto se vive aquém do terrível, encontra-se uma multidão de palavras para exprimi-lo; assim que se o conhece por dentro, já não se acha expressão.”

As desconsolações de toda sorte passam, mas o fundo de que elas procedem subsiste sempre, e ninguém tem o domínio sobre ele. Ele é inatacável e inalterável. Ele é nosso fatum.”

Lembrar-se, em meio ao furor e à desolação, que a natureza, como diz Bossuet, não consentirá em nos deixar demasiado tempo <esse pouco de matéria que ela nos emprestou>.

<Esse pouco de matéria> – de tanto pensar nisso chegamos à calma, a uma calma, isso lá é verdade, que mais valeria nunca termos conhecido.”

O paradoxo não é a entrada em cena de enterros, matrimônios, nascenças. Os eventos sinistros – ou grotescos – exigem o lugar-comum, o terrível, como o penoso, não se acomodam senão no cliché.”

Por mais desenganado que se seja, é impossível viver sem alguma esperança. Todos a sustém, ainda que à revelia, e essa última esperança inconsciente compensa todas as outras, explícitas, que já foram rejeitadas ou exauriram.”

Quanto mais anos a gente acumula, mais a gente fala da desaparição como de um evento distante, altamente improvável até. Quem se tornou tão apegado à vida adquire uma inaptidão para a morte.”

Não perdoamos senão as crianças e os loucos por serem francos conosco: os outros, se eles têm a audácia de imitá-los, arrepender-se-ão cedo ou tarde.”

Para ser <feliz>, é necessário ter constantemente presente ao espírito a imagem das desgraças de que se escapou. Essa seria para a memória uma forma de se readquirir, visto que, não conservando, de hábito, senão as infelicidades passadas, ela se dedica a sabotar a felicidade e assim chega ao êxito.”

Depois de uma noite em branco, os passantes parecem uns autômatos. Ninguém parece respirar ou andar. Cada qual parece movido por uma energia estranha: nada de espontâneo; sorrisos mecânicos, gesticulações de espectros. Espectro você mesmo, como seria você capaz de ver nos outros seres viventes?”

Ser estéril – com tantas sensações! Perpétua poesia sem palavras.”

A fadiga pura, sem causa, a fadiga que sobrevém como que caída do céu: é através dela que me reintegro ao meu eu, que me sei <eu>. Se ela desaparece, não sou mais que um objeto inanimado.”

Tudo que ainda vive no folclore vem de antes do cristianismo. – Tudo que ainda vive dentro de nós também.”

Quem teme o ridículo não irá jamais longe demais, para o bem ou para o mal, e continuará aquém de seus talentos, e mesmo que tivesse algum gênio seria tido como um medíocre.”

NÓS, CONTEMPLADORES PROFISSIONAIS:<Em meio a vossas atividades mais intensas, detende-vos um só instante a fim de ‘contemplardes’ vosso espírito>, – essa recomendação certamente não está destinada a quem <contempla> seu espírito noite e dia, e que, portanto, não tem por que se interromper, sob a boa desculpa de que ele não desenvolve nenhuma <atividade>.” Quando não contemplamos nosso espírito enfim é que nos sentimos donos de uma identidade a-problemática.

Só dura aquilo que foi concebido na solidão, em face de Deus, acredite-se n’Ele ou não.”

A paixão pela música é já ela mesma uma confissão. Sabemos mais sobre um desconhecido que a admira que sobre qualquer um que lhe seja insensível e com quem trombemos todos os dias.”

Não se medita sem gostar de repetições.”

Enquanto o homem estava a reboque de Deus, avançava lentamente, tão lentamente que ele nem mesmo se apercebia disso. Desde que não vive mais à sombra de ninguém, ele se agita, se estressa, e daria qualquer coisa para recuperar a cadência ancestral.”

Perdemos ao nascer tanto quanto perdemos ao morrer. Tudo.”

Saciedade – acabo de pronunciar essa palavra, e já não sei mais a propósito do quê, já que ela se aplica a tudo que sinto e penso, a tudo que amo e detesto, à própria saciedade.”

Nunca matei ninguém, eu faço melhor: matei o Possível, e, exatamente como Macbeth, o que mais tenho necessidade é de orar, se bem que, não mais que ele, não posso dizer Amém.”

É um milagre não sofrer de insônia na cidade.”


ME DEIA

remedeio a falta de remédios com remendos

remedeia ela os pecados do mundo e do sangue matando os filhos e

extirpando suas vidas secando seus corpos duros

sem fluxos nem eflúvios a não ser progressivamente os da

podridão.


bistrot, o barcOpOSujO francês.


O BARZINHO

O barzinho é freqüentado por velhos que dormem no asilo que fica no fundo da cidadezinha. Lá eles ficam por horas, todos os dias, se bobear, copo na mão, se olhando sem falar nada. É aí que, como à intervenção dum relâmpago, um deles se desembesta a contar algum causo engraçado ou curioso, alguma anedota fictícia muito antiga de sua vida, quando tinha bem mais cores. Ninguém escuta, se bem que ninguém ri. Ninguém ri dele nem ninguém ri de coisa alguma. Ninguém troça ou despreza. Ninguém ignora ou é seletivo na atenção. Não ficam na sua, porque não existe mais “sua”. Ninguém é solícito ou bom ouvinte, mas todos o são, ao mesmo tempo, porque não existe a menor resistência. Entre mesas, cadeiras e essas “pessoas”, ninguém nunca sabe o que pode ser mais móvel ou interativo. Na verdade a pessoa, para chegar a esse estado, tem de decair e decair por anos a fio, numa longa viagem ladeira da senilidade e da banalidade abaixo, num se-foder diário imperceptível a olho nu. Se fosse antigamente, na vida camponesa, teriam sufocado um desses velhotes com uma almofada, por compaixão e praticidade. Melhor que vê-lo babar que nem um idiota o resto de seus dias, consumindo recursos da lavoura. Fórmula incomparavelmente mais sábia e humanizada, aperfeiçoada por cada família num insólito consenso independente. Conduta muito superior a pegar velhos inválidos, reuni-los em rebanho, confiná-los a aposentos fedorentos e apertados, sem circulação do ar, para refletir sua penosamente involuída conformação mental. A cura do tédio pelo mais cretino estupor – ou a cura do estupor via o tédio mais cru e cruel?!


Às vezes quem joga água no chopp só quer hidratar sua vida

Às vezes quem joga sêmen no café só quer despertá-la para novas sensações


Une ancienne femme de chambre à mon «Ça va?» me répondit sans s’arrêter : « Ça suit son cours ». Cette réponse archibanale m’a secoué jusqu’aux larmes.”

Vivíamos no campo, eu estava na escola, e, detalhe importante, eu dormia no mesmo quarto que os meus pais. À noite meu pai tinha o costume de ler para minha mãe. Conquanto fosse padre, ele lia todo tipo de coisa, pensando sem dúvida que, haja vista minha pouca idade, não me era possível compreender. Na maioria das vezes não escutava nada e acabava dormindo, a não ser que por alguma razão a estória me fisgasse. Uma noite afiei minha audição. [<É fan-tás-ti-co!!>] Meu pai lia uma biografia de Rasputin, na cena em que o pai, no leito de morte, chama o seu filho e diz: <Vai para São Petersburgo, torna-te mestre de toda a cidade, não te curves diante de ninguém e nada teme, porque Deus não passa de um porco velho.>

Uma tal enormidade na boca de meu pai, para quem o sacerdócio não era nenhuma brincadeira, me impressionou tanto quanto um incêndio ou um terremoto. Não cesso de lembrar cada segundo claramente – e já faz mais de meio século desse dia –, e depois da comoção senti uma espécie de prazer desconhecido, não-familiar, não ousaria dizer perverso…”

Mais de um desequilíbrio – que digo eu, talvez todo desequilíbrio! – provém de uma vingança longamente adiada. Saibamos explodir! Qualquer doença é mais saudável que aquilo que suscita um rancor entesourado.” Os sonhos do idílio infantil que não pode mais ser revivido se tornando o palanque político da execração e do escracho de quem sempre mereceu ser rebaixado, e que agora eu rebaixo até quando estou descansando em paz: A****** FASCISTA, A****** RACISTA! Ninguém vai votar em você, seu B********!

«Mon neveu, c’est clair, n’a pas réussi; s’il avait réussi, il aurait eu une autre fin. — Vous savez, madame, ai-je répondu à cette grosse matrone, qu’on réussisse ou qu’on ne réussisse pas, cela revient au même. — Vous avez raison», me répliqua-t-elle après quelques secondes de réflexion. Cet acquiescement si inattendu de la part d’une telle commère me remua presque autant que la mort de mon ami.”


MAIS NATURAL DO QUE SE PENSA

“— Oh, que pena, me dizia você, que Fulano não tenha produzido nada…

E daí?! Ele existe. Se ele tivesse deixado livros, se ele tivesse tido o azar de <realizar-se>, nós nem estaríamos, pra começo de conversa, falando sobre ele! A vantagem de ser um qualquer é mais rara que a de autor. Produzir é fácil; o que é difícil é desdenhar fazer o uso de suas habilidades.”

ginecologistas se apaixonam por suas clientes (o que não é normal, pois todo corpo por dentro é feio), coveiros têm filhos, doentes incuráveis fazem mil projetos, até os céticos escrevem…”


os grandes desastres nada subsidiam no plano literário ou religioso. Só as meias-desgraças são fecundas, porque, primeiro, elas podem ser, e segundo, são um ponto de partida; já os pastos de um inferno bem-acabado são tão estéreis quanto o paraíso.”

Essas pessoas que entra década, sai década continuam as mesmas são literalmente zumbis, nada de ser vivo. Não estão cumprindo com o devir. Não sabemos reagir a essas <aparições> diurnas!

Eu sei que eu não valho nada, mas em compensação não creio ter chafurdado tanto assim para que me retratem num livro!”

Não faz sentido ter dó de um cachorro. Ele não se lembra de nada do que vive. Ele não retém o ruim que lhe sucede…

Um desconhecido vem me contar que ele matou não sei quem. Ele não é procurado pela polícia, porque ninguém suspeita dele. Sou o único a saber que ele é o assassino. O que fazer? Eu não tenho a audácia nem a deslealdade (porque ele me confiou um segredo, e que segredo!) de denunciá-lo. Me sinto seu cúmplice, e me resigno a ser preso e punido como tal. Ao mesmo tempo, considero que isso seria a suprema tolice. Talvez vá denunciá-lo agora mesmo. E é quando eu acordo.

O interminável é a especialidade dos indecisos. Nada se resolve na vida desses sujeitos, e ainda menos nos pesadelos, digo, sonhos, onde não cessam de perpetuar suas hesitações, sua covardia, seus inesgotáveis escrúpulos. Estes são os mais aptos a péssimas noites de sono.”

JOWDAY:Um filme sobre as bestas selvagens: crueldade sem parar a todas as latitudes. A <natureza>, torturadora do gênio, imbuída dela mesma e de sua obra, exulta não sem razão: a cada segundo, tudo que vive arrepia e faz arrepiar.A piedade é um luxo bizarro, que só os mais pérfidos e mais ferozes dos seres poderiam ter inventado, por precisão de se autopunirem e de se autotorturarem, por ferocidade pura e simples.”

Sobre o outdoor que, à entrada duma igreja, anuncia A Arte da Fuga, alguém pichou: Deus está morto. E tudo isso a propósito de um músico que testemunha que Deus, à hipótese de que ele seja mesmo um defunto, pode ressuscitar, pelo menos o tempo que durar nossa audição dessa cantata ou, justamente, daquela fuga [fuga é um modo clássico de compor, daí o trocadilho]!”

DESCRIÇÃO DE UM ALOÍSIO: “Passamos pouco mais de uma hora juntos. Ele aproveitou cada minuto se gabando. De tanto se esforçar para dizer algo interessante de si mesmo, ele obteve sucesso, eu diria que ele me venceu. Se ele tivesse se dirigido apenas elogios razoáveis, tê-lo-ia achado incrivelmente entediante e arranjaria um jeito de me escafeder em 15 minutos. Mas, ao exagerar, ao fazer direitinho o seu papel de fanfarrão, ao dar tudo de si, ele praticamente chegou lá: da aparência ao espírito faltou bem pouco! O desejo de parecer refinado não depõe contra o refinamento! Um débil mental, se pudesse recuperar o orgulho, a vontade de se ostentar, conseguiria mudar totalmente seu aspecto, de fato voltaria a ser uma pessoa inteligente.”


O ELOGIO DO DOIDIVANAS

DE TANTO QUERER SER ACABOU SENDO

COMIDA DE LOBO SEU NOME

ACREDITE NO SEU POTENCIAL

POTENCILA

He…sito, logo sou.

Quem disse que o pavão não é elegante?


A diferença entre um presumido e um idiota é que um presumido não se acha de modo algum um idiota!

DESCRIÇÃO DE UM JESUS: “X., que já ultrapassou a idade dos patriarcas, depois de teimar, durante um bom bocado, numa discussão coletiva, contra uns e outros, me disse: <A grande fraqueza da minha vida teria sido nunca odiar ninguém.>

O ódio não diminui com a passagem dos anos: ele só aumenta. Aquele de um senil atinge níveis complicados até de imaginar: tornado insensível a suas antigas afecções, todas as suas faculdades são dirigidas aos rancores, os quais, miraculosamente revigorados, sobreviverão mesmo à erosão de sua memória e razão.

… O perigo de conviver demais com velhos vem de observá-los tão distanciados e desapegados dos outros, e tão incapazes de qualquer aproximação a essa altura do campeonato, que fantasiamos muito mais as vantagens de sua condição do que eles jamais usufruem na realidade. E essa estima, real ou fictícia, da lassidão ou da rabugice naturais da idade incitam à presunção.”

Cada família tem sua filosofia. Um dos meus primos, morto ainda jovem, me escrevia: <Tudo é assim, sempre foi e sempre será sem dúvida nenhuma até que já não haja mais nada.>

Minha mãe, por seu turno, sempre encerrava assim suas cartas: <De tudo que o homem tente, ele se arrependerá, cedo ou tarde.>

Esse vício do arrependimento, eu não posso nem mesmo me gabar de ter adquirido por minhas próprias desilusões. Ele me precede, faz parte do patrimônio da minha tribo. Meu principal legado é a inaptidão à ilusão!”

Em contínua insurreição contra minha ascendência, toda a minha vida eu desejei ser outro… Espanhol, russo, canibal,–tudo, tudo, menos o que eu sou. É uma aberração se valorar diferente do que se é, de esposar em teoria todas as condições exceto a sua própria.”

O dia que li a lista de quase todos os sinônimos disponíveis em sânscrito para se referir à palavra <absoluto>, compreendi que errei de caminho, de país, e de idioma.”

Uma amiga, depois de não sei quantos anos de silêncio, me escreveu dizendo que não tinha mais muito tempo, que se avizinhava da entrada do <Desconhecido>… Esse clichê me faz franzir. Não discirno bem no quê se poderia entrar pela morte. Qualquer afirmação nesse terreno já me parece abusiva. A morte não é um estado, ela não é nem sequer uma passagem. O que ela é, pois? E, sendo clichê, vou me meter a responder minha amiga?”

É capaz de eu mudar de opinião sobre um mesmo assunto, um mesmo evento, 10, 20, 30 vezes no espaço de um dia. E dizer, a cada vez, como o último dos impostores, que ouso pronunciar a <última palavra>!”

Algumas pessoas são tão velhas que parecem apopléticas, jurássicas. Uma velha, uma vez, <avançava> em semi-círculo por horas, à minha frente, contemplando o solo (curvada, a única coisa que podia contemplar), em passinhos inimaginavelmente lentos e hesitantes. Poder-se-ia acreditar que aquela criatura aprendia ali a caminhar, que ela tinha medo a cada novo gesto de não saber ou de ter esquecido como se colocam os pés em movimento.

… Tudo que me aproxima do Buda me soa bom.”

Somos pulgas e a Terra é o caixão-cachorro.

<Tudo é desprovido de fundamento e substância>, eu sempre mo repito, nunca sem sentir qualquer coisa próxima à felicidade. O chato é que há uma quantidade imensa de vezes em que não chego a mo repetir…”

Ah! que pena que nunca nos afogamos!… Mais fácil dizer que nos afogueamos.

Alguns escritores, na língua nativa, soam como se estivéssemos lendo alguém num idioma estrangeiro que conhecemos apenas razoavelmente: reconhecemos um sentido aqui, um grupamento de palavras ali, nada mais que isso, mas damos braçadas em sopas de letras insignificantes entre essas ilhas. Um bom exercício de atletismo úmido.

Me é absconso o ritmo dos mares!

Atividade e desonestidade são termos correlacionados.”

A risada desapareceu, depois desapareceu o sorriso.” – autor desconhecido

Não é fácil falar de Deus quando não se é um crente nem um ateu: e este é sem dúvida nosso drama particular, o de todos nós, teólogos inclusos, de não mais podermos ser nem um nem outro.”

Para um escritor, o progresso rumo à autonomia e à felicidade é um desastre sem precedentes. Ele, mais do que ninguém, tem necessidade de seus defeitos: se ele triunfa, está perdido. Que ele se guarde de se tornar alguém melhor, porque se conseguir, se arrependerá amargamente.”

“Deve-se desconfiar das luzes que se possui sobre si próprio. O conhecimento que temos de nós mesmos indispõe e paralisa nosso demônio. É aí mesmo que deve ser buscada a razão de por que Sócrates jamais escreveu.”

O que torna maus poetas ainda piores é que eles só lêem poetas (como o mau filósofo só lê filósofos), embora fossem tirar muito mais proveito de um livro de botânica ou geologia. Não nos enriquecemos a não ser freqüentando disciplinas estrangeiras à nossa. Isso só é verdade, bem entendido, para os domínios em que o eu participa.”

Tertuliano nos indica que, para se curar, os epilépticos iam <chupar com avidez o sangue dos criminosos derramado na arena>. Se eu desse ouvidos aos meus instintos, seria esse o único gênero de terapêutica que eu adotaria para todas as doenças.”

Tem você o direito de se indignar contra alguém que o chame de monstro? O monstro é sozinho por definição, e a solidão, mesmo a da infâmia, supõe qualquer coisa de positivo, uma eleição um pouco especial, mas de qualquer forma eleição, inegavelmente.”

Dois inimigos são um mesmo homem dividido.”

«Não julgue ninguém antes de se pôr no lugar dessa pessoa.» Esse velho provérbio torna impossível qualquer julgamento, porque julgamos alguém justamente porque não podemos nos pôr em seu lugar.”

Quem ama sua independência deve se prestar, a fim de salvaguardá-la, a qualquer depravação, se arriscar até, se for preciso, a ser ignominioso.”

Nada mais abominável que a crítica e, com muito mais razão, o filósofo em cada um de nós: se eu fosse poeta, reagiria como Dylan Thomas, que, assim que alguém comentava seus poemas em sua presença, se jogava no chão e começava a se contorcer.”

Todos que se iram cometem injustiça atrás de injustiça, sem sentir o menor remorso. Do mau humor somente. – O remorso é reservado aos que não agem, aos que não podem agir. Ele os previne de qualquer ação, ele os consola de sua ineficácia.”

A maioria de nossas decepções vêm de nossos primeiros movimentos. O menor élan se paga mais caro que um crime.”

Os aventureiros e os aleatórios estão em desvantagem em relação aos doentes, os perseguidos e as vítimas de toda sorte de coisas e circunstâncias. Porque, se eles vivem, eles não têm lembranças de uma vida. As lembranças exigem provas, testemunhas e a fixação da sensação.”

Gostamos de quem causa uma forte impressão. Vamos atrás dessas pessoas no nosso dia a dia. O vaidoso é quase sempre irritante, na massa de energia que ele é obrigado a pôr em movimento a cada aparição: é um chato que bem gostaria de não sê-lo, a bem da verdade. No fim, todos acabam suportando o chato, e ele se torna uma figura indispensável. Em compensação, quem não visa a efeitos nos deixa pálidos de raiva. Que dizer-lhe, que esperar dele? Ou exploramos o que resta do macaco em nós, ou é melhor nem sairmos em público.”

Não é o medo de empreender, é o medo de ter sucesso que explica mais de um fracasso.”

Eu gostaria de uma reza cheia de palavras acutilantes. Mas, infelizmente, toda reza é igual pra todo mundo. Essa é uma das maiores dificuldades da fé.”

Só podemos suportar o futuro enquanto não tivermos a segurança de poder nos matar no momento desejado.”

Nem Bossuet, nem Malebranche, nem Fénelon se dignaram a comentar os Pensées. Aparentemente, Pascal não lhes parecia grave o bastante.”

O antídoto do tédio é o medo. O remédio deve ser mais forte que o mal.”

Inclusive para emergir à minha superfície sou obrigado a estratagemas que só de pensar já me ruborizam.”

Houve um tempo em que, cada vez que eu sofria qualquer afronta, para afastar de mim toda veleidade de vingança, eu me imaginava bem calmo em minha própria tumba. E logo eu serenava. Não subestime seu cadáver: ele pode servir à ocasião. Mas não exagere o recurso: o próprio papa Inocêncio IX só olhava seu retrato, figurado num caixão, quando precisava tomar decisões de vida ou morte.”

Todo pensamento deriva de uma sensação contrariada.”

A única maneira de conhecer os outros em profundidade é seguir rumo ao mais profundo de si mesmo. Noutros termos, é tomar o caminho inverso dos que se dizem espíritos <generosos>.”

<A bendição da minha vida foi que eu jamais tive necessidade de uma coisa antes de possuí-la!>, me disse uma vez um rabino.”

Ao permitir o homem, a natureza cometeu muito mais que um erro de cálculo: um atentado contra si mesma.”

O medo torna consciente, o medo mórbido e não o medo natural. Se assim não fosse, os animais teriam atingido um grau de consciência superior ao nosso.”

Quanto ao orangotango propriamente dito, o homem é antigo; quanto ao orangotango histórico, ele é relativamente recente: um recém-chegado que ainda não teve o tempo de aprender a se portar na vida.”

Depois de certas experiências, o mais correto seria mudar de nome, porque então já somos outros. Tudo ganha um novo aspecto, a começar pela morte. Ela parece próxima e desejável, reconciliamo-nos com ela, e até aprendemos a tomá-la pela <melhor amiga do homem>, como a chama Mozart numa carta a seu pai agonizante.” Eu me rebatizei aos 20.

Deve-se sofrer até o fundo, até o momento em que cessa-se de acreditar no sofrimento.”

«A verdade permanece oculta a quem alimenta o desejo e o ódio.» (Buda)

… Ou seja, a todos os vivos.”

Atraído pela solidão, ele continua, no entanto, no século: um monge sem coluna.”

«Você fez mal em apostar em mim.»

Quem poderia usar essa linguagem? – Deus e o Fudido.”

Tudo que completamos, tudo que sai de nós, aspira a esquecer suas origens, e não prospera a não ser se voltando contra nós. Daí o signo negativo que demarca todos os nossos sucessos.”

Não se pode falar nada de porra nenhuma. Não haveria um limite para o número de livros.”

O fracasso, mesmo reprisado, parece sempre novo, enquanto que o sucesso, ao se multiplicar, perde todo o interesse, toda a atração. Não é a desgraça, é a felicidade, a felicidade insolente, é vero, que conduz à acidez e ao sarcasmo.” Depois da pizza é que vem a azia!

Um inimigo é tão útil quanto um Buda. (…) ele deixa tudo em ordem para que não nos demonstremos indignos da idéia que ele faz de nós.” Dignidade é meu nome, se eu tenho um só.

Firmamo-nos, chegamos melhor a ser seres firmes, quando aprendemos a reagir contra os livros negadores,¹ dissolventes, contra sua força nociva. Os livros fortificantes, em suma, pois eles suscitam a energia que os nega.² Quanto mais um livro contém de veneno, mais ele exerce um efeito salutar, desde que seja lido à contra-corrente, como todo livro deve ser lido, começando pelo catecismo.”

¹ (20-04-2023) Nota interessante: minha restrição a ler Émil Cioran por vários anos foi o que se falava sobre Émil Cioran. Pensava que ele era um destes autores de livros negadores! Suponho que o leitor ingênuo assim o trate, e teria motivos, em sua visão estreita – mas o caso é bem outro…

² (id.) O fim da frase inverte todo o raciocínio explicitado na nota 1: os livros negadores são os afirmadores, os melhores. Nesse sentido, a Bíblia não é nada negadora, etc. Cioran estaria sendo bem-avaliado pelos “leigos”: porém os leigos, aqueles referidos na primeira nota, são meros niilistas passivos, jovens, jovens demais. I am Orangutan! O princípio retirado por Cioran mais adiante não é nada misterioso ou nonsense: todo veneno é um antídoto também; o que não mata fortalece.

O maior serviço que se pode prestar a um autor é o de interditá-lo de trabalhar durante um tempo determinado. É necessário aplicar tiranias de curta duração, extensíveis a toda atividade intelectual. A liberdade de expressão sem interrupção alguma expõe os talentos a um perigo mortal, obriga-os a se desgastar além de seus recursos e os impede de estocar as sensações e experiências. A liberdade sem limites é um atentado contra o espírito.” O escritor milionário deve ser um verdadeiro asceta, muito disciplinado, se não quiser ser apenas uma piada para a próxima geração.

A pena de nós mesmos é menos estéril do que se pensa. Desde que se sinta o menor acesso, adquire-se uma pose de pensador, e, maravilha das maravilhas, chega-se mesmo a pensar.”

A máxima estóica segundo a qual devemos sofrer resignada e silenciosamente as coisas que não dependem de nós leva em conta apenas as desgraças exteriores, que escapam à nossa vontade. Mas e às que vêm de nós mesmos, como reagir? Se nós formos a fonte de nossos males, a quem nos dirigir? a que recorrer? a nós mesmos? Providenciaremos, de forma contente, o esquecimento de que nós somos os verdadeiros culpados; logo, a existência só é tolerável se renovamos a cada dia essa mentira e esse olvido.”

Minha vida toda eu vivi com o sentimento de ter sido afastado de meu verdadeiro lugar. Se a expressão «exílio metafísico» não tivesse nenhum sentido, minha existência sozinha lhe emprestaria um.”

A fim de salvar a palavra «grandeza» da pompa excessiva, não nos deveríamos servir dela a não ser a propósito da insônia ou da heresia.”

Quer a ironia que não haja pessoa mais vulnerável, mais suscetível, menos disposta a reconhecer seus próprios defeitos que o maledicente. Basta com citar-lhe uma ligeira reserva para que ele perca a continência, se superexcite e se afunde em sua bile.” Keila Virgínia.

É normal que o homem não se interesse mais pela religião, mas pelas religiões, porque é só através delas que ele estará em vias de compreender as múltiplas versões de seu colapso espiritual.”

as irrecusáveis verdades do marasmo”

«Maldito seja aquele que, nas futuras reimpressões das minhas obras, modificar deliberadamente o que quer que seja, uma frase, ou somente uma palavra, uma sílaba, uma letra, um sinal de pontuação!»

Foi o filósofo Schopenhauer ou foi o escritor Schopenhauer que fez Schopenhauer falar assim? Os dois ao mesmo tempo, e essa conjunção (estilo deslumbrante com que se sonha deparar em qualquer obra filosófica) é muito rara. Um Hegel jamais proferiria maldição semelhante! Nem algum outro filósofo de primeira grandeza, salvo Platão.”

Não há nada de mais exasperante que a ironia sem falha, sem intervalo, que não deixe tempo para respirar, e ainda menos para refletir, que, ao invés de ser elusiva, ocasional, é massiva, automática, nos antípodas da sua natureza essencialmente delicada. Tal é em geral o uso que dela faz o alemão, o ser que, por ter sido o que mais meditou acerca da ironia, é o menos apto a manejá-la.” A ironia é que ele foi irônico demais… Deixe para os britânicos, pois eles levam isso a sério (ou não)!

Nada provoca a ansiedade, ela procura se justificar, e, para conseguir, se serve de qualquer método, dos pretextos mais miseráveis, nos quais pega carona, uma vez que os tenha inventado. Realidade em si que precede suas expressões particulares, suas variedades, ela se suscita, ela se engendra por si mesma, ela é «criação infinita», mais propícia, como tal, a evocar maquinações da divindade que a da psique.”

Tristeza automática: um robô elegíaco.”

Diante de uma tumba, as palavras: jogo, impostura, brincadeirinha, sonho, se impõem. Impossível pensar que existir seja um fenômeno sério. A certeza de uma fraude de começo, lá da base. Dever-se-ia cunhar no frontão dos cemitérios: «Nada é trágico. Tudo é irreal.»

Não esquecerei tão cedo a expressão de horror em seu rosto, o esgar, o pavor, a desconsolação extrema, e a agressividade. Ele não estava feliz, não mesmo. Jamais vi alguém tão mal na alegria de seu caixão.”

Não procura nem adiante nem detrás de ti, procura em ti mesmo, sem medo ou arrependimento. Ninguém se ensimesma tanto a ponto de se tornar por isso escravo do passado ou do futuro.”

É deselegante se desaprovar alguém por sua esterilidade, quando ela é postulada [voluntária], quando ela é seu modo de auto-realização, seu sonho…”

As noites que nós dormimos são como se jamais tivessem sido. Só nos restam na memória aquelas em que não pregamos o olho: noite quer dizer noite branca.”

Eu transformei, porque não consegui resolvê-las, todas as minhas dificuldades práticas em dificuldades teóricas. Face ao Insolúvel eu respiro, enfim…” Demonstra que é um bom filósofo. Se isso é bom ou ruim, há que se filosofar a respeito…

A um estudante que queria saber minha opinião acerca do autor do Zaratustra, eu respondi que eu tinha parado de lê-lo há muito tempo. Por quê? mo perguntou. – Porque eu o acho ingênuo demais

Repreendo seus entusiasmos e até seus fervores. Ele demoliu os ídolos unicamente para substituí-los por outros. Um falso iconoclasta, com facetas adolescentes, e não sei que virgindade, que inocência, inerentes à carreira de solitário. Ele não observou os homens a não ser de longe. [E como poderia tê-los observado de perto? Só por memórias muito antigas…] Se os visse de perto, jamais poderia conceber nem exaltar o supra-homem, visão excêntrica, risível, senão grotesca, quimera ou capricho que só podia surgir no espírito d’alguém que não tivera tempo de envelhecer, de conhecer a indiferença, o longo desgosto sereno. [Nós solitários somos muito severos especialmente com os de nossa própria espécie; defeito inocente, incorrigível, de nossa natureza.]

Muito mais próximo me é um Marco Aurélio. Nenhuma hesitação de minha parte entre o lirismo do frênesi e a prosa da aceitação: encontro mais conforto, e mais esperança, mesmo, aos pés de um imperador fatigado que ao lado dum profeta fulgurante.”

«Tem o talento necessidade de paixões? Sim, de muitas paixões reprimidas.» (Joubert)¹ Não há um só moralista que não possamos converter em precursor de Freud.”

¹ Joseph Joubert (Montignac (Dordonha)7 de maio de 1754 – Paris4 de maio de 1824) foi um moralista e ensaísta francês, lembrado sobretudo por seus “pensamentos”, publicados postumamente.”

Escrever é o ato menos ascético que pode haver. É paradoxal que os místicos do cristianismo primitivo tenham nos legado tantas obras. Quiçá não era apenas a vontade de renome na posterioridade o que os movia?”

Sempre se deseja a morte na forma duma enfermidade vaga; mas se a teme ao menor sinal de uma doença precisa.” O mal dos românticos. Tuberculose: uma metáfora. Câncer: uma metáfora de um século científico.

Se eu detesto o homem, não poderia dizer com a mesma facilidade: eu detesto o ser humano, porque apesar de tudo há nessa palavra ser qualquer coisa de pleno, de enigmático e de sedutor, qualidades estranhas à idéia de homem.”

No Dhammapada, recomenda-se, para obter a felicidade, seguir a dupla corrente do Bem e do Mal. Que o Bem seja em si mesmo um entrave, nós ainda somos espiritualmente involuídos demais para admitir. Destarte, não alcançaremos a salvação.”

Eu creio, com esse doidivanas do Calvino, que estamos predestinados ao sucesso ou à reprovação dentro da barriga da mãe. Já se viu antes de nascer.”

É livre aquele que discerniu a inanidade de todos os pontos de vista, e liberto aquele que disso soube tirar as conseqüências.” Tudo é vaidade sob o sol, DESTARTE… incipit tragoedia.

Eu suprimia do meu vocabulário palavra atrás de palavra. O massacre acabou. Uma só sobreviveu: Solidão. Acordei realizado.”

Se pude agüentar até o presente, é que a cada abatimento, que me parecia intolerável, um segundo sucedia, mais atroz, depois um terceiro, e assim sucessivamente. Devo estar no inferno, que eu desejaria ver multiplicar em círculos, para poder descobrir uma nova provação, mais rica que a precedente, debaixo do nono, debaixo do décimo círculo. Tudo isso para me convencer da minha teoria mirabolante. É uma boa política, em termos de tormentos, pelo menos. Talvez essa ansiedade seja a sensação predominante do sujeito infernizado, consista em seu único castigo de uma outra vida onde nada parecido se pudesse conceber. [Quem nunca o pensou que empurre o primeiro grande seixo sisífico!]

Chega de corpo. Já basta o eu!”

um sono de muitos períodos cósmicos me revitalizará”

Almas atormentadas se erigem em teoricistas do desapego, em convulsionários que bancam os céticos.”

«Ele era jovem ainda, se muito nos sessenta. Encontraram-no morto no campo. Que queria você? É desse jeito… É desse jeito… É desse jeito…»

Tantos anos para despertar desse sono em que se embalam todos os demais; e em seguida anos e anos para fugir dessa vigília…”

Adão Shepherd Crusoe quis sair de sua Ilha paradisíaca. Ele ia ficar que nem as árvores. Dane-se religião, juramento, prudência, obediência…

Viver é perder o terreno.”

Num livro gnóstico do segundo século de nossa era, diz-se: «A oração do homem triste nunca tem a força para chegar até Deus.»

… Como não se ora a não ser no abatimento, deduzir-se-á que nunca uma oração foi bem-sucedida.”

Na China Antiga, as mulheres, quando estavam com o humor colérico ou depressivas, subiam em pequenos estrados, reservados especialmente para elas nas ruas, e se deixavam levar por suas torrentes de furor e lamentação. Esse gênero de confessionário deveria ser ressuscitado e adotado em todo lugar, nem que fosse só para substituir o da Igreja, obsoleto, ou o dessa ou daquela terapia, inoperante.”

Um livro é um suicídio procrastinado.” Mais de 10.

O único meio de salvaguardar sua solidão é agredir o mundo inteiro, começando por quem se ama.”

Se vossas provações, no lugar de vos expandir, de vos colocardes num estado de euforia enérgica, vos deprimem e vos amarguram, saibais que vós não tendes vocação espiritual.”

Viver na expectativa, depositar sobre o futuro ou sobre um simples simulacro de futuro todo o imaginável, nos é corriqueiro a tal ponto que não concebêramos a idéia da imortalidade senão por pura necessidade de esperar pela eternidade.”

Toda amizade é um drama às escondidas, uma sucessão de feridas sutis.”

 

Lutero morto por Lucas Fortnagel. Máscara terrificante, agressiva, plebéia, de um leitão sublime… que retrata bem os modos de quem nunca será louvado o bastante por ter dito: «Os sonhos são mentirosos; caga na tua cama, só isso é o verdadeiro.»

Mais se vive, menos útil se nos parece o ter vivido.”

Nenhum autocrata jamais deteve tanto poder quanto um miserável na situação de se dispor a se matar ou não.”

Existir é um estado tão inconcebível quanto seu contrário”

Na Antiguidade, os <livros> eram tão custosos que não era possível colecioná-los, a não ser sendo rei, tirano ou… Aristóteles, o primeiro a possuir uma biblioteca digna do nome. Um cômodo a mais a cargo desse filósofo, um homem já tão repleto de ocupações e atribulações…”

Se eu me conformasse a minhas convicções as mais íntimas, cessaria de me manifestar, de reagir de qualquer forma concebível. Porém, sou ainda capaz de sensações…”

Se eu tivesse um mascote, ele seria o Frankenstein.

Durante um exorcismo da Idade Média, enumeravam-se todas as partes do corpo, mesmo as mais mínimas, das quais o demônio era convidado a se retirar: dir-se-ia um verdadeiro tratado louco e oral de anatomia, que seduz pelo seu excesso de precisão, a profusão de minúcias e o inesperado. Uma encantação minuciosa. Saia das unhas! É insensato mas não isento de efeito poético.”

A noite é um grande lixo incomensurável.

A força dissolvente da conversação: entende-se bem por que a meditação e a ação exigem silêncio.”

Ir à Índia por causa do Vedanta ou do budismo, ou à França por causa do jansenismo. Esse último é o mais recente, pois só sucumbiu há 3 séculos.”

Por que o Gita eleva tão alto a <renúncia ao fruto de seus atos>?

Porque essa renúncia é rara, irrealizável, contrária a nossa natureza e realizá-la é destruir o homem que se foi e que se é, matar em si mesmo todo o passado, a obra de milênios, se emancipar, numa só palavra, da Espécie, dessa ralé ignominiosa e imemorial.”

Êxtase embrionário-larval

A verdade reside no drama individual.”

Os verdadeiros escritores-espelhos de um povo são os figurantes, os secundários.”

Minhas afinidades com o byronianismo russo, de Pétchorine [Lermontov] a Stavroguine, meu tédio e minha paixão pelo tédio.”

Os velhos, faltos de ocupações, têm o ar de querer resolver qualquer coisa de muito complicada e de empregar todas as suas capacidades restantes tão logo e tanto quanto possível. Talvez essa seja a única razão de não haver suicídios em massa nessa idade, como deveria haver se eles estivessem um tiquinho menos absorvidos.”

O amor o mais apaixonado não aproxima tanto dois seres quanto o faz a calúnia. Inseparáveis, o caluniador e o caluniado constituem uma unidade <transcendente>, estão colados inexoravelmente. Um calunia, o outro suporta, mas se ele suporta ele está acostumado. E quem se acostuma reclama pela coisa. Ele sabe que seus desejos serão realizados, que não será esquecido jamais, que ele estará, aonde for, eternamente presente no espírito de seu infatigável bem-feitor.” Os canalhas nunca morrem.

O ermitão nômade é a melhor coisa que já fizeram. Chegar a não ter mais ao quê renunciar! Tal deveria ser o sonho de todo espírito desenganado.”

A negação desesperada – a única negação possível.”

Felizardo Jó, tu que não fostes obrigado a resenhar teus gritos!”

Madame d’Heudicourt, [ama de Luís XIV] observa Saint-Simon, não falava bem de ninguém senão com severas restrições. Sem o saber, este pensador formulou uma lei, não da maledicência, mas da conversação em geral.”

Tudo o que vive faz barulho. – Excelente advocacia pelos minerais!

Bach era brigão, competitivo, metódico, mesquinho, ambicioso, ávido por títulos, honras, etc. Ah, então! o que é que isso pode trazer? Um musicólogo, enumerando as cantatas que têm a morte por tema principal, afirmou que nenhum mortal fôra mais nostálgico. Só isso conta. O resto deriva da biografia.”

As questões penosas e daninhas que nos imputam os mal-educados nos irritam, nos desconcertam, e podem ter sobre nós o mesmo efeito dalguns procedimentos técnicos utilizados no Oriente. Uma estupidez grosseira, agressiva, por que não provocaria ela a iluminação? Ela bem vale uma porrada na cabeça.”

O conhecimento é impossível, e, mesmo que não fosse, ele não resolveria nada. Tal é a posição do cético. O que se quer, o que se busca então? Nem ele nem pessoa alguma jamais saberá. O ceticismo é a bebedeira do impasse.”

Assediado pelos outros, tento me descolar, sem grande sucesso. Chego, no entanto, a alcançar, diariamente, por alguns segundos, um diálogo com aquele que eu gostaria de ser.”

Refletir e ser modesto é uma utopia. Desde que começa a masturbação do espírito, ele troca de lugar com Deus e quem quer que seja. Reflexão é indiscrição, trespassamento, profanação. O espírito não <trabalha>, desarranja. A tensão que trai seus progressos e denuncia suas pegadas revela o caráter brutal, implacável. Sem uma boa dose de ferocidade, não se saberia conduzir um pensamento até o final.”

A maioria dos tumultuadores, dos visionários e dos sábios foi ou de epilépticos ou de dispépticos. [quem tem gastrite, azia crônica, gases] Sobre as virtudes do mal mais nobre, há unanimidade; sobre os embaraços gástricos, em contrapartida, reconhecem-se menos méritos. Contudo, nada convida mais a causar tumulto e revolução que uma dor de barriga.”

Minha missão é de sofrer por todos aqueles que sofrem sem o saber. Eu devo pagar por eles, expiar sua inconsciência, a sorte que eles têm de ignorar até que ponto eles são infelizes.” Ah, meu irmão…

Cada vez que o Tempo me martiriza, eu repito que um de nós dois deve saltar, que é impossível continuar indefinidamente nesse tête-à-tête cruel…”


Todo aquele ou tudo aquilo que socorre o depressivo na hora mais fatal lhe parecerá um semi-deus ou um manjar divino. Uma bíblia diferente no meu criado-mudo… Bible Green and Thin… Two books also. Sans ordre alcune. Postmorten and no resurrection.

É incrivelmente irracional acima de qualquer medida antropológica que Deus tenha sido considerado por longo tempo uma solução, e incrivelmente honesta a previsão de que será impossível uma solução melhor – ou mesmo uma equivalente – aparecer daqui em diante.

Fazer figo da opinião dos outros seria encarnar um deus.


César morreu porque não era um tirano. Fosse tirano, teria executado primeiro todos os seus ofensores. Mas eles não podiam suportar sua clemência.”

Não se enterram deuses impunemente, sabe disso a Filosofia cristã.

O fanatismo é a morte da conversação. Não se discute com um candidato a mártir. O que se poderia dizer a alguém que se recusa a penetrar suas razões e que, a partir da hora em que não se inclinam às dele, preferiria perecer que ceder? Viva os diletantes e sofistas, que, pelo menos, penetram em todas as razões…”

Nossos mais próximos são os primeiros a pôr em dúvida nossos méritos. A regra é universal: nem o próprio Buda escapou: era um primo seu principal desafeto, e, somente após esse prelúdio familiar, Mara, o diabo.”

Para o ansioso, não existe diferença entre o sucesso e o fiasco. Sua reação diante de um ou outro é a mesma. Os dois o desarranjam por igual.”

PARA OS DESEMPREGADOS: “Quando eu me preocupo um pouco demais sobre eu não trabalhar, eu me consolo dizendo que poderia muito bem estar morto e que assim trabalharia ainda menos…”

Melhor dentro do esgoto que acima do pedestal.”

Se debater tanto nas conversas quanto um epilético na crise.”

Não há negador que não fique tentado por qualquer sim catastrófico.”

Pode-se estar assegurado de que o homem jamais atingirá de novo profundezas compatíveis com aquelas exploradas no decorrer dos séculos de diálogo egoísta com seu Deus.”

os termos com os quais eu qualifico minha desgraça são os mesmos que definem, em primeiro lugar, <o ser supremo>: Nem um só instante em que não me encontre fora do Universo!”

Aristóteles, Tomás de Aquino, Hegel – três serviçais do espírito. A pior forma de despotismo é a do sistema, em filosofia e em tudo.”

Deus é o que sobrevive à evidência de que nada merece ser pensado.”

Jovem, nada me dava mais prazer que criar inimigos. Hoje em dia, quando me faço um, meu primeiro pensamento é o de me reconciliar com ele, pra que eu não tenha que me ocupar disso. Ter inimigos é uma grande responsabilidade. Meu fardo só me basta, não posso carregar ainda o dos outros.”

A alegria é uma luz que se devora inexaustivamente; é o sol nos seus começos.”

O insólito não é um critério. Paganini é mais surpreendente e mais imprevisível que Bach.”

NINGUÉM NESSE MUNDO É PORRA NENHUMA, FRANGO, GENTE OU URSO POLAR!

Todo dia devíamos repetir: Eu sou um dos que, aos bilhões e borbotões, se movem na superfície da terra. Um deles e nada mais. Essa banalidade justifica qualquer conclusão, desconsiderando todo tipo de comportamento ou ação: voluptuosidade, castidade, suicídio, trabalho, crime, indolência ou rebelião.

… Disso decorre que cada um tem razão de fazer o que faz.”

Tzintzoum. Essa palavra risível designa um conceito maior da Cabala [Zohar]. Para que o mundo existisse, Deus, que era tudo e estava em tudo, consentiu em se contrair, para deixar um espaço vazio que não fosse habitado por ele: é nesse <buraco> que o mundo tomou lugar.

Sendo assim, ocupamos o terreno vago que ele nos concedeu por misericórdia ou por capricho. Para que nós fôssemos, ele se contraiu e desmilingüiu, limitou sua soberania. Nós somos o produto de seu emagrecimento voluntário, de seu apagamento, de sua abstenção parcial. Em sua loucura, ele se amputou de nós. Que falta de bom senso e de bom gosto teve esse Deus, para não se conservar inteiro!”

No Evangelho segundo os Egípcios, [este manuscrito não chegou até nós] Jesus proclama: <Os homens serão vítimas da morte enquanto as mulheres embarrigarem.> E precisa: <Eu vim destruir as obras da mulher.> [WIKIA: <O perdido Evangelho Grego dos Egípcios, provavelmente escrito no segundo quarto do século II d.C., foi citado por Clemente na sua ‘Miscelâneas’ (Stromata), que é a fonte de quase todos os trechos que chegaram até nossos dias.>]

Quando se embarca nas verdades extremas dos gnósticos, amar-se-ia, se possível, ir muito mais longe, dizer qualquer coisa jamais dita antes, algo que petrifique ou pulverize a história, qualquer coisa oriunda de um neronismo [Nero–ismo, crueldade gratuita, particularmente contra os cristãos] cósmico, duma demência do nível da matéria.”

Traduzir uma obsessão é projetá-la fora de si, é alvejá-la, é exorcizá-la. As obsessões são os daemon de um mundo sem fé.”

O homem aceita a morte, mas não a hora de sua morte. Morrer quando quer que seja, salvo na hora que se deve morrer!”

O absoluto é um tique do espírito.”

Quando eu recapitulo meus projetos que continuaram projetos e os que se realizaram, me bate o arrependimento de ver que esses últimos não tiveram a sorte dos primeiros.”

«Aquele que é inclinado à luxúria é simpático e misericordioso; os que são inclinados à pureza não o são.» (Clímacus [alter ego de Kierkegaard])

Para denunciar com uma tal clareza e vigor, não as mentiras, mas a essência mesma da moral cristã, e de toda moral, é preciso ser um santo, nem mais nem menos do que isso.”

Aceitamos sem medo a idéia de um sono ininterrupto; em compensação, uma vigília eterna (a imortalidade, se ela fosse concebível, seria bem isso) nos deixa de cabelo em pé.

O inconsciente é uma pátria; o consciente, um exílio.”


A LUGUBRIDADE DO ÚLTIMO PÔR DO SOL

Um povo perece. Outros existem e persistem. Muitas vezes os povos perecem um por causa do outro, se é que não é uma lei universal que não comporta exceções, desde os dinossauros. Decadências e ascensões estão intimamente entrelaçadas, como atesta Roma e a barbárie. Os muçulmanos e a Europa. De forma que ao invés da morte pura e simples podemos falar em “fusão de corpos”. O inglês de hoje é o indiano de ontem. O americano de amanhã será o mexicano de hoje. Todos seremos uns japoneses súditos de imperadores exóticos trajando mantos que representam o Astro-Rei. Continuaremos vivos embora sejamos outro alguém. Podemos mesmo registrar “o último moicano” em filmes, documentários, narrativas ou furos jornalísticos. O último quilombola, o último bicho-do-mato, o último africano subsaariano faminto, o último branquelo egresso da União Européia, até o último moscovita comunista. Mas o triste de perecer como um todo, quando a humanidade perecer, com “p” de petrodólares, é que não haverá testemunhas, não será nem fusão, nem pacto. Não será lei de Darwin, onde os animais continuam a prosperar. O gélido sonho dos finados não seguirá sorridente e intransigente nas veias quentes dos conquistadores na moda. Poderia mesmo restar um último homem, judeu errante, holandês rastejante, perambulando sobre e entre destroços hiper-tecnológicos. Mas sem o Olho que Vê e festeja. Não há uma Babilônia a quem se prostituir. Fim da linha. Fim dos avatares. Nem o sol nasce amanhã. Haverá festa mesmo assim?


Sem a crença num universo falhado, o espetáculo da injustiça vigorante sob todos os regimes da Terra conduziria necessariamente mesmo os abúlicos [abulia: falta de vontade extrema, caracterizada como psicopatologia] à camisa de força.”

Cada geração vive no absoluto: ela se comporta como se ela tivesse chegado ao topo, senão ao fim, da história.”

Todo e qualquer povo, num determinado momento de seu progresso, se crê eleito. É nessa fase que ele apresenta do seu melhor e do seu pior.”

Que a guilhotina tenha nascido na França antes de na Itália ou na Espanha não é por acaso. Os espanhóis e os italianos falam sem parar, também, mas eles não se escutam enquanto isso;os franceses, falando e falando, saboreiam sua eloqüência, e não esquecem jamais o que o escutam; chegam ao cume da consciência. Eles, e só eles, podiam considerar o silêncio como uma prova e uma ascese.”

Que as sociedades prósperas são de longe mais frágeis que as outras, é óbvio: só lhes resta esperar a ruína certeira; o bem-estar não é mais um ideal quando já se o possui, e ainda menos quando ele existe entre os cidadãos há gerações. Sem contar que a natureza não o incluiu em seus cálculos e ela não saberia proporcioná-lo sem perecer.”

Se as nações se tornassem apáticas ao mesmo tempo, não haveria mais conflitos, guerras nem impérios. Mas o azar quer que sempre haja povos jovens, e aliás jovens de alto a baixo em todas as sociedades – obstáculo maioral para os sonhos dos filantropos: fazer com que todos os homens atinjam o mesmo grau de lassidão e moleza…”

As revoluções são o sublime da má literatura.”

O cansativo nas comoções públicas é que qualquer um se julga competente o bastante para comentar o assunto.”

DA EDUCAÇÃO NÃO-CÍNICA DO FUTURO: “A única coisa que deveria ser adequadamente ensinada ao jovem é que não há nada a se esperar da vida – vá lá, quase nada. O ideal educacional seria um Quadro das Decepções afixado em classe onde figurassem todos os prováveis descontentamentos reservados a cada um. Haveria alguns exemplos gerais pré-fixados. O aluno teria espaço para completar o seu quadro ele mesmo com o passar dos dias.”

NO ZIL:Um povo nunca faz mais do que uma revolução. Os alemães pararam na Reforma. A França é o país do 89. E lá vão os russos com seu 17. Essa característica singular, a de que qualquer revolução posterior não passa de um simulacro baseado na primordial e única verdadeira, é ao mesmo tempo aflitiva e reconfortante.”

Toda civilização esgotada espera seu bárbaro, e todo bárbaro espera seu daemon.”

O Ocidente é um cadáver que tem cheiro de flor.”

Os brancos merecem cada dia mais o título de pálidos que os índios americanos lhes davam.”

Os romanos, os turcos e os ingleses puderam fundar impérios duráveis porque, refratários a toda doutrina, eles não impuseram nenhuma às nações sujeitadas. Estes povos jamais teriam conseguido exercer uma hegemonia tão durável se fossem afligidos por qualquer vício messiânico. Opressores inesperados, administradores e parasitas, senhores sem convicções, eles possuíam a arte de combinar autoridade e indiferença, rigor e deixar-passar. É essa arte, segredo do verdadeiro mestre, que faltara aos espanhóis lá atrás.”

Qual será o aspecto de nossa sociedade contemporânea que nossos bisnetos apreciarão com mais nostalgia ao ler os livros de História? “Ah, tempos dourados, quando…”?!?!?! “Nós fomos os últimos que ainda tinham uma certa noção de ‘Paraíso Perdido’

Minha visão do amanhã é tão precisa que, se eu tivesse filhos, estrangulá-los-ia na hora.”

Hesíodo foi o primeiro a elaborar uma filosofia da história.¹ Foi ele também que lançou a idéia de declínio. Só com ela, quanta luz ele não jogou sobre o devir histórico! Se, no núcleo das origens, em pleno mundo pós-homérico, ele estimava que a humanidade estava na idade do ferro, o que ele teria dito séculos mais tarde? o que diabos ele diria hoje? Exceto em épocas obnubiladas pela frivolidade ou a utopia, o homem sempre pensou que estava no limiar do pior. Sabendo o que ele sabia e sempre soube, por qual milagre pôde ainda assim variar tanto seus desejos e terrores?”

¹ Boa proposta. Muitos são um tanto conservadores nessa atribuição: dizem que foi Ibn Khaldun!

Quando, na ressaca da guerra de 14, foi introduzida a energia elétrica na minha cidade natal, foi um murmúrio e tanto, e depois a desolação muda. Durante a instalação da eletricidade nas igrejas (eram 3), cada qual estava persuadido de que o Anticristo havia aterrissado e, com ele, o fim dos tempos. Esses camponeses dos Cárpatos viram direitinho, viram muito longe. Eles, que acabavam de sair da pré-história, já sabiam, à época, o que os civilizados foram aprender só um pouco depois.”

Foi do meu preconceito contra tudo que termina bem que veio meu gosto pelas leituras históricas. As idéias são impróprias ao ponto da agonia; elas morrem, decerto, mas sem saber morrer, enquanto que um acontecimento não existe senão com vistas a seu fim. Razão suficiente para que se prefira a companhia dos historiadores à dos filósofos.”

Se repetir é provar que ainda se acredita em si mesmo.”

A idéia de progresso desabona o intelecto.”

À la longue, la tolérance engendre plus de maux que l’intolérance. — Si ce fait est exact, il constitue l’accusation la plus grave qu’on puisse porter contre l’homme.”

O historiador que se mete a julgar o passado faz jornalismo num outro século.”

Em coisa de 200 anos (porque é necessário ser preciso!), os sobreviventes dos povos mais azarados serão confinados em reservas, e o público pagará ingressos para contemplá-los, cheios de desgosto, comiseração ou estupor, e também com uma admiração maligna no rosto.”

“— Você é contra tudo que aconteceu desde a última guerra, me dizia a madame.

Você se confundiu de data. Eu sou contra tudo que aconteceu desde Adão.”

Hitler é sem dúvida alguma o personagem mais sinistro da história. E o mais patético. Ele conseguiu realizar o contrário exato do que queria, destruiu ponto por ponto seu ideal. É por isso que ele é um monstro à parte, quer seja, duas vezes monstro, porque seu próprio patético é monstruoso.”

O sábio é um destruidor aposentado.”

Indivíduo maldito e indivíduo desgraçado não são a mesma coisa.”

Satanás é superior ao agitador, porque se destruir é muito mais difícil e honrado que destruir o que está fora de si.

Dividido ao meio, entre a violência e o desapontamento, eu me penso como o terrorista que, saindo de casa com a idéia de perpetrar um atentado qualquer, acaba parando no meio do caminho para consultar o Eclesiastes ou um Epicteto.”

O <despotismo esclarecido> é o único regime que segue sedutor para o espírito que já viu e viveu tudo.”

Em todo relato antropológico que se me faz constar o homem civilizado foi, num primeiro contato, considerado como um morto-vivo pelo aborígene.”

X. sustenta que nós estamos no fim de um «ciclo cósmico» e que tudo vai cedo ou tarde (cedo ou cedo) ser aniquilado. Disso ele não duvida um só instante.

Ao mesmo tempo, ele é pai de família, e duma família assaz numerosa. Com convicções como as dele, que aberração explica ele atirar nesse mundo sem conserto um filho atrás do outro? Se alguém prevê o Fim, se está certo de que ele logo virá, se inclusive conta com esse Fim, deveria ao menos esperar por ele sozinho. Não se procria em Patmos¹!”

¹ Ilha grega, no mar Egeu, famosa por ter sido o suposto lugar das visões que foram acometidas a João para que ele as descrevesse aos cristãos (Livro do Apocalipse).

Montaigne, um sábio, não teve posteridade; Rousseau, um histérico, ainda agita as nações. Só consigo amar os pensadores que não inspiraram nenhum orador.” Montaigne é assustadoramente superestimado. Só sabia citar autores antigos. Só sabia ler.

Em 1441, no concílio de Florença, foi decretado que os pagãos, judeus, heréticos e cismáticos não teriam parte alguma na <vida eterna> e que todos, a menos que se convertessem à verdadeira religião antes de morrer, irão direto para o inferno.”

O homem que venceu completamente o egoísmo, que não guarda mais traço algum, não pode durar além de 21 dias, é o que é ensinado numa escola moderna do Vedanta.

Nenhum moralista ocidental, mesmo o mais soturno, jamais ousou estipular sobre a natureza humana uma previsão tão seca e exata.”

Primeiro, a crença decidida no progresso; depois, a crença na evolução e sobrevivência do mais forte; depois, a crença na mutação; quarto estágio – a sensação iminente de uma catástrofe sem paralelos.”

Zeus sim era malvado, e ele engendrava Ésquilos.”

Pascal reescreveu à mão algumas de suas Provinciais 17 vezes. É inconcebível como tal homem perdeu tanto tempo com algo tão irrelevante, de interesse hoje menos do que mínimo. Já sua magnum opus, Pensées, por ser um debate entre homem e deus, e não entre homem e homem, ainda merece um bocadinho mais de atenção.”

O ansioso se agarra a todo estímulo excitante de seu desconforto providencial: querer curá-lo é prejudicar seu equilíbrio, a ansiedade sendo a base de sua existência e de sua prosperidade. O confessor astuto sabe que ela é necessária. O padre exalta a ansiedade, essa máquina de remorso. É a sua clientela. O laico não compreende e quer exterminar esse mal.”

Ó, você me diz que a morte não existe. Eu lho concedo, sob a condição de precisar ainda melhor: nada existe. Aceitar a realidade em tudo e então refutá-la no ponto em que parece manifestamente mais real é pura extravagância.”

Por que o homem não hiberna? Por que passa sua época estéril em mortificações e acessos de cólera?”

A vantagem não-negligenciável de ter odiado bastante os homens é de chegar a um ponto em que se os pode suportar, justamente graças à exaustão natural de qualquer ódio.


É lá o Aqui

é aqui o Lá

ECCE HONTE: Virtudes se consomem rápido, quão mais virtuosas são em si. Os vícios só se agravam com a idade.


<Tudo está repleto de deuses>, dizia Tales à aurora da filosofia. Do crepúsculo, devemos dizer, não só por mania de simetria: <Tudo está vazio de deuses>.”


VISÕES RETUMBANTES

Uma grávida num cemitério é uma visão e tanto!

Nasceu onde morreu.

Viveu como morreu,

cavando

o próprio fracasso.

Pagando caro

o ter(re)no.

Esse maldito

importunado

pelas criancinhas travessas

que pulam o muro à noite!

Atchim!

Os ossos do crânio espirraram

* * *

Há mais em comum entre bocejos e orações do que a vã filosofia reza.

* * *

O duro é que pra dizer que a Literatura morreu é preciso ser um Artista.

* * *

Todos proclamam a morte de Deus, mas ninguém quer exumar o cadáver.

* * *

Minha maior ambição é continuar um bom tempo sem ambições.

* * *

A gente se arrepende dos gestos nobres que faz. Mas é verdade, também, que a gente se arrepende dos gestos ignóbeis.”


«Infeliz aquele de que todos falam bem!»

Jesus Cristo


O que me segura num livro de psiquiatria são as aspas dos doentes; o que me segura num livro de crítica são as aspas.”

Os períodos de esterilidade que atravessamos coincidem com uma exacerbação de nosso discernimento, com o eclipse do demente que há em nós.

Ir até as extremidades de sua arte e, mais, de seu ser, essa é a lei de quem quer que se ame, tanto faz se tem realmente talento ou não.”

«Se uma doutrina se espalha, é porque o céu quis.» (Confúcio)

… É nessas horas que eu adoraria me persuadir, todas as vezes, diante de tal ou qual aberração vitoriosa, que minha raiva beira a apoplexia.”

A quantidade de exaltados, de desvalidos e degenerados que eu pude admirar! Alívio vizinho ao orgasmo à idéia de que nunca mais vou abraçar uma causa, qualquer que seja ela…” Sobre seu passado associado à apologia do nazismo.


NUNCA SE TERÁ FALADO O BASTANTE DESSE TIPO DE PESSOA

É um acrobata? É um maestro fisgado pela Idéia? Ele se embala, depois se modera, ele alterna entre alegro e andante, ele é mestre de si como o são os faquires ou os escroques. Todo o tempo que ele fala, dá a impressão de procurar, mas não se sabe o quê: um especialista na arte de desbaratar os pensadores. Se ele dissesse uma só coisa perfeitamente clara e inquestionável, estaria perdido. Como ele ignora, tanto quanto sua audiência, onde ele quer chegar, pode continuar durante horas a fio, sem pôr a perder esse embasbacamento dos fantoches na platéia.”

EmbasBACANTES

É um privilégio viver em conflito com seu tempo. A cada momento é-se consciente de que não se pensa como as outras pessoas. Esse estado de dissonância aguda, por mais indigente, por mais estéril que ele possa parecer, possui entretanto um estatuto filosófico que se procuraria em vão nas cogitações que concordam com os eventos em marcha.”

<Não se pode nada>, não cessava de responder aquela nonagenária a tudo que eu lhe dizia, a tudo que eu grunhisse ao pé de sua orelha, fosse sobre o presente, sobre o futuro, sobre a marcha das coisas…

Na esperança de arrancar-lhe qualquer outra resposta, continuei com minhas apreensões, pesares, reclamações. Não obtendo dela nada além do sempiterno <Não se pode nada>, achei que já tinha tido o suficiente e me fui dali, irritado comigo, irritado com ela. Que idéia foi essa de se abrir para uma imbecil!

Mas uma vez fora, reviravolta completa: <Mas a velha tem razão. Como não me dei conta imediatamente que sua cantilena encerrava uma verdade, a mais importante, sem dúvida, já que tudo que surge a proclama e tudo em nós a ignora?>

Duas sortes de intuição: as originais (Homero, Upanishads, folclore) e as tardias (budismo, Mahayana, estoicismo romano, gnose alexandrina). Relâmpag

THE NATURE AND TREATMENT OF ANXIETY DISORDERS

Barr Taylor & Bruce Arnow, 1988.

For the existentialist Rollo May (1950), anxiety <is described on the philosophical level as the realization that one may cease to exist as a self. . . i.e., the threat of meaninglessness> (p. 193).”

Etimologia greco-latina: sendo pressionado para baixo por tristezas e misérias (pesares).

Jablensky (1985) notes that the English word anxiety does not cover the same semantic space as the French anxieté or the Spanish ansiedad although they all derive from a common root. In French, angoisse is used as a near-synonym for anxiety but connotes more strongly the physical sensations accompanying the experience and may be closer to the English anguish than to anxiety. And the German word angst implies, besides anxiety and anguish, agony, dread, fear, fright, terror, consternation, alarm and apprehension.”

the indefinable nature of the feeling gives it its peculiarly unpleasant and intolerable quality.”

Lay people, in particular, use the terms anxiety, stress and tension interchangeably. There is little agreement in the scientific community as to the definition and nature of stress, and the term is best avoided as it only causes confusion.”

Se o paciente é prejudicado pela ansiedade, procura tratamento, ou se envolve em comportamentos auto-destrutivos a fim de controlá-la, a ansiedade deve ser considerada clínica.”

Generalizada e/ou episódica (ataque de pânico)


CORE CHAT

palpitação do coração

não deixe estranhos dar

palpite, não

pit of emotions

the inverted peak

shadow&light

negative&positive

yes and no world against

you

who am I

a genius, a demon,

Socrates or a man

a single and

pitagorean

human being

that was not

and will not be

just live

with the leaves

leave me

alone

can you?

all of you

levee of emotions

lake of discharge

storm and thunder

revenge

vengeance

action of genius

evil genius

gentle

until

kindle the

sweetness

draw

out

now!

* * *

jittery man

The bullied are afterwards the greatest bullies” Juice R, pessoa sem-graça nota 7 que não quis se identificar. Possui características de liderança. Falam mal pelas suas costas, mas ela não está nem aí…

Queria ter consulta com o dentista a qualquer dia menos hoje!

aquiescente com o tumulto

Eu já havia lido Sartre, mas fui saber o que é náusea quando trabalhei na DRI.

depois eu começo a sentir que estou separado do meu corpo e, sabe, que vou cair ou/hmm/como se eu estivesse fora do meu corpo e não tivesse mais controle sobre minhas funções motoras – não consigo nem caminhar nem conversar”

mas finjo para os trouxas

terapia de impacto

tratamento de choque

de coxinhas estou cheio,

ops, grogue

boxeador

madVanity beats

but the countdown never comes in…

minha boca mais seca que a tua consciência

verme sem olhos, ouvidos, miolos!

miolo mole miolo-oco

guacamole

cabeça-de-ovo

azedo

como abacate

eXtra-

(degra)

(d/g)ado

GG

gado.golpista

odeiam regras então

meu K.O.

será letal

matarei em

legítima defesa

dessa vez

eis meu lema

tímido

em time que está ganhando

mexe-se sim,

para fazer cera


between dizziness and almost vertigo”

Não se sabe o que é mais irritante, se, numa palestra, ninguém prestar atenção… ou todo mundo prestar atenção.

Sintomas muscular-esqueléticos da ansiedade: dores, espasmos, paralisias, rigidez, mioclonia (contrações musculares involuntárias), bater de dentes, voz irregular, tônus muscular crescente, tremores, sensação constante de cansaço, pernas bambas, corpo desajeitado.

No sistema sensório: Tinnitus (doença do ouvido mais freqüente em depressivos; condição também associada com a gradual perda da audição), vista embaçada, hiper-sensibilidade ao calor e frio, sensação generalizada de fraqueza, arrepios repentinos, face corada, face pálida, suor, coceiras.

(…) respiratório: (…) sensação de engasgo. (…) gastro-intestinal: (…) flatulências, dor abdominal, azia, desconforto abdominal, náusea, vômitos, frouxidão intestinal, perda de peso, perda do apetite, constipação (…) genital-urinário: urina freqüente, perda da menstruação, menstruação excessiva, ejaculação precoce, perda da libido. (…) sistema automático: boca seca, tontura, dor de cabeça de tensão, cabelos eriçados.


sentimentos de irrealidade”

impotência para controlar o pensamento”

perda de objetividade e perspectiva”

medo de não conseguir lidar”

medo de se machucar ou morrer”

medo de ficar louco ou incapaz”

medo de avaliações negativas”

imagens visuais aterradoras”

ideação de medo repetitiva”

mobilização do corpo para enfrentar/fugir”

Immobility is classified as attentiveness, in which the animal remains inert while carefully observing its environment—a phenomenon suggested by the phrase <freeze in your tracks,> or as tonic immobility, in which a previously active animal exhibits prolonged freezing and decreased responsiveness.”

For instance, during anxiety episodes some patients feel that their coordination is impaired, that they might faint and that they can’t move their feet.”

vista evitativa

The behavior associated with anxiety frequently becomes independent of the anxiety itself. Furthermore, behavior engaged in for the purpose of controlling anxiety sometimes exacerbates the anxiety. For example, some patients drink excessive amounts of coffee when they feel anxious, yet the caffeine in coffee produces anxiety and even panic.”

The most serious complications of anxiety disorders are often associated with the patient’s attempts to cope with anxiety. Patients may become severely avoidant or depressed, abuse drugs or alcohol, or become helplessly dependent on their family, friends, and the medical system. The avoidance, when manifested as agoraphobia, may be one of the most disabling of all psychiatric problems. (…) Thus, chronic symptoms such as avoidance, which result from efforts to cope with anxiety, are often more disabling than the anxiety itself and need to become the focus of treatment. [lógica da insistência dos terapeutas]

Very uncomfortable. Shopping in store. Unable to wait through check-out stand. I went and sat in car while my Mom paid for the items.”

The septo-hippocampus, thalamus, locus coeruleus, and their afferents and efferents, and various neurotransmitters are clearly involved with anxiety.”

Contemporary psychodynamic theories of anxiety began with Fr.. His first major discussion of anxiety was published in 1894 and his last in 1926, but his writings before and after these also address major issues of anxiety. New insight, observations, experience, and discussions led Fr. to reformulate and elaborate his views. In his final model, and the one still followed by most psychoanalysts, Fraud argued that the generation of anxiety occurs unconsciously, outside of the individual’s awareness.”

She reported that the number of the street the bus was approaching corresponded to the age at which her father had died and that her father had had his heart attack near the hour that corresponded to the time her anxiety attack on the bus occurred.”

Deutsch (1929) presented 4 cases of agoraphobia where defense against aggressive impulses towards parents or parental figures resulted in panic attacks.”

catástrofe narcisista

all the awful sexual things that I was always taught can happen to you when you walk around the streets in the dark”

Threat of loss creates anxiety, and actual loss causes sorrow; both, moreover, are likely to arouse anger.”

beta-blockers, which block many of the peripheral sensations of anxiety, are not effective in blocking panic.”

We have glimpses of some of the systems involved with anxiety, but an integrated model will require new neuroscientific methods capable of observing the actual functioning of the central nervous system under various conditions.” The limbic system is concerned with integrating emotional and motivational behavior, particularly motor coordination in emotional responses (Watson et al., 1986).” For instance, low intensity stimulation of the LC causes head and body turning, eye scanning, chewing, tongue movement, grasping and clutching, scratching, biting fingers or nails, pulling hair or skin, hand wringing, yawning, and spasmodic total body jerking (Redmond et al., 1976).”

Neurotransmitter systems are distributed only partially in the classical anatomic pathways. Neurotransmitters are the chemical <messengers> that control transmission between nerves. In general, they are released at the end of a nerve into the synaptic cleft, the space between the end of one nerve and the beginning of another. These neurotransmitters diffuse across the synaptic cleft to the postsynaptic neuron, where they activate specific sites on the cell membrane called receptors. Attachment to the receptor causes the postsynaptic neuron to alter its standing electrical charge, which in turn may cause it to discharge.” “Already, over 40 neurotransmitters and neurohormones have been isolated from the CNS. However, 2 neurotransmitter systems, the noradrenergic and serotinergic, seem particularly important to anxiety, and each has strong proponents arguing for its central role in anxiety disorders.”

It is possible that patients prone to anxiety disorders have too few noradrenergic receptors, that their system is too sensitive to input (it tends to overshoot), and that their receptors are subsensitive. Neurotransmitter systems are dynamic and it may be that environmental events, like a traumatic experience or separation, are necessary for the noradrenergic system to become disequilibrated.” Que é possível Homero já podia dizê-lo, não carece um neurocientista afirmar com tanta pompa. Seria melhor virem a público quando tivessem qualquer informação certa e transmitir usando seus preciosos neurorreceptores!

Experimentally, the serotonergic system seems to be involved in behavioral inhibition. The suppression of behavioral inhibition following punishment is a phenomenon that seems to be affected by drugs with antianxiety properties.” The antianxiety drugs counteract the behavioral effects of 3 classes of stimuli: those associated with punishment, with the omission of expected reward, and with novelty.” Classificação puramente abstrata e convencional.

VOCÊ É UM HOMEM OU EU MATO? a rat conditioned to expect a shock when a red light is flashed (stimulus of punishment), will exhibit freezing (behavioral inhibition), increase in heart rate and other physiological functions (increment in arousal), and scanning (increased attention).” Vejo que avançamos milhas e milhas desde Pavlov!

TODO GARÇOM TEM CARA DE BUNDA: toughening up by repeated exposure to a feared situation should be enhanced by drugs that increase noradrenergic activity. Exposure combined with imipramine is more effective than exposure alone.”

5. Mild episodic anxiety. Mild episodic anxiety occurs for reasons that are difficult for the patient to identify. [TODA razão de ansiedade é difícil de identificar.] Such anxiety is a common phenomenon in therapy. We include so-called death or existential anxiety in this category.

6. Mild anxiety and mild depression, sometimes called distress. This is probably the most common anxiety disorder. Patients with mild anxiety and depression and concomitant medical problems are the most frequent users of sedative medications. [80% da população mundial – embora apenas traços de porcentagem provavelmente tenham consciência e recebam medicação…]

7. Anxiety related to specific social, family, or work situations. In such patients the anxiety is usually bearable and is seen as secondary to the primary problem. Such patients sometimes meet the criteria for social phobia.”

Traditionally, psychoanalysts have classified distress and generalized and panic anxiety together.”

Panic disorder with agoraphobia is the most severe condition and includes all of the pathology of the other disorders.”

The extreme rituals and obsessive thoughts characteristic of individuals with obsessive-compulsive disorder distinguish this group from other anxiety sufferers.”

DSM-III-R is a necessary evil. It is necessary because it often determines reimbursement, helps with clinical formulation and treatment, and facilitates communication of scientific and clinical information. The drawbacks of DSM-III-R are that it forces clinicians to classify patients into categories that only partially fit their complex problems; it makes assumptions not shared by many therapists (for instance, that mental health problems should be considered medical problems), and it gives undue emphasis to psychiatry over other mental health disciplines since psychiatrists were the ones who mainly developed and implemented the system.”

Pennys-silvana

The syndrome of recurrent panic attacks was recognized as a separate disorder as far back as 1871 when Da Costa described the <irritable heart> and later in 1894 when Fraud first applied the name anxiety neurosis to the syndrome, separating it from the category of neurasthenia.”

The 1869 American Medico-Psychological Association diagnostic system included only simple, epileptic, paralytic, senile and organic dementia, idiocy, cretinism, and ill-defined forms. The next major change in the U.S. occurred in 1917 when the American Psychiatric Association developed a 22-item nosology based on etiology. By then psychoanalytic theory had introduced the concept of neurosis, in which anxious symptoms were attributed to unconscious conflicts. Thus <psychoneurosis> was introduced as a diagnostic category. Disorders subsumed under this heading included hysteria (of which anxiety hysteria was a variant), [afinal, ao que tudo indica a histeria nem existe mais, fato nunca excessivamente sublinhado] psychasthenia or compulsive states, neurasthenia, hypochondriasis, reactive depression, anxiety state, and mixed psychoneurosis.”

DSM-I: 1952

DSM-II: 1968

DSM-III-R: 1980 “In 1980 the term <neurosis> was replaced by <disorder>.” PARA TRANS-TORNO DOS PACI-ENTES

DSM-IV: 1992 (previsão – livro velho!)

A patient often meets the criteria for generalized anxiety disorder, panic disorder, and agoraphobia simultaneously, or, over time, exhibits changing symptomology that at one time may seem most consistent with one diagnosis and at another time with an alternative one. (…) the rigid hierarchical system of DSM-III, in which one anxiety diagnosis precluded another, is loosened.”

feelings of impending doom.” Dá uma música do Black Sabbath

Attacks usually last minutes; occasionally they will last for an hour or more. The individual often develops varying degrees of nervousness and apprehension between attacks. The initial attacks are unexpected or spontaneous, although over time, they may become associated with specific situations, persons or places.”

Não precisa ser um DSM recente para me deixar “apreensivo” (mas o que é isso na vida de um eternamente apreensivo?):

PANIDOG SYMPTOMS – Spair (12/13)!

(1) shortness of breath (dyspnea) or smothering [asfixia] sensations

(2) dizziness, unsteady feelings, or faintness

(3) palpitations or accelerated heart rate

(4) trembling or shaking

(5) sweating

(6) choking

(7) nausea or abdominal distress

(8) depersonalization or derealization

(9) numbness or tingling sensations (paresthesias)

(10) flushes (hot flashes) or chills [rubores (quentura) ou calafrios]

(11) chest pain or discomfort

(12) fear of dying [more like fear of never dying…]

(13) fear of going crazy or doing something uncontrolled

“As a result of this fear, the person either restricts travel or needs a companion when away from home, or else endures agoraphobic situations despite intense anxiety.”

WORKABHORRENT

anxiety is almost invariably experienced if the individual attempts to resist the obsessions or compulsions.” “Obsessions and compulsions secondary to panic and agoraphobia are often readily amenable to treatment; obsessions and compulsions characteristic of obsessive compulsive disorder are far more refractory to change.”

TRAUMATIC SYMPTOMS – Strike!!

Part I

(1) recurrent and intrusive recollections

(2) recurrent and distressing dreams of the event

(3) sudden acting or feeling as if the traumatic event were recurring

(4) intense psychological distress at exposure to events that resemble the traumatic event [síndrome de E. temote]

Espere, uma pausa para distender os músculos…


LITTLE JEW SYNDROME

remote memory

remote control

of your own business

dare your church [synagogue?] matters

and live the secular world

for us sinners you ultra-fool

you’re fuel

for my combustions

my hellish combustions

oh how does it feel to be alone

like some Achilles standing by

beneath the shadows,

repentlessly?

YouReaTraumA

IRA @ YOU

Assunto: Re: calque (Recalc. de cimento – retificação)

To (destino otário): vai.a.a.merda.com.agua.sanitaria@no.teu.cu

cof cof, more coffee coffee please!


Part II

(1) efforts to avoid thoughts, or feelings associated with the trauma

(2) efforts to avoid activities or situations that arouse recollections of the trauma

(3) inability to recall an important aspect of the trauma

(4) marked diminished interest in significant activities

(5) feeling of detachment or estrangement from others

(6) restricted range of affect

(7) sense of foreshortened future”

What about “sense of being superior”?!

Part III

(1) difficulty falling or staying asleep [Grande Bog!]

(2) irritability or outbursts of anger

(3) difficulty concentrating

(4) hypervigilance

(5) exaggerated startle response (?)

(6) physiologic reactivity upon exposure to events that symbolize or resemble an aspect of the trauma

GENERALIZED A. SYMPTOMS

Motor Tension

(1) trembling, twitching, or feeling shaky [“enrolado”, como dizem alguns]

(2) muscle tension, aches, or soreness

(3) restlessness

(4) easy fatigability

Autonomic hyperactivity

(5) Shortness of breath or smothering sensations

(6) palpitations or accelerated heart rate

(7) sweating, or cold clammy hands

(8) dry mouth

(9) dizziness or lightheadedness

(10) nausea, diarrhea, or other abdominal distress

(11) flushes (hot flashes) or chills

(12) frequent urination

(13) trouble swallowing or <lump in throat> [Pomo de Adão? Sensação de ter engolido um tubo?!]

Vigilance and scanning

(14) feeling keyed up or on edge

(15) exaggerated startle response (?)

(16) difficulty concentrating or <mind going blank> because of anxiety

(17) trouble falling or staying asleep

(18) irritability

<The Europeans have taken a slightly different approach to the classification of anxiety disorders. The main European classification system is the International Classification of Diseases (ICD). ICD is not a true nomenclature in that it has a limited number of categories that are not systematically ordered. ICD does not use operational rules but describes the classification for purposes of making the diagnosis. Anxiety states are defined in ICD-9 as ‘various combinations of physical and medical manifestations of anxiety, not attributable to real danger and occurring either in attacks or as a persisting state.’ The anxiety is usually diffuse and may extend to panic. Other neurotic features such as obsessional or hysterical symptoms may be present but do not dominate the clinical picture> (Jablensky, 1985, p. 755). Presumably, there will be some reconciliation between ICD-10 and DSM-IV when they are published in the future.”

a patient may come close to meeting the DSM-III-R criteria for panic disorder but may have too few panic attack episodes to qualify for that diagnosis. The focus of treatment should still be on the panic attacks if they are disabling.” Some patients with recent onset of panic attacks may see a psychotherapist early in the course of their disorder, but this is rare, as most consult a medical specialist first.”

Hipotensão ortostática: condição fisiológica de quem tem níveis de pressão abaixo da média exclusivamente após mais de 3 minutos na posição vertical (em pé); pode ser ignorada e confundida com a condição da tontura ou náusea ansiosas.

lightheadedness (a feeling that one might be about to faint)” Alarme falso desde sempre.

Vertigem de fumar na sacada.

Comer não dá prazer antes de grandes eventos.

Intolerância ao calor e suor excessivo: hipertireoidismo também pode ser a resposta.

Depersonalization or derealization: (may be attributed to) Temporal lobe epilepsy: (Symptoms) Perceptual distortions, hallucinations” Jesus tinha um rombo no lobo.

Keep in mind that anxiety disorder patients often overuse the medical system and caution must be taken to make the appropriate diagnosis while avoiding or minimizing unnecessary tests.”

Drogas ansiosas”: aspirina, cocaína, anfetamina, alucinógenos. Álcool, cafeína e nicotina são conhecidas facas de dois gumes. Qual seria a taxa de nicotina “com moderação”? O antitabagista da rodada.

Fluxograma habitual da nicotina: leve excitação seguida de tensão-relaxação. Abuso: ansiedade (superexcitação).

Café: ansiedade quando abusivo ou em pessoas predeterminadas à sensibilidade.

Somatoform Disorders. (…) The two types of somatoform disorders most likely to present with panic-like symptoms are somatization disorder and hypochondriasis.”

Somatization disorder is distinguished from the anxiety disorders by its course, number of symptoms, and phenomenology. The main feature of somatization disorder is a history of physical symptoms of several years’ duration, beginning before the age of 30. To meet the DSM-III-R criteria, patients must complain of at least 12 symptoms in 4 different body systems, to have sought medical evaluation and treatment of these symptoms without a medical explanation being uncovered. At any one time, these patients usually have at least one or two symptoms that dominate the clinical picture and are present night and day.” Voilà! My research has finally ended…

O QUE É, O QUÉ? SÓ GANHAMOS, MAS COM ISSO SÓ PERDEMOS? O fato de que a cada dia somos brindados com o diagnóstico de novos transtornos e desordens.

compared to patients with somatoform disorders, most panic patients have symptom-free episodes and times when they are not bothered by somatic symptoms.”

Assessing the presence and extent of avoidance is somewhat problematic, particularly for patients who must work or take transportation despite dread of doing so. They may appear to have little restriction, when in fact they live with frequent dread. Four self-report instruments are available to assess avoidance: the Mobility Inventory (Chambless et al., 1985), the Phobic Avoidance Inventory (Telch, 1985), (see Appendix 2), the Stanford Agoraphobia Severity Scale (Telch, 1985), and the Fear Inventory (Marks & Mathews, 1979). Of these, the latter two are easiest to use.”

APPENDIX 2

The Hamilton Anxiety Rating Scale (Hamilton, 1959) is the standard pharmacology outcome rating scale for anxiety. It is designed to be completed by an interviewer. The Stanford Panic Appraisal Inventory (Telch, 1985) was designed to assess patients’ panic cognitions. The Common Fears and Phobias questionnaire is an adaption of the Fear Survey (Wolpe & Lang, 1964). The Stanford Panic Diary is used to collect information on the intensity, symptomatology, place of occurrence, cognition, and patient response to panic attacks. Patients should be given a sufficient number of forms for them to be able to record this information on all the panic attacks they may experience from one visit to another. The Panic Attack Self-Efficacy form is used to monitor treatment. Patients need to be taught how to use the form. Finally, the Phobic Avoidance Inventory, developed by Michael Telch, Ph.D., for the Stanford Agoraphobia Avoidance Research Projects, is a useful clinical tool. Some of the items will need to be changed if the form is used in geographic locations other than the San Francisco Bay area. For instance, the <Driving an Automobile> section refers to Route 280 and Highway 101.”

~(Neste ponto: consultar caderno Goethe com anotações pessoais.)~


OUT OF THE BLUE: randomly, “do nada”…

o nada é o limite

pálido ponto abstrato

vórtice zero do buraco negro

fedro

belo

fim


HAMILTON ANXIETY RATING SCALE

Anxious mood – 68,75%

Tension – 45,75%

Fears – 41,5%

Insomnia – 45,75%

Insomnia during UnB – 54% (only!)

Intellectual compromising – 25%

Depressed mood – 31,25% (Am+Dm=100%!)

Somatic (muscular) – 39,27%

Somatic II – 40%

Cardiovascular symptoms – 41,5%

Respiratory symptoms – 37,5%

Gastrointestinal symptoms – 30,5%

Genitourinary – 31,25%

Autonomic symptoms (boca seca, suor, dor de cabeça) – 58,25%

Behavior at interview – 63,75%


Se meu humor fosse dividido em 10 pedaços, eu seria “6 torrões de ansiedade”, “3 torrões de depressão” e 1 de capricho indeciso. Olá, garçom, vou querer um café. O que vai ser, (ran)cinzas ou azedante? Soda cáustica.

Mais volátil que pedras de granizo em precipitação.

* * *

As many therapists are ambivalent about or opposed to symptom-focused treatment we would like to begin this chapter by briefly attempting to persuade the reader of our point of view, if he or she does not already share it.” “In general, psychodynamic approaches proceed with somewhat diffuse or general goals, while behavioral, cognitive, and pharmacological treatments are more specific in their foci. Specific and non-specific therapies, which have often seen themselves in competition with one another—witness the sometimes acrimonious exchanges between behaviorally oriented clinicians and their dynamic counterparts—have dissimilar goals. (…) To oversimplify a bit, psychodynamic therapy primarily offers insight, self-awareness, and general growth and development, while behavioral and other forms of brief, symptom-focused treatment concentrate on helping the patient achieve palpable relief from certain specific complaints.”

Saia mais!” – talvez signifique: saia mais da sala destes analistas superficiais.

Several authorities on psychodynamic treatment have noted that patients with phobic and other anxiety-related complaints are not receptive to such therapy, or that they do not respond well once engaged in psychodynamic psychotherapy.” “Consider, for example, the agoraphobic patient. In the most severe cases, all facets of the person’s day-to-day life are compromised: work is problematic and often impossible because of the difficulty traveling far from, or even leaving, home; personal and family relationships are distorted by the demands imposed upon intimates to organize their lives to protect the agoraphobic from exposure to anxiety; mundane, everyday tasks such as grocery shopping are either delegated to others, or are undertaken only after carehil [sic – careful?] planning to minimize <unsafe> features of the situation such as lines or traffic; and socializing and other recreational activities are severely curtailed or entirely avoided.” “they would like to be able to grocery-shop independently, or travel more freely, or shop in a department store, or attend a movie, or return to work. And it is here that treatment must begin.” “Often what they want to deal with is another problem such as a difficulty in establishing close relationships or ambivalence about a particular partner, but they seem to need to formulate a more disabling problem in order to justify the need for psychotherapy to themselves or to others. Some, who may have a well-defined anxiety disorder, enter treatment with an a priori bias against behavioral or symptom-focused treatment as <superficial> [mas não é bias, é fato] and seek a therapy that is focused on the promotion of insight and self-understanding. But for the vast majority of patients presenting with anxiety disorders, symptom relief is the most salient initial goal.”

PROFUNDEZA DEMAIS NÃO É REALEZA

even if one assumes that behavioral symptoms have their roots in unconscious conflict, they may become functionally autonomous (Fraud, 1936; Sluzki, 1981), and be maintained by a variety of other factors. Stated differently, the processes that <cause> a problem and those that maintain the problem are likely to be distinct. As the etiological factors may no longer be significant at the time of treatment, symptoms may be relieved without fresh outbreaks [meu caso na fase Victor Hugo].”

ALIMENTE-SE DE COISAS BOAS (MAS PODE CONTINUAR COMENDO FAST FOOD)

as he begins to behave in a less helpless fashion, others in his relationship network are likely to come to treat him as though he is more competent, which will, in turn, enhance his self-perception.”

Just as many psychiatrists never receive training in the administration of exposure therapy and so confine their treatment of anxious patients to pharmacotherapy, many psychologists and social workers trained to conduct exposure therapy are negatively disposed toward the use of medication and do not seek a medical consultation for patients who are failing to carry out therapeutic tasks because the symptoms are too distressing. Further, even when it is employed, medication is often improperly or inadequately applied. That is, the dosage is often too small to reduce the symptoms or it is so great that the anxious symptoms temporarily disappear, and the patient fails to learn to cope more effectively with them should they arise.”

For example, one elderly agoraphobic patient, Mrs. H., with a 40-year history of avoidances of various kinds, made considerable progress in her ability to travel freely and comfortably over a 6-month period. After years of being housebound, she was able to visit her children and grandchildren who lived nearby, take a course at a local college, attend church, and shop in department stores, all without a companion. At one point, she and the therapist agreed that the next task was for her to drive to a nearby city by herself to visit a relative. Like most other activities involving travel, this was something that she had always done with her husband. At this point, progress stopped. For several weeks, she would arrive for her sessions not having done the task, offering a variety of explanations involving inconvenience, but it quickly became clear that there were other issues involved.”

SÍNDROME DA HONESTIDADE: “At the time of the initial consultation, symptoms of panic, which included palpitations, sweatiness, chest pain, dizziness, nausea, and fears of death and insanity were a daily occurrence. (…) She described her parents as very supportive and loving, but when she talked about her interaction with them it was clear that they were extremely demanding, with a very rigid sense of right and wrong. The family had clear and definite rules regarding virtually all areas of behavior—what church to attend and how often, what kind of car one should and shouldn’t drive, what kind of furniture one should have in one’s house, when was a proper time to go to bed, how a dinner table was to be set, what color the napkins should be, and so on. Virtually all behavior was evaluated in terms of its <rightness> or <wrongness> (…) Mrs. K. was the clear favorite among the three siblings in her family.” “K. was somewhat envious of her siblings, who had been <rebellious> as children but seemed to her to have developed a sense of adventure and to enjoy life considerably more than she.” “Considerable time was spent addressing her compliance as it manifested itself in the transference, including her over-enthusiasm for the therapist’s interpretations and her beliefs that she would be abandoned and the therapy relationship terminated if she failed to please the therapist and meet the expectations she imagined he had for her.” “During the course of treatment, Mrs. K. became considerably more assertive, and reported losing the general sense of bemused detachment that formerly had characterized her relationships and activities and were a direct outgrowth of her compliant posture.”

one particular agoraphobic patient of ours dealt with the demands of others in an outwardly compliant way, but when uncomfortable or unhappy with such demands found ways to sabotage them passively. The way this emerged in the therapy was that when the patient felt the therapist did not understand the severity of her problem and was <pushing> too hard for her to complete certain tasks on her own, she would agree to carry out the tasks and then <not find the time>.”

While some patients elect to stay in treatment beyond the point where their presenting symptoms have been reduced or have remitted, it is beyond the scope of our current effort to describe the long-term treatment of the anxious patient.”

The main symptomology of patients with acute anxiety was reviewed in the first chapter. The patient feels anxious, tense, nervous; he is preoccupied and worried and ruminates about some, perhaps, indefinable problem; he may appear worried, with a furrowed brow or tense muscles; he may sweat excessively and have trouble sleeping and concentrating. (…) It is usually not possible to determine when an acute problem will become chronic, but most acute anxiety and tension disorders resolve within 6 months.”

Past history of vulnerability to stress suggests continuation of the same vulnerability to stress, other factors being similar. We have seen patients with panic disorder, for instance, who experience recurrence of panic symptoms only when they feel stressed. In these people stress always seems to produce recurrence of the panic symptoms. Effective and early coping with stress minimizes adverse consequences.”

THE THIN LINE BETWEEN… “The boundary between generalized anxiety disorder and panic disorder is somewhat arbitrary. Generalized anxiety is often a feature of panic disorder, although some patients with panic disorder have all the symptoms of generalized anxiety; conversely, patients with generalized anxiety disorder are likely to have at least infrequent panic attacks, perhaps occurring with only one or two symptoms. Patients with chronic anxiety score high on <neuroticism> on standard personality inventories. The neuroticism factor includes anxious, depressive, and somatic symptoms, low self-esteem and low self-confidence, and irritability.” “Patients report that they are frequently preoccupied, worried, or ruminative; their preoccupations often concern events that are highly improbable. For instance, a wealthy patient may worry that he will become a pauper; an excellent college student may worry that he will fail his classes. When the content of the ruminations involves anticipated problems whose occurrence is more probable, the experience is more accurately described as anticipatory anxiety [parrifobia].”

When compared with those who did not suffer panic attacks, patients who did found their thoughts more clearly articulated, intrusive, credible, and difficult to exclude. Most patients who had experienced panic attacks reported a physical feeling as the most frequent precipitant to episodes of anxiety, whereas patients in the generalized anxiety disorder group reported an anxious thought or a change in mood as the trigger. These data suggest that generalized anxiety disorder patients may be less likely than patients with panic attacks to systematically misconstrue their somatic experiences as dangerous.”

O balão de pensamentos dos quadrinhos foi a invenção literária mais genial do século XX. Talvez a invenção humana por excelência deste século, tirante o avião.

rivotril, nicotine, ecstasy, vicodin, marijuana and alcohol…

In retrospect, she decided that her asthma attack was actually a panic attack. Medical examination was normal. She reported feeling anxious 80-90 percent of the time even when she was not having panic attacks. She reported worrying continuously about her children, her health, and the health of her children. On a scale from 0 to 10, with 10 being the highest anxiety and 0 being none, she rated her anxiety a 10 most of the time.”

Although the electromyographic activity recorded from the frontalis muscle is reliably higher in anxious patients than in controls, EMG activity from forearm, masseter, and other muscle sites does not appear to differ (Lader & Marks, 1971). (…) There is no evidence of EEG abnormalities among anxious patients. Respiration is more rapid and shallow. Finally, although dry mouth is a common symptom of anxiety, there do not appear to be differences in salivation between anxious subjects and controls (Peck, 1966).” “individual differences are sufficient to prevent generalizations regarding the physiological reactivity of anxious patients as a group.” “Evans et al. (1986) found that average daily heart rate was not correlated with anxiety measures.” “at present, we lack a reliable peripheral biologic measure of anxiety.”

As anxiety and depression are closely associated, distinguishing between the two can pose a problem. In a community sample, 67% of subjects with a psychiatric disorder had features of both anxiety and depression that could not be differentiated (Tennant et al., 1981).”

Thyer et al. (1985a) reported that the mean age of onset for GAD [Generalized Anxiety Disorder] patients was 22.8 years. Noyes et al. (1980) have suggested that the onset is gradual. Studies indicating the stability of <neurotic traits> are also relevant here; in adults such traits seem stable from one decade to another. Given the chronic nature of the problem, helping patients learn to tolerate symptoms without abusing prescribed medications or other substances seems particularly important.”

Among the most interesting theories regarding etiology is that generalized anxiety disorder in humans is analogous to sensitization observed in animals. There are 2 basic processes involved in defensive learning: habituation, which is the response decrement that occurs on repeated presentation of a noxious stimulus, and sensitization, which is the increase in defense evoked by strong or noxious stimuli. Habituation is the process that allows an animal to eventually ignore repeated innocuous events, and sensitization is the process that leads it to attend to potentially dangerous ones. (…) Perhaps generalized anxiety disorder represents chronic sensitization characterized by continuous over-attention to potentially noxious or dangerous stimuli.” Uau, como são geniais os psiquiatras de nossa era! Como se houvesse mesmo a possibilidade de ser até outra coisa!

Benson notes that hypnosis, autogenic training, relaxation and transcendental meditation have been shown to lower oxygen consumption, respiration, and heart rate while increasing alpha activity and skin resistance—all responses compatible with inhibited sympathetic activity.” For instance, the subject is invited to imagine floating in a hot bath or a lake and may be told that each breath out will leave him feeling a bit more comfortable and that he will be able to breathe more deeply and easily. Spiegel encourages the patient to picture an imaginary screen in his mind’s eye, a movie screen or a TV screen, and to visualize on that screen a pleasant scene, somewhere the patient enjoys being. After the patient has achieved the ability to produce a comforting scene and is able to achieve body relaxation, he is asked to imagine anxious images. The patient moves from anxious scenes back to comfort and floating—a process similar to desensitization.”

After patients have identified what they would like to say to whom, we model and role-play the situation. Often we suggest the kinds of things that the patient might say and play the role of the patient in the feared situation. We then reverse roles and have the patient practice the interaction. We provide feedback. When the patient feels comfortable with the role-played interaction we then encourage them to use the skills in the actual situation, cautioning them that such situations are rarely identical to the ones created in the office but offer some variations and challenges for them to work on. We agree on the situation they will try and then review it during the next session. Such review may also be useful in elaborating troublesome thoughts. Patients will usually downplay obviously successful interactions or attribute their success to some external factor. Thus, developing a proper cognitive appraisal of their performance is a part of the assertion training.”

It is probably unrealistic to expect patients presenting with GAD to adopt what amounts to a <heart-healthy> life-style (i.e., avoidance of smoking; exercising at aerobic levels 3-5[!] times per week for 20-30 minutes; eating a low-fat, low cholesterol diet, and maintaining a serum cholesterol below 200 mg/dl; blood pressure below 140 systolic and 90 diastolic; and weight no more than 10-20 pounds above ideal for height sex, and age).” “Patients with GAD who drink several cups of caffeinated coffee daily should certainly be encouraged to cut down to no more than one. Those who clearly work an excessive amount of hours should be encouraged to reduce their work load if possible and to build in time for recreation.” Não dê ao escravo o gosto do que ele não pode ter.

The longterm pharmacologic treatment of chronic or generalized anxiety is one of the most controversial issues in medicine. The debate centers on the risk/benefit of such treatment. On one hand, some argue that effective agents should not be withheld from people who are suffering from anxiety disorders. Others argue that the agents are not, in fact, effective and that they carry considerable risk for longterm dependence, unknown side-effects, and life-threatening withdrawal.”

While there is general consensus that benzodiazepines are effective in the short run, given the importance of the question, it is surprising how limited our knowledge is regarding the long-term effectiveness of benzodiazepines. In 1980, after reviewing studies on benzodiazepine effects, the British Medical Association concluded that the tranquilizing effects of such drugs do not persist beyond 3 to 4 months. However, other experts have argued that benzodiazepines are effective beyond 4 months, particularly in patients with severe anxiety.”

He was seriously considering resigning from his firm because he dreaded meetings with clients and other professionals and was hardly able to stand the anxiety. He was drinking 1-2 oz. [?] of alcohol per week; there were no medical causes for his anxiety. He had taken diazepam, 5-10mg per week intermittently for the past 3 years with no apparent benefit. He met the DSM-III-R criteria for panic disorder and for uncomplicated and generalized anxiety disorder. Because of the panic attacks and an unwillingness to take imipramine, he was started on Alprazolam 0.5mg BID. On this dose, he achieved immediate and almost complete relief of his symptoms. For the first time in his life, he said, he no longer dreaded going to work and no longer experienced anguish from hour to hour. (…) Coincident with his improvement, one of his senior partners in the accounting firm decided to retire and wanted to have the patient buy out his interest. Because of the reduced anxiety, the patient was now more confident to deal with clients and to try to obtain new business. He decided to buy the firm, a move that caused him some stress and demanded more intensive effort. This new business venture coincided with the end of the first 6 months on the medication and the patient did not want to stop the medication and possibly jeopardize both his ability to function effectively and his monetary investment. Over the 6 months, he had not increased his medication, was not using alcohol, did not have evidence of withdrawal symptoms, and remained improved. We agreed to continue the medication for another 6 months and then to try a drug-free period.”

O perigo de estar por cima da onda… Assumir riscos em excesso. Contribuir para o próprio fracasso. Ingenuamente. Como se fosse a primeira vez.

At the end of 6 months, now a year into therapy, the patient continued to use the medication as prescribed and maintained his improvement. We strongly encouraged him to try a drug-free period, reviewed the possible long-term risks associated with the drug, and reminded him of our initial agreement. Reluctantly, he gradually stopped the medication, and although he did not seem to have withdrawal symptoms, his anxiety and panic attacks had returned within 3 months and had begun to impair his work. The medication was resumed for another 6 month period.

Although this case is somewhat unusual in the dramatic relief obtained from the medication, the issues are typical for many patients; the medication was associated with improved functioning and alternative therapies seemed ineffective. However, the patient continues to rely on the medication in order to function effectively.”

“In a few patients the withdrawal syndrome can be sufficiently severe to cause epileptic seizures, confusion, and psychotic symptoms (Owen & Tyrer, 1983; Noyes et al., 1986.). For most patients, withdrawal symptoms are more diffuse, including anxiety, panic, tremor, muscle twitching, perceptual disturbances, and depersonalization (Petursson & Lader, 1984; Owen & Tyrer, 1983; Busto et al., 1986).” “Benzodiazepine withdrawal is a real and serious problem and sometimes life-threatening in chronic benzodiazepine users.”

CHOCANDO OS OVOS NO NINHO DA SERPENTE:Jennifer had a difficult family history. She described her father, also a lawyer, as extremely critical, distant, and contemptuous of her and her older sister. She reported that as an adolescent, he would frequently end arguments by saying <You’re fat,> [also known as young] as though this fact disqualified her from rendering opinions or having feelings worthy of consideration, and as though she was to be dismissed on all counts for this reason. She reported that her mother was a loving, <reasonable,> person, who, however, never confronted the father, and, instead, attempted to accommodate to his irascibility.

The patient proved to be highly sensitive to a variety of medications including imipramine, desipramine, protriptyline, nortriptyline, and amitriptyline, complaining that each either caused increased fatigue or increased agitation. We continued with cognitive therapy during this period of about 4 months when numerous medications were tried, but the patient’s depression and anxiety continued. Family therapy with a colleague of the primary therapist was also arranged. The patient reported that the first session <made a huge difference> in her outlook. While nothing was resolved, and she remained unsure whether she and her father could have an acceptable relationship, having her father hear her concerns seemed to lift a weight from her. She reported fears prior to the session that he would dismiss her, deny the validity of her complaints, or storm out of the session. (…) She no longer felt hopeless about the future.”

PARADOXAL INTENTION or REVERSAL PSYCHOLOGY (…) Everytime he felt a little wave of spontaneous alarm, he was not to push it aside but was to enhance it, to augment it, to try to experience it more profoundly and more vividly. If he did not spontaneously feel fear, every 20 or 30 minutes, he was to make a special effort to try and do so, however difficult and ludicrous it might seem. I arranged to see him twice a day over the next two days until his examination. He was an intelligent man, and an assiduous patient. He practiced the exercises methodically, and by the time of the examination he reported himself as almost totally unable to feel frightened. … He passed his examination without apparent difficulty.”

Many of our patients have read books about anxiety before coming to the clinic or wish to do so in the course of therapy. Ghosh and Marks (1986) have even reported that bibliotherapy works as effectively as therapist instruction for self-exposure, at least with agoraphobics. We have yet to see a patient benefit from bibliotherapy to the extent indicated by the Ghosh and Marks study. However, we have found such books useful to help patients gain an understanding of their problem and to feel less alone in struggling with their difficulties. Two books that provide a good discussion of panic are The Anxiety Disease by Sheehan (1984) and Panic: Facing Fears, Phobias and Anxiety by Agras (1985); these books are not designed as self-help manuals.” Then they are probably good lectures.

we have seen patients who avoid speaking in public situations; in most such cases, they fear that their anxiety will become evident to others either through a tremor in their voice or through an inability to speak.”

while the agoraphobic’s fear of losing control and driving his or her car off the road during a panic attack can be easily viewed as <irrational,> the social phobic’s fear of verbally stumbling during a talk or fear of being rejected as a suitor on a date might reasonably occur. (…) Thus a vicious cycle often develops in which the anxiety is actually instrumental in potentiating the consequences most feared by the patient through interaction of the cognitive, physiological, and behavioral aspects of the problem.”

Beck and Emery (1985) have made certain important observations on the phenomenon of shame as it applies to individuals who experience anxiety regarding evaluation. As they note, shame involves insult to one’s public image. Strangers, who are perceived as representatives of a group, may more easily arouse feelings of shame than those with whom we are on intimate terms. (…) Such judgements are viewed as <absolute, finalistic, irrevocable.>

One final observation made by Beck and Emery that may have important treatment implications is that one may feel shame whether the perceived disapproval is communicated or not; shame is tied to the perception of how others think, rather than what they specifically communicate. Thus, an individual might expose him or herself to problematic situations regularly without diminution of anxiety, if he or she continued to believe that others’ negative evaluations continued to be present.

unlike anxiety, which usually ends when the individual exits the fear-evoking situation, the experience of shame continues beyond the individual’s participation, fits with Liebowitz et al.’s (1985a) report that the anxiety of the social phobics they have seen <does not seem to attenuate during the course of a single social event or performance . . . (but rather) augment(s), as initial somatic discomfort becomes a further distraction and embarrassment to the already nervous individual> Seria possível que eu fosse sociofóbico entre 2006-2012 e tenha me tornado progressivamente “apenas” ansioso-depressivo?


who copes with difficulties

is cop(y)ing (with) the

winners

cannot copy without you two!


the social performance standards of those with increased levels of social anxiety are unrealistically high. Thus, the discrepancy between actual performance and the desired standard may be more likely to be pronounced”

being introduced, meeting people in authority, and being watched while doing something are among the more difficult situations for this group, while agoraphobics fear circumstances including being alone, being in unfamiliar places, and open spaces.” <Ele é tímido> são as piores aspas da história.

In our experience, alcohol abuse is a significant problem among social phobics and must be carefully assessed before proceeding with treatment.”

He had begun to avoid small seminars in which he felt class participation would be required. Though verbally appropriate and attractive, he had done little dating, and had had no sexual experiences of any kind with women. He would also become sufficiently nervous over the prospect of asking a young woman for a date that in this situation too, he worried about his voice quavering and was avoiding such encounters. During the sixth week of treatment, he confided to the therapist that he believed that when he thinks about women, he emits an offensive odor that causes others who may be physically near him to leave. This idea had started when he was 17 and a senior in high school. His parents had gone out for the evening and he had masturbated in the family room. His parents however, came home unexpectedly early, within a minute or so of the time he had finished masturbating. Though he had managed to collect himself before they entered the family room, and there was no overt evidence they knew what he had done, he believed that in the act of masturbating he had given off an odor that they could detect. This idea had progressed to the point where he now believed that just thinking about an attractive woman caused him to give off such an odor. He was in the habit of sitting by himself in a corner of the library or cafeteria due to fears that others could smell when he was thinking about women.

The patient’s questionable reality testing and other phenomenology raised the possibility that he might be schizophrenic. However, after discussing these issues with the therapist, and feeling somewhat reassured, he agreed to a consultation with a urologist who was quite understanding and also reassured him. He was greatly relieved by this reassurance, and stopped isolating himself in the school library and cafeteria. Social isolation is often a feature of social phobia, and in such cases, without the availability of corrective feedback, ideas such as the above can develop.”

The onset of social phobia appears typically between ages 15 and 20. Marks (1969) noted that among a sample he studied onset appeared to peak in the late teens. Amies et al. (1983) reported a mean onset of 19, as opposed to 24 among the agoraphobics. Nichols (1974) reported that two thirds of his sample developed the problem before age 25. Shaw (1976) reported that 60% of the social phobics in her sample had developed the problem by age 20 (as compared with 20% of agoraphobics), and 19% of the social phobics rated the onset as acute (as compared with 53% of the agoraphobics).”

Several other hypotheses have been suggested. Nichols (1974) has noted the presence among social phobics of unusual sensitivity to criticism, disapproval, and scrutiny from others, low self-evaluation, rigid ideas regarding appropriate social behavior, a tendency to overestimate the extent to which visible symptoms of anxiety are evident to others, and a fear of being seen as ill or losing control. He argues that perception of loss of regard by others leads the individual to become hyper-aware of his or her anxiety in social situations, leading to increased sensitivity to physical cues and increasing concern that further lack of regard will ensue should such symptoms be noticed.” “poor performance in social situations leads the individual to expect negative evaluation and rejection from others (Curran, 1977). Another hypothesis is that social anxiety and social phobias are mediated by faulty cognitions regarding performance demands and the consequences of negative evaluation, which then, in fact, interfere with effective performance (Beck & Emery, 1985). [Óbvio.] Some of the avoidant strategies employed by social phobics such as gaze aversion, facial inexpressiveness, and reduced talkativeness can engender rejecting responses from others” O que não ensinam na escola: que não querer, conseguir ou suportar olhar no rosto dos outros não é covardia, mas condição. O tagarela é o primeiro a ser punido, mas também o primeiro a ser abordado (pelas mesmas pessoas!): “O que está acontecendo? Tudo bem com você, o que é que tá pegando? O gato comeu sua língua?”. Outrora tive um chefe que ria das pessoas que não conseguiam olhar nos olhos dos outros. Esse chefe, longe de ser um pacato cidadão mediano, era um dos mais neuróticos patológicos não só do setor, mas do órgão inteiro. Sua característica mais pusilânime era chegar dando um bom dia mais animado que o apresentador do Balanço Geral. Com o tempo, entretanto, e a percepção de que as pessoas no trabalho não o enxergavam como sua mãe o enxergava (e portanto ele mesmo se enxergava), graças a sua arrogância, hipocrisia e acerbas observações, e a certeza cada vez maior de que não passava de um chato de galocha, ele começou a se comportar de modo um tanto errático, auto-isolando-se além de toda medida, aproveitando-se do expediente de ser chefe para passar o dia trancado, longe de nossos olhos perscrutadores. Alguns realmente aprendem na prática a baixar a bola.

Beta-blockers have been prescribed to block the peripheral manifestations of anxiety on the assumption that peripheral autonomic arousal increases social anxiety. Beta-blockers have been shown to reduce performance anxiety among such groups as musicians and college students.” “in patients with atypical depression, MAOIs seem to reduce interpersonal sensitivity, which is a measure of sensitivity to rejection, criticism and indifference on the part of others”

As a group, social phobics suffer from a number of cognitive errors. While it is true that the underlying theme of these errors involves sensitivity to the evaluation of others, they may take a variety of forms. The most common cognitive errors we have encountered among social phobics are the following: