CASO SUZANNE URBAN – Binswanger (trad. Tadeu Costa Andrade)

Fonte: https://www.yumpu.com/pt/document/read/12536208/o-caso-suzanne-urban-psicopatologia-fenomenologica-

DIC:

Beeindruckbarkeit: impressionabilidade

Besessenheit: obsessão; possessão (demoníaca).

In der Wirklichkeitstehen: estar com os pés no chão (terra; realidade)

lazareto: hospital de leprosos, espaço destinado à quarentena

mit-teilsam: com-unicativo

Selbst-Verblendung: autocegamento

Verantwortlichkeit: responsabilidade


Da ist eine Fliege in meiner Suppe”

ins Dasein kommen” vir-a-ser

Desde que eu me entendo por gente

Caso Ilse: o <ponto de partida> era o amor passional pelo pai e o sofrimento constante pelos maus-tratos que ele dispensava à mãe.”

“Enquanto, no Caso Ilse, o Dasein estaba sob uma alta-tensão que durou muitos anos e <deu vazão> a si mesma primeiramente no sacrifício da queimadura, depois no delírio de perseguição e no delírio amoroso, a alta-tensão sob a qual está o Dasein no caso Suzanne Urban mostra-se não apenas em um amor <idólatra> pelos pais, mas também em um culto amoroso hipocondríaco <quase anormal> aos pais e ao esposo. Esse culto é afetado profundamente e é colocado sob a máxima prova quando o esposo (um primo) contrai câncer na bexiga.” “Além disso, ressalte-se que não se trata de um delírio de perseguição singular <residual> que se liga a uma vivência de desabamento do mundo, como no caso Schreber-Flechsig, mas, como nos casos Lola e Ilse, de um delírio de perseguição anônimo ou plural.”

(Nota: os títulos a seguir foram insertos por mim de forma arbitrária, não correspondendo nem à posição dos capítulos e tópicos do livro nem coincidindo em nomenclatura.)

1. A FAMÍLIA RELATA O CASO

“nenhuma amizade autêntica.”

“Sobretudo nos últimos anos, colocou que o ideal haveria sido não ter se casado, mas ter feito carreira no teatro. Natureza muito erótica (…) gostava de contar ao velho pai piadinhas eróticas.”

Quem não vira artista fica doido; mas e o artista, anormal, fica o quê?

“Quando menina, era notavelmente bonita. (…) Não agia como uma coquette” “Tornou-se noiva de um primo muito rapidamente”

“Aos 27 anos começaram ataques de espirro paroxísticos [?] que permaneceram fechados à influência terapêutica. A organoterapia junto a renomados laringologistas falhou completamente.”

“O marido era dominado pela esposa, cedia a ela constantemente”“só tinha interesse pelo câncer do marido, não suportava qualquer outro assunto. Indignava-se se alguém risse em sua frente. Queria acima de tudo matar o marido ela mesma e suicidar-se depois. Desejava um acidente que trouxesse a morte para os dois.” “Insultava os médicos porque eles não matavam o marido.”

“A paciente ingressou num hospital psiquiátrico (…) desde o começo, acreditava que estava sendo observada, perseguida pela polícia, radiografada; segundo ela, a família (…) estava tomando seus bens; no parque havia fios elétricos que registravam os passos de todos, ela teria sido infectada com sífilis, além de ter câncer, e todas as doenças possíveis. Recusava comida, acreditando que estava envenenada. À noite, vozes entravam-lhe na cabeça e mandavam-na repetir tudo que havia de mau; tudo seria impresso e divulgado por meio de gravadores especiais. Havia fios por toda parte. Mesmo no banho, haveria aparatos que a fotografavam nua para expô-la publicamente. Julgava que misturados aos remédios tomava sêmen de rãs e lagartos, queria vomitar tudo.”

“As idéias persecutórias pioravam cada vez mais. Gritava da janela (…) haviam cortado fora o nariz, as orelhas, os braços da mãe. Os familiares estavam enfiados em meio a fezes, batiam neles com barras de ferro, etc.”

“alta após 4 semanas”

“Nos últimos tempos, envelheceu muito, os cabelos esbranquiçaram rapidamente.”

2. COMO SUZANNE SE VÊ

“[Internada na clínica de Binswanger,] escreveu em poucos dias 2 cadernos completos, em alemão, embora esse não fosse seu idioma natal. (…) A partir dos escritos, pode-se perceber o quão exatamente as informações dadas pela paciente concordam com as dadas pelos familiares do ponto de vista do tempo e dos fatos”

Visto que a doença piorava cada vez mais, que meu marido começou a sofrer de insônia total apesar da medicação e que só comia se o forçavam e se alimentava principalmente de sangue prensado com creme, ovos e carne, os médicos sugeriram, uma vez que não se podia obter o novo medicamento (mesotório) onde morávamos, que fôssemos a Paris, ao que meus familiares também me encorajavam, dizendo que eu devia de toda maneira, embora estivesse arrasada, inconsolável, tentar também isso, a fim de nunca poder me culpar por [não] ter tentado fazer todo o possível para, se não salvar, ao menos prolongar a vida do homem. Essa estadia de 2 meses em P. foi o inferno para o pobre homem; alguns médicos queriam mandar operar meu marido, proposta, contudo, veementemente rejeitado por outros médicos.”

Enquanto eu estou andando pelo parque, eu escuto minhas expressões um tanto triviais serem repetidas por algumas mulheres que estão andando o mais perto possível de mim, a fim de me mostrar que elas ouviram tudo. Isso me deixa frenética. Até mesmo meus pensamentos são repetidos por outras pessoas. Eu digo para minha irmã ‘Nós estamos aqui entre espiões, o que eles querem de mim?’, mas ela apenas ri”

eu pressinto uma corrente elétrica”

tornei-me assassina de toda a família; não isso apenas; eu mando despedaçar a tumba do meu pai. Esses pensamentos me vêm na língua …, que eu nunca usei em casa. (…) e eu, assassina, estou deitada aqui na cama, estou sendo alimentada, estão me dando banho enquanto meus inocentes familiares atormentam-se.”

nós somos mendigas, eu caluniei vocês todos por meio do poder do diabo.”

Agora estou vivendo com a única esperança de escrever um pedido (petição) de que fuzilem as pobres pessoas sofridas ao invés de martirizarem-nas por tanto tempo.”

3. ANOTAÇÕES DE BINSWANGER

“Teriam-na mandado dizer que seu sobrinho é um socialista. Sente depois, com toda a exatidão, que estão arrancando os olhos dele.”

“tão logo conta uma piada, faz mais uma vez censuras a si mesma. (…) Conta com muito gosto as piadas mais sujas. Pergunta quem lhe tirou o entendimento.”

“Em 4 de setembro de 1920 é retirada do hospital psiquiátrico pela irmã imprudente, depois da assinatura de uma declaração rigorosa (…) Desde então, não ouvimos sequer mais uma palavra a seu respeito, e todas as buscas ficaram sem resultado devido aos caos da I e II Guerras Mundiais.”

“Até o último momento, a letra era tão precisa e pequena que a paciente podia colocar toda a história de seu sofrimento em um cartão postal”

4. ANÁLISE DO DASEIN

O médico disse-lhe que havia uma parte da bexiga que estava ferida, mas, quando ele virou as costas, fez para mim uma cara tão terrivelmente desesperançosa que fiquei completamente paralisada (…) de modo que o médico agarrou minha mão para me indicar que eu não devia mostrar a ele nenhuma das minhas sensações. Essa mímica foi uma coisa pavorosa! Meu marido também percebeu algo, talvez, mas exibiu uma expressão completamente amigável e apenas perguntou ao médico de onde isto poderia ter vindo; ele respondeu que isso frequentemente está no sangue, sem que se saiba sua origem.”

“horror mudo”

“Suzanne Urban leu no rosto e na mímica do médico não apenas a sentença de morte do marido, mas também a perspectiva das dores tormentosas que o aguardavam.”

“Todo o Dasein estava agora sob o domínio do tema de que foi encarregado na <cena original>, o tema do <câncer do marido>. Como algo de que alguém é encarregado <a partir de fora>, esse tema implica um encargo, o encargo, propriamente, de <levar a cabo> esse tema de alguma maneira, de não sucumbir a ele, mas vencê-lo.”

“Suzanne Urban agora fala consigo mesma, ouve a si mesma, escuta exclusivamente a si mesma. Se o dito de que todo monólogo é um diálogo (Vossler) é correto, isso também se aplica neste caso.”

“Enquanto o si-mesmo aberto (aberto à verdadeira comunidade) atenua a carga de tal tema falando a respeito dele com um amigo, o si-mesmo que se enclausura com o tema procura carregá-la <exclusivamente> em seus próprios ombros, sem ver que esses ombros se tornaram fracos demais para isso há muito. A essa altura estamos diante do 1º passo desse Dasein em direção ao cegamento do si-mesmo ou à extravagância.”

Vacas não-malhadas e gatos no telhado: “Nachts sind alle Kühe grau”

“Como é regra nos delírios de perseguição plurais, aqui o pretenso fundador da <desgraça de toda a família> [o psiquiatra da internação] vai depressa para o 2º plano para temporariamente dar lugar a uma pessoa completamente diferente (<a prostituta de rua>, a enfermeira) e somente ser mencionado de novo ocasionalmente. O Dr. R. figura aí como aquele que a separou de seu marido (…) o carrasco da família” “Apesar de tudo isso, não parece fora de questão que o Dr. R. deva seu significado de desgraça ou de pavor a uma <identificação atmosférica> com o urologista que <martirizou> o marido com seu exame e lhe revelou o diagnóstico de câncer tão <pavorosamente>. Pois o verdadeiro carrasco, aquele com quem <a desgraça de toda a família> começou, é decerto o médico da cena original

Te peguei pela nota de rodapé.

Tu te tornas eternamente citável pelo artigo que publicas.

“Também a autosseculusão frente aos outros é uma forma desse ser compartilhado (…) Todavia, com isso ainda estamos na superfície, completamente à parte do fato de que a passividade sempre implica uma forma de atividade e vice-versa.”

Mundchen, a boquinha de Munique.

É fitar e começar: start and resume (pressing start): starren: é ver pra crer: que fita, pode crer!

Select your destinyfreedom!

Pausar qualquer progresso.

Engessar qualquer um que deu um pau na máquina que deu pau.

Congelar, reter, dar crise de pânico e resetar.

Meu torpor seguro onde cristalizaram as emoções já faz um tempo.

Já faz um tempo que as pessoas agem como se portas-afora fossem.

Ágora é que são elas, cuspindo na cara dos carnavais.

Parcas fora do baralho, só estão no mundo real –

Presente de hilota e pelego!

Recebo, não nego, dadivoso logro quando hipomaníaco eu estiver.

Rancorosa Lola Corre do Tempo que Assedia a Moça de Somas Bonitas.

Poxa que rosa sua coxa, recorro aos meus pensamentos para encerrar o coro

Com uma mensagem que não escoe pelo ralo: uma ponte entre nossas

Aspirações.

Abismo cheio de miasma, conhecido como el mismo.

Cacarejou a cara do novo dia normal e malogrado.

O Apanhador de Sentidos no Campo do Nonsense.

Em termos de sentido da vida, a única coisa que se apanha, em muitas pessoas, é seu eu-criança. Isso é falta de apanhar, K.! Preguiça mental!

Entorpecido em suas sólidas crenças morais.

Fagulhas de luz negra em seu olhar gasoso, de névoa desinteressada.

História da Moral: Não conte.

Wish-to-do-list:

Ator: doar um

Um ator, atordoar

fina morte morna de morfina

“Em lugar da simesmação autentica do Dasein no sentido da existência, entra a errância sem-fim para o <mundo pavoroso>, para a <odisséia pavorosa>.”

“A notável idiossincrasia das narrações delirantes dos esquizofrênicos está correlacionada ao fato de que o <como> da narração, a representação linguística, pode ser extremamente sucinta e precisa – tão precisa que um leigo, em regra, dará crédito às declarações delirantes da paciente prontamente se elas não forem abstrusas demais –, enquanto o <o quê>, o conteúdo de suas narrativas, é em regra notavelmente impreciso, vago, ambíguo, até mesmo <aventuroso>.”

me sinto como se…”

“Quanto mais evidente é a sinistra entrega de Suzanne à publicidade, mais os órgãos executores dela (aqui como em outros lugares) se subtraem a uma verificação exata. Todos procedem de maneira mais ou menos secreta. (…) está cercada de espiões, contudo não consegue vê-los e identificá-los; ela escuta <um apitar policial>, mas não vê nenhum policial. (…) A despeito do sentimento de ódio para com o Dr. R e para com a <prostituta de rua>, Suzanne, ao contrário do presidente do senado Schreber, não implica com uma pessoa determinada, ao redor da qual circula amor & ódio. Não foi <ele> nem <ela> que armou, mas simplesmente <armaram> uma <armadilha pavorosa>” Bem weberiano!

“Lidamos com duas <linguagens> da paciente ao mesmo tempo: uma linguagem do pavor e uma linguagem da verificação calma e da reflexão. Delírio e reflexão sóbria não se excluem mutuamente”

“Suzanne ouve dia e noite um uivo pavoroso, como o dos lobos. <Tossem> e <cospem> alto diante da janela dela, ela vê grandes facas de cozinha que estão numa janela e grita alto ao ver algumas gotas de sangue sobre o chão, etc.”

“a criada do hospital está vestindo os aventais dela, para <mostrar-lhe> que estão fazendo <revistas> (policiais) em seu quarto. As declarações de uma senhora de que se deveria deixar o gato <dar uma boa mastigada no pássaro>, certos movimentos manuais e o ato de puxar o nariz, tudo isso tem o mesmo sentido, que algumas vezes ela escuta expresso por palavras: <a cabecinha precisa cair>.”

“Depois de pensar como seria bom se quisessem decapitar ela própria (em lugar de seus familiares), ela vê <diante de si> um menino que tem um sabre de brinquedo fazer o movimento da decapitação. Ao capinara grama <mostram> a foice significativamente: <Eu, contudo, entendi o sentido da foice>.”

zombam dela, até mesmo da doença do marido: Câncer, câncer, pelo amor de Deus! Por que não lagosta?”

“O que torna o <paciente que sofre de delírio> alheio a nós, o que o faz parecer alienado não são percepções ou idéias isoladas, mas o fato de seu enclausuramento em um esboço de mundo dominado por um único ou alguns poucos temas, ou seja, enormemente estreito.”

“há os pensamentos que mandam-na pensar!”

“obrigam-na a pensar que os familiares são cobertos com chumbo e piche.”

“O mais tormentoso de todos os tormentos é, na verdade, a obrigação, que parte de um poder diabólico, de caluniar seus familiares <em pensamentos> ou com palavras e, desse modo, de fazer-se culpável pelos martírios e pela decadência tormentosa deles, portanto, de ser uma criminosa, por assim dizer, uma criminosa a contragosto.”

1) ‘voz’ inquisidora; 2) poder caluniador dos pensamentos e das palavras; 3) instância transcendente que reflete o jogo de perguntas e respostas, sendo aceita como destino pela ‘voz’, que no entanto ‘corrige’ as respostas quando necessário.

“Aí vemos que O Dasein ainda consegue resistir à publicização dos <pensamentos> ou, ao menos, ainda consegue encará-la de frente se ela estiver em extrema contradição com o si-mesmo. No entanto, é claro que as acusações caluniadores surgem a partir do próprio Dasein.”

Detalhe curioso: a ‘voz’ diz-lhe injustamente o tempo todo que seu marido, inocente, é um falso-moedeiro. “Em Kreuzlingen [segunda internação, na Suíça], ela sempre ouve o martelar de uma forja <nos ouvidos>, que indica que ali mora a mulher do falsificador de dinheiro!”

“E se alguém designa todos esses pensamentos como idéias delirantes, declara ela energicamente: Não são idéias delirantes, são idéias verdadeiras! E logo após Suzanne faz de novo um relato completamente objetivo sobre o novo medicamento que foi inventado contra o câncer em Munique e que seu irmão buscará.”

“a intenção de matar o marido com veneno (arsênico) agora é colocada como a causa de sua internação no 1º hospital”

A paciente passa a se arranhar (no lugar da enfermeira), a se masturbar sem consideração com quem a assiste ao invés de ter vergonha de qualquer atitude em seclusão, uma vez que é sempre, de alguma forma, filmada e gravada: “O mundo compartilhado, que normalmente tem o papel principal no delírio, aqui afunda em direção à completa insignificância. O Dasein retorna à vida no próprio corpo e ao gozo do próprio corpo, agora não mais na seclusão do mundo com-partilhado, mas <diante dos olhos dele>.”

ESPACIALIZAÇÃO DO DASEIN ou TEATRO DA PERSEGUIÇÃO: “Ellen West designava seu Dasein como uma prisão, uma rede e, sobretudo, um palco, cujas saídas estão ocupadas por homens armados <de espadas sacadas>

Jemandem auf den Leibrücken

“Mesmo os pensamentos são <coisas> que são como que tiradas de um recipiente e inseridas nele.”

“mundo sinistro marionético” “Essa consciência de ser uma simples marionete nas mãos de manipuladores desconhecidos está relacionada ao que há de mais pavoroso nos pavores” “Também o predomínio da tecnologia e do maquinário tecnológico está correlacionado à redução do mundo desse delírio a um simples mundo do contato.”

Minkowski – Les notions de distance vécue

E agora, que devir poderá dar uma condição de possibilidade de me salvar? EEEEuuuuuuu

Já conhecemos da <experiência natural> o papel da polícia como um poder sinistro-anônimo. É preciso ler somente O Processo de Kafka para ter uma idéia do tipo, da dimensão e do efeito desse poder. Além da polícia, agora entram em ação também seus companheiros, seja a mando dela, seja por conta própria.” “o médico encaminhador ou ‘carrasco’, os enfermeiros, os outros pacientes, os companheiros de viagem, etc.” “órgãos executores do pavoroso

“Em todos os casos, trata-se das formas do pegar ou ser-pego por algo relacionados ao mundo compartilhado, no sentido da impressionabilidade.

“Acima desses <ramos> dos órgãos executores do pavoroso e, especialmente, acima da polícia, encontramos – como contratantes – o partido (anti-socialista), o exército de ocupação (vive-se então a Primeira Guerra Mundial) ou mesmo o Estado. E sobre tudo isso está simplesmente o poder diabólico do pavoroso, que ora é apenas pressentido, ora é ouvido como uma ‘voz’ terrível.”

“Apesar de ele assumir uma voz, não se chega manifestamente à personificação propriamente dita do poder do pavoroso na forma de um diabo ou um demônio, como muitas vezes podemos constatar em outros casos. Em todo caso, também não ouvimos dizer nada sore visões diabólicas.”

Szilasi – Potência e impotência do espírito

5.O PALCO: CASO ELLEN WEST X CASO URBAN. QUANDO A PEÇA ENCENADA E MUITO CONVINCENTE TORNA-SE POR FIM O REAL (TEATRO DO PAVOR). REFERÊNCIA À TRAGÉDIA GREGA CLÁSSICA.

“o Dasein que adentrou o símile do palco de Ellen West está de uma vez por todas cercado por cortinas que não podem ser deslocadas, por inimigos insuperáveis.”

Resignação como a “ajuda que vem do próprio Dasein”.

“Uma vez que a possibilidade de ser da impressionabilidade se autonomize completamente e, com isso, se torne desmedida e ilimitada, e, consequentemente, o Dasein se limite ao recebimento de impressões, fala-se de alucinação. Se essa receptividade estiver sob a supremacia do pavoroso e obtiver instruções dele, trata-se necessariamente de alucinações pavorosas. O mesmo vale para os pensamentos.”

“O <palco> inteiro está posto em cena por um único <diretor>, por um único poder que confere sentido e dá uma direção. É apenas a partir desse poder que todos os atos que conferem e cumprem sentidos recebem sua diretiva e seu cumprimento intencional.”

Mergulho na viscosa piscina do delírio. Fácil entrar, difícil sair.

“Enquanto o delírio é uma das formas da sujeição do Dasein a esse poder do pavoroso, o mito e a religião, a poesia e a filosofia representam, pelo contrário, formas da superação dele.” “O pavoroso diz respeito ao Dasein em seu isolamento no autismo

Partida bem disputada antes da partida bem acenada

como se…” símile, analogia, erga mínimo distanciamento, abstração, consideração fria de uma autoimagem – diferente de quando se passa ao delírio (psicose) p.d.

“O ser-espiritual é exatamente esse retorno, esse recuperar-a-si-mesmo do tumulto do mundo, a possibilidade da capacidade de ser no espírito.”

passa-se à voz passiva do ente

“O próprio pavoroso-aflitivo se transformou aqui: em lugar do marido, encontramos toda a família ameaçada pelo martírio e pela morte, no lugar do martírio por uma doença incurável, entraram os martírios feitos pela polícia, etc.”

“Daí resulta que, para a compreensão do delírio, não podemos recorrer nem a um distúrbio do juízo em termos de um equívoco, nem a um distúrbio de percepção sensorial, de ilusão por meio de alucinações. Ambos são já consequências da transformação da estrutura do ser-no-mundo como um todo, no sentido do ser-no-mundo deliróide.”

“Ele não se porta de maneira diferente de uma pessoa a quem aconteceu uma injustiça real. Não tem somente a necessidade de <dizer o que sofre>, mas também de defender a si mesmo e os outros dos sofrimentos. (…) o contato com o mundo compartilhado não está de nenhuma maneira interrompido.”

Quem tem inimigos sempre tem testemunhas e objetos neutros no universo. Não houvesse isso, seria apenas uma câmara de yin-yang e partir-se-ia para o confronto direto. No entanto, o inimigo é covarde, é astuto e “mais sujo” do que nós (os personagens delirantes), precisa recorrer a subterfúgios e a táticas infames para “ganhar de nós”. Como ainda cremos, apesar de tudo, numa justiça como princípio das coisas, olhamos em todos os recantos atrás de alguém que simpatize com nossa causa e perceba a vileza e a má-fé de nossos oponentes-perseguidores.

Desse ponto de vista, aquele que sofre de delírio de perseguição não é de forma alguma autista.” Ele sofre de hiper-realidade. Ele pensa que cometeu o crime perfeito e agora sofre uma retaliação não menos impecável…

O perseguido é um secreto exibicionista.

“a <conversão> dos acontecimentos em <ação> vai muito mais longe do que onde já se chegou ou pode se chegar na tragédia e também no mais arrepiante drama barroco. (…) o delírio (…) supera a (…) tragédia (…) [porque] (…) também os pensamentos [são] recebidos [de fora e incluídos] na ação.”

“aqui, como na tragédia, não há <rua sem-saída>, mas tudo vai a qualquer lugar e vem de qualquer lugar e claramente <se refere a um centro>”, o que, como já ressaltamos, exclui o acaso. (…) [Mas,] enquanto na tragédia o poeta é quem <transforma a matéria-prima com sua força>, no delírio o poder formador (…) é cego, e isso implica DESTRUIR A FORMA” Édipo é o autor dessa mímica infernal.

6. CONTINUAÇÃO DO TÓPICO ANTERIOR. REFERÊNCIA À POESIA DE BAUDELAIRE.

Para usar o idioleto idiótico de Einstein, no delírio de perseguição, deus joga todos os dados que tem à mão!

À procura da batida perfeita, quer dizer da cena perfeita, quer dizer, da cena original.O protótipo de todos os males.

O SONETO DA DESTRUIÇÃO AUTÔMATO-SANGRENTA

Sem cessar, ao meu lado, se agita o Demônio,

Ele nada em torno de mim como um ar impalpável

Eu o trago e sinto que queima meu pulmão

E o enche de um desejo eterno e culpável.

Por vezes ele toma, sabendo meu grande amor pela Arte,

A forma da mais sedutora das mulheres

E, sob pretextos especiosos da tristeza,

Acostuma meu lábio a filtros infames.

Ele me conduz assim, longe do olhar de Deus,

Arquejando e quebrado de fadiga, em meio

Às planícies do Tédio,¹ profundas e desertas.

E lança aos meus olhos cheios² de confusão

Vestimentas sujas, feridas abertas,

É a máquina sangrenta da Destruição!”

Baudelaire

¹ Tártaro

² de cisne

νος

Nada no ar

Ar que queima

Fogo que chamusca,

soterra

Terra que cobre

Tudo de novo.

Imagina se esse eidos pega n’olho

Você vê resultados nos testes de Rorschach?

7. A PARANÓIA DE ROUSSEAU

“nos ocuparemos de um caso especialmente famoso e bem-documentado da literatura mundial, o de Jean-Jacques Rousseau.”

“Esse caso é muito apropriado ao que nos interessa, pois a língua francesa é extraordinariamente rica em expressões metafóricas, que são aquilo de que se trata aqui.”

“Rousseau sofria de um delírio de perseguição completamente não-sangrento, puramente social ou reputacional, em termos de uma difamação levada ao extremo, e, no entanto, nele encontramos um vasto número de expressões da esfera do maquinário e da tecnologia a serviço da destruição.” UnB murky atmosphere

Rousseau, Dialogues (vol. XVIII[!] das Obras completas)

Barbarus hic ego sum quia non intelligor illis”

Ovídio

Aqui sou um bárbaro, pois não me entendem”

agrupamentos, cochichos, risos desrespeitosos, olhares cruéis e selvagens, escárnio… atentados… o inimigo sabe exatamente aquilo que mais nos pode ferir, como que magicamente… somos nós que temos rivais finalmente à nossa altura, ou nossa mente nos prega essa peça tão pesada (nosso maior inimigo é nossa própria inteligência tão sutil em seu masoquismo autoacusatório?)?

esse corredor polonês assintótico, entre a certeza absoluta de ser o bode expiatório e a certeza de ser só um ser-num-mundo-ruim, eternamente em dúvida entre os dois pólos perfeitos, eternamente num julgamento impreciso sobre todos os eventos e circunstâncias em pingue-pongue

Eles encontraram a arte de me fazer sofrer uma morte lenta me mantendo enterrado vivo”

R.

“lama”

“apunhalam-me impunemente”

“tudo é uma armadilha”

“maldade diabólica”

não soa, é!

a ameaça de um vago processo…

ocafka da Kapes

a vingança é impessoal

Imaginem pessoas que começam a colocar cada um uma boa máscara, bem ajustada, que se armam com ferro até os dentes, que surpreendem seu inimigo em seguida, o acertam por trás, colocam-no nu, atam-lhe o corpo, os braços, as mãos, os pés, a cabeça, de modo que ele não possa se mover, colocam-lhe uma mordaça na boca, furam-lhe os olhos, o estendem sobre a terra e passam, enfim, sua nobre vida a massacrá-lo de pavor docemente, de modo que, morrendo por suas feridas, ele não cesse de senti-las tão cedo … a vista cruel deles fere seus olhos por todas as partes … o espetáculo do ódio o aflige e o dilacera ainda mais [na mente que no corpo]”

…estes Senhores conjurados em um complô anônimo para difamar-me, inclusive em face do amanhã…” “o grupo parte de 2 rivais, cujo número rapidamente aumenta para 10, mas gradualmente passa a abranger o mundo inteiro (l’univers)”

neurose de transferência do inimigo mortal zena-carolina (nevrose à 4)

cassaram-lhe a aposentadoria integral

invejavam seu carrão

não o valorizavam o suficiente

obviamente falavam mal dele as suas costas (((sem provas)))

UnB – tornar-se um adulto – emular o progenitor

pessoas falam mal de mim às costas

fazem cartazes, infringem normas do Orkut (sim, com provas!)

desvalorizam-me a olhos vistos (a imbecil que desistiu do curso para cursar medicina diz que Heisenberg não pode ser citado numa aula de Introdução à sociologia, pois “não tem nada a ver”, física nada tem a ver com este mundo compartilhado em que pisamos – e mesmo se tivesse, vc fez uma analogia idiota!!)

o calouro que tomou pinho-sol (como se tivesse sido um litro, foi um gole de desafio, mas isso não importa, é a última coisa que importaria, o que importa é a mofa e a troça, passar adiante este relato mui cômico… e ele não tem direito de se enfezar com essa história, afinal, quem mandou ele… inclusive quebrar o dente numa escada numa festa… que ridículo! que ridículo ele descontar hipócrita e dissimuladamente em seu blog intelectual – ele não tem esse direito! – ele me chamou de chato lá… disse que eu dou sono, eu atrapalho, que NÓS SOMOS BURROS, inadmissível, alguém que tomou um gole de pinho-sol ser superior a nós, ovelhas de rebanho, em qualquer coisa que seja!…apague seu blog, viva de acordo com meus preceitos, seu… doido… retifico… seu menos-que-doido pois eu li em Foucault que doidos são seres complexos e honrados vc é um menos-que-nada-e-além-do-mais-vc-é-um-playboyzinho-que-estudou-no-CEUB, meu pai arquiteto que gosta de ornar a casa com colunas gregas jamais teria dinheiro para pagar 700 reais por mês numa FACULDADE para mim, embora ele custeie minha vida numa cidade longe de Fortaleza num apartamento NO CENTRO DA CIDADE, o que pelas minhas contas, para o ano de 2007, excede com facilidade as 2 mil pratas… ó!)

O curso inteiro virou meu inimigo

Mas tinha começado com um núcleo duro…

Logo me afastei até mesmo dos meus amigos mais próximos, que decerto não compactuavam com nada dessa marmotada toda…

Virei um desconfiado de carteirinha. Estava sendo observado na biblioteca, na cantina…

E depois? Ninguém me deus os parabéns, era mera obrigação… Então, a OBRIGAÇÃO de honrar os pais eu a cancelo, porque eu sou livre. Sua obrigação é sofrer seu destino.

Meu destino foi sofrer meu estágio probatório. E rir no meio de uma pandemia, rir, gargalhar, galhofar cada vez mais alto e espalhafatoso, até o dia que por acidente (pois já não mais me perseguem, as pessoas estão paranoicas com outras coisas muito mais importantes, sem dúvida! estou curado!) – por acidente eu disse! – toparem com seus nomes nodoados num post numa entrada miserável na internet e tudo recomeçar?… MAS ESTE É UM PROCESSO SEM-FIM E AUTORRETROALIMENTADO, não se esqueça! Ele faz e paga e sofre e recebe o que pagou e assim por diante incessante infinitamente até que alunos e professores todos se esmaguem num abraço coletivo cheio de ruído e cólera e, não foi nada demais… insignificante.

No fim, eles têm de admitir: eu sou marcante. Eu tenho digitais, eu marco aquilo que toco. Se transformo em ouro ou cinzas, não interessa, o Dasein não tem – para emitir diagnósticos – qualquer resquício de pressa

A vítima de racismo que comeu uma banana e deixou o agressor com cara de tacho é uma história que me lembra muito a minha!

Eu lavei minha boca e troquei a dentadura, para poder falar (com) coisas(-pessoas) melhores.

Eu sou viciado nessa história porque apesar da dor que me causou e que ainda me causa marginalmente, eu viveria todos estes capítulos de novo e de novo… Se sou doente de alguma coisa, essa é minha doença e ela é com toda certeza absolutamente intencional e culpa minha!

A provocação tem 1000 vozes. É próprio da provocação misturar os gêneros, multiplicar os vocábulos, fazer literatura, e esta integridade da matéria dura que nos provoca vai ser atacada, não somente pela mão armada, mas pelos olhos ardentes, pelas injúrias. O ardor combativo, o neikos, é polivalente.”

Bachelard

Mas e Rousseau?

8.DESCONTINUIDADE TEMPORAL

“No pavor abismal relativo ao diagnóstico de câncer e no congelamento de todo o Dasein, <o tempo> estava, por assim dizer, em repouso, não se desdobrou em seus êxtases e, portanto, o Dasein não existia mais no sentido pleno da palavra.”

ab –ismo (até o exagero)

Mitwelt

mundo.com

niilismo&vc.td.a.ver.

“Enquanto no quarto estudo, o Caso Lola Voss, tivemos que nos contentar essencialmente com a verificação e a descrição dessa transformação, esperamos, neste quinto estudo, ter dado um passo a mais na compreensão daseinanalítica [hm] dela. Temos consciência que ainda estamos longe da meta.”

“A palavra physis vem do verbo phyo (nascer, originar-se).”

Um grau além da citação cruzada ou autocitação: a citação de um livro que é dedicado à própria teoria! Grosso modo: “Como diz Binswanger apud Szilasi …” Binswanger [!!!]

“com a evolução da esquizofrenia crônica, acontece pouca coisa, e sempre menos, na medida em que os pacientes esquizofrênicos não têm experiências novas no sentido da experiência natural, i.e., que <adicionem algo novo> às antigas, mas apenas experiências em termos da monotonia do velho estribilho. Permanece-se fundamentalmente na experiência do elemento geral único, e, assim, <não acontece muita coisa>”

“uma longura que se diferencia da lentidão da depressão.”

“no delírio de perseguição, tem-se uma imensidão de <<novas>> experiências

“A temporalização da longura nunca conduz à temporalização do tédio

“Vale notar que o termo utilizado para <andamento musical> em alemão é Tempo

Adorno riria desse esforço: “Binswanger está tentando distinguir na etimologia de longura e lentidão vestígios de formas diferentes de lidar com o tempo. Infelizmente não é possível manter essas relações etimológicas em português.”

“A palavra para tédio é Langweile, formada pelo adjetivo lang e o substantivo Weile (momento, intervalo de tempo).”

“Se alguém, no convívio da vida e do trabalho, for irritado repetidamente da mesma maneira pela mesma pessoa, <ele não vai suportar para sempre>. Em verdade, aqui se experiencia a generalidade da irritação novamente em cada particularidade, mas não de maneira que (como no delírio) o particular represente o geral e exista somente pela graça dele, mas de modo que o geral se particularize de fato em toda sua dimensão, i.e., experiencie sua plena concreção em cada <ensejo> particular (…) É isso que, frente ao irritante, não suportamos para sempre.”

9. A CONSUMAÇÃO DO PAVOR

Husserl, Ideen zu einer reinen Phänomenologie und phänomenologischen Philosophie

“Só se repare de passagem que eu, a despeito de minha convicção da importância filosófica e científica imperecível do método puramente fenomenológico, não estou no campo do <intuicionismo absoluto> da maneira que Husserl o advoga, razão pela qual ainda sou aberto a contemplações e reflexões, como disse Hans Kunz em O problema do espírito na Psicologia Profunda (art.).”

Dormimos todos juntos sobre vulcões”

Goethe

Naquilo que é teu, também vejo o que é meu”

Ulisses no Ájax de Sófocles

é 1000, tio! run!

é 100&cia.

10. TENTATIVAS DE DIAGNÓSTICO

“quando o clínico fala de pessoa ou personalidade, ele já deixou o campo da análise do Dasein.”

estamos demasiado acostumados a agir como se a doença invadisse uma pessoa saudável como se fosse alguém estranho!”

Tiling, Tipificação e Distúrbio Individual do Espírito, 1904.

“Eu vejo em T., a despeito de seus esquemas psicológicos historicamente condicionados, um predecessor da psiquiatria clínica moderna.”

“Suzanne Urban nunca perdeu sua <orientação> e nunca exibiu os distúrbios de pensamento esquizofrênicos formais. Isso também é importante para o tipo de ocorrência delirante de forma de delírio de nosso caso. Pois, ainda que se diferencie dos casos Strindberg e Rousseau pelo <afeto> melancólico em alto grau, tem em comum com eles a forma do delírio.”

“A alguém que leia o histórico da doença pode surgir a suspeita de que, no caso de Suzanne Urban, se tratasse de um delírio puramente depressivo (<afetivo>, <holotímico> ou <sintímico>). Esta suspeita se funda no fato de que de acordo com a família a doença começou com um <transtorno triste de humor>, que o humor permaneceu até o final depressivo e [que] os delírios [são de tipo] melancólico.”

O delírio de culpabilidade leva a acreditar que se cometeram os crimes mais graves sem que haja razão para tanto, ou transforma más ações pequenas e reais em pecados imperdoáveis. Por causa do crime, não somente o paciente é castigado de maneira atroz nessa e na outra vida, mas também todos [os] seus familiares, o mundo inteiro”

Bleuler

7 x 77: a Bíblia é um manual psiquiátrico de primeira grandeza!

“Aqui não se fala de um pecado imperdoável e de seu castigo atroz.” Suzanne sente-se injustiçada. Além disso ela foi uma “criminosa” completamente passiva (de acordo consigo mesma).

hunter x hunter

paranoid x depressed

sense vs. sense

Muito Além da Melancolia (de Ken?)

Delírio de referência: sistematizado e independente do ciclo crime-culpa-e-castigo. Perto disso, a pura mel-ancolia é uma doce brisa.

“há uma perda das inibições morais que não é conciliável com o diagnóstico de melancolia.”

“Com isso, chegamos ao terreno espinhoso da paranoidia, da parafrenia e da paranóia. Já dizemos de antemão que, juntamente com Kolle, Bleuler, Mayer-Gross e outros, somos da opinião de que, hoje em dia, tanto a paranóia (psicótica) quanto a parafrenia devem ser classificadas como esquizofrenia.”

“Do ponto de vista puramente sintomatológico, o caso S.U. poderia ser classificado como a paraphrenia systematica de Kraepelin, já que se trata aqui de um desenvolvimento sorrateiro de um delírio de perseguição constantemente em avanço sem degeneração da personalidade.” Sublinhados: discordantes do caso S.U.

Este sujeito é incurrável, disse o doktor alemal. Ele não pode ser comido!

“o fosso de lama, semelhantemente à caverna, é uma forma particular especialmente feia, fétida e pútrida de profundeza da terra.”

“Uma vez que o diagnóstico de esquizofrenia parece confirmado, e visto que, <onde idéias delirantes e alucinações … estão em primeiro plano>, fala-se (como em Bleuler) de paranoidia, precisamos incluir o caso nesse subgrupo esquizofrênico e, quanto à orientação delirante, classificá-lo como delírio de perseguição paranóide.” Ainda assim: “não vemos sintomas catatônicos, negativismos, estereotipias, excentricidades, maneirismos e também neologismos ou propriedades lingüísticas esquizofrênicas”.

“paralisia das pernas”: histeria

delírio de perseguição singular (portanto necessariamente identitário, vinculado a um sujeito) x delírio de perseguição plural identitário (teoricamente possível, mas que sempre tenderia a alargar seus inimigos, tendendo ao próximo) x delírio de perseguição plural anônimo (caso S.U.)

INFERÊNCIA DA DESCONFIANÇA

Aquele que não desconfia de ninguém… talvez desconfie de si mesmo.

Aquele que não desconfia de ninguém, nem de si mesmo… talvez simplesmente não exista!

Aquele que desconfia de si mesmo, talvez não desconfie de mais ninguém. Saudável desconfiado! Homem invejável!

Aquele que desconfia de um, mas que não desconfia de si mesmo, pode desafortunadamente desconfiar de muitos.

Mas, amigos, aquele que desconfia de muitos, esse desconfia de todos os homens, mais cedo ou mais tarde!

Schreber, por exemplo, o típico delirante singular, vai sucumbindo ao delírio em degraus – imagem perfeita, porque uma escada não é uma rampa. Há uma descontinuidade, mas a ocorrência de ataques ou surtos agudos, que, pelo menos até o segundo, são visivelmente mais importantes do ponto de vista clínico e do ponto de vista do aprofundamento do delírio. Após o segundo, Schreber já está convencido de que ele está no centro de uma trama que envolve o destino do mundo inteiro. E no entanto é só uma figura que emite a voz. Seu pai ou deus. Há posteriormente certa contração (relaxamento), que podemos chamar de descida da escada.

Suzanne, ao contrário, ignora a escada, dá um drible da vaca no real, mesmo no real do delírio, enquanto o delirante for um Schreber. Quem são os inimigos de Suzanne? A sociedade anônima. Enfermeiras, doutores, bedéis, a polícia inteira da cidade ou do país, todos os fascistas e capitalistas, em última instância. Porque de repente os Urban são um bando de socialistas. O mundo não vai ser salvo nem acabar de maneira alguma, mas esse terremoto com Suzanne no centro de seu palco seria suficiente para liquefazer toda a ordem do seu dia. Ela, a vítima. Não deixarão constar nas manchetes de jornais nem nos livros de história a verdadeira história: que Suzanne é inocente. O Grande Irmão a apanhou. E ele tem infinitos avatares intercambiáveis. O que é que fazem com os perseguidos políticos? Podem muito bem metralhar. Mas se não metralham? Talvez não metralham porque existe o risco de se tornarem mártires! Aí então são mais cosméticos e cirúrgicos: basta com exilá-los, torná-los párias inofensivos, eternas personae non gratae. Se Suzanne está viva, só pode ser esse o tratamento a ela dispensada pelos inimigos ocultos!

O dia em que cri que o apresentador do canal de esportes se dirigia a mim, porque sabia que eu estava na pior. A mim!

A internet escamoteia Cila ou Caribde.

Ou eu bem gostaria que fosse verdade, para vender mais livros…

Quem cai na boca do trombone e é o centro das fofocas quer se matar –

Porque não pode se identificar

Com o lunático solitário que só queria ser falado e criticado!

Ou vice-versa.

Schreber x Professor Flechsig

ódio concentrado, advindo do amor pelo pai

Suzanne x “autoridades”

culpa sem relação interpessoal específica, difundida por todos os sentidos alucinados

culpa totalizante, culpa da própria nulidade social

o delírio seria a vingança da moral contra um eu torpe, que se torna mera coisa, títere no teatro. e sua punição deve ser universalmente contemplada, como num reality show ou grande panóptico avant la lettre, seu corpo nu, sua micção, defecação, o ato de comer, transpirar, assoar o nariz, gozar… menos exibicionismo a contragosto que um voyeurismo de si, um sadomasoquismo em que se é boneco, personagem trágico, platéia, direção e os próprios antagonistas.

Schuld em alemão significa tanto culpa quanto dívida.”

“Uma vez que o conceito de autismo é usado ora no sentido daseinanalítico, ora no psicológico, caracterológico, psicopatológico ou psicanalítico, ele se tornou cientificamente quase inutilizável hoje em dia.”

novo demais pra ser demente, velho demais pra ser bobão.

“Nós vimos que nossa própria paciente se encontra na menopausa e os cabelos esbranquiçaram rapidamente nos últimos tempos.”

“Lembramos que Bleuler notou muito freqüentemente nos paranóides uma <sexualidade fraca>, bem como a falta de desejo por filhos. (…) um autoerotismo <forte> dificilmente pode ser concebido como um sinal de sexualidade forte.” “sem a predisposição sadomasoquista, o exame e o adoecimento do marido não teriam esse papel proeminente na doença.”

“seguimos Bleuler quando ele diz <de acordo com nossos conceitos, a constituição hipo-paranóica é uma subforma da psicopatia esquizóide, assim como a paranóia involutiva é uma subforma da esquizofrenia paranóide.>

11. DE VOLTA A HEIDEGGER& ARREMATE

“Aqui o medo não mantém o Dasein <no nada>, desse modo, ele não deixa o mundo naufragar na insignificância, antes confere a ele uma significância distinta e absolutizada, a do pavoroso e, assim, do significado pavoroso de toda singularidade.

“Vemos no conceito de necessidade de delírio o quanto a investigação do delírio (para o mal do conhecimento psiquiátrico) acabou sendo levada a reboque pela investigação normal-psicológica.”

Diretamente relacionado com as polêmicas Freud//Adler: “Bleuler observa com muita agudeza mais uma vez [péla-saco] que se alguém fala de desejo ou necessidade de estar doente, de interesse pela doença, de meta, de ganho da doença, de fuga para as doenças, de intenção e organização, é necessário ter claro em mente, por causa das conseqüências práticas, que essas expressões e conceitos são tirados das idéias de um leigo sobre a psique [!] normal e, na verdade, não deveriam ser de forma alguma empregados em relação a estados mórbidos.”

Nunca vou entender como os autores cinicamente (acordo tácito?), após ridicularizarem Freud num parágrafo, sem citar, nas suas linhas, ‘F.’ e ‘psicanálise’, procedem, logo a seguir, a uma exaltação fabulosa do <legado>: “Em F., o conceito é muito mais profundo do que naquilo que se costuma falar [mais ainda?] sobre o processo de cura, uma vez que ele está firmemente baseado na teoria (construída com muita fineza) da libido, do recalque, do retorno do recalcado e da projeção.”

Projeção continua, a meu ver, o conceito mais problemático da psicologia em geral.

“A partir desse caso de Schwab, pode-se encontrar facilmente um caminho para o <demônio diabólico> de Suzanne Urban e de muitos outros pacientes que sofrem de delírio”

“nos afastamos de Bleuler e de Jung quando eles querem desqualificar a teoria do delírio primário com a assunção e freqüente evidenciamento de motivos inconscientes

“Hans Kunz acreditava que era necessário ver a vivência de desabamento do mundo (cf. Schreber) <como o conteúdo> do delírio primário <mais adequado à ocorrência>, contudo essa vivência (como nosso caso mostra) não é de forma alguma um pressuposto necessário para o delírio primário.”

Heidenhain, J.J. Rousseaus Persönlichkeit, Philosophie und Psychose

“Vê-se quão pouco o critério da recorrência pode, do ponto de vista da <deflagração do delírio>, ser utilizado no diagnóstico diferencial de paranóia e esquizofrenia.”“Mesmo o <esquizofrênico> que chega imediatamente à certeza delirante tem, como nosso caso mostra também, experiências sempre novas que confirmam as antigas.”

“Hoje não podemos mais dizer que as idéias persecutórias se misturam ao quadro da doença <em razão de ilusões sensoriais>, como se podia ler na avaliação do hospital psiquiátrico Sonnenberg sobre o presidente do senado Schreber e infelizmente ainda se pode ler freqüentemente. Antes temos que perceber de uma vez por todas que as alucinações não são distúrbios isolados, como ressaltam Schröder e Meyer-Gross. Mas o precursor nesse tema foi Minkowski em Le Temps vécu, 1923.”

Um louco não faz mais do que perceber a condição humana a sua maneira”

Sartre

As alucinações não se originam de um distúrbio do sensório – compreendendo-se essas funções no sentido psicológico –, também não se originam de um distúrbio das funções da percepção, do pensamento, do juízo, mas partem de um distúrbio e uma variação das funções simpáticas da sensação. Visto que essas funções estão alteradas, o paciente vive outra comunicação com o mundo; mas uma vez que os modos de ser-no-mundo são fundamentais para todas as vivências, as alucinações não são distúrbios isolados”

Erwin Straus, Do Sentido dos Sentidos, 1935

“No conto Na Colônia Penal de Kafka, um viajante, ao ver um delinquente, pergunta ao oficial se ele sabia sua sentença. <Não>, diz o oficial, <seria inútil anunciá-la a ele. Ele já a sente sobre seu corpo>. Dessa maneira, Suzanne Urban não vem a saber de sua sentença, mas de seu sofrimento <sobre seu corpo>, e, por isso, é <inútil> <anunciar> ou explicar a sentença a ela, ou esclarecê-la. E quando Kafka continua: <não é fácil decifrar a escrita (da sentença) com os olhos; nosso homem a decifra, mas com suas feridas>, também nossa pobre S.U. decifra a escrita de seu <destino> não com os olhos (da compreensão), mas com suas <feridas> e as de seus familiares, com os <sofrimentos infligidos> a ela e a eles. (…) O Dasein zomba de qualquer outra experiência; pois esta é a mais <impressionante> no sentido duplo da palavra.” (íntimo e doloroso)

“Por mais que a clínica não consiga evitar todas as tentativas psicológicas, caracterológicas e biológicas de responder o porquê dessa questão em termos de um conhecimento objetificante, a tarefa da psiquiatria como ciência não se esgota nisso.”

“As capacidades anímicas, as propriedades anímicas, a alma (no sentido da psicologia e da psicopatologia), o caráter, a pessoa, a personalidade, o impulso, etc., tudo isso está ontologicamente no limbo, ou seja, não tem fundamento ontológico. Encontramos esse fundamento na analítica do Dasein de Heidegger.”

Jaeger, Paideia II [!!], Die griechische Medizin als Paideia

“o terrível não pode mais se tornar algo impessoal e extramundano contra o qual se pode invocar o destino, mas ele se tornou um ente intramundo que ainda é acessível sob o aspecto da hostilidade.”

Não existe satisfação compensatória: não é uma expiação que demande “x” de tempo ou energia, até haver a quitação. Em tese Suzanne poderia sofrer de seu delírio um tempo infinito (enquanto viver), sem tendência à cura. Realmente o poema de Baudelaire caía bem: uma máquina infernal!

Não importa o conteúdo do delírio: o médico deve analisar a vida pregressa desse tipo de paciente esquizofrênico.

Situação de partida > Autonomização delirante (a paciente perde o foco da ‘angústia original’, quando ainda tinha um ser-no-mundo autêntico)

Da psicose paranóica em suas relações com a personalidade, seguido de Primeiros escritos sobre a paranóia – Jacques Lacan (tradução de Aluisio Menezes, Marco Antonio Coutinho Jorge e Potiguara Mendes da Silveira Jr.), Forense Universitária, RJ (1987). Edição original francesa de 1975.

ORELHAS: “Da Psicose Paranóica, que já foi considerada como a última grande tese da psiquiatria contemporânea, constitui, na verdade, já a primeira incursão de Lacan no campo propriamente psicanalítico. (…) Após a leitura, Salvador Dalí criaria seu método paranóico-crítico[?], o qual traria novo fôlego para o movimento surrealista.”

DA PSICOSE PARANÓICA EM SUAS RELAÇÕES COM A PERSONALIDADE (DOUTORADO EM MEDICINA ORIENTADO POR HENRI CLAUDE, 1932)

A MEU IRMÃO, O R.P. MARC-FRANÇOIS LACAN, BENEDITINO DA CONGREGAÇÃO DE FRANÇA.”

A QUE SE ACRESCENTA MENÇÃO AOS MAIS VELHOS QUE HONRO, DENTRE OS QUAIS DR. ÉDOUARD PICHON. DEPOIS UMA HOMENAGEM A MEUS COMPANHEIROAS HENRI EY E PIERRE MALE, ASSIM COMO A PIERRE MARESCHAL.”

Dentre os estados mentais da alienação, a c1ínica psiquiátrica desde há muito distinguiu a oposição entre dois grandes grupos mórbidos; trata-se, qualquer que seja o nome pelo qual tenham sido designados, segundo as épocas, na terminologia, do grupo das demências e do grupo das psicoses.”

na ausência de qualquer déficit detectável pelas provas de capacidade (de memória, de motricidade, de percepção, de orientação e de discurso), e na ausência de qualquer lesão orgânica apenas provável, existem distúrbios mentais que, relacionados, segundo as doutrinas, à <afetividade>, ao <juízo>, à <conduta>, são todos eles distúrbios específicos da síntese psíquica.” “sem uma concepção suficiente do jogo dessa síntese, a psicose permanecerá sempre como um enigma: o que sucessivamente foi expresso pelas palavras loucura, vesânia, paranóia, delírio parcial, discordância, esquizofrenia. Essa síntese, nós a denominamos personalidade, e tentamos definir objetivamente os fenômenos que lhe são próprios”

Com efeito, historicamente, os conflitos das doutrinas, cotidianamente, as dificuldades da perícia médico-legal, nos demonstram a que ambigüidades e a que contradições remete toda concepção desta psicose [a paranóica] que pretende prescindir de uma definição explícita dos fenômenos da personalidade.”

Se dedicamos algum cuidado a essa exposição, não foi apenas por um interesse de documentação cuja importância para os pesquisadores, no entanto, conhecemos, mas porque aí se revelam progressos clínicos incontestáveis.”

I. POSIÇÃO TEÓRICA E DOGMÁTICA DO PROBLEMA

I.1. FORMAÇÃO HISTÓRICA DO GRUPO DAS PSICOSES PARANÓICAS

Três escolas, em primeiro plano, trabalharam, não sem se influenciar, para o isolamento do grupo: a francesa, a alemã, a italiana.”

O termo paranóia foi conceituado cientificamente pela primeira vez pela escola alemã (Cramer, 15/12/1893). Já o “termo, já empregado pelos gregos, foi utilizado por Heinroth, em 1818, em seu Lehrbuch des Störungen des Seelenslebens, inspirado nas doutrinas kantianas.”

Kraepelin e Bouman de Utrecht (…) evocam o tempo em que 70 a 80% dos casos de asilo eram catalogados como paranóia. Tal extensão se devia às influências de Westphal e Cramer. A paranóia era então a palavra que, em psiquiatria, tinha a significação mais vasta e mais mal-definida; era também a noção mais inadequada à clínica. Com Westphal, ela se torna quase sinônimo, não só de delírio, mas de distúrbio intelectual. E isso tinha sérias conseqüências numa época em que se estava prestes a admitir delírios larvares ou <em dissolução> (zerfallen) como causas de todas as espécies de estados singularmente diferentes de um distúrbio intelectual primitivo. Kraepelin zomba desses diagnósticos de <velhos paranóicos>, atribuídos a casos correspondentes à demência precoce, a estados de estupor confusional, etc.” “as paranóias agudas, às quais Kraepelin recusa qualquer existência autônoma”

Os paranóicos são anacronismos vivos . . . O atavismo se revela ainda mais claramente na paranóia do que na imoralidade constitucional porque as idéias mudam de uma maneira mais precisa e mais visível do que os sentimentos

Riva, E. nosog. della paranoïa

ENANTIODROMIA? “Quanto ao delírio [sintoma sine qua non da paranóia], ele se elabora segundo <duas direções opostas que freqüentemente se combinam entre si> (Kraep.). São o <delírio de prejuízo em seu sentido mais geral e o delírio de grandeza>. Sob a primeira denominação se agrupam o delírio de perseguição, de ciúme e de hipocondria. Sob a segunda, os delírios dos inventores, dos interpretadores filiais, dos místicos, dos erotômanos. A ligação é estreita entre todas essas manifestações; o polimorfismo, freqüente, a associação bipolar de um grupo ao outro, comum.”

O delírio é, em regra, sistematizado. Ele é elaborado intelectualmente, coerente numa unidade, sem grosseiras contradições internas. É uma verdadeira caricatura egocêntrica de sua situação nas engrenagens da vida que o doente compõe para si, numa espécie de <visão-de-mundo>.”

I.2. CRÍTICA DA PERSONALIDADE PSICOLÓGICA

O dado clínico da evolução sem demência, o caráter contingente dos fatores orgânicos (reduzidos, de resto, a distúrbios funcionais) que podem acompanhar a psicose, a dificuldade teórica, enfim, de explicar suas particularidades (o delírio parcial) pela alteração de um mecanismo simples, intelectual ou afetivo – tais elementos, e outros ainda mais positivos, fazem com que a opinião comum dos psiquiatras, como sabemos, atribua a gênese da doença a um distúrbio evolutivo da personalidade.”

A psicologia científica se esforçou no sentido de precisar por completo a noção de personalidade, removendo-a de suas origens metafísicas, mas, como acontece em casos análogos, acabou por desembocar em definições bastante divergentes.”

a) A PERSONALIDADE SEGUNDO A CRENÇA COMUM

a personalidade é a garantia que assegura, acima das variações afetivas, as constâncias sentimentais; acima das mudanças de situação, a realização das promessas. É o fundamento de nossa responsabilidade.”

b) ANÁLISE INTROSPECTIVA DA PERSONALIDADE

Na verdade, a introspecção disciplinada só nos fornece perspectivas muito decepcionantes.” Boa.

Após algumas dessas crises, nós não nos sentimos mais responsáveis por nossos desejos antigos, nem por nossos projetos passados, nem por nossos sonhos, nem mesmo por nossos atos.” Parece que em cem anos conseguiram arruinar completamente com o conceito de “tese de doutorado”… Nada que hoje se leia parece vir de um sujeito, apenas linhas robóticas.

c) ANÁLISE OBJETIVA DA PERSONALIDADE

A personalidade, que se perde misteriosa na noite da primeira idade, afirma-se na infância segundo um modo de desejos, de necessidades, de crenças, que lhe é próprio e como tal foi estudado. Ela borbulha nos sonhos e esperanças desmedidas da adolescência, em sua fermentação intelectual,¹ em sua necessidade de absorção total do mundo sob os modos do gozar, do dominar e do compreender; ela se estende, no homem maduro, em uma aplicação de seus talentos ao real, um ajustamento imposto aos esforços, em uma adaptação eficaz ao objeto, ela pode se concluir em seu mais alto grau na criação do objeto e no dom de si mesmo. No velho, finalmente, na medida em que até aí ela soube se liberar das estruturas primitivas, ela se exprime numa segurança serena, que domina a involução afetiva.”

¹ Ver a clara ebulição destes sintomas no diário adolescente do autor desta “autobiografia prematura”: https://clubedeautores.com.br/livro/as-teorias-supremas.

Moisés escreveu o Pentateuco, pensamos, porque, se assim não o fizesse, todos os nossos hábitos religiosos deveriam ser mudados.”

William James

O “nós” implicado no itálico seria somente os hebreus contemporâneos de Moisés, ou literalmente a humanidade de todos os tempos? Seu ato foi criar uma moral redentora que não havia ainda? Ou cristalizar uma que havia mas que inelutavelmente seria perdida numa espécie de pressentimento de mais um dilúvio, sendo sua palavra escrita capaz de retardar ao máximo ou evitar essa hecatombe moral (congelamento zen-budista ou egípcio do modo de ser humano)? Questionamento absurdo.

d) DEFINIÇÃO OBJETIVA DOS FENÔMENOS DA PERSONALIDADE

(…)

e) POSIÇÃO DE NOSSA DEFINIÇÃO COM RELAÇÃO ÀS ESCOLAS DA PSICOLOGIA CIENTÍFICA

(…)

f) DEFINIÇÃO DA PSICOGENIA EM PSICOPATOLOGIA

Ninguém atualmente duvida mais, efetivamente, da organicidade do psíquico, nem sonha fazer da alma uma causa eficaz.”

Contra o “inatismo” da doença ou derivação de “trauma físico”: “o evento causal só é determinante em função da história vivida do sujeito, de sua concepção sobre si mesmo e de sua situação vital com relação à sociedade; o sintoma reflete em sua forma um evento ou um estado da história psíquica, exprime os conteúdos possíveis da imaginação, do desejo ou da vontade do sujeito, possui um valor demonstrativo que visa uma outra pessoa; o tratamento pode depender de uma modificação da situação vital, quer nos próprios fatos, na reação afetiva do sujeito com relação a eles ou na representação objetiva que deles possui.” Tornar o problema consciente é o mais fácil: convencer-nos a sentir outra coisa diante do que sabemos ou promover uma mudança existencial seriam, respectivamente, da menos para a mais difícil das tarefas, as missões realmente problemáticas. “Modificação da situação vital” pode querer dizer: de forma nenhuma esse emprego! Mas somos tão passivos na questão, o mais das vezes, quanto quando torcemos pelo nosso time do coração…

No que concerne à perícia, que é o critério prático da ciência do psiquiatra, é sobre essas bases que se fundamentam, mais ou menos implicitamente, as avaliações de responsabilidade, tais como a lei as exige de nós.” Para o não-psicanalista, só seria possível uma prova negativa: não se trata de loucura traumática nem congênita, logo pode ser (ou pode não ser!) que o paciente seja psicótico! Sua biografia teria de ser avaliada, mas a carga moral excele nesse tipo de análise de medicina forense funesta. Só um verdadeiro analista poderia tentar c[r]avar mais fundo e chegar a uma intuição melhorada da coisa… Impraticável que o Estado aponsentasse o servidor no limbo entre a psicose (supostamente intratável fora de Lacan) e a “simples” neurose… O mais prático e conveniente seria exonerá-lo do cargo. Meu próprio caso é uma ilustração salutar: se, no futuro, eu me encontrar nessa situação, o que diz, por exemplo, o “complexo” laudo do meu eletroencefalograma detalhado? Que eu tenho um cérebro perfeitamente saudável, mas que ignora-se por que raios eu tenho uma calosidade ou espécie de coágulo idêntico ao do epiléptico – sem o ser! Ao ponto de o médico, com certeza um pobre coitado sem culpa de sua ignorância, mas sem as qualificações exigidas para esta grandiosa tarefa (este é o fato nu e cru), me perguntar levianamente se eu sofri alguma forte pancada na cabeça durante minha fase de crescimento! Em síntese, toda a magna ciência “desses caras” não passa de especulação da mais comezinha… Que diferença faz o episódio causador da “bolha de sangue seco” numa região cerebral que não afeta minhas faculdades intelectivas, se eles sequer sabem o motivo de eu não apresentar qualquer sintoma de epilepsia em decorrência dessa mesma “bolha”? Uma adolescência terrível seria simplesmente o chute mais plausível. E para tê-lo concluído bastou a mim, o sujeito que viveu meu enredo, sem seis ou sete anos de estudos em medicina.

g) FECUNDIDADE DAS PESQUISAS PSICOGÊNICAS

Ler o livro de um dos pais da Físico-química, Wilhelm Ostwald, sobre os maiores físicos e químicos do século XIX (Les Grands Hommes [Energetische Grundlagen der Kulturwissenschaft]). A introdução do ponto de vista energético nas leis da criação intelectual é aí muito sugestiva.”

h) VALOR PROBLEMÁTICO DOS SISTEMAS CARACTEROLÓGICOS E DA DOUTRINA CONSTITUCIONALISTA

Mas quando Kretschmer chega a formar o quadro dos diversos tipos de personalidade, encontramos nele, sob o mesmo modo de reações sintéticas, temperamentos de natureza muito diversa: assim, subjacentes à personalidade estênica [resiliente, elástica, flexível, até eufórica ou hiperativa a depender do contexto], existem temperamentos ciclotimo-hipomaníacos [Ver abaixo. Para mim, a rigor, a diferença entre ciclotimo-hipomaníaco e depressivo ciclotímico é zero, mudando apenas o momento do ciclo em que o sujeito se encontra. Não importa onde você está agora na montanha-russa, contanto que saibamos que, como todos os outros passageiros, você vai completar uma – ou umas – volta(s) e descer outra vez… Ou, enfim, numa metáfora mais literal, que nunca vai realmente descer, mas vai passar infinitas vezes pelos mesmos pontos, quer queira, quer não…], por um lado, e também esquizotimo-fanáticos [delirantes originais]: quanto à personalidade astênica [fatigada, extenuada; numa palavra: preguiçosos¹], encontramos esquizóides agudamente hiperestênicos e depressivos ciclotímicos.” No fundo, passividade é resistência, derrota é estratégia; ação é rigidez, síndrome de Pirro… Tudo é permitido. Todo mundo é cão e se vira nesse mundo de manés, malandros e cães, amarrados com cordames e lingüiças…

¹ Brincadeirinha… Parece que o termo psicastenia, mais usado na primeira metade do século XX, deriva realmente da neurastenia lida em autores do século XIX (lassidão nervosa lassidão psíquica); a astenia tem a ver com certa lassidão inata do indivíduo: em situações estressantes, ele tende mais à passividade que o não-astênico (ou estênico), chega à irritabilidade (falência emocional) mais facilmente e quando não mais suporta a hiperexcitação cai num quadro depressivo. Da mesma fontea que usei para entender esta droga de parágrafo (mais sintomático da dificuldade de Lacan com a escrita que a conduta de Rousseau de uma suposta paranóiab), segue (alto interesse pessoal nos grifos desta cor!):

a https://www.psiquiatriageral.com.br/psicopatologia/06personalidade.htm
b Lacan diz meia-dúzia de vezes neste livro que Rousseau ERA SEM SOMBRA DE DÚVIDA UM PARANÓICO, das quais devo ter transcrito pelo menos 3. Gostariamos de ver uma monografia sobre o assunto, tão detalhada quanto a de Aimmée!

Personalidade explosiva – Caracteriza-se por exagerada excitabilidade emocional, tendendo à irritabilidade e predisposição a reações motoras correspondentes a essa excitabilidade. Motivos mínimos são capazes de desencadear crises de cólera, durante as quais o indivíduo perde o domínio de si próprio. Segue-se um estado de mau humor. Também se denominam estes casos de <tipos epileptóides>.” Bastante esclarecedor, ou pelo menos intrigante, para quem leu minhas anotações mais acima

Personalidade ciclóide – Distinguem-se duas variedades: a hipomaníaca [mania leve, tendência eufórica] e a pessimista-angustiosa. No primeiro grupo vemos os indivíduos eufóricos, expansivos, comunicativos, simpáticos, sintonizando facilmente com qualquer ambiente.i [Ambos] fazem facilmente amigos, são tolerantes e conciliantes no que diz respeito à moral. Há tanta facilidade para rir como para chorar, correspondendo a alternações de excitação e depressão.ii

i Nojo!

ii Gon Freecs, é você?

O pessimista-angustioso também revela inquietação. Tristes presságios povoam seu pensamento. São indivíduos fatalistas, céticos e de exagerada crítica, tendentes ao rancor.”

Personalidade esquizóide – Caracterizam o interesse pelo que é raro e original, a tendência a fugir do meio habitual para melhor viver no mundo interior de suas próprias idéias, sonhos e desejos.”

No entanto, esse vocabulário é inútil, uma vez que das 10 personalidades listadas, possuo compatibilidade com várias, ao mesmo tempo em que sou avesso a várias (às vezes simultaneamente), e praticamente me vejo excluído apenas daquelas apontadas como “mais freqüentes em mulheres”. Também posso listar um vasto número de pessoas que se enquadrariam sem esforço em quase todas. Ou seja, trata-se de cultura inútil! Como a própria página, aliás, indica, humildemente: Acumulação de defeitos da personalidade – Não é fácil encontrar, na vida prática, os tipos puros de personalidades psicopáticas como foram descritas. O que se verifica habitualmente é a acumulação de defeitos de personalidade no mesmo indivíduo.”

* * *

O mesmo do acima expresso em outras palavras, mostrando a diferença entre psicopático ou tipo psicopata e psicótico, o doente por excelência: “As constituições psicopáticas, hereditárias ou não, são inatas . . . As constituições são apenas variações, por excesso ou por falta, das disposições normais” Delmas

i) PERSONALIDADE E CONSTITUIÇÃO

A constituição [o legado teórico que Lacan utiliza mas que pretende superar nesta monografia], com efeito, pode traduzir apenas uma fragilidade orgânica em relação a uma causa patogênica externa à personalidade, i.e., em relação a certo processo psíquico, para empregar o conceito geral elaborado por Jaspers” “Os problemas da relação da psicose com a personalidade e com a constituição não se confundem.”

I.3. CONCEPÇÕES DA PSICOSE PARANÓICA COMO DESENVOLVIMENTO DE UMA PERSONALIDADE

a) AS PSICOSES PARANÓICAS AFETAM TODA A PERSONALIDADE

Não é para nos surpreender o fato de que o doente conserve todas as suas capacidades de operação, que ele se defronte, por exemplo, com uma questão formal de matemática, de direito ou de ética. Aqui, os aparelhos de percepção, no sentido mais geral, não estão de modo algum expostos aos estragos de uma lesão orgânica. O distúrbio é de outra natureza”

b) AS PSICOSES NÃO HERDAM APENAS TENDÊNCIAS DA PERSONALIDADE; ELAS SÃO O SEU DESENVOLVIMENTO, LIGADO À SUA HISTÓRIA. – DE KRAFFT-EBBING A KRAEPELIN.

Lembremos que se encontra em Magnan o inicio da distinção entre a paranóia, desenvolvimento de uma personalidade (delírio dos degenerados) e a parafrenia, afecção progressiva (delírio crônico).”

YIN FILHO DE YANG

Desde há muito o ser íntimo, toda a evolução do caráter do candidato à paranóia, se terão revelado anormais; além disso, não se pode negar que, freqüentemente, a anomalia específica da orientação do caráter é determinante para a forma especial que mais tarde assumirá a Verrücktheit primária, embora esta equivalha a uma <hipertrofia do caráter anormal>. Assim, vemos, por exemplo, um indivíduo anteriormente desconfiado, fechado, amante da solidão, um dia se imaginar perseguido; um homem brutal, egoísta, dotado de opiniões falsas sobre seus direitos, vir a dar num querelante; um excêntrico religioso cair na paranóia mística.” Krafft-Ebing

Kraepelin critica, primeiramente, a teoria, muito vaga, dos <germes mórbidos>, em que Gaupp e também Mercklin instituem o início do delírio na personalidade, e que, em suma, vem a dar na teoria de Krafft-Ebbing.”

a conformidade (antes e durante o delírio) do colorido pessoal das reações hostis ou benevolentes com relação ao mundo externo, a concordância da desconfiança do sujeito com o sentimento de sua própria insuficiência, e também aquela de sua aspiração ambiciosa e apaixonada pela notoriedade, pela riqueza e pela potência com a superestimação desmedida que tem de si mesmo” Kraepelin

E ele lembra o fato (já assinalado por Specht) da sua freqüência nas situações sociais eminentemente favoráveis a tais conflitos, como a do professor, por exemplo.”

O que, de resto, distingue a reação do paranóico das de tantos outros psicopatas atingidos pela mesma insuficiência é sua <resistência>, <seu combate apaixonado contra os rigores da vida, em que ele reconhece influências hostis>. É dessa luta que se origina o reforço do amor próprio. Vê-se, conclui Kraepelin, <que o delírio forma aqui uma parte constituída da personalidade> (Bestandteil des Personlichkeit.)”

A exuberância da juventude, toda voltada para as grandes ações e para as experiências intensas, reflui pouco a pouco diante das resistências da vida, ou então é canalizada por uma vontade consciente de seu fim em vias ordenadas. As desilusões e os obstáculos levam ao amargor, às lutas apaixonadas ou então à renúncia que encontra seu refúgio em miúdas atividades de amador e em planos consoladores para o futuro. Mas pouco a pouco decresce a força de tensão; o pensamento e a vontade se embotam no círculo estreito da vida cotidiana, e, de tempos em tempos, apenas revivem na lembrança as esperanças e as derrotas do passado.” O paraíso do escritor-professor misantropo.

Para Kraepelin, o delírio de grandeza é então essencialmente <a trama perseguida, na idade madura, dos planos de alto vôo do tempo da juventude>.”

<recusar o juízo de outrem ou se esquivar em esperanças de futuro, que nenhum insucesso pode dissolver>. São essas as duas vias em que se engaja o pensamento delirante.” Dois gumes da mesma lâmina.

3 ESTÁGIOS DE GÊNESE DA DOENÇA: “Na juventude, a psicose, <oriunda de devaneios complacentes>, distinguir-se-ia <por seu colorido romântico, pela predominância das ilusões da memória e de um delírio de inventor>. Surgido na idade madura e ligado a idéias de perseguição, o delírio parecerá, antes de mais nada, uma medida de defesa contra as influências contrariantes da vida e se distinguirá essencialmente por uma superestimação desmedida das próprias capacidades do sujeito. Sobrevindo mais tarde [senilidade], com ou sem idéias de perseguição, o delírio se aproximará da primeira forma por seu aspecto de delírio de compensação.” Não faz sentido: a compensação perfeita é o próprio narcisismo hiperbólico!

é no sonho de aventura e onipotência da juventude, nas construções irrealizáveis da criança curiosa pelas maravilhas da técnica, que o delírio vai encontrar seu modelo.” “persiste uma certa ambigüidade entre a noção de um desenvolvimento mediante <causas internas> e a de reação às <causas exteriores>.”

c) NA PSICOGENIA DAS PSICOSES PARANÓICAS, A ESCOLA FRANCESA SE PRENDE À DETERMINAÇÃO DOS FATORES CONSTITUCIONAIS. SÉRIEUX & CAPGRAS. [PRINCIPAIS DISCÍPULOS DE MAGNAN, ESCREVIAM A 4 MÃOS] DIFICULDADES DE UMA DETERMINAÇÃO UNÍVOCA. DE PIERRE JANET A GÉNIL-PERRIN.

Sérieux & Capgras não aceitam as tentativas de autores como Griesinger, Dagonet, Féré, Specht, Nacke, para diferenciar, em seu mecanismo, a interpretação mórbida da normal. A interpretação só é mórbida em virtude da orientação e da freqüência que lhe impõe a ideologia de base afetiva, própria não só do delírio, mas do caráter anterior do sujeito. Idéias de perseguição e de grandeza são diversamente combinadas em intensidade e em sucessão, mas segundo uma ordem fixa para cada enfermo. <O plano do edifício não muda, mas suas proporções aumentam>, pois o delírio progride <por acumulação, por irradiação, por extensão>, <sua riqueza é inesgotável>.

O delirante alucinado, dizem, experimenta uma mudança que o inquieta; primeiro, ele rechaça os pensamentos que o assediam; ele tem consciência da discordância destes com sua mentalidade anterior; mostra-se indeciso. Só chega à certeza, à sistematização, no dia em que a idéia delirante se tornou sensação.”

O primeiro período do delírio crônico, período interpretativo, surgiu-nos como uma manifestação da desordem mental provocada por uma brusca ruptura entre o passado e o presente, pelas modificações da atividade mental e pelos <sentimentos de incompletude que daí resultam> (Pierre Janet). O doente, ao buscar uma explicação para esse estado de mal-estar, forja interpretações que não o satisfazem, etc. Nada de semelhante ocorre no delírio de interpretação propriamente dito, cuja origem se perde ao longe.”

No delírio de reivindicação [subtipo do de interpretação] eles dão destaque, entre outros mecanismos, ao da <idéia fixa que se impõe ao espírito de maneira obsedante, orienta sozinha toda a atividade . . . e a exalta em razão dos obstáculos encontrados>. É o próprio mecanismo da paixão.”

Em 1898, Janet observa o aparecimento de delírios de perseguição, que ele denomina paranóia rudimentar, nos mesmos sujeitos que apresentam a síndrome a que deu o nome expressivo de <obsessão dos escrupulosos>. Os modos de invasão desse delírio, seus mecanismos psicológicos, o fundo mental sobre o qual se desenvolve, mostram-se idênticos ao fundo mental e aos acidentes evolutivos da psicastenia. Notemos que, em suas observações, Janet ressalta que o delírio surge como uma reação a certos acontecimentos traumatizantes. Quanto às predisposições constitucionais, são aquelas do psicastênico: o sentimento de insuficiência de sua própria pessoa, a necessidade de apoio, a baixa da tensão psicológica [?], aí estão traços bem diferentes da constituição paranóica, tal como deveria ser ulteriormente fixada.”

Assim como um pé aleijado cresce harmoniosamente em relação ao germe no qual preexistia, do mesmo modo os erros do interpretante crescem assim como devem crescer num cérebro que os implica todos potencialmente desde sua origem. Na verdade, não existe aqui princípio nem fim.” Dromard

A noção de bovarismo foi definida originalmente por Jules de Gaultier como <o poder concedido ao homem de se conceber como aquilo que não é>.”

d) NA PSICOGENIA DAS PSICOSES PARANÓICAS, A ESCOLA ALEMÃ SE PRENDE À DETERMINAÇÃO DOS FATORES REACIONAIS. BLEULER. PROGRESSO DESTA DETERMINAÇÃO. DE GAUPP A KRETSCHMER E A KEHRER.

O caráter invasivo comparável ao câncer e a incurabilidade do delírio são determinados pela persistência do conflito entre o desejo e a realidade.” Bleuler

Desde 1905, Friedmann chama atenção para um certo número de casos, que ele designa como um subgrupo da paranóia de Kraepelin. Nesses casos, o delírio aparece claramente como uma reação a um acontecimento vivido determinado e a evolução é relativamente favorável. Ele os denomina paranóia benigna e indica três traços de caráter, próprios a tais sujeitos: eles são <sensíveis, tenazes, exaltados>.”

Em 1909, Gaupp dá o nome de <paranóia abortiva> a delírios de perseguição que, nos melhores casos, podem ser curados; e a descrição magistral que nos dá a respeito mostra-nos a evolução de um delírio paranóico num terreno tipicamente psicastênico. <Trata-se, escreve, de homens instruídos, numa idade entre 25 e 45 anos, que sempre se mostraram com humor benevolente, modesto, pouco seguros de si, antes ansiosos, muito conscienciosos, escrupulosos até, em suma, aparecendo em toda sua maneira de ser semelhantes aos doentes que sofrem de obsessões. Naturezas ponderadas, voltadas para a critica de si mesmo, sem nenhuma superestimação de si, sem humor combativo. Neles se instala de maneira inteiramente insidiosa, sobre a base de uma associação específica mórbida e, na maioria dos casos, num vínculo temporal mais ou menos estreito com um acontecimento vivido de forte carga afetiva,¹ um sentimento de inquietação ansiosa com idéia de perseguição; com isto existe uma certa consciência da enfermidade psíquica; eles se queixam de sintomas psicastênicos. Esses seres, de natureza moralmente delicada, indagam primeiro se seus inimigos de fato não têm razão de pensarem mal a seu respeito, mesmo que não tenham dado lugar, por sua conduta, a uma crítica maliciosa ou a uma perseguição policial, senão judicial. Mas não aparece nenhum estado melancólico, nenhum delírio de auto-acusação; ao contrário, surgem idéias de perseguição com uma significação sempre mais precisa, bem-fundamentadas logicamente e coerentes, que se orientam contra pessoas ou corpos profissionais determinados (a polícia, etc.). O delírio de relação não se estende a todo o meio ambiente; desse modo, por exemplo, o próprio médico nunca será incluído na formação delirante, no decurso de uma estada de vários meses na clínica; ao contrário, o doente sente certa necessidade do médico, porque a segurança de que nenhum perigo o ameaça e de que, na clínica, ajuda e proteção lhe são garantidas, por vezes age sobre ele de maneira apaziguadora. Uma conversa séria com o médico pode aliviá-lo por algum tempo, mas certamente não de maneira duradoura. Às vezes, fazem algumas concessões e admitem que se trata de uma desconfiança patológica, de uma particular associação mórbida [João & Pablo]; mas novas percepções no sentido do delírio de interpretação trazem, então, precisamente um novo material ao sistema de perseguição. Com o progresso da afecção ansiosa, desconfiada, que evolui segundo grandes oscilações, as idéias de perseguição se tornam mais precisas e ocasionais ilusões sensoriais reforçam o sentimento de sua realidade. [Eu vi, eu ouvi, eu senti, clara, issa! como a luz do dia! Mas chega de graça, pois divago e devaneio, taíscutando? Nãominimize minha capacidade de autossuperação! Passei muito tempo irreconhecível: de heleno, me tornei num jururu! Um inseto marinado em ódio, impotência e rancor… Grande alívio que tudo isso findou!] Em momentos mais calmos, mostra-se uma certa lucidez sobre as idéias de perseguição anteriores: <Por conseguinte, eu evidentemente imaginei isso>; desse modo, a enfermidade continua durante anos, ora em remissão, ora exacerbando-se [COCHICHE NA MINHA FRENTE, SUA IMBECIL DESAFORADA! – desabafo diacrônico]; sempre persiste o fundo de humor de pusilanimidade ansiosa e o doente é dominado por esta reflexão: <Em que eu mereci essas marcas de hostilidade?> É apenas de maneira passageira que ele chega a se revoltar contra essa tortura eterna, ou até a se defender contra a agressão delirante. Jamais arrogância, nem orgulho, jamais idéias de grandeza, elaboração inteiramente lógica das idéias mórbidas de relação, nenhum traço de debilidade, uma conduta inteiramente natural. Os enfermos, que chegam livremente na clínica e a deixam de acordo com sua vontade, possuem até o fim a maior confiança no médico, gostando de voltar a consultá-lo quando, na prática de sua profissão, se sentem novamente perseguidos e importunados. Chegam então com a seguinte pergunta: <Será que isso realmente não passa de imaginação?> Com muita freqüência, não se constata uma progressão clara da afecção, embora nem sempre seja assim. Num caso observado, as associações mórbidas típicas existem há 12 anos, embora nenhum sistema delirante rígido se tenha constituído; trata-se bem antes de idéias de perseguição que variam em força; com isso, o doente é capaz de atuar na profissão em que está empregado. Em períodos relativamente bons, sempre se faz valer uma semiconsciência da enfermidade; a idéia prevalente não domina o sujeito inteiramente como ocorre no delírio de reivindicação. [síntese: eu sou mais controlado e lúcido que o meu pai; eu gestiono as idéias, não o contrário.] Em todos os casos, a disposição depressiva escrupulosa existia desde sempre; assim sendo, trata-se de um quadro delirante caracterogênico que, de certa maneira, é simétrico [eu e JJ, espelhos paralelos] ao quadro delirante caracterogênico colorido de mania de tantos querelantes.>”

¹ CONVIDADO A SE RETIRAR: A EXPULSÃO QUE NÃO É UMA EXPULSÃO, CLARO, SÓ PARA INGLÊS VER! CIRCUITO DA IPSEIDADE: T. EDSON OF JUDAS DE AGUIARHELEN[JUICEofjuízo][EN]A_PAPA_CEARIBADEVOLTÀORIGEM SAUL,[OpecadoR]DENTEBASDAVIFILHOFRITOFRAC.ASSADO ADOCONVIDADO.INESPERADOzzzSONECANABILIOTECASEMINARIO.PADRE.CAPESPESCAPEI.PEIXOTO.PEIXEFISGADO.BARBAZUL.LEUQAR.SEUSPRÓPRIOSPROBLEMAS.PROFESSORCONFESSOR.MAMAMARINADÓLEOGRAXO.ÁCIDO.ASSÍDUO.DERREPENTESÓQUERDORMIR.ALERGICO.FECHEOBLOGDEVIDOAMUDANÇASNAPOLÍTICAINSTITUCIONAL.QUEBRAQUEIXOMU.DANÇA.DINHEIRROTEIRO.RO-TEI-RO.POLIGLOTAGIOTAUTODIDATA.OPERSEGUIDOTEMDESEROPRIMEIRONACORRIDADÁDIVIDA.ROLLING.INCAPAZDEPAZ.DARDO.EU.JUD.EU.SELENCIOSILÊNIOVOZALTATROVÃORIENTACAOÀSVESSAS.MIQUEIXOMEQUEIXO.MAX.ILAR.TIRITA.DESCONFORME.CONFIRMEALGUÉMCONFIRMEQUEUSOUAQUILOQUEUPENSOQUEUSOU.NAOVÁN’ADOSOUTROS.POBLA.CIÓNDEMIERDAS.US.UNDER.THE.PILE.LASTLAP,LARS.TREADINGPUNCH.WHO’R’THEY THE DAY THEY KNEW… DIFUZZ.RETOMANDOFIODAMEADA:EX-PULSO.INTEGRANTE DA ORIENTAÇÃO²coordenação todos os seus esforços anteriores foram v ã o s nesta janela fechada que n a d a representa. andando em círculos circulando pelo andaime escada fechada escura claustrofóbica claudicante suor de sangue.

SÓ METENDO A BROCA PARA APROFUNDAR O SUBSOLO

ENQUANTO A ÁRVORE DA VIDA RELUZ LÁ NO ALTO, NÃO QUE NÃO ESTEJA DALGUM MODO ABORTADA.

PORQUE CRESCEU DEMAIS. SIMBÓLIRÔNICO,NÃO?!

QUE É QUE PODE RE VE LAR

GALHOPODRE200320102017stilldigginginthisstillsea

estilingue_do_tempo it lingers it really lingers…

JUDICIALIZAÇÃO DO SEU CU GORDO QUE JÁ CAGOU CAGARÁ NETINHOS

(isso não é poesia, é só é só terapia.)

o delírio retorna a um estado de acalmia, quando a ocasião é liquidada ou seus efeitos compensados. Qualquer outro acontecimento vital ulterior poderá então desencadear a doença de maneira análoga.” Kraepelin

O paranóico não sara, ele se desarma.”

Ver a distinção entre temperamento e caráter em Ewald, Temperament und Charakter, Berlln, 1924.”

A representação do acontecimento e o estado afetivo desagradável que está ligado a ela tendem a se reproduzir indefinidamente na consciência. Assim sendo, esse modo reacional da repressão é completamente oposto ao do recalcamento que, na histeria, por exemplo, repele a <lembrança> penosa para o inconsciente.”

REAÇÃO BANAL > REPRESENTAÇÃO OBSEDANTE > HIPER-SENSIBILIDADE > NEUROSE OBSESSIVA

Do blasé ao perfeito poeta? Do you still read me?! Do you steal my stuff behind my back?

A representação consciente do trauma inicial transforma-se em representações parasitárias (Fremdkörperbildung), que lhe foram associadas, mas que não têm com ela mais nenhum elo significativo.” É ou não é meu caso, no caso? Espero que era, que essa era tenha passado… pro passado.

Pode-se constatar nos sensitivos [X obsessivos¹] uma curiosa mistura de tendências estênicas (intensidade dos sentimentos interiorizados) e astênicas (dificuldade de exteriorização, falha de condução, retenção e repressão) (…) superestimação dos fracassos² (…) É essa tensão que constitui o fator psicológico determinante nos delirantes sensitivos; estes são, em suma, completamente subjugados pelas tensões sociais e éticas, onde havíamos visto um componente essencial da personalidade.”

¹ Se essa permuta é válida não fica muito claro (em Kretschmer, de qualquer modo).

² A descrição do fenômeno não dá conta: não é possível ser um narcisista convencido e um fracassado ultimado ao mesmo tempo! Se só um passarinho pode escapar, um precisa ficar… Goleiro mão-de-gaoiola.

O melhor tratamento na juventude (~20 anos) seria: “Mãe, pelo menos o seu filho é um irresponsável!” Infelizmente comigo fizeram o inverso, retroalimentando o mal!

Fonte: vozes da minha cabeça?! Vozes antigas de desafetos reavivadas…

Por conseguinte, o sensitivo se distingue do expansivo¹ pela inferioridade considerável de sua força psíquica e pelo conflito interior resultante do fato de suas predileções éticasPoderia até fingir ser outra pessoa, mas isso vai contra meus valores mais arraigados. O tipo expansivo: Pa******, a antecessora no PG** da CA***, a vulgarmente conhecida como: grossa. O que para ela seria um sincericídio (sempre um suicídio moral com muitas testemunhas, espetaculoso) para mim é justamente preservação da minha integridade diante do espelho. O outro não me importa (mediatamente) – tant pis… Provavelmente a dita-cuja poderia alegar a mesma coisa (invertida). (P.S.: Soube a referida foi indiciada em comissão de ética por ser expansiva demais em e-mails institucionais… Cof cof… Pode até gostar de trabalho – o problema é quando gosta tanto que até dá trabalho pros outros…)

– Gostou de cima?

– Como assim? Eu nunca subi ali.

– De semancol, que eu mandei você tomar.

A PERSONALIDADE SENSITIVA DE KRETSCHMER EM POUCAS PALAVRAS: “uma extraordinária impressionabilidade, uma sensibilidade extremamente acessível e vulnerável, mas, por outro lado, certa dose consciente de ambição e de tenacidade. Os representantes acabados desse tipo são personalidades complicadas, muito inteligentes, dotados de um alto valor, homens de fina e profunda sensibilidade, de uma ética escrupulosa e cuja vida sentimental é de uma delicadeza excessiva e de um ardor todo interiorizado; são vítimas predestinadas de todas as durezas da vida. Encerram profundamente neles próprios a constância e a tensão de seus sentimentos. Possuem capacidade refinada de introspecção e de autocrítica. São muito suscetíveis e obstinados, mas, com isso, particularmente capazes de amor e de confiança. Têm por eles próprios uma justa auto-estima e, no entanto, são tímidos e muito inseguros quando se trata de se mostrar, voltados para si e no entanto abertos e filantropos, modestos mas de uma vontade ambiciosa, possuindo, de resto, altas virtudes sociais”

lutas internas tão inúteis quanto secretas”

O EM VÃO!

Depois da (auto)crítica vem o desespero, depois do desespero a nova crítica e resolução firme, e ad

A interação do caráter e da experiência representa, no delírio de relação sensitivo, a causa essencial da doença.”

A situação mais típica do sensitivo que adoece em seu meio social é a do <contexto social e espiritual, tão ambíguo, do professor primário, fértil em pretensões e que, no entanto, não recebe nenhuma consagração, colocado num plano superior e todavia mal-assegurado por uma formação espiritual [material?] incompleta.>

O ELO DURKHEIMIANO: “Quando esses 3 fatores psicológicos [de dentro para fora, nesta ordem: a personalidade inata; o <evento-catástrofe> ou uma série episódica de contradições temperamento-êxitos&fracassos, enfim, o TRAUMA; o meio social mais geral] acarretaram uma repressão mórbida, então o fator biológico do esgotamento concorre essencialmente para o desencadeamento da doença, assim como, inversamente, o estado de fadiga neurastênica pode facilitar, em primeiro plano, o aparecimento de repressão nos caracteres sensitivos.”

A experiência decisiva com a situação vital que a subtende é simplesmente tudo. Se a suprimíssemos, a doença ficaria reduzida a nada. Ela forma, por sua repetição na obsessão, o objeto sempre novo dos remorsos depressivos, dos temores hipocondríacos . . .”

O SÍTIO E O VAGABUNDO (pais e irmão)

Toda semana a mesma coisa… toda semana esse ciclo trágico… isso nunca vai acabar… isso de novo… outra vez…” “Reclamo, mas eles fingem que não me escutam ou logo se esquecem e tudo acontece como da primeira vez…” “Essas memórias continuam voltando e eu fico preso a elas por vários dias, até me recuperar e parar de sentir a dor nas costas…” “Minha vó que morreu… Ela se compadeceria por mim? Quem se compadece por mim? Isso é algum tipo de vingança dos meus ancestrais, uma maldição muito anterior a minha existência? É culpa minha?!? Por que eu não sei lidar melhor com essa MERDA?! Por que eu sou assim?! Que derrota…” “E se eu só for piorando cada vez mais e for um incapacitado minha vida inteira?” “Me jogo ou não me jogo? E se eu não morrer? Tenho coragem? Meu ‘amigo’ me falou que é só se jogar de cabeça, não tem erro, e eu não vou sentir nada, eu vou apagar antes de chegar ao chão… Por que não? Por que me sujeitar a ver e sentir todo esse ciclo se repetindo de novo e de novo e me sentir impotente sempre e sempre?… Qual o sentido nisso tudo? Eu gostaria de chamar a atenção pra minha existência da única forma que me é possível, depois de tudo que tentei… que é deixando de existir…”

O livro que me “salvou”: Vontade de Potência.

* * *

MELHOROU MAS NEM TANTO: “todas as idéias de prejuízo e de inquisição pela família e pelos colegas, pelo público e pelos jornais, todas as angústias de perseguição provocadas pela polícia e pela justiça, provêm desse acontecimento inicial e a ele retornam.”

a intensidade afetiva dos paroxismos, a ausência ordinária de reações agressivas, seu caráter apenas defensivo nos casos puros, a ênfase hipocondríaca do quadro, a amargura sentida em relação à própria inutilidade, o esforço no sentido do restabelecimento e a confiança do apelo ao médico.”

RESIGNA-TE!

Se deus (pai) morrer para mim, eu me torno uma espécie de Jason, conforme a literatura (o que me faz ser útil à sociedade e ter meu valor, ser um neurastênico, é que eu sofro continuamente sentindo o parasitismo causal dessa relação sem-saída). Um psicopata apagaria esse indesejável para-além do inconsciente e, astênico, dormente, insensível, maquínico, dissolvido, solto até mesmo do social, se realizaria, porém se perdendo, desvinculado de qualquer valor futuro… É esse altruísmo-no-egoísmo do herói que nos redime “no fim”…

Ver como eu cheguei a essa conclusão após ser um niilista conceitual virtualmente completo e agora que me entendo eticamente é uma verdadeira epopéia realizada, teatro grego in loco e na carne, mas já finalizado… Milagroso, enfim. Hic salta.

Muitos sóis sob o céu em seu ofuscante vermelho alaranjado róseo amarelado ainda quero assistir ou pressentir ou sentir, com a luz penetra assentir, menear, condescender às sombras do Hades apenas para depois me REDimir, em pele nova e calejada, ainda rosácea, mas mais de réptil, como se fosse possível continuar sofrendo e estar-agora-anestesiado tudo ao mesmo tempo e em evolução única, singular, astral, austral, hiperbórea, meridional, crítica, sub-tropical, na linha do Equador de toda a rotundidade desta vida neste planetinha neste seculozinho miserável e ingrato e que no entanto nos enche de graça e contentamento sabe-se lá pelo quê exatamente, mas sei que há algo… Tem de haver. Tende a haver. Não importa, há.

As psicoses leves não vêm às mãos do médico de asilo, mas do médico de consultório. Assistidas por ele em tempo oportuno, elas devem desaparecer completamente, deixar uma correção completa do delírio.

Algumas formas, como o delírio dos masturbadores [???], parece que, mesmo após manifestações graves, podem ser completamente curadas.”

O início da evolução é muito mais nítido do que deixa perceber a noção de insidiosidade sobre a qual insistem as descrições clássicas de Kraepelin e Gaupp.”

A evolução, assim, nada tem de esquemático: curas rápidas, reações agudas, evolução prolongada por muitos anos com cura relativa, evolução recidivante desencadeada em ocasiões absolutamente determinadas, ou oscilações durante anos na fronteira entre a eclosão delirante e sua base neurótica.”

a evolução típica não apresenta fenômenos de despersonalização.”

Eis por que Kretschmer não fica, de modo algum, embaraçado, em suas considerações doutrinais, por só ter descrito um tipo particular de psicose paranóica. Ele efetivamente nada mais quis demonstrar, diz-nos, senão que, <quanto mais sensitivo é um caráter, tanto mais especificamente ele reagirá, no caso, a um complexo de culpa mediante um delírio de relação de estrutura sutil>.”

Não existe a paranóia, mas apenas paranóicos.”

I.4. CONCEPÇÕES DA PSICOSE PARANÓICA COMO DETERMINADA POR UM PROCESSO ORGÂNICO

Um delírio, com efeito, não é um objeto da mesma natureza que uma lesão física, que um ponto doloroso ou um distúrbio motor. Ele traduz um distúrbio eletivo das condutas mais elevadas do doente: de suas atitudes mentais, de seus juízos, de seu comportamento social. Além do mais o delírio não exprime este distúrbio diretamente; ele o significa num simbolismo social. Este simbolismo não é unívoco e deve ser interpretado.”

o doente, para exprimir a convicção delirante, sintoma de seu distúrbio, pode se servir apenas da linguagem comum, que não é feita para a análise das nuanças mórbidas, mas somente para o uso das relações humanas normais.”

A concepção subjacente que ele tem de si mesmo transforma o valor do sintoma: uma convicção orgulhosa, se estiver fundada numa hiperestenia afetiva primitiva, não tem o mesmo valor que uma defesa contra a idéia fixa de um fracasso ou de uma falta”

a evolução para a atenuação, a adaptação, mesmo a cura da psicose, fatos, em suma, reconhecidos por todos os autores, virão corrigir a primeira noção da irredutibilidade do delírio.”

Existem, certamente, fatores orgânicos da psicose. Devemos precisá-los tanto quanto possível. Se nos dizem que se trata de fatores constitucionais, admitiremos de boa vontade, contanto que isto não seja pretexto para uma satisfação meramente verbal” “Este processo é menos grave ou menos aparente do que aqueles que devem ser reconhecidos na psicose maníaco-depressiva, na esquizofrenia ou nas psicoses de origem tóxica. Ele é da mesma natureza. Em todas essas psicoses, o laboratório revelou alterações humorais ou neurológicas, funcionais senão lesionais, que, por ficarem insuficientemente asseguradas, não permitem menos que se afirme a prevalência do determinismo orgânico do distúrbio mental. Ainda que tais dados faltem nas psicoses paranóicas, seu andamento clínico pode nos fazer admitir sua identidade de natureza com as psicoses orgânicas. Esta é a tese de vários autores que se opõem aos partidários da psicogênese.” “Quando se trata de precisar quais são estes distúrbios característicos, as respostas diferem de autor para autor. Contudo, o estado atual da psiquiatria pode explicar a incerteza destas respostas, e não permite afastar a hipótese que lhes é comum, a de um determinismo não-psicogênico.”

TAXONOMIA BÁSICA E RELAÇÕES DE ORIGEM (“ORGANOGÊNESE”) DESSA CORRENTE:

distúrbios do humor, mais ou menos larvares, da psicose maníaco-depressiva;

– dissociação mental, mais ou menos frustra, dos estados paranóides e da esquizofrenia;

– determinismo, mais ou menos revelável, do delírio por estados tóxicos ou infecciosos.”

Estas pesquisas gravitaram na França em torno da concepção do automatismo psicológico; elas resultaram na Alemanha na formação de um conceito analítico: o de processo, que foi especialmente criado pelas pesquisas sobre as psicoses paranóicas. Estes dois conceitos, o de automatismo e o de processo, definem-se por sua oposição às reações da personalidade. Acreditamos portanto que as pesquisas psicogênicas conservam todo seu valor.”

a) RELAÇÕES CLÍNICAS E PATOGÊNICAS DA PSICOSE PARANÓICA COM OS DISTÚRBIOS DO HUMOR DA PSICOSE MANÍACO-DEPRESSIVA.

A relação das variações de humor, maníaco e melancólico, com as idéias delirantes é uma questão que nunca deixou de estar na ordem do dia das discussões psiquiátricas. Foi certamente um progresso capital da nosografia quando Lasègue isolou seu delírio das perseguições das lipemanias, com as quais Esquirol as confundia. Contudo, basta evocar o esforço de análise que teve que ser feito em seguida para discriminar os perseguidos melancólicos dos verdadeiros perseguidos para ver o quanto aparecem intrincadas variações depressivas do humor e idéias delirantes.”

A exaltação maníaca faz parte do quadro clássico dos perseguidos perseguidores. Os autores modernos: Köppen, Sérieux e Capgras, que se fundamentam numa nosografia precisa do delírio de reivindicação, reconhecem aí um dos traços essenciais da síndrome.”

Taguet insiste nas formas intermitentes do delírio, que aparecem nos estados de superexcitação periódica da inteligência, da sensibilidade e da vontade. Estes fatos, por volta de 1900, estavam na ordem do dia e eram objeto de discussões apaixonadas. Estas eram provocadas pela confiança por demais absoluta que certos autores davam ao progresso clínico representado pelo isolamento da noção de delírio sistematizado na França, da Verrücktheit ou da paranóia primária na Alemanha.” Para Kraepelin, este termo de paranóia periódica é uma contradictio in adjecto, e ele não hesita nessa época em tachar de <candura> aqueles que o usam.”

a alteração maníaca do humor, a logorréia [verbosidade], a grafomania [hábito ou compulsão da escrita, coerente ou não], a inquietude, a impulsão de agir, a ideorréia [fertilidade mental], a distração: características da mania.”

Por certo acreditamos que é preciso abster-se de confundir a variação ciclotímica com os estados afetivos secundários às idéias delirantes. Ou, melhor dizendo, acreditamos ser preciso distinguir, com Bleuler, o distúrbio global do humor, depressivo ou hiperestênico, ou variação afetiva holotímica – e os estados afetivos ligados a certos complexos representativos, que representam uma situação vital determinada, ou variação afetiva catatímica.”

b) RELAÇÕES CLÍNICAS E PATOGÊNICAS [DE ORIGEM ORGÂNICA] DAS PSICOSES PARANÓICAS COM A DISSOCIAÇÃO MENTAL DAS PSICOSES PARANÓIDES E DA ESQUIZOFRENIA, CONFORME OS AUTORES.

Não há dúvida de que existem fatos freqüentes em que um surto fugaz de sintomas esquizofrênicos precedeu em alguns anos o surgimento de uma psicose paranóica que se estabelece e dura.” “Enfim, a saída de uma psicose paranóica típica, evoluindo para uma dissociação mental manifesta de tipo paranóide, não é nada incomum.”

Kahn, na Alemanha, apresenta fatos que demonstram <que muitos paranóicos legítimos atravessam em um período precoce um processo esquizofrênico e que eles conservam disso um ligeiro déficit a partir do qual a paranóia se instala>.”

Bleuler e os fatores psicogênicos da paranóia:

1. “uma afetividade com forte ação de circuito, que se distingue além disso pela estabilidade de suas reações”

2. “uma certa desproporção entre a afetividade e o entendimento.”

// “mecanismo paratímico larvar”

Bl. admite ainda a permutabilidade, em certas instâncias, entre processos esquizo e paranóicos.

Por outro lado, temos razões para admitir que na esquizofrenia existe sempre um processo anatômico, mas não nas paranóias.” B.

c) RELAÇÕES CLÍNICAS E PATOGÊNICAS DA PSICOSE PARANÓICA COM AS PSICOSES DE INTOXICAÇÃO E DE AUTO-INTOXICAÇÃO. – PAPEL DO ONIRISMO E DOS ESTADOS ONIRÓIDES. – RELAÇÃO ENTRE OS ESTADOS PASSIONAIS E OS ESTADOS DE EMBRIAGUEZ PSÍQUICA. – PAPEL DOS DISTÚRBIOS FISIOLÓGICOS DA EMOÇÃO.

Encontramos incessantemente, na pena dos autores, o voto de que um estudo melhor das seqüelas delirantes, que persistem depois dos delírios agudos, dos estados confusionais, dos estados de embriaguez delirante e de diversos tipos de onirismo, venha nos dar novos esclarecimentos sobre o mecanismo dos delírios.

O estudo do alcoolismo nos trouxe fatos fortemente sugestivos de idéias fixas pós-oníricas, de delírios sistematizados pós-oníricos, de delírios sistematizados de sonho a sonho, de delírios com eclipses (Legrain).”

Desde então, a questão que se coloca é a de saber se os estados de auto-intoxicação, tais como podem ser realizados pelos distúrbios digestivos diversos, a estafa, etc., não podem desempenhar um papel essencial nas psicoses.”

O desequilíbrio parassimpático, particularmente, parece desempenhar um papel determinante no surgimento dos estados de embriaguez atípicos e dos estados sub-agudos alcoólicos.”

os estudos estatísticos de Drenkhahn (1909), onde se vê, após as medidas proibitivas tomadas contra o alcoolismo no exército alemão, a proporção dos distúrbios catalogados como neuróticos e psicóticos se elevar numa proporção estritamente compensatória da diminuição dos distúrbios ditos alcoólicos.”

James, para quem a crença comporta um elemento afetivo essencial, salientou o fato de que certos estados de embriaguez parecem determinar experimentalmente o sentimento da crença.”

Tentou-se atribuir, nas nossas psicoses, um papel todo particular à intoxicação pelo café, tão freqüentemente observada, com efeito, em certos sujeitos, mulheres próximas à menopausa, nas quais explode um delírio paranóico. Mesmo aí não se poderia falar de uma determinação exclusiva pelo tóxico.” Heuyer & Borel, Accidents subaigus du caféisme, 1922.

De resto, esses determinismos humorais, ainda que fossem mais claramente confirmados nos fatos, deixariam intacto o problema da estrutura psicológica complexa dos delírios paranóicos, que é o problema a que nos dedicamos.”

d) ANÁLISES FRANCESAS DO “AUTOMATISMO PSICOLÓGICO” NA GÊNESE DAS PSICOSES PARANÓICAS. – RECURSO À CENESTESIA POR HESNARD & GUIRAUD. – AUTOMATISMO MENTAL, DE MIGNARD & PETIT. – SIGNIFICAÇÃO DOS “SENTIMENTOS INTELECTUAIS” DE JANET. – A NOÇÃO DE ESTRUTURA EM PSICOPATOLOGIA, SEGUNDO MINKOWSKI.

O único vínculo teórico comum a essas pesquisas é a noção muito flexível de automatismo psicológico, que não tem nada em comum, senão a homonímia, com os fenômenos de automatismo neurológico. Graças à complexidade dos sentidos do termo automatismo, ele convém perfeitamente a uma série de fenômenos psicológicos que, como bem o mostrou nosso amigo H. Ey, são de ordem extremamente diversa.”

Quando a ordem da causalidade psicogênica, tal como a definimos mais acima, é modificada pela intrusão de um fenômeno de causalidade orgânica, diz-se que há um fenômeno de automatismo. Este é o único ponto de vista que resolve a ambigüidade fundamental do termo automático, permitindo compreender ao mesmo tempo seu sentido de fortuito e de neutro que se entende com relação à causalidade psicogênica, e seu sentido de determinado que se entende com relação à causalidade orgânica.”

CENESTESIA. Por este termo, compreende-se o conjunto das sensações proprioceptivas e enteroceptivas: tais como sensações viscerais, sensações musculares e articulares, mas somente enquanto elas permanecem vagas e indistintas e, propriamente falando, enquanto, como isto se passa em estado de saúde, ficam no estado de sensações puras, sem chegarem à percepção consciente.” “Ela forma a peça-mestra de uma doutrina geral da gênese dos distúrbios mentais, engenhosamente construída por Hesnard.”

Janet apresenta amplos conhecimentos sobre o mecanismo da ilusão da memória, fenômeno que depende, e no mais alto grau, das insuficiências de adaptação ao real; mas ele não ataca, para si mesmo, o fenômeno tão delicado da interpretação. Contudo sua análise impõe, quanto a esse tema, sugestões preciosas. E é muito mais concebível que a interpretação mórbida, bem diferente do mecanismo normal da indução errônea ou da lógica passional, possa depender de um distúrbio primitivo das atividades complexas, distúrbio que a personalidade imputa naturalmente a uma ação de natureza social.

Qualquer que seja a expressão intelectual que lhes imponham as necessidades da linguagem, para o doente como para o observador, é preciso conceber os sentimentos intelectuais como estados afetivos, quase inefáveis, de que o delírio representa apenas a explicação secundária, freqüentemente forjada pelo doente após uma perplexidade prolongada.”

Se o autor se recusa, com efeito, a concluir prematuramente por qualquer alteração de um sistema de neurônios especializado, cuja existência permanece cientificamente mítica, é, no entanto, a uma concepção biológica destes distúrbios que ele adere.” “A causalidade biológica desses fatos é bem acentuada pela influência de condições como as doenças, a fadiga, as emoções, as substâncias excitantes, a mudança de meio, o movimento, o esforço, a atenção, que agem não como fatores psicogênicos, mas como fatores orgânicos. § Esses sentimentos intelectuais, normalmente afetados pela regulação das ações (sentimento de esforço, de fadiga, de fracasso ou de triunfo), parecem também traduzir, com freqüência, de forma direta, uma modificação orgânica. Eles tenderão, contudo, nos dois casos, a surgir para o sujeito como condicionados pelos valores socialmente ligados ao sucesso dos atos pessoais (estima de si, auto-acusação) e uma conclusão delirante, correspondente a essas ilusões, aparecerá.” “um controle preciso desses dados poderia ser trazido pelo estudo psicológico atento dos fenômenos subjetivos da psicose maníaco­depressiva.”

A necessidade do familiar exige um trabalho de reclassificação, de reorganização. Essa reorganização se faz em torno de alguns fatos, tomados freqüentemente ao acaso, e que desempenharão o papel de cristais de poeira numa mistura em alta fusão. A cristalização será aliás pouco estável no princípio: somente mais tarde ela chegará a um sistema coerente, a expressões verbais fixas.” Meyerson & Quercy

UnB 2009: mictório FD antes da aula de TPM: o que sou eu, o que estou fazendo aqui, essa rotina apresenta algum sentido? doravante: petrificação da noção de que “ele” é o culpado por tudo. “Você é um lixo; fracassado… eu no seu lugar… VOCÊS… quem é ‘vocês’?”

[subsidiariamente (não em minha opinião, de qualquer forma),] depois, a tentativa, bem-sucedida ou não, de redução do distúrbio pelas funções conceituais, mais ou menos organizadas, da personalidade.” Vencer na vida, mesmo aos olhos cínicos, hipócritas e inconfessáveis do LIXO. Queimar qualquer centelha nesse intuito. Êxito.

Os autores são induzidos a tal concepção pelos fatos que trazem com o nome de interpretações frustradas, e que são interpretações em que faltam certos elementos da interpretação completamente desenvolvida.

Esse é o caso do doente no qual, após um período alucinatório, o delírio de perseguição se reduziu pouco a pouco a puras interpretações. Acontece um dia que uma vizinha, ocupada em podar uma cerca, solta estas palavras: <Tudo isso é selvagem.> O doente fica transtornado. No entanto, ele não pode afirmar que essas palavras o visavam. <Isso lhe pareceu engraçado.> Isso continua a lhe parecer engraçado. Ele está certo que a vizinha não pode lhe querer mal. A anamnese do doente, que merece ser lida nos pormenores, traduz ao mesmo tempo sua boa vontade (a ausência certa de reticência [não seria presença?]) e sua impotência para explicar aquilo que lhe aconteceu.

Esse doente está nesse momento perfeitamente orientado e conserva as reações intelectuais e mnêmicas na média normal.

Estamos aí na presença de uma atitude mental que se caracteriza por um estado afetivo quase puro, e em que a elaboração intelectual se reduz à percepção de uma significação pessoal impossível de precisar.

Tal redução do sintoma se apresenta como um fato de demonstração notável, mas, para que toda elaboração conceitual faltasse, parece ser necessário estarmos diante de um caso em que a reação de defesa psicológica seja má [ruim], e a observação nos indica com efeito que o caso se agrava ulteriormente e apresenta um quadro que se revela esquizofrênico.”

Quando todos os olhares são acusadores, pontiagudos, hostis, nos tornamos uma verdadeira lixa por todos os lados, e, assim como não sabemos o que fazer com essas pessoas, elas também não fazem idéia do que fazer conosco. Fica elas por elas. Cada um com seus problemas genealógicos e bons ou maus pais.

Segundo a definição de Husserl, que é seu iniciador, a fenomenologia é <a descrição do domínio neutro do vivido e das essências que aí se apresentam>. Nós não podemos dar aqui mesmo uma idéia do método de que se trata. Digamos somente que Minkowski, que parece não ignorar essas pesquisas, transforma profundamente, como costuma fazer, seu método e seu espírito.”

ENTÃO A FENOMENOLOGIA HUSSERLIANA É UMA “IDÉIA PLATÔNICA”, NO SENTIDO MAIS PEJORATIVO DO TERMO, NA PIOR COMPREENSÃO POSSÍVEL DA FILOSOFIA DE PLATÃO: “Para compreender um delírio de ciúme, por exemplo, é preciso evitar de imputar à doente, ciumenta de uma outra mulher, uma construção dedutiva ou indutiva mais ou menos racional, mas compreender que sua estrutura mental a força a se identificar com sua rival, quando ela a evoca, e a sentir que ela é substituída por esta. Em outros termos, as estereotipias mentais são consideradas nesta teoria como mecanismos de compensação, não de ordem afetiva, mas de ordem fenomenológica. Inúmeros casos clínicos foram assim interpretados por Minkowski.”

conteúdo e forma só poderão ser dissociados arbitrariamente na medida em que o papel do trauma vital nas psicoses for resolvido.” Referência ao élan vital de Minkowski.

e) ANÁLISES ALEMÃS DA ERLEBNIS PARANÓICA. – A NOÇÃO DE PROCESSO PSÍQUICO, DE JASPERS. – O DELÍRIO DE PERSEGUIÇÃO É SEMPRE ENGENDRADO POR UM PROCESSO, PARA WESTERTERP.

Inúmeros acontecimentos, que sobrevêm ao alcance dos doentes e chamam sua atenção, despertam neles sentimentos desagradáveis pouco compreensíveis. Esse fato os preocupa bastante e os aborrece. Algumas vezes tudo lhes parece tão forte, as conversas ressoam com veemência demasiada em seus ouvidos, algumas vezes mesmo qualquer barulho, um acontecimento ínfimo, é suficiente para irritá-los. Eles têm sempre a impressão de que são eles que são visados nisso. Acabam por ser completamente persuadidos disso. Observam que falam mal a seu respeito, que é precisamente a eles que prejudicam. Colocadas sob forma de juízo, essas experiências engendram o delírio de relação.” Jaspers

Ele nota o sobrevir episódico de fenômenos pseudo-alucinatórios. <Todos esses distúrbios não alcançam contudo um verdadeiro estado de psicose aguda. Os doentes orientados, ponderados, acessíveis freqüentemente até aptos ao trabalho, têm todo o lazer e o zelo necessário para elaborar, para explicar suas experiências, um sistema bem-organizado e idéias delirantes numerosas, explicativas, nas quais eles próprios não reconhecem freqüentemente mais que um caráter hipotético. Quando tais experiências se dissiparam após um tempo bastante longo [três anos, p.ex.?], não se encontra mais que os conteúdos delirantes de juízos petrificados; a experiência paranóica particular desapareceu.>”

reivindicante com tom depressivo”

Jaspers distingue ainda modificações intermediárias na reação¹ e no processo.² São aquelas que, embora sendo determinadas de modo puramente biológico e sem relação com os acontecimentos vividos pelo doente, são entretanto restauráveis e deixam intacta a personalidade: tais são os acessos, as fases, e os períodos, cujos exemplos podem ser encontrados em várias doenças mentais.”

¹ “Os episódios agudos não ocasionam nenhum transtorno duradouro. O statu quo ante se restabelece.”

² “Os episódios agudos têm por conseqüência um transtorno não-restaurável.”; “Enxerto parasitário único comparável ao progresso de um tumor.” Nascimento de uma segunda personalidade.

A organização psíquica é totalmente destruída nos processos orgânicos grosseiros: as lesões evolutivas do cérebro, na verdade, provocam distúrbios mentais que têm apenas a aparência de uma verdadeira psicose. A observação nos mostra, de fato, que a cada instante de sua evolução intervêm alterações psíquicas sempre novas, heterogêneas entre elas, sem liame estrutural comum.”

Quatro casos de delírio de ciúme, agrupados 2 a 2, ilustram de modo notável esta oposição da psicose que se apresenta como um desenvolvimento [reversível]¹ àquela que aparece como um processo.”

¹ Classificação jasperiana. Não se concorda com ele hoje: a psicose é um processo incurável. Mas, como veremos, o próprio Lacan tinha muita fé no seu oposto!

O delírio de ciúme (logo seguido de idéias de perseguição) manifesta-se num lapso de tempo relativamente curto, sem limites nítidos, mas que não ultrapassa cerca de um ano.”

idéia delirante de ser observado (<falam baixo e zombam do sujeito>) (…) sintomas somáticos interpretados (<vertigem? cefaléia? distúrbios intestinais?>).”

Ressalva: precisaríamos de um estudo sobre o advento de paranóias e manias persecutórias em tempos de derrocada da democracia…

não se encontra nenhuma adjunção de novas idéias delirantes, mas o sujeito guarda seu delírio antigo, não o esquece; ele considera seu conteúdo como a chave de seu destino e traduz sua convicção por atos. (…) O sujeito não é reticente.

Essas personalidades apresentam um complexo de sintomas que podemos aproximar da hipomania: consciência de si nunca enfraquecida, irritabilidade, tendência para a cólera e o pessimismo, disposições que, à menor ocasião, se transformam em seu contrário: atividade incessante, alegria de empreender.”

[No caso de predisposição caracterológica, sem desencadeamento de processo psíquico no delirante ciumento] persiste apenas a tendência a novas explosões durante ocasiões apropriadas. Aqui, não há idéias de perseguição, nem de envenenamento; por outro lado, forte tendência à dissimulação.”

O doente percebe que <alguma coisa nos acontecimentos tem a ver com ele sem que compreenda o que é>.” Westerterp

Westerterp evidencia aqui minuciosamente as armadilhas a que a tendência a querer tudo compreender leva o observador; ele descobre, com muita sutileza, nos casos em que foi exercida a penetração psicológica por demais hábil de pesquisadores anteriores, os defeitos da armadura dessas explicações psicogênicas demasiado satisfatórias. Os levantamentos sobre o caráter anterior também devem ser submetidos a uma crítica minuciosa.”

Sempre teremos de tratar depressões e neuroses a nossa própria maneira. Uma solução mágica infalível, digo, uma solução científico-empírica infalível de 50 anos atrás já pode ser sabotada pelo inconsciente do doente médio, posto que tal solução se tornou lugar-comum na literatura e a depressão ou neurose, como um vírus ou bactéria, já se aperfeiçoou a fim de promover sua disseminação. A teoria da couraça ou de imunidade protetiva a novos episódios depressores infelizmente é – mas apenas porque tornou-seincorreta.

4. após um curto lapso de tempo sem atribuírem qualquer causa aos sintomas que sentem tão nitidamente, os doentes encontram uma explicação que os satisfaz mais ou menos, na idéia delirante de serem perseguidos por uma certa categoria de homens por causa de uma ação precisa;

5. então, uma forte desconfiança vem cada vez mais em primeiro plano;

6. o delírio, nascido assim secundariamente, permanece alimentado pela continuação das manifestações do processo, mas tira também de si mesmo interpretações compreensíveis, como toda idéia prevalente;

7. não existe nenhuma alucinação.

II. O CASO “AIMÉE” OU A PARANÓIA DE AUTOPUNIÇÃO

Acreditamos que, em vez de ser obrigatório publicar o conjunto de nosso material de modo forçosamente resumido, é, ao contrário, pelo estudo, tão integral quanto possível, do caso que nos pareceu mais significativo que poderemos dar o máximo de alcance intrínseco e persuasivo a nossos pontos de vista.”

II.1 EXAME CLÍNICO DO CASO “AIMÉE”

Distúrbios mentais que evoluem há mais de um ano; as pessoas com as quais ela cruza na rua dirigem-lhe insultos grosseiros, acusam-na de vícios extraordinários, mesmo se essas pessoas não a conhecem; as pessoas de seu meio falam mal dela o mais que podem e toda a cidade de Melun está a par de sua conduta, considerada como depravada; ela também quis deixar a cidade, mesmo sem dinheiro, para ir a qualquer lugar.”

O delírio que apresentou a doente Aimée revela a gama quase completa dos temas paranóicos. Temas de perseguição e temas de grandeza nele se combinam estreitamente. Os primeiros se exprimem em idéias de ciúme, de dano, em interpretações delirantes típicas. Não há idéias hipocondríacas, nem idéias de envenenamento. Quanto aos temas de grandeza, eles se traduzem em sonhos de evasão para uma vida melhor, em intuições vagas de ter que realizar uma grande missão social, em idealismo reformista, enfim, numa erotomania sistematizada sobre uma personagem da realeza.”

Aimée colabora ardentemente na confecção do enxoval da criança esperada por todos. Em março de 192.. ela dá à luz uma criança do sexo feminino, natimorta. O diagnóstico é asfixia por circular de cordão. Segue-se uma grande confusão na doente. Ela atribui a desgraça a seus inimigos; de repente parece concentrar toda a responsabilidade disso numa mulher que durante 3 anos foi sua melhor amiga. Trabalhando numa cidade afastada, esta mulher telefonou pouco depois do parto para saber das novas. Isto pareceu estranho a Aimée; a cristalização hostil parece datar de então.”

Uma segunda gravidez acarreta a volta de um estado depressivo, de uma ansiedade, de interpretações análogas. Uma criança nasceu a termo em julho do ano seguinte (a doente está cem 30 anos).” “Durante a amamentação, ela se torna cada vez mais interpretante, hostil a todos, briguenta. Todos ameaçam seu filho. Ela provoca um incidente com motoristas que teriam passado perto demais do carrinho do bebê. Causa diversos escândalos com os vizinhos. Ela quer levar o caso à justiça.”

A seu favor, ela invoca o fato de querer ir aos Estados Unidos em busca do sucesso: será romancista. Ela confessa que teria abandonado seu filho.”

eu interrogo as minhas companheiras, algumas das quais são loucas e outras tão lúcidas quanto eu, e quando eu tiver [sic] saído daqui, eu me proponho a morrer de rir por causa do que me acontece, pois acabo me divertindo realmente por ser sempre uma eterna vítima, uma eterna desconhecida, Santa Virgem, que história a minha! o senhor a conhece, todo mundo a conhece mais ou menos, a tal ponto falam mal de mim”

guardava uma profunda inquietude: Quais eram os inimigos misteriosos que pareciam persegui-la? Ela não devia realizar um grandioso destino? Para procurar a resposta destas perguntas é que ela quis sair de sua casa, ir para a cidade grande.”

Um dia, diz ela, como eu trabalhava no escritório, enquanto procurava, como sempre, em mim mesma, de onde podiam vir essas ameaças contra meu filho, escutei meus colegas falarem da Sra. Z. Compreendi então que era ela quem nos queria mal.” “Uma vez, no escritório de E., eu tinha falado mal dela. Todos concordavam em considerá-la de boa família, distinta . . . Eu protestei dizendo que era uma puta. É por isso que ela devia me querer mal.”

A mais exaustiva pesquisa social não pôde nos revelar que ela tivesse falado a alguém a respeito da Sra. Z. Apenas uma de suas colegas nos relata vagas menções contra o <pessoal de teatro>.”

Um dia (ela precisa o ano e o mês), a doente lê no jornal Le Journal que seu filho ia ser morto <porque sua mãe era caluniadora>, era <vil> e que se <vingariam dela>. Isto estava claramente escrito. Havia, além disso, uma fotografia que reproduzia a empena de sua casa natal na Dordonha, onde seu filho passava férias naquele momento, e ele, de fato, aparecia num canto da foto. Uma outra vez, a doente fica sabendo que a atriz vem representar num teatro bem próximo de sua casa; ela fica transtornada. para zombar de mim.>”

Como certos personagens dos mitos primitivos se revelam como substitutos de um tipo heróico, assim aparecem atrás da atriz outras perseguidoras, cujo protótipo último, como veremos, não é ela mesma. São Sarah Bernhardt, estigmatizada nos escritos de Aimée, a Sra. C., essa romancista contra a qual quis abrir processo num jornal comunista. Vemos, a partir daí, o valor, mais representativo que pessoal, da perseguidora que a doente reconheceu. Ela é o tipo da mulher célebre, adulada pelo público, bem-sucedida, vivendo no luxo. E se a doente faz em seus escritos o processo vigoroso de tais vidas, dos artifícios e da corrupção que ela lhes imputa, é preciso sublinhar a ambivalência de sua atitude; pois ela também, como veremos, desejaria ser uma romancista, levar uma grande vida, ter uma influência sobre o mundo.”

<Pensei que a Sra. Z. não podia estar só para me fazer tanto mal impunemente, era preciso que ela fosse apoiada por alguém importante.> Leitora assídua de novos romances e seguindo avidamente o sucesso dos autores, a doente achava, com efeito, imenso o poder da celebridade literária.”

Todas essas personagens, artistas, poetas, jornalistas, são odiados coletivamente como grandes provocadores dos infortúnios da sociedade. <Trata-se de uma ralé, uma raça>; <eles não hesitam em provocar por suas bazófias o assassinato, a guerra, a corrupção dos costumes, para conseguir um pouco de glória e prazer.>”

À medida que nos aproximamos da data fatal, um tema se precisa, o de uma erotomania que tem por objeto o príncipe de Gales.” “Ela disse ao médico perito que, um pouco antes do atentado, havia em Paris grandes cartazes que informavam ao Sr. P.B. que, se ele continuasse, seria punido. Ela tem portanto protetores poderosos, mas parece que os conhece mal. Com respeito ao príncipe de Gales, a relação delirante é bem mais precisa. Temos um caderno seu onde ela anota cada dia, com data e hora, uma pequena efusão poética e apaixonada que dirige a ele.”

O quarto de hotel em que morava estava recoberto de retratos do príncipe; ela juntava igualmente os recortes de jornal relativos a seus movimentos e sua vida. Não parece que ela tenha tentado aproximar-se dele na ocasião de uma estada do príncipe em Paris, a não ser por um impulso metafórico (poemas). Por outro lado, parece que ela lhe remeteu pelo correio, por várias vezes, seus poemas (um soneto por semana), memoriais, cartas, uma das quais quando da viagem do príncipe à América do Sul, instando que desconfiasse dos embustes do Sr. de W. (já anteriormente mencionado), diretor da Imprensa Latina, que <dá a palavra de ordem aos revolucionários, pelos jornais, com as palavras em itálico>. Mas, detalhe significativo, até o fim ela não assina suas cartas.

Encontramo-nos, observemos, diante do próprio tipo da erotomania, segundo a descrição dos clássicos, retomada por Dide. O traço maior do platonismo ali se mostra com toda a nitidez desejável.

Assim constituído, e apesar dos surtos ansiosos agudos, o delírio, fato a destacar, não se traduziu em nenhuma reação delituosa durante mais de 5 anos. Certamente, nos últimos anos, certos sinais de alerta se produzem. A doente sente a necessidade de <fazer alguma coisa>. Porém, ponto notável, esta necessidade se traduz primeiro pelo sentimento de uma falta para com deveres desconhecidos que ela relaciona com os preceitos de sua missão delirante. Sem dúvida, se ela conseguir publicar seus romances, seus inimigos recuarão assustados.

Assinalamos suas queixas junto às autoridades, seus esforços para fazer com que um jornal comunista aceitasse ataques contra uma de suas inimigas, suas importunações junto ao diretor desse jornal. Estas lhe custam mesmo a visita de um inspetor de polícia, que usou de uma intimidação bastante rude.”

Eu fui ao editor perguntar se podia vê-lo, ele me disse que ele vinha todas as manhãs apanhar sua correspondência, e eu o esperei na porta, apresentei-me e ele me propôs dar uma volta de carro pelo bosque, o que aceitei; durante este passeio, eu o acusei de falar mal de mim, ele não me respondeu. Por fim, tratou-me de mulher misteriosa, depois de impertinente, e eu não tornei a vê-lo mais.”

Nos últimos 8 meses antes do atentado, a ansiedade está crescendo. Ela sente então cada vez mais a necessidade de uma ação direta. Ela pede a seu senhorio que lhe empreste um revólver e, diante de sua recusa, pelo menos uma bengala <para amedrontar essas pessoas>, quer dizer, aos editores que zombaram dela.

Ela depositava suas últimas esperanças nos romances enviados à livraria G. Daí sua imensa decepção, sua reação violenta quando eles lhe são devolvidos com uma recusa. É lamentável que não a tenham internado então.

Ela se volta ainda para um derradeiro recurso, o príncipe de Gales. Somente nesses últimos meses é que ela lhe envia cartas assinadas. Ao mesmo tempo, envia-lhe seus 2 romances, estenografados, e cobertos com uma encadernação de couro de um luxo comovente. Eles lhe foram devolvidos, acompanhados da seguinte fórmula protocolar:

Buckingham Palace

The Private Secretary is returning the typed manuscripts which Madame A. has been good enough to send, as it is contrary to Their Majesties’ rule to accept presents from those with whom they are not personally acquainted.

April, 193…

Este documento data da véspera do atentado. A doente estava presa, quando ele chegou.”

Desde então, a doente está cada vez mais desvairada. Um mês antes do atentado, ela vai <à fábrica de armas de Saint-Étienne, praça Coquillère> e escolhe um <facão de caça que tinha visto na vitrina, com uma bainha>.”

Que pensará ela de mim se eu não me mostro para defender meu filho? que eu sou uma mãe covarde.”

Uma hora ainda antes deste infeliz acontecimento, eu não sabia ainda onde iria, e se não iria visitar, como de hábito, o meu garotinho.”

Nenhum alívio se segue ao ato. Ela fica agressiva, estênica, exprime seu ódio contra sua vítima. Sustenta integralmente suas asserções delirantes diante do delegado, do diretor da prisão, do médico-perito”

Sr. Doutor – escreve ela ainda num bilhete de tom extremamente correto, no 15º dia de sua reclusão –, gostaria de pedir-lhe para que fizesse retificar o juízo dos jornalistas a meu respeito: chamaram-me de neurastênica, o que pode vir a prejudicar minha futura carreira de mulher de letras e de ciências.”

Oito dias após meu ingresso – escreveu-nos em seguida, na prisão de Saint-Lazare –, escrevi ao gerente de meu hotel para comunicar-lhe que estava muito infeliz porque ninguém quis me escutar nem acreditar no que eu dizia. Escrevi também ao Príncipe de Gales para dizer-lhe que as atrizes e escritores me causavam graves danos.”

Vinte dias depois, escreve a doente, quando todos já estavam deitados, por volta das 7 da noite, comecei a soluçar e a dizer que esta atriz não tinha nada contra mim, que não deveria tê-la assustado; as que estavam ao meu lado ficaram de tal modo surpresas que não queriam acreditar no que eu dizia, e me fizeram repetir: mas ainda ontem você falava mal dela! – e elas ficaram estupefatas com isso. Foram contar à Madre Superiora que, a todo custo, queria me enviar à enfermaria.”

A estatura da doente está acima da média. Esqueleto amplo e bem-constituído. Ossatura torácica bem desenvolvida, acima da média observada nas mulheres de sua classe. Nem gorda nem magra. Crânio regular. As proporções crânio-faciais são harmoniosas e puras. Tipo étnico bastante bonito. Ligeira dissimetria facial, que fica dentro dos limites habitualmente observados. Nenhum sinal de degenerescência. Nem sinais somáticos de insuficiência endócrina.”

Durante vários meses conserva um estado subfebril leve, criptogenético, de 3 ou 4 décimos acima da média matinal e vespertina. Contraiu, pouco antes de seu casamento, uma congestão pulmonar (de origem gripal – 1917) e suspeitou-se de bacilose. Exames radioscópicos e bacteriológicos repetidos deram um resultado negativo. A radiografia nos mostrou uma opacidade hilar à esquerda. Outros exames negativos.”

Dois partos cujas datas anotamos. Uma criança natimorta asfixiada por circular do cordão. Não se constatou anomalia fetal nem placentária. Diversas cáries dentárias por ocasião dos estados de gravidez. A doente tem uma dentadura postiça no maxilar superior.”

Assinalemos, quanto aos antecedentes somáticos, que a vida levada pela doente desde a sua estada em Paris, trabalhando no escritório das 7 às 13h, depois preparando-se para o baccalauréat (vestibular e colação de grau do ensino médio), percorrendo bibliotecas e lendo desmedidamente, caracteriza-se por um surmenage intelectual e físico evidente. Ela se alimentava de maneira muito precária, escassa e insuficiente, para não perder tempo, e em horas irregulares. Durante anos, mas só depois de sua permanência em Paris, bebeu cotidianamente 5 ou 6 xícaras de café preparado por ela mesma e muito forte.”

A família insiste muito quanto à emoção violenta sofrida pela mãe [outra <perseguida> ou <querelante>] durante a gestação de nossa doente: a morte da filha mais velha se deveu, com efeito, a um acidente trágico: ela caiu, na frente de sua mãe, na boca de um forno aceso e rapidamente morreu em decorrência de queimaduras graves.” (Lembra o caso Suzanne Urban.)

Consideram-na em seu serviço como muito trabalhadora, <pau para toda obra>, e atribuem a isso seus distúrbios de humor e de caráter.¹ Dão-lhe uma ocupação que a isola em parte. Uma sondagem junto a seus chefes não revela nenhuma falha profissional até seus últimos dias em liberdade. Muito pelo contrário, na manhã seguinte ao atentado, chega ao escritório sua nomeação para um cargo acima do que ocupava.”

¹ O velho preconceito – se é assim, deviam nos aposentar ou reduzir nossa carga horária sem prejuízo!

o ritmo do relato, fato notável numa doente como esta, não é retardado por nenhuma circunlocução, parêntese, retomada, nem raciocínio formal.”

Diminui o tempo que poderia dedicar a seus trabalhos literários favoritos para executar inúmeros trabalhos de costura com que presenteia o pessoal do serviço. Estes trabalhos são de feitura delicada, de execução cuidadosa, porém de gosto pouco sensato.” HAHAHA!

As anomalias do comportamento são raras; risos solitários aparentemente imotivados, bruscas excursões pelos corredores: estes fenômenos não são freqüentes e só foram observados pelas enfermeiras. Nenhuma variação ciclotímica perceptível.

A doente mantém uma grande reserva habitual de atitude. Por trás desta, tem-se a impressão de que suas incertezas internas não foram de modo algum apaziguadas. Vagos retornos erotomaníacos podem ser pressentidos sob suas efusões literárias, embora se limitem a isso.”

uma vida de Joana d’Arc, as cartas de Ofélia a Hamlet; Quantas coisas eu não escreveria agora se estivesse livre e tivesse livros!”

Agora que os acontecimentos me devolveram à minha modéstia, meus planos mudaram e eles já não podem perturbar em nada a segurança pública. Não me atormentarei mais por causas fictícias, cultivarei não só a calma como a expansão da alma. Cuidarei para que meu filho e minha irmã não se queixem mais de mim por causa do meu excessivo desinteresse.”

Já evocamos ou citamos alguns escritos da doente. Vamos estudar agora as produções propriamente literárias que ela destinava à publicação. Seu interesse de singularidade já justificaria o lugar que lhes atribuímos, se além disso não tivessem um grande valor clínico, e isto sob um duplo ponto de vista. Estes escritos nos informam sobre o estado mental da doente na época de sua composição; mas, sobretudo, permitem que possamos apreender ao vivo certos traços de sua personalidade, de seu caráter, dos complexos afetivos e das imagens mentais que a habitam, e estas observações proporcionarão uma matéria preciosa ao nosso estudo das relações do delírio da doente com sua personalidade.”

De fato, tivemos a felicidade de poder dispor destes dois romances que a doente, após a recusa de vários editores, enviou como último recurso à Côrte Real da Inglaterra (cf. acima). Ambos foram escritos pela doente nos 8 meses que antecederam o atentado, e sabemos em qual relação com o sentimento de sua missão e com o da ameaça iminente contra seu filho.

O primeiro data de agosto-setembro de 193.. e foi escrito, segundo a doente, de um só fôlego. Todo o trabalho não teria ultrapassado mais de 8 dias, se não houvesse sofrido uma interrupção de 3 semanas, cuja causa examinaremos mais adiante; o segundo foi composto em dezembro do mesmo ano, em um mês aproximadamente, <numa atmosfera febril>.

Lembremos desde já que os dois romances nos chegaram em forma de exemplares estenografados,¹ onde não aparece nenhuma particularidade tipográfica. Este traço se confirma nos rascunhos e manuscritos que temos em nosso poder, e se opõe à apresentação habitual dos escritos dos paranóicos interpretantes: maiúsculas iniciais nos substantivos comuns [o alemão é um povo doido mesmo!], sub-linhas [= SUBTRAÇO], palavras destacadas, vários tipos de tinta, todos traços simbólicos das estereotipias mentais.”

¹ Estenografia ou taquigrafia: a técnica aprendida por David Copperfield em seu estágio entre os Commons, parte do ofício de um advogado e também de um escrivão que deve escrever rápido e com precisão os acontecimentos de uma reunião ou depoimentos, sem deixar de incluir todas as informações necessárias. “Os sistemas típicos da taquigrafia fornecem símbolos ou abreviaturas para as palavras e as frases comuns, o que permite que alguém, bem treinado no sistema, escreva tão rapidamente que possa acompanhar as falas de um discurso.” “Marco Túlio Tirão (? – c. 4 a.C.), escravo e secretário de Cícero, é considerado o inventor da taquigrafia que elaborou o sistema Notae tironianae (abreviaturas tironianas).” “[A] Inglaterra é considerada a pátria da taquigrafia moderna. O médico e sacerdote inglês Timothy Bright (cerca de 1551—1615) publicou em 1558 [aos 7 anos de idade? HAHAHA] (sic – 1588) o sistema de taquigrafia Characterie, propiciando o renascimento da taquigrafia.” Método absurdamente ininteligível! “No Brasil o método mais usado no Legislativo e Judiciário brasileiro é o sistema inventado pelo gravador e taquigráfico espanhol Francisco de Paula Martí Mora (1761–1827), porém o método de taquigrafia mais comum é o de Oscar Leite Alves (1902–1974).”

Solicitamos a ajuda de nosso amigo Guillaume de Tarde que, iniciado desde há muito tempo por seu pai, o eminente sociólogo, na anállse grafológica, se diverte com isso nas horas vagas.”

As duas obras têm valor desigual. A segunda traduz, sem dúvida, uma baixa de nível, tanto no encadeamento das imagens quanto na qualidade do pensamento. Entretanto, o traço comum é que ambas apresentam uma grande unidade de tom e que um ritmo interior constante lhes garante uma composição. Nada, com efeito, de preestabelecido em seu plano: a doente ignora aonde será levada quando começa a escrever. Nisto ela segue, sem o saber, o conselho dos mestres (<Nada de plano. Escrever antes de pôr a nu o modelo . . . A página em branco deve sempre ser misteriosa>, P. Louys).”

Consultar nosso artigo, escrito em colaboração com Lévy-Valensi e Migault, Écrits ‘inspirés’. Schizographie. A.M.P. (Annales Médico-Psychologiques), n. 5, 1931.” (breve no Seclusão)

Quanto às circunlocuções da frase: parênteses, incidentes, subordinações intricadas, quanto a essas retomadas, repetições, rodeios da forma sintática, que exprimem nos escritos da maior parte dos paranóicos as estereotipias mentais de ordem mais elevada, é bastante notável constatar sua ausência total não só no primeiro escrito, como também no segundo.” Irônicas observações, vindas logo do rocambolesco Lacan – ou será que não?!? Talvez não houvesse melhor emissor deste ‘elogio velado da loucura’!

Revela-se uma sensibilidade que qualificaremos de essencialmente <bovariana>, referindo-nos diretamente com esta palavra ao tipo da heroína de Flaubert.” “Mas esses desvarios da alma romântica, embora freqüentemente apenas verbais, não são estéreis”

Inúmeras vezes veremos surgir sob sua pena termos de agricultura, de caça e de falcoaria. Esses toques de <regionalismo> são aliás bastante inábeis, mas são o signo de sua ingenuidade; e esse traço pode tocar exatamente aqueles que têm pouquíssimo gosto pelos artifícios de tal literatura. De resto, sente-se nela a presença de uma real cultura telúrica. A doente conhece muito bem seu patoá,¹ a ponto de ler a língua de Mistral.² Se fosse menos autodidata, poderia tirar melhor partido disso.”

¹ Dialeto campesino.

² “Frederic Mistral, also Josèp Estève Frederic Mistral (1830–1914), was an Occitan writer and lexicographer of the Occitan language.a Mistral received the 1904 Nobel Prize in Literature <in recognition of the fresh originality and true inspiration of his poetic production, which faithfully reflects the natural scenery and native spirit of his people, and, in addition, his significant work as a Provençal philologist>.”

a Dialeto românico também chamado lenga d’òc ou langue d’oc (d’où região do Languedoc), falado, entre outras regiões, no sul da França, na Gasconha, em Mônaco, no Piemonte da Itália e em algumas partes da Espanha. Considerado irmão do catalão ou mesmo abrangendo-o de todo, pelo menos nas etiologias mais disseminadas até o final do século XIX. Antigamente já foi sinônimo do Provençal, mas hoje são entidades lingüísticas distintas. Quase uma língua morta, cujos esforços de gramaticalização e conversão para a modalidade escrita esbarram em intensas diferenças de sítio a sítio, tornando uma padronização virtualmente impossível.

Cosmopolitas não falam em patoá.

PREPAREM-SE PARA O SHOW DE HORRORES E CLICHESINSÍPIDOS VERDESCAMPOS! “O título do romance [n. 1] é O Detrator; está dedicado a Sua Alteza Imperial e Real, o Príncipe de Gales.”

Em abril, os animais têm seus segredos, entre os arbustos a erva se agita ao vento, ela é fina, focinhos leitosos a descobrem. Que sorte! O leite será bom esta noite, eu beberei um bocado, diz o cão com a língua de fora. O dia inteiro as crianças brincaram umas com as outras e com os fiçhotes dos aromais, eles se acariciam, eles se amam.”

Quantas fontes você conhece, fontes que você pode esvaziar de um gole, diz o menor ao mais velho que é profeta? Eu! Quantas você quiser! Mas eu não vou mostrá-las a você, você se descalçaria para se banhar. Ah! não profanar minhas fontes. Eu posso levar você à beira do riacho se você prometer sempre responder quando eu chamar. Sempre te responderei, diz o menor, não apenas uma vez, sempre. Seus olhos são fontes vivas; eles são maiores que as tulipas.”

É isto que a fez sorrir? Ela sorri. Ela senta atrás da janela sem lâmpada. Sonha com o noivo desconhecido. Ah! se houvesse um que a amasse, que a esperasse, que desse seus olhos e seus passos para ela!”

Pensamentos ferozes, pensamentos fortes, pensamentos ciumentos, pensamentos suaves, pensamentos alegres todos vão para ele ou vêm dele. Não são mais do que os dois no claro obscuro, seu coração queima como brasa, os planetas em fogo batem asas, a lua joga suas flores purpurinas no quarto. Ela pensa em tudo que a deslumbra, na rocha adamantina da gruta, na coroa imarcescível do pinheiro, ela escuta seu murmúrio, é o prelúdio.”

David descobre seu caminho. Ele veste seguro sua farda de soldado. Esse órfão que vive com os homens manteve toda a sua rudeza. Depois de se encher de água turva, sua mãe tombou no campo num verão quente quando os peixes morrem no leito estreito da torrente. Seus cabelos estão jogados para trás como a cabeleira de uma espiga de centeio, ele é como um magnífico vespão cor de aurora e de crepúsculo. Esse camponês sabe se virar. Ninguém o iguala em arrumar, num piscar de olhos, um campo de pernas para o ar, ele reconhece o foiceiro pela foiçada, poda as árvores, doma os touros, faz trelas finas, acha a toca da lebre, as picadas de javali, sacode as sacas de sementes, sabe a idade dos pastos, evita as farpas, o precipício, os atoleiros, e sempre protege as safenas de suas pernas nuas. Ele sabe também usar a pena, evitar as lesões gramaticais, ele manda seus pensamentos para Aimée.”

As lianas que a cobrem são furadas por lagartas aneladamente dispostas ou apinhadas em grupo, ladrilhos de mosaico. Sob este emaranhado há a nota viva do coral das lesmas e dos chapeuzinhos de musgo recobrindo as sarças, os sapinhos tropeçam nas folhas aos menores toques de gafanhotos ou caem na relva seca que grita como um gonzo.”

De manhã, ao alvorecer, abro os postigos, as árvores que vejo estão aureoladas de alabastro, a penumbra as envolve, estou emocionada, esta aurora é doce como um amor.”

Ela sonha. Um marido! Ele, um carvalho, e eu, um salgueiro furta-cor, que o entualasmo do vento une e faz murmurar. Na floresta, seus ramos se cruzam, entrelaçam-se, perseguem-se nos dias de vento, as folhas amam e vibram, a chuva lhe envia os mesmos beijos. Oh! Como sou ctumenta, meu marido é um carvalho e eu uma cerejeira branca! Eu sou multo ciumenta, ele é um carvalho e eu um salgueiro furta-cor! No bosque instável, a chuva lhes envia os mesmos beijos. Curvo-me para pegar um gládio, eu o encontrei em meu caminho; é prectso conquistar o direito de amar! No entanto a alegria está na casa, o pai, a mãe são fellzes. Estes dois adultos ágeis, cujos corpos foram maltratados pela terra tenaz, com muitos ‘Y’ nas faces e rugas na testa, amam seus filhos tanto quanto a terra e a terra tanto quanto seus fllhos.”

Calcula-se que será preciso perder quatro dias para se casar, o que é multo em plena estação! um para comprar os panos, outro para comprar ouro, outro na costureira e o quarto para passar o contrato.”

À beira da torrente, deixo a madeira morta seguir o seu curso e sou toda risos quando deslizam minhas canoazinhas onde está sentada toda uma comitiva de besouros ou de escaravelhos que vão estupidamente para a morte.”

Ah! não há nada melhor que tocar violino na neve durante o inverno.”

As meninas gulosas sempre às escondidas por gulodices, eu lhes ensino a guardar na boca uma maçã ou uma noz, mesmo se a glote se levanta, em seguida eu descasco uma coxa de noz bem branca, elas a comem sem nunca pensar em minhas astúcias inocentes.”

eu como leão tenho um apetite imenso

descasco o rizoma do feto”

Eu os preveni quando o incêndio estourou no bosque. Era preciso ouvir o crepitar! As bagas de genebra estalavam seco e as fagulhas me seguiam, o assombro me havia dado asas e o pilriteiro esporões, eu parecia o pássaro aviador, em volta de minhas hélices o ar ressonava, mais rápido que as nuvens eu vencia o vento”

Na passagem, podemos notar claramente uma alusão ao príncipe de Gales, identificado com o rouxinol (Nightingale).”

A corcarne da concupiscência.

Querem diamantes para suas coroas? Estão no alto dos ramos, a seu alcance, sob seus passos. Atenção quando caminham! Se os encontrarem, não digam nada. As puritanas os quereriam para seus rosários, a cortesã em seu quarto cheio de espelhos até o teto se cobria com eles, a milionária em seu camarote no espetáculo o faria seu único enfeite, pois ela não está em absoluto vestida, seu vestido colante é da cor de sua carne, não vemos onde ele começa”

O colírio de pele de serpente tinge seus olhos viciosos. Os seus sapatos não são para andar, os chapéus de bambu, de crina, de seda, de tule, ela os veste de maneira espalhafatosa. Seus vestidos são bordados com canutilhos [fios de ouro ou prata]: é todo um museu, uma coleção de modelos inéditos ou excêntricos, neles o grotesco domina, mas há de se cobrir esse corpo sem encanto, há que se fazer olhado. Todo este aspecto artificial surpreende, ela expulsou o natural, os aldeões não olham mais as outras mulheres. Ela sabe como manejar os homens! Passa os dias na sua banheira, depois a cobrir-se de enfeites; mostra-se, intriga, maquina.”

Desde então, <cochichos, risadinhas, apartes, complôs> compõem a pintura expressiva da arnbiência do delírio de interpretação.”

No caminho, um casal vai com um grande ruído de sapatos ferrados, tão grandes quanto os seus vazios ressoam. O marido é orgulhoso e forte, ele tem um filho, ele o olha, a mulher leva a criança que se agarra a seu pescoço e a suas tetas caídas, a criança sorri, a mãe tem um semblante de animal feliz, eles se amam. Aimée inveja o par.”

Oh criança, oh meninas que morrem, flores brancas que uma surda foice abate, fonte vicejante exaurida, apartada pelo negro e sublime mistério do globo, paloma caída do ninho e que faz seu sudário no chão assassino, frágil peito de pássaro que expira no bico ensangüentado do gavião, negra visão, que

amem vocês!

Abracem este corpo de criança!

Antes que o coloquem no ataúde,

Chorem, chamem mais e mais

Terão para se consolar,

Um metro cúbico no cemitério

Onde seu corpo virá rezar

Descobrirão então

Que a terra pode ser muito querida

Quando ela os liga à criança.

Ajoelhem-se abençoando-a

Com seus olhos abrindo-a logo

Para encontrar um camafeu branco!

O autodidatismo transparece a cada momento: truísmos, declamações banais, leituras mal-compreendidas, confusão nas idéias e nos termos, erros históricos.”

O estilo permite notar traços de <automatismo>, no sentido muito amplo de um eretismo intelectual sobre um fundo deficitário.”

Encontramos a mesma busca preciosa na escolha das palavras, mas desta vez com um resultado bem menos feliz. Palavras extraídas de um dicionário explorado ao acaso seduziram a doente, verdadeira <namorada das palavras>, segundo seus próprios termos, por seu valor sonoro e sugestivo, sem que nem sempre acrescentasse a isto discernimento e atenção ao seu valor lingüístico adequado ou a seu alcance significativo.”

Em toda a parte onde vou me observam, olham-me com um ar de suspeita de modo que à minha porta a multidão não tarda em me apedrejar. O flibusteiro a incita. Quero sair, fazem uma investida que me obriga a recuar, e eu pago um direito de ancoragem. Suporto algumas avanias. É pau para toda obra, diz uma mulher. Olham-na, ela fala de Jaime I, diz uma outra. Durmo muito mal, eu caço as feras no matagal com sua Alteza. Lêem isso nos meus olhos.”

Surrealismo involuntário.

O coração me leva, o sangue me chama

Eu beijo o solo, todo banhado de seu sangue

A multidão impedida, conferencia e fugindo

Me lança uma espada de brilho rebelde

Partimos sozinhos, e a multidão suspeita

Do escaninho das janelas nos espreita ao passar.”

É um incorruptível, diz o historiador; não bebe, não tem mulheres, matou milhares como um covarde, o sangue corre da praça do Trono até a Bastilha. Foi preciso Bonaparte apontando seus canhões sobre Paris para deter a carnificina.”

Os poetas são o inverso dos Reis, estes amam o povo, os outros amam a glória e são inimigos da felicidade do gênero humano.”

A retórica de Aristóteles não repousa em base alguma, é sempre o tema da licença, dos subterfúgios com a virtude por fachada, é uma traição contra seu rei. Eis ainda Cícero, cúmplice do assassinato de César, e Shakespeare colocando o assassino na altura de grande homem. No século XVIII, os filósofos pérfidos atacam os soberanos e os nobres que os protegem e os hospedam. Outras vezes, tiram dos grandes os sentimentos que eles não têm e com os quais se enfeitam. E o povo não reage. É por isso mesmo que as nações se deixam riscar da história do mundo, e se houvesse apenas Paris na França, logo o seríamos. Se há uma ilha que esteja habitada só por animais monstruosos e horríveis, é ela, é a própria cidade com suas prostitutas às centenas de milhares, seus rufiões, suas pocilgas, auas casas de prazeres a cada cinqüenta metros enquanto que a miséria se acumula no único cômodo do pardieiro.”

Eles me matam em efígie e os bandidos matam; cortam em pedaços e os bandidos cortam em pedaços, fazem segredos e os povos fazem segredos, preparam sedições, excitam em vez de apaziguar, pilham, destroem e vocês destroem: vocês são vândalos. (…) Não há escândalo que não tenha sido sugestionado pela conduta ou manobras desenvoltas de alguns amantes das letras ou de Jornalismo.”

Os que lêem livros não são tão bestas quanto os que os fazem, eles lhes acrescentam.”

Cem vezes no ofício

Retomem seu trabalho

Pulam-no sem parar e tornem a poli-lo

Acrescentem algumas vezes e com freqüência suprimam.”

Quem vende estes sapatos, estas novidades! Tusso, espirro! Os americanos? Eu não confio em meus sapatos amarelos; eu faço a queixa, examino meu sapato. Qual o seu número?, pergunta-me um estrangeiro, e o seu?, digo-lhe. Fazemo-nos compreender a custo de mímicas.”

Embora haja matizes, as mulheres de província são mais potáveis que as das cidades”

Sem dúvida alguma lhe aconteceu ficar boa de uma enxaqueca porque uma amiga lhe conta uma história engraçada, e se você medir a extensão das emoções à grandeza do sentimento, você está em presença do milagre, é a relatividade das influências”

vou pra ilha, minha filha

uma ilhota, filhota

bem longe, um lounge

dessa bolota!

uma cabra que sai do teatro francês com uma rosa úmida e viscosa completamente desabrochada para fora e um topete louro entre os chifres, os jornalistas lhe fizeram pastar as mais belas flores do jardim de Paris, ela espalhou suas virtudes por toda parte. É preciso fugir!”

Eu não posso mais avançar, o cortejo me impede a marcha, pergunto o que isto significa, calam-se, é um segredo de comédia, está rotulado: <Honra e Pátria>.”

as crianças soletram o silabário enquanto se aromatiza a refeição. A família está em pé à minha volta, consternada, ansiosa, todos se abraçam ao mesmo tempo cheios de terror ante o Reino da Vergonha. FINIS

Este delírio merece o nome de sistematizado em toda a acepção que os antigos autores davam a este termo. Por mais importante que seja considerar a inquietação difusa que está em sua base, o delírio impressiona pela organização que liga seus diversos temas. A estranheza de sua gênese, a ausência aparente de qualquer fundamento na escolha da vítima, não lhe conferem traços particulares.”

Devem-se deixar de lado igualmente as diversas variedades de parafrenias kraepelinianas. A parafrenia expansiva apresenta alucinações, um estado de hipertonia afetiva, essencialmente eufórica, uma luxúria do delírio, que são estranhos ao nosso caso.”

A psicose paranóide esquizofrênica, de Claude [o orientador], deve ser deixada de lado pelas mesmas razões. (…) a atividade profissional de nossa paciente prosseguiu até a véspera do atentado. Estes sinais eliminam tal diagnóstico.”

Paranóia (Verrücktheit), este é o diagnóstico ao qual nos prenderíamos a partir de agora, se uma objeção não nos parecesse poder ser levantada em virtude da evolução curável do delírio em nosso caso.”

o próprio Kraepelin abandonou o dogma da cronicidade da psicose paranóica. (…) Seja o que for, a descrição magistral de Kretschmer mostrou um tipo de delírio paranóico em que se observa a cura

A evolução curável de nosso caso pode nos permitir incluí-lo entre as esquizofrenias de evolução remitente e curável a que se refere Bleuler? Certamente (…) A esquizofrenia, como se sabe, é caracterizada pelo <afrouxamento dos elos associativos> (Abspannung der Assoziationsbindungen). O sistema associativo dos conhecimentos adquiridos é sem dúvida o elemento de redução maior destas convicções errôneas, que o homem normal elabora sem cessar e conserva de maneira mais ou menos duradoura. A ineficácia desta instância pode ser considerada como um mecanismo essencial de um delírio como o de nosso sujeito.” No entanto, cf. Lacan, é um delírio sistematizado demais para um caso de esquizofrenia.

Quanto aos distúrbios esporádicos que nossa doente apresentou, tais como sentimentos de estranheza, de déjà vu, talvez de adivinhação do pensamento, e mesmo as raríssimas alucinações, eles podem se manifestar entre os sintomas acessórios da esquizofrenia, mas de modo algum lhe pertencem especificamente. Os distúrbios mentais da primeira internação puderam nos fazer pensar por um momento num estado de discordância. Porém, nenhum documento que possuímos nos permite afirmá-lo. § Resta a hipótese de uma forma da psicose maníaco-depressiva. (…) nenhuma destas características aparece com suficiente nitidez em nosso caso”

No interior do quadro existente da paranóia, nosso diagnóstico ficará, sem dúvida alguma, com o de delírio de interpretação.”

Sérieux & Capgras: de interpretação X de reivindicação. O problema: em S. et C., o delírio é incurável.

Séglas: delírio melancólico.

II.2 A PSICOSE DE NOSSO CASO REPRESENTA UM “PROCESSO” ORGANO-PSÍQUICO?

O que importa é fazer precisar ao doente, sempre evitando sugerir-lhe algo, não seu sistema delirante, mas sim seu estado psíquico no período que precedeu a elaboração do sistema”

É antes de mais nada um sentimento de transformação da ambiência moral: <Durante minha amamentação, todo o mundo havia mudado ao meu redor … Meu marido e eu, parecia-me que nos tornáramos estranhos um ao outro.>

Um estranho no ninho: sou eu mesmo, que nem pássaro sou.

Meu bastardo diário,

Aqui no inferno dizem (Lá no inferno diziam, muitos anos atrás)…

Ele é muito inteligente mas (Síndrome de Helenojuçara)

O imbecil de hoje é o manipulador de amanhã (num jogo sem freio e sem exceções – quem tenta descer da roda, se espatifa no concreto do chão – único lugar para onde se cai)

Um certo aroma de golpe no ar

Encadeamento lógico de um tolo oportunista no poder e seus avatares espelhados

#DRINÃO

evolução em 3 fases, que designaremos:

(I) fase aguda,

(II) fase de meditação afetiva e

(III) fase de organização do delírio.”

ESTADO ONIRÓIDE: “No sonho, como se sabe, o jogo das imagens parece, ao menos em parte, desencadeado por um contato com a ambiência reduzido a um mínimo de sensação pura. Aqui, ao contrário, há percepção do mundo exterior, mas ela apresenta uma dupla alteração que a aproxima da estrutura do sonho: ela nos parece refratada num estado psíquico intermediário ao sonho e ao estado de vigília; além disso, o limiar da crença, cujo papel é essencial na percepção, está aqui diminuído.”

a doente, em sonho, caça na selva com a Alteza por quem está apaixonada”

O PERSEGUIDO PROCURA SEUS CARRASCOS (O REINO DAS SUPERINDIRETAS): “Não é, como pode parecer à primeira vista, de maneira puramente fortuita que uma significação pessoal vem transformar o alcance de certa frase escutada, de uma imagem entrevista, do gesto de um transeunte, do <fio> a que o olhar se engancha na leitura de um jornal.”

Todo hiper-interpretativo tem um quê de Fox Mulder: onde morrem a família, os amigos e as relações interpessoais no trabalho, morre também a teoria da conspiração. Ela precisa ser de amplo alcance para sua chama continuar a arder. O maior alcance possível: de preferência, a política. Prato cheio para servidores públicos.Kafka e seus processos…

Essas características nos levam a admitir que estes fenômenos dependem desses estados de insuficiências funcionais do psiquismo, que atingem eletivamente as atividades complexas e as atividades sociais, e cuja descrição e teoria foram fornecidas por Janet em sua doutrina da psicastenia. A referência a esta síndrome explica a presença, manifesta em nosso caso, de perturbações dos sentimentos intelectuais. A teoria permite, além disso, compreender que papel desempenham nas perturbações as relações sociais no sentido mais amplo, como a estrutura destes sintomas, bem-integrados à personalidade, reflete sua gênese social, e, enfim, como os estados orgânicos de fadiga, de intoxicação, podem desencadear seu aparecimento.” Um filho natimorto ou a constatação de que minha carreira é uma bosta, etc.

Sim, é como no tempo em que eu ia ao jornal comprar os números atrasados de um ou dois meses antes. Eu queria reencontrar neles o que havia lido, por exemplo, que iriam matar meu filho e a foto na qual eu o havia reconhecido. Porém, jamais reencontrei o artigo nem a foto, dos quais, no entanto, eu me recordava. No final, o quarto estava entulhado desses jornais.”

ilusão da memória: (…) [e]sses distúrbios mnêmicos são, com efeito, bem frustros: nunca constatamos, num exame clínico sistemático e minucioso, distúrbios amnésicos de evocação, a não ser os que assinalamos em nossa observação e que incidem eletivamente no momento de introdução no delírio dos principais perseguidores.”

imagem-fantasia imagem-recordação

(transformação oniróide-delirante; “crises de psicolepsia” em Janet)

Janet ressaltou admiravelmente o papel desses distúrbios da memória nos sentimentos ditos sutis, experimentados pelos perseguidos alucinados (Les sentiments dans le délire de persécution, artigo).”

o indivíduo que dorme e desperta bruscamente por um ruído provocado recorda-se de ter formado em sonho um encadeamento de imagens, que lhe parece ter tido uma duração importante e do qual, no entanto, toda ordem está manifestamente destinada a ocasionar o ruído que provocou o despertar, e do qual, aliás, o sujeito não podia prever nem a vinda inesperada nem a qualidade. Este fato, como todos aqueles que deixam tão enigmática a questão da duração dos sonhos, faz com que se perceba bem a dificuldade que apresenta uma orientação temporal objetiva no desenvolvimento representativo das imagens.”

nossa doente, como tantos outros psicopatas no período de incubação ou de eflorescência de sua doença, consultava abundantemente um destes videntes cuja propaganda se espalha livremente nos classificados dos jornais. (…) Que numa das consultas pagas de horóscopo lhe tenha sido anunciado que uma mulher loura desempenharia um importante papel em sua vida, o de uma fonte de infortúnios, esta foi a crença na qual a doente, durante sua psicose, apoiou em parte sua convicção delirante, no que concerne [a] sua principal perseguidora. Ora, hoje ela sabe, tendo sido feita a averiguação, que jamais lhe foi escrito nada semelhante.” “numerosas interpretações são ilusões da memória

Essa concepção é diferente da doutrina clássica, que vê na interpretação uma alteração do raciocínio, fundada sobre elementos constitucionais do espírito. Acreditamos que nossa análise constitui, em relação à clássica, um progresso real, ainda que seja apenas para compreender os freqüentes casos em que este suposto fator constitucional falta de maneira manifesta e onde é impossível discernir, na origem do delírio, o menor fato de raciocínio ou de indução delirante.”

II.3 A PSICOSE DE NOSSO CASO REPRESENTA UMA REAÇÃO A UM CONFLITO VITAL E A TRAUMAS AFETIVOS DETERMINADOS?

sobre a infância de um sujeito, os registros familiares parecem sofrer os mesmos mecanismos de censura e de substituição que a análise freudiana nos ensinou a conhecer no psiquismo do próprio sujeito. A razão é que neles a pura observação dos fatos é perturbada pela estreita participação afetiva que os misturou a sua própria gênese. Quanto aos parentes colaterais, entra em jogo, além disso, a defasagem vital que alguns anos bastam para produzir na época da infância. Aqueles que pudemos ver, a irmã mais velha e um dos irmãos, têm, respectivamente, 5 anos a mais que a doente e 10 anos a menos. Necessidades econômicas, por outro lado, acrescentaram seu efeito aos fatores psíquicos: a irmã que criou a doente durante seus primeiros anos teve que deixar o teto paterno aos 14 anos, a própria doente aos 18, o que nos dá os limites de observação tanto da irmã quanto do irmão.”

As esperanças que a inteligência reconhecida de nossa doente dava a seus parentes, valiam-lhe, nestes pontos, concessões, e até certos privilégios mais positivos. Alguns destes privilégios, tais como uma roupa branca mais fina que a de suas irmãs, parecem ainda provocar nelas uma amargura que não arrefeceu. O autor responsável por esta diferença de tratamento parece ter sido sua mãe. O intensíssimo vínculo afetivo que uniu Aimée de modo muito particular a sua mãe parece-nos que deve ser salientado.”

Nenhuma reação nela é comparável à que desencadeia a evocação do pesar atual de sua mãe: <Eu deveria ter ficado junto dela>, este é o tema constante das lamentações da doente.” “após os recentes acontecimentos ocorridos com sua filha, ela se fechou num isolamento feroz, imputando formalmente à ação hostil de seus vizinhos mais próximos toda a responsabilidade do drama.”

JÁ QUE VOCÊ GOSTA DE ESTUDAR… “O cultivo do devaneio é confessadamente precoce. É possível que uma parte das promessas intelectuais que a doente produziu tenha derivado disto, e que seja por conta desta particularidade que ela deva ter parecido aos seus como designada entre todas para aceder à situação superior de professora.”

esta abulia profissional e esta ambição inadaptada, que Janet também descreveu entre os sintomas psicastênicos.”

Esse tema do touro perseguindo volta com freqüência nos sonhos de Aimée (ao lado de um sonho de víbora, animal que pulula em sua terra), e é sempre de mau agouro.”

Dom-juan de cidade pequena e poetastro da igrejinha <regionalista>, essa personagem seduz Aimée pelos charmes malditos de um ar romântico e de uma reputação bastante escandalosa.” “A desproporção com o alcance real da aventura é manifesta: os encontros, bastante raros a ponto de terem escapado à espionagem de uma cidade pequena, de início desagradaram a doente; ela cede enfim, mas para ouvir logo de seu sedutor, decididamente apaixonado por seu papel, que ela não foi para ele senão o lance de uma aposta. Tudo se limita ao último mês de sua estadia na cidade pequena. Entretanto, esta aventura que leva consigo os traços clássicos do entusiasmo e da cegueira próprios à inocência, vai reter o apego de Aimée por 3 anos. Durante 3 anos, na cidade afastada em que seu trabalho a confinará, manterá seu sonho por uma correspondência trocada com o sedutor que ela não deve rever. Ele é o único objeto de seus pensamentos, e entretanto ela nada sabe nos contar sobre ele, mesmo à colega, de algum modo sua conterrânea, que é então a segunda grande ligação de amizade de sua vida.”

Seu desinteresse é então completo e se expressa de maneira comovente num pequeno traço: declina as satisfações de vaidade que lhe oferece a colaboração literária nas folhas da paróquia sob o cuidado de seu amante.”

Interiorização exclusiva, gosto pelo tormento sentimental, valor moral, todos os traços de um apego como este concordam com as reações que Kretschmer relaciona ao caráter sensitivo.”

As razões de fracasso de uma ligação como esta parecem só se dever à escolha infeliz do objeto. Esta escolha traduz, ao lado de arrebatamentos morais elevados, uma falta de instinto vital de que dá testemunho, aliás, em Aimée, a impotência sexual que o transcorrer de sua vida permite corroborar”

cansada de suas complacências tão vãs quanto dolorosas (…): <Passo bruscamente do amor ao ódio>”

Estes sentimentos hostis ainda não estão mitigados. Eles são marcados pela violência do tom das réplicas que Aimée opõe às questões com que a pusemos à prova: <Triste indivíduo>, assim o designa, empalidecendo ainda. <Ele pode morrer. Não me fale mais deste cáften … e deste grosseiro>. Tornamos a encontrar aí esta duração indefinida, na consciência, do complexo passional que Kretschmer descreve como mecanismo de repressão.”

Ela [sua melhor amiga, do escritório,] considera o trabalho a que foi compelida como muito inferior à sua condição moral, o que faz com que não se preocupe muito com ele. Toda sua atividade é empregada em manter sob seu prestígio intelectual e moral o pequeno mundo de seus colegas: ela rege suas opiniões, governa seus lazeres, assim como em nada negligencia para aumentar sua autoridade pelo rigor de suas atitudes. Grande organizadora de noitadas em que a conversa e o bridge são levados até bem tarde, ela conta ostensivamente numerosas histórias sobre as relações passadas de sua família, não desdenha em absoluto de fazer alusão às que lhe restaram. Ela representa junto a estas simplórias meninas o atrativo dos costumes nos quais ela as inicia. Por outro lado, ela sabe impor o respeito por meio de um recato e de hábitos religiosos não-desprovidos de afetação.” “através desta amiga é que pela primeira vez chegam aos ouvidos de Aimée o nome, os hábitos e os sucessos de Sra. Z., que era então vizinha de uma tia da narradora, e também o nome de Sarah Bernhardt que sua mãe teria conhecido no convento, ou seja, as duas mulheres que a doente designará mais tarde como suas maiores perseguidoras. Tudo levava Aimée a sofrer as seduções dessa pessoa, a começar pelas diferenças com que ela mesma se sente marcada em relação a seu meio: <Era a única que saía um pouco do comum, no meio de todas essas meninas feitas em série.>

<Com esta amizade, nos diz, opondo-a a suas duas primeiras amizades, eu guardava sempre um jardim secreto>: é o reduto onde a personalidade sensitiva se defende contra as investidas de seu contrário.” https://www.gutenberg.org/files/113/113-h/113-h.htm

<Eu me sinto masculina.> Ela deixou escapar a palavra-chave.”

Esse caráter de jogo na atitude sexual parece se confirmar, na época a que nos referimos, numa série de aventuras que ela dissimula muito bem dos que a cercam. Nesta menina desejável, o gosto da experiência se acomoda a uma frieza sexual real. Sua virtude, pelo menos no sentido farisaico, se acha também freqüentemente a salvo.” “Pudemos fazer uma idéia da personalidade do marido; não tivemos necessidade de solicitá-lo para que ele nos trouxesse informações tão prolixas quanto benévolas sobre sua mulher. Trata-se de um homem muito ponderado em seus julgamentos e, é bem provável, em sua conduta também, mas em quem nada dissimula a orientação muito estreitamente positiva dos pensamentos e dos desejos, e a repugnância a qualquer atitude inutilmente especulativa” “Desde esta época, imputa-se a Aimée ter se queixado de ciúme; mas seu marido também faz a mesma coisa. Os dois esposos tiram a matéria desses reproches das confissões recíprocas que eles fizeram sobre o passado deles. Parece que então, para Aimée, estes reproches nada mais são do que o que ficaram sendo para seu marido, armas com que se exprime o desentendimento que se comprova. Trata-se apenas ainda deste tipo de ciúme, qualificado por Freud, de ciúme de projeção.

Em breve Aimée retorna a este vício, a leitura, nem sempre tão <impune> quanto os poetas o crêem. Ela se isola, diz seu marido, em mutismos que duram semanas.” “ela se servirá do mais fútil pretexto para ficar em casa se, por exemplo, lhe chamam para um passeio, mas, uma vez que saiu, na hora de voltar só criará empecilhos.” A má-consciência sartriana

MULHER OMO: “Impulsões bruscas no andar, na caminhada, risos intempestivos e imotivados, acessos paroxísticos de fobia da mácula, lavagens intermináveis e repetidas das mãos; todos fenômenos típicos das agitações forçadas de Janet.”

Viúva de um tio que foi em primeiro lugar seu empregador [sua irmã mais velha], que depois fez dela sua mulher com a idade de 15 anos, esta Ruth de um Boaz merceeiro¹ não realizou uma necessidade de maternidade, profundamente sentida por sua natureza. A partir de uma histerectomia total sofrida aos 27 anos por razões que desconhecemos, esta insatisfação, exaltada pela idéia de que não há esperança para ela e sustentada pelo desequilíbrio emotivo da castração precoce, torna-se a instância dominante de seu psiquismo. Pelo menos ela nos confessou isso sem disfarce, quando nos disse com toda a candura ter encontrado seu consolo no papel de mãe que conquistou junto ao filho de sua irmã a partir do fim do primeiro ano, ou seja, desde alguns meses que antecederam a primeira internação de Aimée.”

¹ Personagens bíblicas.

ela acabou por fazer súplicas que eram, aliás, desnecesárias, para remediar tão grandes infortúnios. Acabou suas declarações com um quadro apologético de sua dedicação para com a doente, da atenção sem trégua de que dera provas ao seu lado, enfim, das angústias que tivera.”

Eu me dava conta de que não significava mais nada para ele. Pensava freqüentemente que ele seria mais feliz se eu lhe devolvesse a liberdade, e que pudesse construir sua vida com outra.

Entretanto, tendo caráter sensitivo e psicastênico, Aimée não poderia apaziguar simplesmente com tal abandono, nem mesmo se contentar com o refúgio do devaneio. Ela sente a situação como uma humilhação moral e o exprime nos reproches permanentes que lhe formulam sua consciência. Não se trata aí, porém, de uma pura reação do seu foro íntimo; esta humilhação se objetiva na reprovação, bem real, que sua irmã lhe impõe incessantemente por seus atos, por suas palavras e até em suas atitudes.

Mas a personalidade de Aimée não lhe permite reagir diretamente por uma atitude de combate, que seria a verdadeira reação paranóica, entendida no sentido que esse termo assumiu desde a descrição de uma constituição que levou esse nome. Não é, com efeito, dos elogios e da autoridade que lhe são conferidos pelos que a cercam que sua irmã vai tirar sua principal força contra Aimée, é da própria consciência de Aimée. Aimée reconhecia, por seu valor, as qualidades, as virtudes, os esforços de sua irmã. Ela é dominada por ela, que representa sob um certo ângulo a imagem mesma do ser que ela é impotente para realizar. Como ela o foi, num grau menor, diante da amiga com qualidades de líder. Sua luta surda com aquela que a humilha e lhe toma o lugar só se exprime na ambivalência singular das opiniões que ela tem a seu respeito. Com efeito, é surpreendente o contraste entre as fórmulas hiperbólicas por meio das quais presta homenagem às generosidades de sua irmã e o tom frio com que as expressa. Às vezes sem querer explode a confissão: <Minha irmã era por demais autoritária. Ela não estava comigo. Estava sempre do lado do meu marido. Sempre contra mim.>” “<jamais pôde suportar> os direitos assumidos por sua irmã na educação da criança.”

Devemos reconhecer aí a confissão do que é tão rigorosamente negado, a saber, no caso presente, da queixa que Aimée imputa à sua irmã por ter raptado seu filho, queixa em que é surpreendente reconhecer o tema que sistematizou o delírio.” “Ora, esta queixa no delírio foi afastada da irmã com uma constância cujo verdadeiro alcance a análise vai nos mostrar.”

com o trauma moral da criança natimorta aparece em Aimée a primeira sistematização do delírio em torno de uma pessoa, a quem são imputadas todas as perseguições que ela sofreu. Esta espécie de cristalização do delírio se produziu de uma forma tão súbita que o testemunho espontâneo da doente não deixa dúvida; e ela se produziu com a amiga de outrora, Senhorita C. de la N. [, avatar da irmã mais velha]” “Quando, pela primeira vez, Aimée passa a uma reação de combate (a uma reação conforme com a descrição aceita da constituição paranóica), ela só o alcança por um viés; substitui o objeto que se oferece diretamente a seu ódio por um outro objeto, que provocou nela reações análogas pela humilhação sofrida e pelo caráter secreto do conflito, mas que tem a vantagem de escapar ao alcance de seus golpes. A partir daí, Aimée não deixará de derivar seu ódio para objetos cada vez mais distanciados de seu objeto real, como também cada vez mais difíceis de atingir.” CURA: Dê um chute no patrão e um tiro no seu pai!

E os próprios temores que sua irmã manifesta atualmente quanto à própria vida, ainda que a própria doente nunca a tenha ameaçado, têm todas as características de uma advertência do seu instinto. Sem dúvida, por ocasião das últimas cenas em que Aimée queria forçar seu testemunho e falava em matar seu marido se não obtivesse o divórcio, ela pôde sentir, na violência do tom da doente, até onde iam realmente suas ameaças assassinas.”

O surto delirante difuso que desabrocha com a segunda gravidez permanece compatível com uma vida profissional e familiar sensivelmente normal até nos primeiros meses de amamentação. Observemos de passagem que a menor amplitude das desordens, a intensidade diminuída da inquietude, que distinguem este surto do primeiro, parecem ligadas ao primeiro esboço de sistematização, cujo mecanismo acabamos de descrever. Até o quinto mês de amamentação, por outro lado, Aimée é quem cuida exclusivamente de seu filho (testemunho do marido).”

Mas logo, apoiando-se em certas inexperiências de Aimée, a irmã impõe sua direção na educação da criança. As grandes reações interpretativas (querelas, escândalos, idéias delirantes) se multiplicam então, até o intento de fuga, na base de devaneios ambiciosos. Esta reação, que parece de natureza essencialmente psicastênica, leva o conflito a seu auge (<Arrancaram-me o meu filho>) e justifica a internação.”

Deixam-na, então, viver só de seu salário, em Paris. Este isolamento pode ter sido favorável como garantia imediata contra um perigo de fato; no entanto, permanece muito mais discutível como medicação psicológica.” “Suas intervenções e sua própria presença serão cada vez mais mal-recebidas em casa. Ela fingirá ignorar seu marido quando de suas visitas, depois quase não as fará, e cada vez mais se enclausurará nas atividades compensatórias e quiméricas que ela criou para si em seu isolamento parisiense.”

Enfim, suas tentativas, condenadas, para resolver o conflito por um divórcio que lhe devolvesse o filho, parecem corresponder a um sobressalto supremo da doente diante da expiração do prazo impulsivo do delírio, diante do batente inelutável que a espera na via de derivação afetiva em que seu psiquismo se comprometeu. Estes esforços últimos, que racionalmente parecem provenientes de fantasias do delírio, correspondem, não obstante, a um esforço obscuro e desesperado das forças afetivas em direção à saúde.

Ninguém no meio ambiente de Aimée estava em condições de reparar na urgência da situação. Com o mesmo desconhecimento bastante desculpável com que repetidas vezes acolheram suas tentativas de confidência delirante, os seus repeliram rudemente investidas das quais só podiam perceber o caráter inoportuno.

Por isso, com a firmeza quase consciente de uma necessidade longamente alimentada, numa última hesitação crepuscular, na hora mesmo em que pouco antes a doente pensava ainda que ia ficar junto de seu filho, ela efetivou a violência fatal contra uma pessoa irresponsável

Chegaram, entretanto, por fim, a confinar a doente numa atividade em que ela trabalha[va] sozinha, e onde eventualmente seus erros teriam o mínimo de conseqüências. Notemos, no entanto, o balanço favorável de seus esforços, que se traduz pela sanção de uma promoção”

tormentos éticos objetivados, próximos dos escrúpulos psicastênicos.”

Ao lado desta vida profissional em que a adaptação é relativamente conservada, a doente leva uma outra vida <irreal>, ela nos diz, ou <inteiramente imaginária>. <A doente, conta uma de suas colegas, vivia uma vida absurda>; mais ainda: <Ela estava fechada em seu sonho.>”

Após 3 anos, ela se recusará a fazer uso de suas férias de outra forma que não seja se dedicando inteiramente a estas atividades: <Eu passei os 20 dias de uma de minhas licenças sem sair da Biblioteca Nacional>. Reconhecemos aí o caráter forçado das perseverações psicastênicas: acontece que, conta seu marido, ela rejeita, numa ocasião particularmente favorável, rever seus parentes após uma longa separação, alegando que prepara o exame de baccalauréat. Essas atividades se mostram ineficazes: fracassa 3 vezes no baccalauréat.”

ela negligencia então seu próprio filho, parece pouco atenta por ocasião de 2 crises de apendicite que a criança apresenta. Depreendemos aí o próprio mecanismo dessas discordâncias da conduta sobre as quais insiste Blondel: a saúde da criança, que forma o tema ansioso central de seu delírio, deixa-a indiferente

Nesta vida psíquica dominada em sua maior parte pelo irreal, pelo sonho e pelo delírio, a dissimulação era de se esperar. Em tais doentes, dissimulação e reticência são apenas o avesso de uma crença delirante, cujo caráter incompleto eles indicam.” “Várias vezes ela se entrega na casa dela [?] a pequenos furtos destinados a cobrir seus déficits orçamentârios: jóias [?] e livros, que pertencem ao patrimônio, são roubados por ela sem que ninguém saiba.”

Esses temas de revolta e de ódio aparecem como secundários ao próprio delírio. Ressaltemos que na mesma época a doente chega a dar uma forma literária não-desprovida de valor, não só aos melhores élans de sua juventude, como também às experiências mais valiosas que pôde viver, as de sua infância.”

À antiga amiga, ela pedirá perdão por todo o mal que injustamente lhe desejou, do qua1 certamente nada lhe disse, senão ao romper com a correspondência, mas que poderia ter tido enormes conseqüências. Vários outros encontros, como no fim de um romance sentimental, terão por objetivo encerrar [com] o [seu] passado. Irá ter com a criada de seu hotel, etc.”

A irmã mais velha se opõe formalmente à simples idéia de ter que se encontrar com nossa doente, mesmo em nossa presença. Diante de um apelo por carta feito por esta, ela respondeu em termos tais que acreditamos ser conveniente poupar nossa doente de ouvi-los e participar-lhe somente o essencial. A própria doente, após breves conversas com seu marido, se opõe, a partir de então, a qualquer novo encontro. <Seria preciso, ela afirma, que me colocassem numa camisa-de-força para me arrastar até ele.> Ela mantém contato apenas com um irmão que a visita regularmente; e vive na esperança de encontrar seu filho.”

O balanço desta atitude se traduz praticamente em uma produção que, apesar de nossos incentivos, permaneceu quase nula desde sua entrada no serviço. Ela se restringiu a algumas poesias curtas, embora sejam de uma qualidade bem inferior não só em relação a suas produções maiores, mas também em relação a suas tentativas anteriores do mesmo gênero, nas quais ela mostrava uma alegria sem igual.”

Nada nos permite falar, em nossa doente, de disposição congênita, nem mesmo adquirida, que se exprimiria nos traços definidos da constituição paranóica.”

O sentimento da natureza, que Montassut observa com muita precisão como freqüente nos paranóicos, não é em absoluto, como ele o afirma, uma simples conseqüência de sua inadaptação social. Ele representa um sentimento de um valor humano positivo, cuja destruição no indivíduo, mesmo se ele melhora sua adaptação social, não pode ser considerada como um benefício psíquico.”

Todos os traços que, em nossa doente, poderiam se aproximar das características atribuídas à constituição dita paranóica – superestima megalomaníaca, desconfiança, hostilidade para com o meio, erros de juízo, autodidatismo, acusação de plágio, reivindicações sociais – só surgem em Aimée secundariamente à eclosão delirante.”

As magistrais descrições desses dois autores, clinicamente convergentes em numerosos pontos, são, no entanto, bastante diferentes por sua concepção patogênica. Janet tem do distúrbio fundamental da psicastenia uma concepção estrutural e energética, e parece remetê-la a um defeito congênito. Kretschmer tem do caráter sensitivo uma concepção dinâmica e evolutiva e o relaciona essencialmente à história do sujeito.”

No entanto, a mesma objeção vale tanto para os processos hiponóides cuja observação é comum não apenas em doentes bastante diferentes, como também em sujeitos normais, quanto para esses traumatismos psíquicos que formam a trama de toda vida humana: por que tanto uns quanto outros determinam num caso dado uma psicose e uma psicose paranóica, e não qualquer outro processo neurótico ou desenvolvimento reativo?”

II.4 A ANOMALIA DE ESTRUTURA E A FIXAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE DE AIMÉE SÃO AS CAUSAS PRIMEIRAS DA PSICOSE

a) DE COMO A PSICOSE DE NOSSA PACIENTE FOI REALIZADA PELOS MECANISMOS DE AUTOPUNIÇÃO QUE PREVALECEM NA ESTRUTURA DE SUA PERSONALIDADE.

Sobre a teoria da intencionalidade da consciência, reportar-se à obra fundamental de Brentano, Psychologie von empirischen Standpunkte, 1874.“

As intenções conscientes são desde há muito o objeto da crítica convergente dos <físicos> e dos moralistas, que mostraram todo o seu caráter ilusório. Esta é a razão principal da dúvida metódica lançada pela ciência sobre o sentido de todos os fenômenos psicológicos.”

O mérito desta nova disciplina, que é a psicanálise, é nos ter ensinado a conhecer essas leis, a saber: aquelas que definem a relação entre o sentido objetivo de um fenômeno de consciência e o fenômeno objetivo a que corresponde: positivo, negativo, medíato ou imediato, essa relação é, com efeito, sempre determinada.” “Este método de interpretação, cuja fecundidade objetiva se revelou nos vastos campos da patologia, se tornaria ineficaz no limiar do domínio das psicoses? Não questionamos as classificações clínicas e queremos evitar qualquer síntese, mesmo teórica, que seja prematura. Porém, trata-se aqui apenas de aplicar aos fenômenos da psicose um método de anâlise que já deu suas provas em outra parte. Se uma psicose, com efeito, entre todas as entidades mórbidas, exprime-se quase puramente através de sintomas psíquicos, recusaremos a ela por isso mesmo todo sentido psicogênico? Parece-nos que seria abusar do direito de prejulgar, e que a questão só pode ser resolvida depois de ser posta à prova.” “Talvez a natureza da cura nos demonstre a natureza da doença.” “De saída, pode-se falar em cura? Sim, se damos a esse termo o valor clínico de redução de todos os sintomas mórbidos; quanto à persistência de uma predisposição determinante, não podemos decidir sobre ela, já que é esse o problema que tentamos cingir. O fato é que no 20º dia de sua detenção, e com um caráter brusco bem nítido, a psicose manifestada pelo delírio com seus diferentes temas curou. Depois, a paciente permaneceu no asilo, e essa cura se manteve até o momento presente, ou seja, durante um ano e meio aproximadamente.”

A única intoxicação que pode ser discutida é o cafeinismo; mas não devemos exagerar o papel atribuído ao café nos distúrbios mentais.”

Tais curas instantâneas do delírio se observam num tipo único de caso, e mesmo assim eventualmente: isto é, nos delirantes ditos passionais após a realização de sua obsessão assassina. O delirante, após o assassinato, sente nesse caso um alívio característico acompanhado pela queda imediata de todo o aparelho da convicção delirante.

Não se encontra aqui nada semelhante logo após a agressão. Certamente, esta agressão fracassou e a doente não transparece nenhuma satisfação especial pela evolução favorável que se verifica rapidamente no estado de sua vítima; mas este estado persiste ainda por 20 dias. Nada mudou, então, do lado da vítima. Ao contrário, quer nos parecer que alguma coisa mudou do lado do agressor. A doente <realizou> seu castigo”

Que esses fatos se impusessem primeiramente aos praticantes da psicanálise, isto só se deve à abertura psicológica de seu método, pois nada implicava esta hipótese nas primeiras sínteses teóricas dessa doutrina. Não podemos empreender aqui a demonstração deste ponto que pensamos retomar em outro lugar: a análise dos determinismos autopunitivos e a teoria da gênese do supereu que ela engendrou representam na doutrina psicanalítica uma síntese superior e nova.”

O poder afetivo do protótipo é dado por sua existência real na vida da doente. Mostramos mais acima que ele era representado por esta irmã mais velha, de quem Aimée sofreu todos os graus de humilhação moral e de reproches de sua consciência. Num menor grau, a sua amiga intima, a Senhorita C. de la N., que para Aimée representava tão eminentemente a adaptação e a superioridade para com seu meio, objeto de sua íntima inveja, desempenhou um papel análogo; porém, segundo a relação ambivalente, própria precisamente à inveja, sentimento que comporta uma parte de identificação; e isto nos leva à segunda significação do protótipo delirante.”

Mulheres de letras, atrizes, mulheres do mundo, elas representam a imagem que Aimée concebe da mulher que, em algum grau, goza da liberdade e do poder social.” “Mas o objeto que Aimée atinge só tem um valor de puro símbolo, e ela não sente com seu gesto nenhum alívio. Contudo, pelo mesmo golpe que a torna culpada diante da lei, Aimée atinge a si mesma, e, quando ela o compreende, sente então a satisfação do desejo realizado: o delírio, tornado inútil, se desvanece.”

o que nossa pesquisa forneceu foi, insistimos neste ponto, um distúrbio que só tem sentido em função da personalidade ou, se preferirmos, um distúrbio psicogênico.”

b) DE COMO, AO CONCEBER ESTES MECANISMOS AUTOPUNITIVOS, SEGUNDO A TEORIA FREUDIANA (UMA CERTA FIXAÇÃO EVOLUTIVA DA ENERGIA PSÍQUICA CHAMADA LIBIDO), DÁ-SE CONTA DAS CORRELAÇÕES CLÍNICAS MAIS EVIDENTES DA PERSONALIDADE DO SUJEITO. [Até para redigir TÍTULOS Lacan é um boçal! Teseu sem Ariadne…]

A evolução da libido na doutrina freudiana parece corresponder com muita precisão, em nossas fórmulas, a esta parte, considerável na experiência, dos fenômenos da personalidade cujo fundamento orgânico é dado pelo desejo sexual.”

enquanto alguns veriam no presente caso uma regressão da consciência para esse estado de indiferenciação primordial (Blondel), outros sem hesitar atribuiriam o distúrbio inicial a uma deficiência deste contato vital com a realidade, que é para eles a fonte primeira de toda atividade humana; estes falariam de racionalismo mórbido (Minkowski) e nosso mestre e amigo Dr. Pichon, citando Chesterton, nos diria: <O louco não é em absoluto o homem que perdeu a razão; o louco é aquele que perdeu tudo, menos sua razão>.”

Quanto à imprecisão relativa do conceito de libido, ela não deixa para nós de ter seu valor. Tem, com efeito, o mesmo alcance geral que os conceitos de energia ou de matéria em física, e nessa qualidade representa a primeira noção que permite entrever a introdução em psicologia de leis de constância energética, bases de toda ciência.”

Encontraremos uma síntese feliz do conjunto dos trabalhos psicanalíticos sobre [sintomas da perda de objeto] no livro de O. Fenichel, Perversionen, Psychosen, Charakterstörungen, particularmente em seu capítulo das <Esquizofrenias>, p. 68-106.

A prevalência mórbida dos mecanismos de autopunição será sempre acompanhada, portanto, de distúrbios que manifestam a função sexual. A fixação sádico-anal, que eles representam na maioria das vezes, explica sua correlação com os distúrbios neuróticos obsessivos e os sintomas ditos psicastênicos.”

Se o valor patogênico de uma fixação pode ser aproximado de uma constituição, suscetível a um determinismo orgânico congênito, este valor dela se difere, quando deixa lugar à hipótese de um determinismo traumático

Esses pontos teóricos explicam a concomitância de traços de morbidez propriamente psicastênicos e obsessivos. Por outro lado, eles dão seu valor clínico às deficiências, que são negligenciadas no quadro de Janet, e que dizem respeito à esfera sexual.”

incerteza do pragmatismo sexual (escolha de parceiros de uma incompatibilidade máxima)”

Eu o amo, ele.

A primeira denegação possível: Eu não o amo. Eu o odeio, projetada secundariamente em Ele me odeia, fornece o tema de perseguição. Esta projeção secundária é imediata na fenomenologia própria ao ódio, e pode prescindir, quer nos parecer, de qualquer outro comentário.

A segunda denegação possível: Eu não o amo. É ela que eu amo, projetada secundariamente em Ela me ama, fornece o tema erotomaníaco. Aqui, a projeção secundária, pela qual a iniciativa amorosa parte do objeto, implica a intervenção de um mecanismo delirante próprio, deixado por Freud na obscuridade.

A terceira denegação possível: Eu não o amo. É ela que o ama, fornece, com ou sem inversão projetiva, o tema de ciúme.

Há, enfim, segundo Freud, uma quarta denegação possível, é aquela que incide globalmente sobre toda a fórmula e diz: Eu não o amo. Eu não amo ninguém. Amo somente a mim.”

Fixação narcísica e pulsão homossexual são, portanto, neste caso, oriundas de pontos evolutivos muito próximos da libido. Estão quase contíguas no estágio de gênese do supereu. Este fato, segundo a teoria, indica um fraco processo regressivo e explica a benignidade relativa e a curabilidade da psicose em nosso caso.” Ou do artista em geral?

c) O PROTÓTIPO “CASO AIMÉE” OU A PARANÓIA DE AUTOPUNIÇÃO FRUTOS DE SEU ESTUDO: INDICAÇÕES DE PRÁTICA MÉDICA E MÉTODOS DE PESQUISA TEÓRICA.

Não temos de modo algum, com efeito, a ambição de acrescentar uma entidade nova à nosologia já tão pesada da psiquiatria. Os quadros, como se sabe, nela se distinguem com muita freqüência pela arbitrariedade de sua delimitação, por suas imbricações recíprocas, fontes de incessantes confusões, sem falar daqueles que são puros mitos. A história da psiquiatria demonstra suficientemente seu caráter vão e efêmero.”

a psiquiatria – não é, que pena, um truismo lembrá-lo –, sendo a medicina do psíquico, tem por objeto as reações totais do ser humano, isto é, as reações da personalidade no primeiro plano. Ora, como acreditamos ter demonstrado, não há informação suficiente sobre esse plano senão através de um estudo tão exaustivo quanto possível da vida do sujeito. Contudo, a distância que separa a observação psiquiátrica da observação médica corrente não é tamanha que explique os 23 séculos que separam Hipócrates, o pai da Medicina, de Esquirol, em quem veríamos, de bom grado, o padrasto da psiquiatria.”

O isento método da observação psiquiátrica já era conhecido, com efeito, por Hipócrates e sua escola. E a cegueira secular que se seguiu só nos parece imputável à dominação inconstante, mas contínua, de preconceitos filosóficos. Tendo dominado 15 séculos com Galeno [com seu plurivitalismo, espécie de antecessor do materialismo mecanicista], esses preconceitos são mantidos de um modo notável pela psicologia atomística da Enciclopédia, reforçados ainda pela reação comtista que exclui a psicologia da ciência, e permanecem não menos florescentes na maior parte dos psiquiatras contemporâneos, quer sejam psicólogos ou supostos organicistas. O principal destes preconceitos é que a reação psicológica não oferece ao estudo interesse em si mesma, porque ela é um fenômeno complexo. Ora, isto é verdadeiro apenas em relação aos mecanismos físico-químicos e vitais que esta reação põe em jogo, mas falso no plano que lhe é próprio. Ele é, com efeito, um plano, que tentamos definir, e no qual a reação psicológica tem o valor de toda reação vital: ela é simples por sua direção e por sua significação.”

Seja como for, graças às circunstâncias históricas favoráveis, a observação do psiquismo humano, não de suas faculdades abstratas, mas de suas reações concretas, nos é de novo permitida. Pensamos que toda observação fecunda deve se impor à tarefa de fazer monografias psicopatológicas tão completas quanto possível.” “É nessa medida mesma que somos contrários a acrescer, segundo o costume, uma nova entidade mórbida, cuja autonomia não seríamos capazes de sustentar, aos quadros existentes. (…) O quadro clínico que vamos apresentar, apesar de nossas reservas, se limitará a este alcance puramente prático. (…) Se for preciso um título ao tipo clínico que vamos descrever, escolheremos o de paranóia de autopunição [em detrimento de ‘psicose paranóica’].”

c.1) Diagnóstico, Prognóstico, Profilaxia & Tratamento da Paranóia de Autopunição

A personalidade anterior do sujeito é, antes de mais nada, marcada por um inacabamento das condutas vitais (a melhor introdução ao estudo da personalidade desses sujeitos se acha nos trabalhos já citados de Janet e de Kretschmer). Este traço está próximo da descrição dada por Janet das condutas psicastênicas; ele se distingue dela no que os fracassos incidem menos sobre a eficácia do rendimento social e profissional, freqüentemente satisfatórios, que sobre a realização das relações da personalidade que se relacionam à esfera sexual, ou seja, dos vínculos amorosos, matrimoniais, familiares.”

ódio familiar (…) fuga diante do casamento e, quando realizado, desentendimento e fracassos conjugais, desconhecimento das funções de parentesco – este é o passivo do balanço social desses tipos de personalidade.”

Esses mesmos sujeitos que demonstram impotências de resultado constante nas relações afetivas para com o próximo mais imediato, revelam nas relações mais longínquas com a comunidade virtudes de uma incontestável eficácia. Desinteressados, altruístas, menos presos aos homens que à humanidade, habitualmente utopistas, esses traços não exprimem neles somente tendências afetivas, mas atividades eficazes: servidores zelozos do Estado, preceptores ou enfermeiras convencidos de seu papel, empregados ou operários excelentes, trabalhadores encarniçados, eles se conformam melhor ainda a todas as atividades entusiastas, a todos os <dons de si> que os diversos empreendimentos religiosos utilizam, e geralmente a todas as comunidades, quer sejam de natureza moral, política ou social, que se fundam sobre um vínculo supra-individual.”

descargas afetivas espaçadas, mas extremamente intensas, manifestam-se habitualmente pelo reviramento de todas as posições ideológicas (conversão), mais freqüentemente pela inversão de uma atitude sentimental: passagem brusca, a respeito de uma pessoa, do amor ao ódio,¹ e inversamente. Nenhum estudo médico da vida afetiva desses sujeitos vale as admiráveis observações que encerra a obra de Dostoiévski; ver particularmente: Humilhados e ofendidos, O eterno marido, Crime e castigo, O duplo, Os demônios.”

¹ Tipo ideal: Freud.

São hipermorais, jamais amorais. O que não quer dizer que não possam dissimular, principalmente sobre suas reações afetivas mais profundas.”

Nem acesso esquizofrênico legítimo nem fase maníaco-depressiva são oberváveis nos antecedentes. Os traços da constituição paranóica permanecem míticos.” [?]

Revela-se, o mais das vezes, uma relação manifesta entre o acontecimento crítico ou traumático [expulsão do colégio militar] e um conflito vital que persiste há vários anos. Este conflito, de forte ressonância ética, está muito freqüentemente ligado às relações parentais ou fraternas do sujeito.”

O perseguidor principal é sempre do mesmo sexo que o do sujeito, e é idêntico, ou pelo menos representa claramente, a pessoa do mesmo sexo à qual o sujeito se mantém preso mais profundamente por sua história afetiva.” Coisa curiosa… Porque tirando o pai tirânico prototípico, os únicos seres capazes de me infligir qualquer dano psicológico nesse mundo são as mulheres organizadas em bando.

As idéias de grandeza não se exprimem na consciência do sujeito por nenhuma transformação atual de sua personalidade. Devaneios ambiciosos, projetos de reforma, invenções destinadas a mudar a sorte do gênero humano, elas têm sempre um alcance futuro, do mesmo modo que um sentido nitidamente altruísta. Elas apresentam assim características simétricas das idéias de perseguição. O mesmo conteúdo simbólico é aí fácil de ser reconhecido: ele se refere tanto numas quanto noutras ao ideal do eu do sujeito. Essas idéias podem não ser desprovidas de toda ação social efetiva e as idéias ditas de grandeza podem receber assim um início de realização. Já assinalamos, aliás, o caráter convincente que as ideologias dos paranóicos devem a sua raiz catatímica.”

O PATHOS: “Nenhuma nota clínica propriamente melancólica se observa no curso do delírio; apesar da tendência auto-acusadora particular que salientamos nas idéias delirantes, não se encontra nenhum sinal de inibição psíquica. No entanto, certos estados de exaltação passageira parecem corresponder a variações holotímicas e cíclicas do humor. A convicção delirante é poderosamente sustentada por essas variações positivas estênicas.

A dissimulação desses sujeitos se deve menos aos fracassos de suas tentativas de expansão que a determinada incerteza residual de suas crenças.” “O perigo que impõem a outrem as virtualidades reacionais desses sujeitos é inversamente proporcional ao paradoxo de seu delírio. Em outros termos, quanto mais as concepções do sujeito se aproximam do normal, mais ele é perigoso. Sérieux e Capgras já sublinharam o nível bem mais elevado do perigo apresentado pelos delirantes ditos reivindicadores (querelantes de Kraepelin), tanto em virtude da violência e da eficácia de sua reação agressiva [JJ] quanto de sua iminência imediata. Os paranóicos que descrevemos estão situados entre estes sujeitos e os interpretativos [este seria eu, um ‘paranóide atenuado’], cujas reações mais tardias e menos eficazes Sérieux e Capgras já observam.

a manutenção da psicose depende da permanência do conflito gerador.”

As indicações profiláticas se impõem antes de mais nada. Elas devem se manter, para nossos sujeitos, a meio caminho de um isolamento social grande demais, que favorece o reforço de suas tendências narcísicas, e de tentativas de adaptação por demais completas, com cujos gastos afetivos eles não podem arcar, e que serão para eles a fonte de recalcamentos traumáticos. O isolamento total na natureza é uma solução válida, mas cuja indicação é puramente ideal.”

A estadia prolongada no meio familiar só fará provocar uma verdadeira estagnação afetiva, segunda anomalia, cujo efeito viria se acrescer ao distúrbio psíquico, que quase sempre foi determinado nesse próprio meio. Quando este meio, por fim, faltar (morte dos pais), a psicose encontraria, a clínica nos mostra a cada dia, seu terreno ótimo.”

A fórmula de atividade mais desejável para esses sujeitos é seu enquadramento numa comunidade laboriosa, à qual os liga um dever abstrato.” “Como professores, enfermeiras, ajudantes de laboratório ou de biblioteca, empregados, contramestres, eles revelarão qualidades morais de grande firmeza, ao mesmo tempo em que capacidades intelectuais em geral não-medíocres. Mas a sociedade moderna deixa o indivíduo num isolamento moral cruel, e de modo muito particularmente sensível nessas funções cuja situação intermediária e ambígua pode ser por si mesma a fonte de conflitos internos permanentes.”

Paris encerra, dispõe, consume ou consome a maior parte dos brilhantes infelizes cujos destinos foram chamados de profissões delirantes . . . Nomeio assim todos esses ofícios cujo principal instrumento é a opinião que se tem de si mesmo, e cuja matéria primeira é a opinião que os outros têm a seu respeito. As pessoas que os exercem, votadas a uma eterna candidatura, são necessariamente sempre afligidas por um certo delírio de grandeza que é atravessado e atormentado sem trégua por um certo delírio de perseguição. Neste povo de únicos reina a lei de fazer o que nunca ninguém fez, nem nunca fará. (…) Vivem apenas para obter e tomar duradoura a ilusão de serem sós, pois a superioridade não é senão uma solidão situada nos limites atuais de uma espécie. Cada um deles funda sua existência na inexistência dos outros, mas dos quais é preciso arrancar seu consentimento, o de que eles não existem. Eu me divirto, às vezes, com uma imagem física de nossos corações, que são feitos intimamente de uma enorme injustiça e de uma pequena justiça combinadas. Imagino que haja em cada um de nós um átomo importante entre nossos átomos, e constituído por dois grãos de energia que mais queriam é se separar. São energias contraditórias mas indivisíveis. A natureza as juntou para sempre, embora sejam furiosamente inimigas. Uma é o eterno movimento de um grande elétron posttivo, e este movimento inesgotável engendra uma seqüência de sons graves na qual o ouvido interior distingue sem nenhuma dificuldade uma profunda frase monótona: Há apenas eu. Há apenas eu. Há apenas eu, eu, eu . . . Quanto ao pequeno elétron radicalmente negativo, ele grita no ápice do agudo, fura e volta a furar de maneira mais cruel, o tema egotista do outro: Sim, mas há alguém… Sim, mas há alguém… Alguém, alguém, alguém... E outro alguém . . . Pois o nome muda com bastante freqüência . . .” Paul Valéry

O ENGAJAMENTO EM PEQUENAS ASSOCIAÇÕES DE INDIVÍDUOS COM FINS COMUNS COMO TERAPIA: “Sabe-se, por outro lado, que as tendências homossexuais recalcadas encontram nestas expansões sociais uma satisfação tanto mais perfeita quanto ao mesmo tempo é mais sublimada e mais garantida contra qualquer revelação consciente.” Realmente é assim: de células bolsonaristas a rodas literárias.

A técnica psicanalítica conveniente para estes casos ainda não está, segundo o testemunho dos mestres, madura. Aí está o problema mais atual da psicanálise e é preciso esperar que ele encontre sua solução. Pois uma estagnação dos resultados técnicos no seu alcance atual acarretaria logo o deperecimento da doutrina.”

urge corrigir as tendências narcísicas do sujeito por uma transferência tão prolongada quanto possível. Por outro lado, a transferência para o analista, despertando a pulsão homossexual, tende a produzir nesses sujeitos um recalcamento no qual a própria doutrina nos mostra o mecanismo maior do desencadeamento da psicose. (…) O mínimo que pode acontecer é o abandono rápido do tratamento pelo paciente. Mas, em nossos casos, a reação agressiva se dirige com muita freqüência contra o próprio psicanalista [e pra quem mais seria?], e pode persistir por muito tempo ainda, mesmo após a redução de sintomas importantes, e para o espanto do próprio doente. Por isso inúmeros analistas propõem, como condição primeira, a cura destes casos em clínica fechada. Notemos, entretanto, como uma outra antinomia do problema da psicanálise das psicoses, que a ação deste tratamento implica até aqui a boa vontade dos doentes como condição primeira.

PURO NADA TEÓRICO: “Por isso o problema terapêutico das psicoses nos parece tornar mais necessária uma psicanálise do eu do que uma psicanálise do inconsciente; quer dizer, é num melhor estudo das resistências do sujeito e numa experiência nova de sua <manobra> que ele deverá encontrar suas soluções técnicas.”

c.2) Métodos e Hipóteses de Pesquisa sugeridos por Nosso Estudo

Todo o delírio de Aimée, já o mostramos, pode, ao contrário, ser compreendido como uma transposição cada vez mais centrífuga de um ódio cujo objeto direto ela quer desconhecer. Curada, ela denega formalmente toda culpa que seria atribuída a esta irmã, apesar da atitude plenamente desumana que esta manifesta, então, para com ela.” Eu tenho uma tendência completamente centrípeta: a despeito de mim mesmo, só o que quero é me lembrar.

Parece-nos mesmo que ao conflito agudo e manifesto entre os pais correspondiam os raros casos de delírio paranóico precoce que vimos, a saber, em dois meninos de 14 e 16 anos: delírio nitidamente agressivo e reivindicador no mais jovem, delírio de interpretação típico no mais velho.”

Os pesquisadores italianos modernos, como já mencionamos anteriormente (cap. I, 1ª parte), esperam obter a chave das estruturas mentais da paranóia a partir de uma aproximação com as formas, definidas pelos sociólogos, do pensamento primitivo, chamado ainda de pensamento pré-lógico. Foram levados a esse caminho pelo espírito que sobrevive das teorias lombrosianas, e encontram o melhor apoio nos trabalhos da escola sociológica francesa contemporânea.”

esse caráter de necessidade pessoal que reveste para ela a obra literária, tudo isto se deve menos à psicose que aos traços precedentes? Certamente não, pois ela só conseguiu levar a cabo o que escreveu de melhor, e de mais importante, no momento mais agudo de sua psicose e sob a influência direta das idéias delirantes. A queda da psicose parece ter acarretado a esterilidade de sua pena. Não se pode dizer, ao contrário, que só uma instrução suficiente tanto dos meios de informação quanto de crítica, numa palavra, a ajuda social, faltou-lhe para que tenha realizado obra válida? Isto nos parece patente em inúmeras linhas de seus escritos. Todo aquele que nos lê evocará aqui, sem dúvida, o exemplo de um paranóico de gênio, de Jean-Jacques Rousseau. Consideremo-lo, pois, um instante, em função de nossa doente.” “Por outro lado, só um estudo histórico muito minucioso da atividade social e da atividade criadora do escritor poderia nos permitir julgar aquilo que seus próprios meios de expressão devem de positivo a sua anomalia mental: a saber, não só sua sensibilidade estética e seu estilo, mas seu poder de trabalho, suas faculdades de arrebatamento, sua memória especial, sua excitabilidade, sua resistência à fadiga, em suma, os diversos meios de seu talento e de seu ofício.”

MISTER INDIRETAS: “Nossa análise, manifestando a inanidade de toda gênese <racional> desses fenômenos,¹ retira todo valor dos argumentos puramente fenomenológicos sobre os quais certas doutrinas se fundam para opor radicalmente a interpretação, por um lado, e, por outro, os fenômenos <impostos>, xenopáticos, que chamamos ainda de <alucinatórios> por uma extensão admitida, embora discutível, do termo alucinação.”

¹ Nisso está plenamente certo.

Pode-se dizer que, ao contrário dos sonhos, que devem ser interpretados, o delírio é por si mesmo uma atividade interpretativa do inconsciente [e quem interpreta o delírio?]. Estamos diante de um sentido inteiramente novo que se oferece ao termo delírio de interpretação.”

Nada mais difícil de apreender que o encadeamento temporal, espacial e causal das intuições iniciais, dos fatos originais, da lógica das deduções, no delírio paranóico, seja ele o mais puro.”

O parentesco, por outro lado, das concepções que citamos com as produções míticas do folclore é evidente: mitos de eterno retorno, sósias e duplos dos heróis, mito da Fênix, etc.”

Notemos o seu parentesco mais inesperado com certos princípios gerais da ciência, a saber, os princípios de constância energética, ao menos na medida em que não os completam os princípios correlativos de queda e de degradação da energia. Este paralelo não surpreenderá aqueles para quem o belo livro de Meyerson (Cheminement de la pensée) houver mostrado a identidade formal dos mecanismos profundos de todo pensamento humano. Ele tornará claro, por outro lado, o fato, indicado por Ferenczi, da predileção manifesta em inúmeros paranóicos e parafrênicos (e também dementes precoces) pela metafísica e pelas doutrinas científicas que dela se aproximam.”

A última palavra da ciência é prever, e se o determinismo, o que acreditamos, se aplica em psicologia, deve nos permitir resolver o problema prático que a cada dia é colocado ao perito a propósito dos paranóicos, a saber, em que medida um sujeito dado é perigoso e, especialmente, é capaz de realizar suas pulsões homicidas.” “Os casos não são raros, na prática da perícia psiquiátrica, em que o assassinato constitui por si só todo o quadro semiológico da anomalia psíquica presumida.”

Um sujeito de que se pode dizer que levou uma vida exemplar pelo controle de si, pela doçura manifesta do caráter, pelo rendimento laborioso e pelo exercício de todas as virtudes familiares e sociais de repente mata: mata duas vezes e dois de seus mais próximos, com uma lucidez que revela a execução meticulosa dos crimes. Pensa em matar ainda e se matar em seguida, mas de repente se detém, como saciado. Ele vê o absurdo de seus crimes. Uma motivação, no entanto, o manteve até então: a de sua inferioridade, de seu destino votado ao fracasso. Motivação ilusória, pois nada em sua situação ia pior do que lhe era costumeiro, nem do que é comum a todos. Por um momento, no entanto, epifenômeno da impulsão-suicídio, o futuro se lhe afigurou fechado. Não quis abandonar os seus a suas ameaças, e começou o massacre. O primeiro crime, impulsivo, como acontece mais freqüentemente, mas preparado por uma longa obsessão; depois, no segundo crime, execução calculada, minuciosa, refinada. O exame psiquiátrico e biológico dos peritos, a observação prolongada durante vários meses em nosso serviço, só apresentaram depois do drama resultados totalmente negativos.” “Sua conduta sem faltas, a doçura quase humilhada de todo seu comportamento, em particular conjugal, assumem, só depois, um valor sintomático.”

o perigo maior, mais imediato, mais dirigido também, que os querelantes apresentam, depende do fato de que neles o impulso homicida recebe o concurso energético da consciência moral, do supereu, que aprova e justifica o impulso. Sem dúvida, a forma sem máscara sob a qual a obsessão criminosa aparece aqui na consciência e a hiperestenia hipomaníaca concomitante se devem a esta situação afetiva, que se apresenta como o inverso do complexo de autopunição. Ao contrário, nas psicoses autopunitivas, que, como já mostramos, se traduzem clinicamente por um delírio de interpretação, as energias autopunitivas do supereu se dirigem contra as pulsões agressivas provenientes do inconsciente do sujeito, e retardam, atenuam e desviam sua execução.”

Longe de se lastimar, como, com efeito, faz o querelante, por um prejuízo preciso, realizado, que é preciso fazer com que seu autor pague, o interpretativo crê sofrer por parte de seus perseguidores danos cujo caráter ineficaz, sempre futuro, puramente demonstrativo, é surpreendente para o observador, se ele escapar, aliás, à crítica do sujeito. Na maioria das vezes, é somente após um período não apenas dubitativo, mas longânime, que os sujeitos chegam a reagir. Mesmo esta reação, como aparece em nossa doente, terá primeiro um caráter por si mesmo demonstrativo, um valor de advertência, que deve freqüentemente permitir prevenir outros mais graves: o que, como já vimos, seguramente teria podido ser feito em nossa doente. Vê-se, enfim, que na medida mesma em que a reação assassina vai atingir um objeto que só suporta a carga de um ódio diversas vezes transferido, a própria execução, ainda que preparada, é com bastante freqüência ineficaz por falta de estenia.”

Inúmeros desses casos vêm à nossa memória: um desses sujeitos, de origem estrangeira, após dez anos de perseguição delirante, suportada sem reação grave, vai ter na casa de um banqueiro de sua nacionalidade, que ele implicou, sem conhecê-lo, na conspiração de seus inimigos, e o abate com cinco tiros de revólver. Notemos que, nesses casos, se o alívio afetivo se produz após o assassinato, a convicção delirante persiste.”

III. EXPOSIÇÃO CRÍTICA, REDUZIDA EM FORMA DE APÊNDICE, DO MÉTODO DE UMA CIÊNCIA DA PERSONALIDADE E DE SEU ALCANCE NO ESTUDO DAS PSICOSES

É o postulado que cria a ciência, e a doutrina, o fato.”

É de uma confusão bastarda desses dois primeiros pontos de vista [intuitivo-lingüístico x metafísico-fenomenológico], um e outro excluídos pelas próprias condições da ciência, que nasceu a doutrina das constituições psicopatológicas. Essa doutrina estava, portanto, destinada a se esgotar, no plano dos fatos, nesse verbalismo puro nas especulações escolásticas mais vazias de substância.

O ponto de vista do social no fenômeno da personalidade nos oferece, ao contrário, uma dupla tomada científica: nas estruturas mentais de compreensão que engendra de fato, ele oferece uma armadura conceitual comunicável; nas interações fenomenais que ele apresenta, ele oferece fatos que têm todas as propriedades do quantificável, pois são moventes, mensuráveis, extensivos.

(…)

Mas, inversamente, pela via dessas relações de compreensão, é o próprio individual e o estrutural [intuitivo e metafísico] que visamos a atingir, tão longe quanto possa ser cingido o concreto absoluto.”

fazemos uma hipótese: se rejeitamos aquelas das doutrinas clássicas, não deixamos nunca nós mesmos de pretender forjar uma. Essa hipótese, é que existe um determinismo que é específico da ordem definida nos fenômenos pelas relações de compreensibilidade humana. Esse determinismo, nós o chamamos de psicogênico. Essa hipótese merece o título de postulado; indemonstrável com efeito e pedindo um assentimento arbitrário, ela é em todos os pontos homóloga aos postulados que fundam legitimamente qualquer ciência e definem para cada uma, ao mesmo tempo, seu objeto, seu método e sua autonomia.”

Pode-se dizer que esta ciência é o complemento filosófico da ciência positiva, complemento tanto mais útil que, ao ignorar seu domínio, corre-se o risco de introduzir nessas matérias delicadas graves confusões metódicas.”

a idéia que funda a caracterologia de Klages, e que ele exprime como a manifestação na ordem humana de um conflito entre o Espírito e a Vida. Consideramos que tal ponto de vista não tinha lugar em um trabalho que se apresenta como inaugural de um método rigoroso em uma ciência puramente positiva. Notemos, no entanto, que ele não deixa de trazer clarezas profundas sobre o caso fundamental do nosso estudo.”

Ao leitor curioso por se iniciar nos problemas próprios da fenomenologia da personalidade, indiquemos, além dos trabalhos de uma exposição muito rigorosa de Klages, um livro que, por ser de uma composição um pouco confusa, permanece bastante sugestivo: o de Max Scheler, Nature et Formes de la Sympathie (trad. fran. de Lefebvre, Payot); particularmente as pp. 311-84, em que é estudado o problema, tão fundamental para toda a psiquiatria e psicologia empírica, dos fundamentos fenomenológicos do eu de outrem.”

Na tripla preeminência desses dados até aqui desconhecidos na psicose, a saber das anomalias do comportamento sexual, do papel eletivo de certos conflitos e de seu elo com a história infantil, não podemos deixar de reconhecer as descobertas da psicanálise sobre o papel primordial, em psicopatologia, da sexualidade e da história infantis.”

O único dado da técnica psicanalítica que tivemos em conta foi o valor significativo que atribuímos às resistências da personalidade do sujeito, ou seja, particularmente a seus desconhecimentos e denegações sistemáticos. Mas trata-se aí de uma reação psicológica cujo alcance, por ter sido brilhantemente utilizado pela psicanálise, nem por isso deixa de ter sido reconhecido bem anteriormente ao aparecimento desta ciência. Que nos seja suficiente, sem remontar mais acima, evocar a ênfase dada a essa reação pelos ensaístas e moralistas da tradição francesa, de La Rochefoucauld a Nietzsche.

dado o pouco de realidade apreendido até aqui pela nascente ciência da personalidade, estes postulados parecem oferecer apenas um pequeno ponto de apoio ao pensamento, sobretudo para os espíritos que se formaram somente nas representações da clínica, e cuja reflexão, por esse fato mesmo, não pode prescindir de imagens intuitivas.” Hoje mesmo li um parágrafo praticamente idêntico em Jung!

Lacan diz de forma um pouco mais polida: A Psicanálise permite-nos concluir que nossa paciente psicótica é lésbica, sádico-anal e incestuosa.

Filha de neurose, psicosinha é.

A própria noção de fixação narcísica, sobre a qual a psicanálise funda sua [a-]doutrina das psicoses, permanece muito insuficiente, como manifesta bem a confusão dos debates permanentes sobre a distinção do narcisismo e do auto-erotismo primordial – sobre a natureza da libido que concerne o eu (o eu sendo definido por sua oposição ao isso a libido narcísica provém do eu ou do isso?); sobre a natureza do próprio eu

¹ O problema capital da Psicanálise: eu e isso não podem ser opostos quando, de uma perspectiva nietzscheana, p.ex., muito mais lúcida e inclusive didática, eu e isso não passam de partições arbitrárias do próprio inconsciente. E mesmo no sistema formal estilizado do freudismo clássico a eterna necessidade de montar uma tópica tripartite nunca casa com necessidades terapêuticas de pacientes para-neuróticos (ou com a explicação da própria alma humana): como explicar que a instância da censura (supereu) não seja, ela sim, a que se opõe diametralmente ao isso, o inconsciente mais arcaico e profundo? Além disso, se não se considera o eu como contido no inconsciente, o problema só piora: ele está parte dentro, parte fora? Como é isso? Se queriam uma unidade mediadora, não deviam criar uma instância ex nihilo só para isso, sob pena de ter de lidar com “estrelas-do-mar que crescem dos braços amputados de uma primeira estrela-do-mar que se tentou matar”! E como se chama ou se dá a mediação isso-eu, e a eu-supereu? Existe mediação isso-supereu (sim, claro que existe, mas um freudiano ata suas mãos com seus a priori incautos – era para ser esse fraturado eu que acaba tendo uma identificação meramente negativa!)? O freudiano diria: isso e eu são polares, e mesmo com uma instância ‘no meio’, se relacionam – porém, objeta-se com bom senso: como o eu mais espontâneo estaria na periferia a consciência e o órgão de controle superegóico (a sociedade, os pais) por detrás, quando é visivelmente o inverso?!? Em suma, quanto mais se chafurda no “pseudo-empiricismo freudista”, mais a questão fica confusa e abstrata, senão insultante! Se não se deseja abrir mão de “um eu parte consciente, parte inconsciente”, melhor seria, para início de conversa, voltar a Nietzsche. Há um consciente e inconsciente, basta. Consciente e inconsciente são sistemas interrelacionados umbilicalmente. Basta. Ou, para ser ainda mais direto: só o que existe é o Inconsciente, sendo o consciente a ponta de fenômeno visível do iceberg humano. O resto não passa de especulação de vigaristas aproveitadores.

Narcisismo e punheta são sinônimos em diferentes níveis lingüísticos.

Deus sofre de despersonalização aguda grave.

Sabe-se, com efeito, que as primeiras bases desta concepção [revisionista do narcisismo – um primeiro cisma com Freud antes da segunda tópica de Freud?] são lançadas em um estudo de Abraham sobre a demência precoce, datado de 1908 [Die psychosexuellen Differenzen der Hysterie und der Dementia praecox].” Uma cratera lunar perto do sistema solar da loucura… Cem aninhos somente…

Digamos, no entanto, que a nosso ver a oposição freudiana do eu e do isso parece sofrer de uma dessas confusões, cujo perigo sublinhamos antes, entre as definições positivas e as definições gnoseológicas que se podem dar dos fenômenos da personalidade. Em outras palavras, a concepção freudiana do eu nos parece pecar por uma distinção insuficiente entre as tendências concretas, que manifestam esse eu e apenas como tais dependem de uma gênese concreta, e a definição abstrata do eu como sujeito do conhecimento.” “esse princípio de realidade só se distingue do princípio do prazer num plano gnoseológico e, assim sendo, é ilegítimo fazê-lo intervir na gênese do eu, uma vez que ele implica o próprio eu enquanto sujeito do conhecimento.”

Esse supereu, Freud o concebe como a reincorporação (termo aqui justificado, apesar de sua estranheza aparente no estudo de fenômenos psíquicos), como a reincorporação ao eu, de uma parte do mundo exterior. Essa reincorporação incide sobre os objetos cujo valor pessoal, do ponto de vista genético social em que nós mesmos definimos este termo, é maior: com efeito, ela incide nesses objetos que resumem em si mesmos todas as coerções que a sociedade exerce sobre o sujeito, sejam os pais ou seus substitutos. Como explicar essa reintegração? Por um fim puramente econômico, isto é, inteiramente submetido ao princípio do prazer.

Podemos observar que o sujeito é aliviado da tirania dos objetos externos na medida dessa introjeção narcísica, mas na medida também em que, em razão dessa introjeção mesma, ele reproduz esses objetos e lhes obedece.

Em que medida todas as funções intencionais do eu e mesmo as primeiras definições objetivas se engendram de maneira análoga, é o que só podemos esperar saber mediante as vias de pesquisas futuras, dentre as quais o estudo das psicoses ditas discordantes parece nos oferecer esperanças maiores.”

a questão que se coloca é a de saber se todo conhecimento não é de início conhecimento de uma pessoa antes de ser conhecimento de um objeto, e se a própria noção de objeto não é, para a humanidade, uma aquisição secundária.”

vemos que se nos impõem, no estudo genético e estrutural dessas tendências concretas, noções de equivalência energética que só podem ser fecundas. Essas noções, aliás, introduzem-se por elas próprias em toda pesquisa psicológica, uma vez que esta última vise aos fenômenos concretos.”

Sem esse recurso ao conceito energético, por exemplo, a concepção kretschmeriana dos caracteres permanece ininteligível.”

As pesquisas epistemológicas mais recentes demonstraram abundantemente que é impossível pensar cientificamente, e mesmo pensar simplesmente, sem implicar de algum modo os dois princípios fundamentais de uma certa constância assim como de uma certa degradação de uma entidade, a qual desempenha um papel substancial em relação ao fenômeno. A essa entidade, a noção de energia fornece sua expressão mais neutra e mais comumente empregada. De nossa parte, ressaltemos aí, de passagem, a aura que ela parece conservar da gênese, que é preciso lhe atribuir, como a tantas outras formas de estruturas conceituais, de uma intencionalidade primitivamente social.”

Nenhum estudo da psicose passional, na literatura francesa, parece-nos demonstrar maior penetração clínica e justeza na indicação das sanções sociais do que a bela monografia de Marie Bonaparte sobre o caso, que apaixonou a opinião pública, da sogra assassina, Sra. Lefebvre.”

Somente o exame da continuidade genética e estrutural da personalidade nos elucidará, com efeito, em que casos de delírio se trata de um processo psíquico e não de um desenvolvimento, isto é, em que casos se deve reconhecer a manifestação intencional de uma pulsão que não é de origem infantil, mas de aquisição recente e exógena, e de tal ordem que, de fato, certas afecções, como a encefalite letárgica, fazem-nos conceber sua existência, ao nos demonstrar seu fenômeno primitivo.”

Este <paralelismo> [automatismo mental], que supõe que toda representação é produzida por uma reação neurônica qualquer, arruína radicalmente toda e qualquer objetividade. Basta ler o livro de Taine sobre A inteligência, que dá a essa doutrina sua mais coerente exposição, para se convencer de que ela não permite de modo algum conceber em que diferem, por exemplo, a percepção e a alucinação. Aliás, Taine induz logicamente uma definição da percepção como <alucinação verdadeira>, que é a definição mesma do milagre perpétuo. Ao menos Taine concebia as conseqüências de sua doutrina. Mas seus epígonos, nossos contemporâneos, não se sentem mais embaraçados com elas. Eles as ignoram tranqüilamente. Desconhecendo o alcance heurístico dos preceitos de seus antecessores, eles os transformam nos propósitos sem conteúdo de uma rotina intelectual, e acreditam suprir, na observação dos fenômenos, os princípios de objetividade mediante afirmações gratuitas sobre sua materialidade.”

Vê-se aqui nosso acordo com a crítica definitiva das localizações cerebrais feita por Bergson em Matière et Mémoire. O conhecimento aprofundado dessa obra deveria ser, ousamos dizer, exigido de todos aqueles a que se confira o direito de falar de psicopatologia.”

Vê-se que, em nossa concepção, aqui concordante com Aristóteles, o meio humano, no sentido que lhe dá Uexküll, seria por excelência o melo social humano. Inútil ressaltar o quanto essa concepção se opõe às doutrinas, aliás arruinadas, da antropologia individualista do século XVIII, e particularmente a uma concepção como a do Contrato social de Rousseau, cujo caráter profundamente errôneo, de resto, assinala diretamente a estrutura mental paranóica própria de seu autor.”

se define o delírio como a expressão, sob as formas da linguagem forjadas pelas relações compreensíveis de um grupo, de tendências concretas cujo insuficiente conformismo às necessidades do grupo é desconhecido pelo sujeito. Esta última definição do delírio permite conceber, de um lado, as afinidades observadas pelos psicólogos entre as formas do pensamento delirante, e as formas primitivas do pensamento; de outro, a diferença radical que as separa pelo único fato de que umas estão em harmonia com as concepções do grupo e as outras não.”

Estejamos certos de que aqueles que não julgam esses esclarecimentos necessários, que são, convenhamos, de ordem metafísica, fazem eles próprios, sem que disso suspeitem, uma metafísica, mas da ruim, atribuindo constantemente a este fenômeno mental, definido só por sua estrutura conceitual – como a paixão, a interpretação, a fantasia imaginativa, o sentimento de xenopatia –, o alcance de um sintoma objetivo sempre equivalente a si mesmo.”

CONCLUSÕES

Uma medida válida dessas tendências só pode ser dada por um estudo experimental do sujeito, do qual, até o presente momento, somente a psicanálise nos oferece a técnica aproximada. Para essa avaliação, a interpretação simbólica do material das imagens vale menos a nossos olhos do que as resistências pelas quais se mede o tratamento. Em outros termos, no estado atual da técnica, e supondo-a perfeitamente conduzida, os fracassos do tratamento possuem, para a disposição à psicose, um valor diagnóstico igual e superior às suas revelações intencionais. Somente o estudo dessas resistências e desses fracassos poderá fornecer as bases da nova técnica psicanalitica, da qual esperamos, no que diz respeito à psicose, uma psicoterapia dirigida.”

PRIMEIROS ESCRITOS SOBRE A PARANÓIA

O PROBLEMA DO ESTILO E A CONCEPÇÃO PSIQUIÁTRICA DAS FORMAS PARANÓICAS DA EXPERIÊNCIA

Entre todos os problemas da criação artística, o que mais imperiosamente requer – e até para o próprio artista, acreditamos – uma solução teórica, é o do estilo.” “Segundo a natureza desta idéia, o artista, com efeito, conceberá o estilo como o fruto de uma escolha racional, de uma escolha ética, de uma escolha arbitrária, ou então ainda de uma necessidade sentida cuja espontaneidade se impõe contra qualquer controle, ou mesmo que é conveniente liberá-la por uma ascese negativa.”

esses postulados estão suficientemente integrados à linguagem corrente para que o médico que, dentre todos os tipos de intelectuais, é o mais constantemente marcado por um leve retardamento dialético, não houvesse acreditado ingenuamente que pudesse reencontrá-los nos próprios fatos. Além disso, não se deve desconhecer que o interesse pelos doentes mentais nasceu historicamente de necessidades de origem jurídica.”A partir daí, a questão maior que se colocou à ciência dos psiquiatras foi aquela, artificial, de um tudo-ou-nada da degradação mental (art. 64 do Código Penal).” “É o triunfo do gênio intuitivo próprio à observação, que um Kraepelin, ainda que engajado completamente nesses preconceitos teóricos, tenha podido classificar, com um rigor ao qual quase nada se acrescentou, as espécies clínicas cujo enigma devia, através de aproximações freqüentemente bastardas (de que o público retém apenas as senhas: esquirofrenia, etc.), engendrar o relativismo noumenal inigualado pelos pontos de vista ditos fenomenológicos da psiquiatria contemporânea. Essas espécies clínicas nada mais são que as psicoses propriamente ditas (as verdadeiras <loucuras> do vulgo).”

o delírio se revela, com efeito, muito fecundo em fantasias de repetição cíclica, de multiplicação ubiquista, de retornos periódicos sem fim dos mesmos acontecimentos, em pares e triplas dos mesmos personagens, às vezes como alucinações de desdobramento da pessoa do sujeito. Essas intuições são manifestamente próximas de processos muito constantes da criação poética e parecem uma das condições da tipificação, criadora do estilo.”

Os delírios, com efeito, não têm necessidade de nenhuma interpretação para exprimir, só por seus temas, e à maravilha, esses complexos instintivos e sociais que a psicanálise teve grande dificuldade em descobrir entre os neuróticos.”

pode-se afirmar que Rousseau, para quem o diagnóstico de paranóia típica pode ser aplicado com a maior certeza, deve a sua experiência propriamente mórbida a fascinação que exerceu em seu século por sua pessoa e por seu estilo.”

o gesto criminoso dos paranóicos comove às vezes tão longe a simpatia trágica, que o século, para se defender, não sabe mais se ele deve despojá-lo de seu valor humano ou então oprimir o culpado sob sua responsabilidade.”

MOTIVOS DO CRIME PARANÓICO: O CRIME DAS IRMÃS PAPIN

o drama se desencadeia muito rapidamente, e sobre a forma do ataque é difícil admitir uma outra versão que a que deram as irmãs, a saber, que ele foi súbito, simultâneo, levado de saída ao paroxismo do furor: cada uma delas subjuga uma adversária, arranca-lhe, em vida, os olhos da órbita – fato inédito, dizem, nos anais do crime – e a espanca. Depois, com a ajuda do que encontram a seu alcance, martelo, pichel de estanho, faca de cozinha, elas se encarniçam no corpo de suas vítimas, esmagam-lhes as faces, e, deixando à mostra o sexo delas cortam profundamente as coxas e as nádegas de uma para ensagüentar as da outra. Lavam, em seguida, os instrumentos desses ritos atrozes, purificam-se a si mesmas, e deitam-se na mesma cama: <Agora está tudo limpo!>”

No decorrer de uma outra crise, ela tenta arrancar os olhos, por certo que em vão, porém com algumas lesões. A agitação furiosa necessita desta vez a aplicação de camisa-de-força; ela se entrega a exibições eróticas, depois aparecem sintomas de melancolia: depressão, recusa de alimentos, auto-acusação, atos expiatórios de um caráter repugnante; depois disso, várias vezes, ela diz frases de significação delirante. Lembremos que a declaração de Christine de ter simulado tais estados não pode de modo algum ser tida como a chave real de sua natureza: o sentimento de jogo é nesse caso freqüentemente sentido pelo sujeito, sem que seu comportamento seja por isso menos tipicamente mórbido.

A 30 de setembro, as irmãs são condenadas pelo júri. Christine, entendendo que sua cabeça será cortada na praça de Mans, recebe esta notícia de joelhos.

Contudo, as características do crime, os problemas de Christine na prisão, a estranheza da vida das irmãs, haviam convencido a maioria dos psiquiatras da irresponsabilidade das assassinas.”

Christine pergunta como estão passando suas duas vítimas e declara que acredita que elas voltaram num outro corpo”

É provável mesmo que elas sairiam dos quadros genéricos da paranóia para entrar no das parafrenias, isolado pelo gênio de Kraepelin como formas imediatamente contíguas.”

Ouviu-se, no decorrer dos debates, a surpreendente afirmação de que era impossível que dois seres fossem tomados juntos pela mesma loucura, ou antes a revelassem simultaneamente. É uma afirmação completamente falsa. Os delírios a dois estão dentre as formas das psicoses reconhecidas desde há muito. As observações mostram que eles se produzem eletivamente entre parentes próximos, pai e filho, mãe e filha, irmãos e irmãs.” “Nossa experiência precisa destes doentes nos fez hesitar, contudo, diante da afirmação, sobre a qual muitos passam por cima, da realidade de relações sexuais entre as irmãs. Por isso é que somos gratos ao doutor Logre pela sutileza do termo <casal psicológico>, em que se percebe sua reserva quanto a este problema. Os próprios psicanalistas, quando fazem derivar a paranóia da homossexualidade, qualificam esta homossexualidade de inconsciente, de <larvar>. Essa tendência homossexual só se exprimiria por uma negação apaixonada de si mesma, que fundaria a convicção de ser perseguido e designaria o ser amado no perseguidor. Mas o que é esta tendência singular que, tão próxima assim de sua revelação mais evidente, ficaria sempre dela separada por um obstáculo singularmente transparente?”

O <mal de ser dois> de que sofrem esses doentes pouco os libera do mal de Narciso.”

parece que entre elas as irmãs não podiam nem mesmo tomar a distância que é preciso para se matar. Verdadeiras almas siamesas, elas formam um mundo para sempre fechado; lendo seus depoimentos depois do crime, diz o doutor Logre, <tem-se a impressão de estar lendo duplo>. Com os únicos meios de sua ilhota, elas devem resolver seu enigma, o enigma humano do sexo.”

Que longo caminho de tortura ela teve de percorrer antes que a experiência desesperada do crime a dilacerasse de seu outro si-mesmo, e que ela pudesse, depois de sua primeira crise de delírio alucinatório, em que ela acredita ver sua irmã morta, morta sem dúvida por esse golpe, gritar, diante do juiz que as confronta, as palavras da paixão manifesta: <Sim, digo sim.>”

A curiosidade sacrílega que constitui a angústia do homem desde as priscas eras, é ela que as anima quando desejam suas vítimas, quando elas acossam em suas feridas hiantes [escancaradas] o que Christine mais tarde, perante o juiz, devia chamar, em sua inocência, <o mistério da vida>.”

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Abraham, Versuch einer Entdwicklungsgeschichte der Libido

Aravantinos, Esculape et les Asclépiades, 1907. [Livro sobre as observações psiquiátricas da Antiguidade]

Chaslin, La Confusion mentale primitive

Delmas, La Personnalité humaine

Exposito, Sulle natura e Sull’unità delle cosidette psicosi affective (artigo)

Ey, La notion de constitution, Essai critique (artigo)

Génil-Perrin, Les Paranoïaques

Heuyer, Le devinement de la pensée, 1926. (artigo)

Janet, Obsessions et psychasthénie

Jaspers, Psicopatologia Geral (favoritos – passeidireto)

Jung, Der Inhalt der Psychosen

Keraval, Des délires plus ou moins cohérents désignés sous le nom de paranoïa (artigo)

Lasègue, “Délire des persécutions”, in Études médicales, t. I.

Legrand du Saulle, Délire de persécution (sobre a coincidência do mesmo distúrbio em pares familiares)

Pode-se ler aí, entre outros fatos, que o ancestral da linhagem, paranóico hipocondríaco, aterrorizava seus filhos com ameaças de morte – que fazia uso de sua filha, a mais inteligente das crianças e sua preferida, para escrever enquanto ditava suas memórias –, que, enfim, irritando-se com suas próprias dificuldades de estilo (sintoma paranóico), <mandava sua filha embora brutalmente ou a retinha para fazê-la dependurar-se numa porta até que caísse em síncope>. Não é de espantar então que após uma educação como esta, a menina, de todas as crianças, viesse [a] apresentar, por volta dos 50 anos, <um delírio de perseguição dos mais intensos com insuperáveis tendências ao suicidio>.”

Meyer, “What do histories of cases of insanity teach us concerning preventive mental hygiene during the years of school life”, in Psychological Clinic, 1908, t. II.

Régis, Les Régicides, 1890.

Russell, Analyse de l’esprit

Séglas, La Paranoïa, historique et critique

Sérieux & Capgras, Les folies raisonnantes [As loucuras racionais][*], 1906.

[*] SOBRE A OPÇÃO DE TRADUÇÃO DO TÍTULO: “Consultar a tradução brasileira de Paulo César Geraldes & Sonia Ioannides (sob supervisão de Ulysses Vianna Filho) do Manual de Psiquiatria, de Henri Ey, Ed. Masson, Rio, 1981.

Tanzi & Lugaro, Trattato delle malattie mentali, t. II.

Tarde, Philosophie pénale, 1890.

White & Jelliffe, The philosophy of occupation therapy, in Arch. of occupational therapy, z.

ÉCRITS «INSPIRÉS»: SCHIZOGRAPHIE – Lacan, en collaboration avec Lévy-Valensi et Migault, 1931. In: Annales médico-psychologiques, t. II. Traduzido. Íntegra em https://escritosavulsos.com/1931/11/12/escritos-inspirados-esquizografia/

Gaëtan Gatian de Clérambault [1872-1934] é considerado, por muitos, o último e mais brilhante dos clássicos. Obteve, em 1905, o cargo de médico adjunto da Enfermaria Especial do Comando de Polícia, onde já era interno de Paul-Émile Garnier [1848-1905]. Com a morte de Ernest Dupré [1862-1921], que havia sido seu professor, torna-se médico-chefe da instituição. Lacan o considerava seu <único mestre em psiquiatria> (cf. C.M. Ramos Ferreira; J. Santiago [2014] Apresentação de pacientes: Clérambault, mestre de Lacan. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, vol. 17, n. 2. São Paulo, junho de 2014. Disponível em: <dx.doi.org/10.1590/1984-0381v17n2a05>). Ademais, cumpre notar que Clérambault entendeu o presente artigo como sendo uma divulgação não-autorizada das suas próprias ideias a respeito da paranoia, de modo que Lacan suprimirá o texto quando da reedição de sua tese de doutorado, onde figurarão outros de seus <Primeiros escritos sobre a paranoia>. (N. do T.)”

Jules Séglas [1856-1939] — alienista hospitalar entre os anos de 1886 e 1921 e presidente da Sociedade Médico-Psicológica (1908) — vinha minorando, desde o ano de 1914, o aspecto sensório-motor do fenômeno alucinatório; aproximava-o, assim, ainda mais do delírio e, portanto, de certa psicogên[e]se da alucinação. Anos depois, criticará sua primeira teoria da alucinação, baseada na excitação dos <centros nervosos> — teoria que, na época, já não sustentava mais a comparação com a clínica moderna da afasia. Com isso, a clínica da alucinação vai se articulando com a ideia de uma patologia da linguagem interna, e as alucinações psicomotoras acabam se equivalendo a uma exofasia (a linguagem interna se aliena do sujeito e o pensamento se articula quase que automaticamente em movimento). Séglas distingue isso da hiperendofasia, que seria o excesso da linguagem interna — que ele acredita estar mais próximo da auditivação e da perseguição. Cf. P. La Sagna, ‘Séglas et le système de l’Autre Méchant’, La cause freudienne, vol. 74, n. 1, pp. 201-221. Disponível em: <www.cairn.info/revue-la-cause-freudienne-2010-1-page-201.htm>. Cf. também: J. Séglas, ‘Hallucinations psychiques et pseudo-hallucinations verbales’, Journal de psychologie normale et pathologique, vol. 11, 1914. (N. do T.)”

Mentismo noturno: “De acordo com o alienista Philippe Chaslin [1857-1923], trata-se de um fluxo rápido e incontrolável de pensamentos e imagens que o sujeito não consegue interromper, tipicamente acompanhado de ansiedade e ocorrendo geralmente quando se está para dormir, causando insônia. (N. do T.)”

Georges Clemenceau [1841-1929] foi um médico francês que cedo se tornaria estadista, integrando a Assembleia Nacional. Atuando como jornalista, fundou o periódico La Justice e foi o responsável pela publicação do famigerado J’accuse de Émile Zola, em 13 de janeiro de 1898, no jornal L’Aurore, do qual era editor-chefe. Foi senador e primeiro-ministro, chefiando o país durante a Primeira Guerra Mundial. (N. do T.)”

Acreditei compreender que estão fazendo do meu caso uma questão parlamentar… mas é tão velado, tão difuso”

Lipotimia: “Perda de força muscular, porém sem perda de consciência, com conservação das funções respiratória e cardíaca. É acompanhada de palidez, suores frios, vertigens, zumbido nos ouvidos e a impressão de desmaio iminente. (N. do T.)”

Acrescentemos aqui algumas notas sobre o estado somático da doente. Elas são negativas, sobretudo. Cumpre reter: uma gripe em 1918 [isso é grave, doutor!!]; um cafeinismo evidente; um regime alimentar irregular; um tremor nítido e persistente nos dedos” Oops…

A LÍNGUA ESTÁ SEMPRE VOLTANDO: “Em todo caso, vale ressaltar que, no campo dos estudos da linguística diacrônica, reconhece-se a presença da forma amur na linha histórica que culmina no termo francês moderno — de modo que o neologismo da paciente poderia ser entendido, de certa maneira, também como um arcaísmo. Cf. Christian Schmitt, ‘Cultisme ou Occitanisme? Étude sur la provenance du français amour et ameur’, Romania, 1973, vol. 376, pp. 433-462. Disponível em: <www.persee.fr/doc/roma_0035-8029_1973_num_94_376_2386>. (N. do T.)”

Eu sou irmão do rato mau que te enrouca se você faz a rota da mãe do sabiá fuinha e refeito de pinho, mas, se você é sol e poeta de feitos, eu banco o Revisto, desse lugar eu vou sair. Botei a pata no teu patavina. Tempestade é uma ova, tua cova compro eu Senhor.

Marcelle Ch. no xadrez é nada cortês com os poetas sem vez, mas deixa cem vez mais esquifes que mil patifes.

Genin.(*)”

Em 10 de novembro pede-se à doente que escreva aos médicos uma carta curta em estilo normal. Ela logo o faz, em nossa presença e com sucesso. Pede-se a ela, em seguida, que escreva um post-scriptum seguindo as suas <inspirações>. Aqui está o que ela nos oferece:

Post-Scriptum inspirado.

Queria descobri-los os mais inéditos senhores na marmota do mico mas estão aterrados porque os odeio a ponto de querê-los todos salvos. Fé d’Arma e de Marna para ensafadá-los e fazê-los chorar o fardo alheio, o meu não.

Marna do diabo.”

Vale lembrar que Marne au diable [Marna do diabo] evoca La mare au diable [O charco do diabo], o título de um romance campestre da autoria de George Sand [1804-1876] e que havia sido publicado em 1846. O livro conta a história de Germain(*), um jovem viúvo que, após cair num luto profundo com o falecimento da esposa — que havia deixado o marido e três filhos —, procura se casar novamente, encorajado pelo sogro. Ao saber que havia uma viúva numa região vizinha (Catherine Guerin) que também estava procurando se casar de novo, Germain vai ao seu encontro acompanhado de Marie — uma moça cuja guarda lhe foi confiada e irá trabalhar numa fazenda perto do local onde mora a viúva — e de um dos filhos, que embarca clandestinamente na viagem. No entanto, um temporal tira o grupo do caminho, fazendo com que busquem refúgio numa floresta, onde passam a noite ao lado de um charco — episódio decisivo para o restante da história. (N. do T.)”

Frequentemente o fim da carta preenche a margem. Nenhuma outra originalidade de disposição. Não há sublinhados.

Nenhuma rasura. O ato de escrever, quando o testemunhamos, realiza-se sem interrupção, como que sem pressa.”

A doente afirma que aquilo que ela exprime lhe é imposto, não de uma forma irresistível — nem mesmo rigorosa —, mas de um modo já formulado. É, no sentido forte do termo, uma inspiração.

Essa inspiração não a perturba quando escreve uma carta em estilo normal na presença do médico. Ela advém, em contrapartida — e, ao menos episodicamente, é sempre acolhida —, quando a doente escreve sozinha. Mesmo numa cópia dessas cartas, destinada a ser guardada, ela não descarta uma modificação do texto que lhe é <inspirada>.”

Para os escritos recentemente compostos, na maioria das vezes ela oferece interpretações que aclaram o mecanismo de sua produção. Só nos damos conta disso quando nos submetemos a uma análise objetiva. Com Pfersdorff, atribuímos a toda interpretação dita <filológica> um valor apenas de sintoma.” Nota do tradutor: “Charles Pfersdorff [1875-1953], médico que havia se formado na Kaiser-Wilhelms-Universität (Estrasburgo), passou a atuar como assistente na Clínica Médica do Hospital Civil da cidade em 1899. Foi para Viena em 1901 a fim de estudar seis meses com Richard von Krafft-Ebing [1840-1902]; e no ano seguinte, para Heidelberg, onde estudou com Emil Kraepelin [1856-1926] durante um ano. Já tendo atuado como professor na Universidade de Estrasburgo antes da Guerra — que o levou à frente de batalha, mantendo-o afastado da docência —, retorna à cidade em 1917 e, em 1919, assume a cátedra de psiquiatria, da qual será titular até o ano de 1945. Suas contribuições se deram em torno de três temas principais: a demência precoce, a esquizofrenia (especialmente do ponto de vista dos aspectos linguísticos) e as crianças com deficiência intelectual.”

estado de estenia que acompanha as inspirações”

Eu faço a língua evoluir. É preciso sacudir todas essas velhas formas”

Henry Head [1861-1940] foi um neurologista inglês que realizou pesquisas pioneiras no campo dos sistemas sensoriais. Seu último grande trabalho, Aphasia and kindred disorders of speech [Afasia e outros distúrbios da fala aparentados], foi avaliado por Macdonald Critchley (The black hole and other essays [London: Pitman, 1964]) como <a melhor monografia sobre o tema da afasia na literatura neurológica”. Ao descrever a “afasia semântica> nessa obra, Head propõe um vínculo entre os aspectos linguísticos e intelectuais da fala, algo cujas implicações posteriormente receberiam crédito e ampliação de afasiologistas moderno[s]. (N. do T.)”

Numa primeira abordagem eles estão reduzidos ao mínimo. Contudo, encontram-se elisões silábicas que incidem frequentemente — ponto digno de nota — na primeira sílaba; assaz frequentemente o esquecimento de uma partícula, no mais das vezes de uma preposição: por ou de etc. Acaso se trata daqueles curtos barramentos ou inibições do curso do pensamento que fazem parte dos sutis fenômenos negativos da esquizofrenia? O fato é ainda mais difícil de afirmar por conta de a doente dar dele interpretações delirantes. Ela suprimiu esse e ou aquele de porque ele teria botado a sua iniciativa a perder. Nos escritos ela faz alusão a isso.”

A ruminação mental consiste no retorno obsedante dos mesmos pensamentos improdutivos ou das mesmas preocupações, dominados pela dúvida, sem que possam ser descartados da consciência. (N. do T.)”

as palavras pamonha, de onde derivam pamonhuda e pamonhona, que são xingamentos que designam sempre a sua principal inimiga, a Srta. G…”

Em passagens bem mais raras, o vínculo sintático é destruído e os termos formam uma sequência verbal organizada pela associação assonante de tipo maníaco (…) Em parte, a fadiga condiciona essas formas, que são mais frequentes no final das cartas.”

Os experimentos feitos por alguns escritores sobre um modo de escrita que eles chamaram de <surrealista>, e cujo método descreveram muito cientificamente, mostram o grau de notável autonomia a que podem chegar o[s] automatismos gráficos fora de toda e qualquer hipnose.”

Ao cabo de nossa análise, constatamos ser impossível isolar na consciência mórbida o fenômeno elementar, psicossensorial ou puramente psíquico, que seria o núcleo patológico ao qual a personalidade que permaneceu normal reagiria. O distúrbio mental nunca está isolado.”

Nada é, em suma, menos inspirado — no sentido do espírito — do que esse escrito sentido como inspirado. É quando o pensamento é curto e pobre que o fenômeno automático o suplementa. Ele é sentido como exterior porque suplementa um déficit do pensamento. Ele é julgado como válido porque é convocado par uma emoção estênica.”

A respeito da esquizofasia/esquizografia e seus efeitos na história da psicanálise através da teorização tardia de Jacques Lacan, bem como sua relação com a vanguarda poética e literária da época, cf. F. Hulak, ‘Schizographie, l’avant-garde d’un symptôme’, L’Évolution Psychiatrique, vol. 82, n. 2, abr.–jun. de 2017, pp. 279-290. Disponível em: <www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0014385515001140>. Cf. também: J. Chénieux-Gendron, ‘Jacques Lacan, L’Autre de André Breton’. In: É. Marty,  Lacan et la littérature. Paris: Éditions Manucius, 2005, pp. 27-48. [Em português: <Jacques Lacan, ‘O Outro’ de André Breton> (Trad. R.E. Franco), Manuscrítica, n. 29, 2015. Disponível em: <www.revistas.fflch.usp.br/manuscritica/article/view/2351>.

AMERICAN NERVOUSNESS: ITS CAUSES AND CONSEQUENCES (A supplement to “Nervous exhaustion: Neurasthenia”) – George Beard, 1881.

-Um glamouroso retrato da decadência ocidental, embora ingenuamente otimista quanto a ele e de um ultimado chauvinismo ianque!-

Nervousness is strictly deficiency or lack of nerve-force. This condition, together with all the symptoms of diseases that are evolved from it, has developed mainly within the 19th century, and is especially frequent and severe in the Northern and Eastern portions of the United States. Nervousness, in the sense here used, is to be distinguished rigidly and systematically from simple excess of emotion and from organic disease.”

The sign and type of functional nervous diseases that are evolved out of this general nerve sensitiveness is neurasthenia (nervous exhaustion), which is in close and constant relation with such functional nerve maladies as certain physical forms of hysteria, hay-fever [rinite alérgica], sick-headache, inebriety, and some phases of insanity; is, indeed, a branch whence at early or later stages of growth these diseases may take their origin.”

The greater prevalence of nervousness in America is a complex resultant of a number of influences, the chief of which are dryness of the air, extremes of heat and cold, civil and religious liberty, and the great mental activity made necessary and possible in a new and productive country under such climatic conditions.

A new crop of diseases has sprung up in America, of which Great Britain until lately knew nothing, or but little. A class of functional diseases of the nervous system, now beginning to be known everywhere in civilization, seem to have first taken root under an American sky, whence their seed is being distributed.

All this is modern, and originally American; and no age, no country, and no form of civilization, not Greece, nor Rome, nor Spain, nor the Netherlands, in the days of their glory, possessed such maladies.” Not in their glories, that is.

to solve it in all its interlacings, to unfold its marvellous phenomena and trace them back to their sources and forward to their future developments, is to solve the problem of sociology itself.” [!!!]

Among the signs of American nervousness specially worthy of attention are the following: The nervous diathesis [degenerescência genética, i.e., uma suposta maior vulnerabilidade a doenças dos nervos decorrente da debilidade dos progenitores]; susceptibility to stimulants and narcotics and various drugs, and consequent necessity of temperance¹ [e ainda chama essa abordagem de sociológica sem levar em conta o fator cultural?]; increase of the nervous diseases inebriety [alcoolismo ou uma ligeira variação deste – suscetibilidade exagerada –, que o autor diferenciará no segundo capítulo] and neurasthenia (nervous exhaustion), hay-fever, neuralgia [dor crônica nas terminações nervosas], nervous dyspepsia [indigestão], asthenopia [fadiga ocular e dores de cabeça derivadas] and allied diseases and symptoms [bem específico…]; early and rapid decay of teeth [já fez seu Amil Dental?]; premature baldness; sensitiveness to cold and heat; increase of diseases not exclusively nervous, as diabetes and certain forms of Bright’s disease of the kidneys and chronic catarrhs; unprecedented beauty of American women; frequency of trance and muscle-reading [a tênue linha entre a paranormalidade e simples efeitos de indução eletromagnética]; the strain of dentition, puberty, and change of life; American oratory, humor [haha!], speech, and language; change in type of disease during the past half-century, and the greater intensity of animal life on this continent. [???]

¹ Ah, obviamente Sêneca e Epicuro concordariam contigo!

longevity has increased, and in all ages brain-workers have, on the average, been long-lived, the very greatest geniuses being the longest-lived of all.” “the law of the relation of age to work, by which it is shown that original brain-work is done mostly in youth and early and middle life, the latter decades being reserved for work requiring simply experience and routine.” Pequena confusão entre decaimento fisiológico e e incorporação da experiência como forma de reduzir o esforço mental!

Poetas românticos não usavam a cabeça? Pois sua efemeridade é mais-que-popular…

in all our cyclopedias of medicine, the terms hysteria, somnambulism, ecstasy, catalepsy, mimicry of disease, spinal congestion, incipient ataxy, epilepsy, spasms and congestions, anemias and hyperemias, alcoholism, spinal irritation, spinal exhaustion, cerebral paresis, cerebral exhaustion and irritation, nervousness and imagination [!] are thrown together recklessly, confusedly, hopelessly as in a witches cauldron; and in all, and through all, one shall look vainly—save here and there, for an intelligent and differential description of neurasthenia, the most frequent, the most important, the most interesting nervous disease of our time, or of any time

still our medical graduates, after years spent in listening to lectures, must wait for their diploma before they are even ready to begin the study of this side of the nervous system. Meantime the literature of ataxia [desarranjo da coordenação motora], which is but an atom compared with the world of functional nervous diseases, has risen and is yet rising with infinite repetitions and revolutions to volumes and volumes.”

So far as I know, there has been no hostile criticism of this philosophy in Germany, but in England, even now, these views are not unanimously sustained.” Nazistas retesados.

1. NATURE AND DEFINITION OF NERVOUSNESS

Trance, with its numerous, interesting and intricate phenomena, a condition that has been known in all ages, and among almost all people, is not nervousness, albeit nervous people are sometimes subject to it. See my work on Trance [não muito interessado, mas obrigado assim mesmo!], in which this distinction between physiology and psychology is discussed more fully and variously illustrated.” “This interesting survival of the Middle Ages that we have right here with us today, is the most forcible single illustration that I know of, of the distinction between unbalanced mental organization and nervousness. These Jumpers are precious curiosities, relics or antiques that the 14th century has, as it were, dropped right into the middle of the 19th. The phenomena of the Jumpers are as interesting, scientifically, as any phenomena can be, but they aren’t contributions to American nervousness.

Brainlessness (excess of emotion over intellect) is, indeed, to nervousness, what idiocy is to insanity”

Nervousness is not passionateness. A person who easily gets excited or angry, is often called nervous. One of the signs, and in some cases, one of the first signs of real nervousness, is mental irritability, a disposition to become fretted over trifles; but in a majority of instances, passionate persons are healthy—their exhibitions of anger are the expression of normal emotions, and not in any sense evidences of disease, although they may be made worse by disease, either functional or organic. Nervousness is nervelessness—a lack of nerve-force.” “In medical science we are forced to retain terminology that is in the last degree unscientific, for the same reason that we retain our orthography, which in the English language is, as all know, very bad indeed.” <Febre da grama> realmente não é muito literal!

fear of lightning, or fear of responsibility, of open places or of closed places, fear of society, fear of being alone, fear of fears, fear of contamination, fear of everything, deficient mental control, lack of decision in trifling matters, hopelessness, deficient thirst and capacity for assimilating fluids, abnormalities of the secretions, salivation, tenderness of the spine, and of the whole body, sensitiveness to cold or hot water, sensitiveness to changes in the weather, coccyodynia, pains in the back, heaviness of the loins and limbs, shooting pains simulating those of ataxia, cold hands and feet, pain in the feet, localized peripheral numbness and hypersesthesia, tremulous and variable pulse and palpitation of the heart, special idiosyncrasies in regard to food, medicines, and external irritants, local spasms of muscles, difficulty of swallowing, convulsive movements, especially on going to sleep, cramps [cãibras ou cólicas], a feeling of profound exhaustion unaccompanied by positive pain, coming and going, ticklishness [hiperdelicadeza ou sensibilidade; em sentido mais estrito, facilidade para sentir comichão ou cócegas], vague pains and flying neuralgias, general or local itching, general and local chills and flashes of heat [calafrios e ondas de calor esporádicos], attacks of temporary paralysis, pain in the perineum, involuntary emissions, partial or complete impotence, irritability of the prostatic urethra, certain functional diseases of women [vague!], excessive gaping and yawning [bocejar exagerado], rapid decay and irregularities of the teeth, oxalates, urates, phosphates and spermatozoa in the urine, vertigo or dizziness, explosions in the brain at the back of the neck [?!], dribbling and incontinence of urine [incontinência urinária e seu reverso, alternados], frequent urination, choreic movements of different parts of the body, trembling of the muscles or portions of the muscles in different parts of the body, exhaustion after defecation and urination, dryness of the hair, falling away of the hair and beard, slow reaction of the skin, etc. Dr. Neisser, of Breslau, while translating my work on Nervous Exhaustion into German, wrote me that the list of symptoms was not exhaustive. This criticism is at once accepted, and was long ago anticipated. An absolutely exhaustive catalogue of the manifestations of the nervously exhausted state cannot be prepared, since every case differs somewhat from every other case.”

There are millionnaires of nerve-force—those who never know what it is to be tired out, or feel that their energies are expended, who can write, preach, or work with their hands many hours, without ever becoming fatigued, who do not know by personal experience what the term <exhaustion> means; and there are those—and their numbers are increasing daily—who, without being absolutely sick, without being, perhaps for a lifetime, ever confined to the bed a day with acute disorder, are yet very poor in nerve-force; their inheritance is small, and they have been able to increase it but slightly, if at all; and if from overtoil, or sorrow, or injury, they overdraw their little surplus, they may find that it will require months or perhaps years to make up the deficiency, if, indeed they ever accomplish the task. The man with a small income is really rich, as long as there is no overdraft on the account; so the nervous man may be really well and in fair working order as long as he does not draw on his limited store of nerve-force. But a slight mental disturbance, unwonted toil or exposure, anything out of and beyond his usual routine, even a sleepless night, may sweep away that narrow margin, and leave him in nervous bankruptcy, from which he finds it as hard to rise as from financial bankruptcy.”

Hence we see that neurasthenics who can pursue without any special difficulty the callings of their lives, even those callings requiring great and prolonged activity, amid perhaps very considerable excitement, as that of statesmanship, politics, business, commercial life, or in overworked professions, are prostrated at once when they are called upon to do something outside of their line, where their force must travel by paths that have never been opened and in which the obstructions are numerous and can only be overcome by greater energy than they can supply.” The purpose of treatment in cases of nervous exhaustion is of a two-fold character— to widen the margin of nerve-force, and to teach the patient how to keep from slipping over the edge.”

Our title is justified by this, that if once we understand the causes and consequences of American nervousness, the problems connected with the nervousness of other lands speedily solve themselves.” The philosophy of Germany has penetrated to all civilized nations; in all directions we are becoming Germanized. Similarly, the nervousness of America is extending over Europe, which, in certain countries, at least, is becoming rapidly Americanized. Just as it is impossible to treat of German thought without intelligent reference to the thought of other nationalities, ancient or modern, so is it impossible to solve the problem of American nervousness without taking into our estimate the nervousness of other lands and ages. [Acaba de contradizer o grifado em verde!]”

O REVERSO DA MEDALHA

Indeed, nervousness, in its extreme manifestations, seems to save one from these organic incurable diseases of the brain and of the cord; with some exceptions here and there, the neurasthenic does not go into or die of nervous disease.” They may become insane—some of them do; they may become bed-confined invalids; they may be forced, as they often are, to resign their occupations, but they do not, as rule, develop the structural maladies to which here refer.” nervousness is a physical not a mental state, and its phenomena do not come from emotional excess or excitability or from organic disease but from nervous debility and irritability.”

2. SIGNS OF AMERICAN NERVOUSNESS

No one dies of spinal irritation; no one dies of cerebral irritation; no one dies of hay-fever; rarely one dies of hysteria; no one dies of general neuralgia; no one dies of sick-headache; no one dies of nervous dyspepsia; quite rarely does one die of nervous exhaustion; and even when these conditions are the cause of death they are not noted as such in the tables of mortality” Nervousness of constitution is, indeed, an aid to longevity, and in various ways; it compels caution, makes imperative the avoidance of evil habits, and early warns us of the approach of peril.” Wickedness was solemnly assigned as the cause of the increase of nervous diseases, as though wickedness were a modern discovery.” nervous diathesis—an evolution of the nervous temperament.” “It includes those temperaments, commonly designated as nervous, in whom there exists a predisposition to neuralgia, dyspepsia, chorea, sick-headache, functional paralysis, hysteria, hypochondriasis, insanity, or other of the many symptoms of disease of the central or peripheral nervous system.”

A fine organization. The fine organization is distinguished from the coarse by fine, soft hair, delicate skin, nicely chiselled features [bem-cinzelada ou esculpida – somos belos!], small bones, tapering extremities [membros pontiagudos, i.e., que se afunilam nas mãos e nos pés, na canela e no antebraço!], and frequently by a muscular system comparatively small and feeble. It is frequently associated with superior intellect, and with a strong and active emotional nature.” “It is the organization of the civilized, refined, and educated, rather than of the barbarous and low-born and untrained”

The nervous diathesis appears, within certain limits, to protect the system against attacks of fever and inflammation.” Isso explicaria porque só tive febre uma vez desde a idade adulta.

The tuberculous diathesis frequently accompanies a fine organization; but fine organizations only in a certain proportion of cases have a tuberculous diathesis. The nervous diathesis is frequently not only not susceptible to tuberculosis, but apparently much less so than the average, and sometimes, indeed, seems to be antagonistic to it, for there are many nervous patients in whom no amount of exposure or hardship or imprudence seems to be able to develop phthisis [tísica]” Devo acrescentar alguma imunidade ao câncer?

Among Americans of the higher orders, those who live in-doors, drinking is becoming a lost art; among these classes drinking customs are now historic, must be searched for, read or talked about, like extinct or dying-away species.” There is, perhaps, no single fact in sociology more instructive and far reaching than this, and this is but a fraction of the general and sweeping fact that the heightened sensitiveness of Americans forces them to abstain entirely, or to use in incredible and amusing moderation, not only the stronger alcoholic liquors, whether pure or impure, but also the milder wines, ales, and beers, and even tea and coffee.”

I replied that there were very few nervous patients who were not injured by it, and very few who would not find it out without the aid of any physician. Our fathers could smoke, our mothers could smoke, but their children must oft-times be cautious; and chewing is very rapidly going out of custom, and will soon, like snuff-taking, become a historic curiosity; while cigars give way to cigarettes. From the cradle to the grave the Chinese empire smokes, and when a sick man in China has grown so weak that he no longer asks for his pipe, they give up hope, and expect him to die. Savage tribes without number drink most of the time when not sleeping or fighting, and without suffering alcoholism, or without ever becoming inebriates [!]” But 50 years ago opium produced sleep; now the same dose keeps us awake, like coffee or tea—susceptibility to this drug has been revolutionized.” Thus the united forces of climate and civilization are pressing us back from one stimulant to another, until, like babes, we find no safe retreat save in chocolate and milk and water.”

Reprove an Angola negro for being drunk and he will reply, <My mother is dead,> as though that were excuse enough. Even as recently as the beginning of the present century, the custom of drinking at funerals yet survived with our fathers. At the present time both culture and conscience are opposed to such habits.”

It is through the alcohol, and not the adulterations, that excessive drinking injures.” This functional malady of the nervous system which we call inebriety, as distinguished from the vice or habit of drunkenness, may be said to have been born in America, has here developed sooner and far more rapidly than elsewhere, and here also has received earlier and more successful attention from men of science.” For those individuals who inherit a tendency to inebriety, the only safe course is absolute abstinence, especially in early life; and in certain cases treatment of the nervous system, on the exhaustion of which the inebriety depends.”

AQUILO QUE NENHUMA REVISTA DE NUTRIÇÃO DIRÁ: “we so often find not only epileptics, but neurasthenics and nervous persons with other symptoms, are free and sometimes excessive eaters. They say their food does not give them strength, and it does not, for the same reason that the acid poured into the impure fluid of the battery does not give us electric force. There are those who all their lives are habitually small eaters and yet are great workers, and there are those who, though all their lives great eaters, are never strong; their food is either not digested or thoroughly assimilated, and so a much smaller fraction than should be is converted into nerve-force.”

In all the great cities of the East, among the brain-working classes of our large cities everywhere, pork, in all its varieties and preparations, has taken a subordinate place among the meats upon our tables, for the reason that the stomach of the brain-worker cannot digest it.”

Four and 5 meals a day is, or has been, the English and, notably, the German custom. Foreigners have greatly surpassed us in the taking of solid as well as liquid food.”

The eyes also are good barometers of our nervous civilization. The increase of asthenopia and short-sightedness [miopia], and, in general, of the functional disorders of the eye, are demonstrated facts and are most instructive. The great skill and great number of our oculists are constant proof and suggestions of the nervousness of our age. The savage can usually see well; myopia is a measure of civilization.” “near-sightedness increases in schools” Macnamara declares that he took every opportunity of examining the eyes of Southall aborigines of Bengal, for the purpose of discovering whether near-sightedness and diseases of like character existed among them, and he asserts that he never saw a young Southall whose eyes were not perfect.”

at the age of 20, 26% of Americans are near-sighted. In Russia, 42%, and in Germany, 62%.” A nação mais intelectual do mundo.

American dentists are the best in the world, because American teeth are the worst in the world.”

Irregularities of teeth, like their decay, are the product primarily of civilization, secondarily of climate. These are rarely found among the Indians or the Chinese; and, according to Dr. Kingsley, are rare even in idiots”

It is probable that negroes are troubled earlier than Indians. The popular impression that negroes always have good teeth is erroneous—the contrast between the whiteness of the teeth and the blackness of the face tending not a little to flatter them.”

Coarse races and peoples, and coarse individuals can go with teeth badly broken down without being aware of it from any pain; whereas, in a finely organized constitution, the very slightest decay in the teeth excites pain which renders filling or extracting imperative. The coarse races and coarse individuals are less disturbed by the bites of mosquitoes, by the presence of flies or of dirt on the body, than those in whom the nervous diathesis prevails”

It is said, for example, of the negroes of the South, that they rarely if ever sneeze.”

Special explanations without number have been offered for this long-observed phenomenon—the early and rapid decay of American teeth—such as the use of sweets, the use of acids, neglect of cleanliness, and the use of food that requires little mastication. But they who urge these special facts to account for the decay of teeth of our civilization would, by proper inquiry, learn that the savages and negroes, and semi-barbarians everywhere, in many cases use sweets far more than we, and never clean their mouths, and never suffer, except in old age.”

the only races that have poor teeth are those who clean them.” Quando o remédio vem mais tarde que a doença.

Among savages in all parts of the earth baldness is unusual, except in extreme age, and gray hairs come much later than with us. So common is baldness in our large cities that what was once a deformity and exception is now almost the rule, and an element of beauty.”

Increased sensitiveness to both heat and cold is a noteworthy sign of nervousness.”

Cold bathing is not borne as well as formerly.” “Water treatment is as good for some forms of nervous disease as it ever was; but it must be adapted to the constitution of the patient, and adapted also to the peculiar needs of each case.”

The disease, state, or condition to which the term neurasthenia is applied is subdivisible, just as insanity is subdivided into general paresis or general paralysis of the insane, epileptic insanity, hysterical, climatic, and puerperal insanity; just as the disease or condition that we call trance is subdivided into clinical varieties, such as intellectual trance, induced trance, cataleptic trance, somnambulistic trance, emotional trance, ecstatic trance, etc.

That diabetes is largely if not mainly a nervous disease is becoming more and more the conviction of all medical thinkers, and that, like Bright’s disease, it has increased of late, can be proved by statistics that in this respect are in harmony with observation.”

A ERA DA RINITE E DAS ALERGIAS: “A single branch of our neurological tree, hay-fever, has in it the material for years of study; he who understands that, understands the whole problem. In the history of nervous disease I know not where to look for anything as extraordinary or instructive as the rise and growth of hay-fever in the USA.”

Catarrh of the nose and nasal pharyngeal states — so-called nasal and pharyngeal catarrh — is not a nervous disease, in the strict sense of the term, but there is often a nervous element in it; and in the marked and obstinate forms it is, like decay and irregularities of the teeth, one of the signs or one of the nerve-symptoms of impairment of nutrition and decrease of vital force which make us unable to resist change of climate and extremes of temperature.”

The phenomenal beauty of the American girl of the highest type, is a subject of the greatest interest both to the psychologist and the sociologist, since it has no precedent, in recorded history, at least; and it is very instructive in its relation to the character and the diseases of America.”

The same climatic peculiarities that make us nervous also make us handsome”

In no other country are the daughters pushed forward so rapidly, so early sent to school, so quickly admitted into society; the yoke of social observance (if it may be called such), must be borne by them much sooner than by their transatlantic sisters — long before marriage they have had much experience in conversation and in entertainment, and have served as queens in social life, and assumed many of the responsibilities and activities connected therewith. Their mental faculties in the middle range being thus drawn upon, constantly from childhood, they develop rapidly a cerebral activity both of an emotional and an intellectual nature, that speaks in the eyes and forms the countenance; thus, fineness of organization, the first element of beauty, is supplemented by expressiveness of features — which is its second element”

Handsome women are found here and there in Great Britain, and rarely in Germany; more frequently in France and in Austria, in Italy and Spain”

One cause, perhaps, of the almost universal homeliness of female faces among European works of art is the fact that the best of the masters never saw a handsome woman.” Esqueceu da relatividade histórica do tipo belo!

If Raphael had been wont to see everyday in Rome or Naples what he would now see everyday in New York, Baltimore, or Chicago, it would seem probable that, in his Sistine Madonna he would have preferred a face of, at least, moderate beauty, to the neurasthenic and anemic type that is there represented. [?]”

To the first and inevitable objection that will be made to all here said — namely, that beauty is a relative thing, the standard of which varies with age, race, and individual — the answer is found in the fact that the American type is today more adored in Europe than in America; that American girls are more in demand for foreign marriages than any other nationality; and that the professional beauties of London that stand highest are those who, in appearance and in character have come nearest the American type.” Isso se chama cultura hegemônica, e não um argumento de defesa – e um pouco de chauvinismo também…

The ruddiness or freshness, the health-suggesting and health-sustaining face of the English girl seem incomparable when partially veiled, or when a few rods away” HAHA. Uma obra não muito recomendável na parte estética… Beleza EXÓTICA!

The European woman steps with a firmer tread than the American, and with not so much lightness, pliancy, and grace. In a multitude, where both nations are represented, this difference is impressive.”

The grasp of the European woman is firmer and harder, as though on account of greater strength and firmness of muscle. In the touch of the hand of the American woman there is a nicety and tenderness that the English woman destroys by the force of the impact.”

3. CAUSES OF AMERICAN NERVOUSNESS

Punctuality is a greater thief of nervous force than is procrastination of time. We are under constant strain, mostly unconscious, often-times in sleeping as well as in waking hours, to get somewhere or do something at some definite moment.”

In Constantinople indolence is the ideal, as work is the ideal in London and New York”

There are those who prefer, or fancy they prefer, the sensations of movement and activity to the sensations of repose”

The telegraph is a cause of nervousness the potency of which is little understood. (…) prices fluctuated far less rapidly, and the fluctuations which now are transmitted instantaneously over the world were only known then by the slow communication of sailing vessels or steamships” “every cut in prices in wholesale lines in the smallest of any of the Western cities, becomes known in less than an hour all over the Union; thus competition is both diffused and intensified.”

Rhythmical, melodious, musical sounds are not only agreeable, but when not too long maintained are beneficial, and may be ranked among our therapeutical agencies.”

The experiments, inventions, and discoveries of Edison alone have made and are now making constant and exhausting draughts on the nervous forces of America and Europe, and have multiplied in very many ways, and made more complex and extensive, the tasks and agonies not only of practical men, but of professors and teachers and students everywhere” Um tanto utópico e nostálgico para um “médico pragmático”…

On the mercantile or practical side the promised discoveries and inventions of this one man have kept millions of capital and thousand of capitalists in suspense and distress on both sides of the sea.”

the commerce of the Greeks, of which classical histories talk so much, was more like play — like our summer yachting trips”

The gambler risks usually all that he has; while the stock buyer risks very much more than he has. The stock buyer usually has a certain commercial, social, and religious position, which is thrown into the risk, in all his ventures”

as the civilized man is constantly kept in check by the inhibitory power of the intellect, he appears to be far less emotional than the savage, who, as a rule, with some exceptions, acts out his feelings with comparatively little restraint.”

Love, even when gratified, is a costly emotion; when disappointed, as it is so often likely to be, it costs still more, drawing largely, in the growing years of both sexes, on the margin of nerve-force, and thus becomes the channel through which not a few are carried on to neurasthenia, hysteria, epilepsy, or insanity.”

A modern philosopher of the most liberal school states that he hates to hear one laugh aloud, regarding the habit, as he declares, a survival of barbarism.”

There are two institutions that are almost distinctively American — political elections and religious revivals”

My friend, presidents and politicians are chips and foam on the surface of the sea; they are not the sea; tossed up by the tide and left on the shore, but they are not the tide; fold your arms and go to bed, and most of the evils of this world will correct themselves, and, of those that remain, few will be modified by anything that you or I can do.”

The experiment attempted on this continent of making every man, every child, and every woman an expert in politics and theology is one of the costliest of experiments with living human beings, and has been drawing on our surplus energies with cruel extravagance for 100 years.” Agora, 250…

Protestantism, with the subdivision into sects which has sprung from it, is an element in the causation of the nervous diseases of our time. No Catholic country is very nervous, and partly for this—that in a Catholic nation the burden of religion is carried by the church.” Coitado do Brasil, trocando o certo pelo duvidoso assim…

The difference between Canadians and Americans is observed as soon as we cross the border, the Catholic church and a limited monarchy acting as antidotes to neurasthenia and allied affections. Protestant England has imitated Catholicism, in a measure, by concentrating the machinery of religion and taking away the burden from the people. It is stated —although it is supposed that this kind of statistics are unreliable— that in Italy insanity has been on the increase during these few years in which there has been civil and religious liberty in that country.”

The anxieties about the future, family, property, etc., are certainly so wearing on the negro, that some of them, without doubt, have expressed a wish to return to slavery.”

advances in science are not usually made by committees—indeed, are almost never made by them, least of all by government committees”

The people of this country have been pressed constantly with these 3 questions: How shall we keep from starving? Who is to be the next president? And where shall we go when we die? In a limited, narrow way, other nations have met these questions; at least two of them, that of starvation and that of the future life; but nowhere in ancient or modern civilization have these 3 questions been agitated so severely or brought up with such energy as here.”

Those who have acquired or have inherited wealth, are saved an important percentage of this forecasting and fore-worry”

The barbarian cares nothing for the great problems of life; seeks no solution — thinks of no solution of the mysteries of nature, and, after the manner of many reasoners in modern delusions, dismisses what he cannot at once comprehend as supernatural, and leaves it unsatisfactorily solved for himself, for others, and for all time”

Little account has been made of the fact that the old world is small geographically. The ancient Greeks knew only of Greece and the few outside barbarians who tried to destroy them. The discovery of America, like the invention of printing, prepared the way for modern nervousness; and, in connection with the telegraph, the railway, and the periodical press increased a hundred-fold the distresses of humanity.” The burning of Chicago—a city less than half a century old, on a continent whose existence was unknown a few centuries ago—becomes in a few hours the property of both hemispheres, and makes heavy drafts on the vitality not only of Boston and New York, but of London, Paris, and Vienna.”

Letter-writing is an index of nervousness; those nations who writes the most letters being the most nervous, and those who write scarcely at all, as the Turks and Russians, knowing nothing or but very little of it.”

The education of the Athenian boy consisted in play and games and songs, and repetitions of poems, and physical feats in the open air. His life was a long vacation, in which, as a rule, he rarely toiled as hard as the American lad in the intervals of his toil. (…) What they called work, gymnastics, competition games, and conversations on art and letters, is to us recreation.”

Up to a certain point work develops capacity for work; through endurance is evolved the power of greater endurance; force becomes the parent of force. But here, as in all animate nature, there are limitations of development which cannot be passed. The capacity of the nervous system for sustained work and worry has not increased in proportion to the demands for work and worry that are made upon it.”

GREEN COMMENT LAND: “Continuous and uniform cold as in Greenland, like continuous and uniform heat as on the Amazon, produces enervation and languor; but repeated alternations of the cold of Greenland and the heat of the Amazon produce energy, restlessness, and nervousness.”

The element of dryness of the air, peculiar of our climate as distinguished from that of Europe, both in Great Britain and on the Continent, is of the highest scientific and practical interest.” “On the nervous system this unusual dryness and thinness of the air have a many-sided influence; such as increase of headaches, neuralgias, and diminished capacity for sustaining cerebral toil.” The organs, pianos, and violins of America are superior to those made in Europe at the present time. This superiority is the result, not so much of greater skill, ingenuity, or experience, but—so far as I can learn, from conversing with experts in this line—from the greater dryness of the air, which causes the wood to season better than in the moist atmosphere of Europe.”

Moisture conducts electricity, and an atmosphere well charged with moisture, other conditions being the same, will tend to keep the electricity in a state of equilibrium, since it allows free and ready conduction at all times and in all directions.” In regions where the atmosphere is excessively dry, as in the Rocky Mountains, human beings—indeed all animals, become constantly acting lightning-rods, liable at any moment to be made a convenient pathway through which electricity going to or from the earth seeks an equilibrium.”

in the East our neuralgic and rheumatic patients, just before thunder-storms, are suddenly attacked by exquisite pains that at once disappear with the fair weather. There are those so sensitive that for 100 miles, and for a full day in advance, as Dr. Mitchell has shown, they can predict the approach of a storm.”

Dryness of the air, whether external or internal, likewise excites nervousness by heightening the rapidity of the processes of waste and repair in the organism, so that we live faster than in a moist atmosphere.”

one of the Manchester mill owners asserted that, during a season of dry weather, there was, in weaving alone, a loss of 5%, in quantity, and another loss of 5%, in quality; in spinning, also, an equal loss is claimed. To maintain moisture in mills, sundry devices have been tried, which have met, I believe, with partial success in practice.”

Even in our perfect Octobers, on days that are pictures of beauty and ideals of climate — just warm enough to be agreeable and stimulating enough not to be depressing, we yet remain in the house far more than Europeans are wont to do even in rainy or ugly seasons.” So what, Mr. Productive Media?

The English know nothing of summer, as we know of it — they have no days when it is dangerous, and scarcely any days when it is painful to walk or ride in the direct rays of the sun; and in winter, spring, and fall there are few hours when one cannot by proper clothing keep warm while moderately exercising.”

The Kuro Siwo stream of the Pacific, with its circuit of 18,000 miles, carries the warm water of the tropics towards the poles, and regulates in a manner the climate of Japan. Mr. Croll estimates that if the Gulf Stream were to stop, the annual temperature of London would fall 30 degrees [Farenheit], and England would become as cold as Nova Zembla. It is the influence of the Gulf Stream that causes London, that is 11° farther north than New York, to have an annual mean temperature but 2° lower.”

According to Miss Isabella Bird, who has recently published a work entitled Unbeaten Tracks in Japan, which is not only the very best work ever written on Japan, but one of the most remarkable works of travel ever written by man or woman, it seems that the Japanese suffer both from extremes of heat and cold, from deep snows and ice, and from the many weeks of sultriness such as oppress us in the US. The atmosphere of Japan is though far more moist than that of America, in that respect resembling some of the British Isles”

Our Meteorological Bureau has justified its existence and labors by demonstrating and popularizing the fact that our waves of extreme heat and of extreme cold and severe climatic perturbations of various kinds are born in or pass from the Pacific through these mountains and travel eastward, and hence their paths can be followed and their coming can be predicted with a measure of certainty.”

in the latter part of the winter and early spring—or what passes for spring, which is really a part of winter, and sometimes its worse part—there is more suffering from cold, more liability to disease, by taking cold, and more debility from long confinement in dry and overheated air than in early and mid-winter”

the strong races, like the Hebrews and Anglo-Saxons, succeed in nearly all climates, and are dominant wherever they go; but in unlimited or very extended time, race is a result of climate and environment.”

Savages may go to the most furious excesses without developing any nervous disease; they may gorge themselves, or they may go without eating for a week, they may rest in camp or they may go upon laborious campaigns, and yet never have nervous dyspepsia, sick-headache, hay-fever, or neuralgia.”

No people in the world are so careful of their diet, the quality and quantity of their food, and in regard to their habits of drinking, as the very class of Americans who suffer most from these neuroses.”

Alcohol only produces inebriety when it acts on a nervous system previously made sensitive. Alcoholism and inebriety are the products not of alcohol, but of alcohol plus a certain grade of nerve degeneration.”

But bad air, that is, air simply made impure by the presence of human beings, without any special contagion, seems powerless to produce disease of any kind, unless the system be prepared for it. Not only bad air, but bad air and filth combined, the Chinese of the lower orders endure both in this country and their own, and are not demonstrably harmed thereby (…) but impure air, plus a constitution drawn upon and weakened by civilization, is an exciting cause of nervous disease of immense force.”

The philosophy of the causation of American nervousness may be expressed in algebraic formula as follows: civilization in general + American civilization in particular (young and rapidly growing nation, with civil, religious, and social liberty) + exhausting climate (extremes of heat and cold, and dryness) + the nervous diathesis (itself a result of previously named factors) + overwork or overworry, or excessive indulgence of appetites or passions = an attack of neurasthenia or nervous exhaustion.”

Dr. Habsch, the chief oculist in Constantinople, says that the effect of tobacco upon the eyes is very problematical; that everybody smokes from morning to night, the men a great deal, the women a little less than the men, and the children smoke from the age of 7 and 8 years. He states that the number of cases of amaurosis [cegueira] is very limited. If expert oculists would examine the eyes of the Chinese, who smoke quite as much as the Turks, if not more, and smoke opium as well as tobacco, they would unquestionably confirm the conclusion of Dr. Habsch among the Turks. Dr. Habsch believes that in persons with a very delicate skin and conjunctiva [membrana mucosa que liga as pálpabras com o tecido ocular propriamente dito] among the Turks, smoking frequently causes chronic irritation, local congestion, profuse lachrymation, blepharitis ciliaris [inflamação dos cílios], and more or less intense redness of the eyelids. (cf. Dr. Webster on Amblyopia [Perda de visão] from the Use of Tobacco) [livro inexistente na web]”

The Hollanders, according to a most expert traveller, Edmondo De Amicis, are the greatest smokers of Europe; on entering a house, with the first greeting you are offered a cigar, and when you leave another is handed to you; many retire with a pipe in their mouth, re-light it if they awake during the night; they measure distances by smoke – to such a place by not so many miles but by so many pipes.” “Says one Hollander, smoke is our second breath; says another, the cigar is the 6th finger of the hand.”

Opium eating in China does not work in the way that the same habit does in the white races.” “when it is said of a Chinaman that he smokes opium, it is meant that he smokes to excess and has a morbid craving for it, just as with us the expression a man drinks means that he drinks too much”

It is clear that the habit of taking opium does not necessarily impair fertility, since large families are known among those who use opium, even to excess.”

Among my nervous patients I find very many who cannot digest vegetables, but must use them with much caution; but all China lives on vegetables, and indigestion is not a national disease. Many of the Chinese live in undrained grounds, in conditions favorable to ague and various fevers, but they do not suffer from these diseases, nor from diseases of the lungs and bronchial tubes, to the same extent as foreign residents there who do not use opium.”

I have been twice favored with the chance to study Africa in America. On the sea islands of the South, between Charleston and Savannah, there are thousands of negroes, once slaves, most of whom were born on those islands, who there will die, and who at no time have been brought into relation with our civilization, except so far as it is exhibited in a very few white inhabitants in the vicinity. Intellectually, they can be not very much in advance of their African ancestors; in looks and manners they remind me of the Zulus now exhibiting in America; for although since emancipation they have been taught by philanthropists, part of the time under governmental supervision, some of the elements of common school teaching, yet none of them have made, or are soon likely to make, any very important progress beyond those elements, and few, if any of them, even care to exercise the art of reading after it is taught them. Here, then, is a bit of barbarism at our door-steps; here, with our own eyes, and with the aid of those who live near them and employ them, I have sought for the facts of comparative neurology. There is almost no insanity among these negroes; there is no functional nervous disease or symptoms among them of any name or phase; to suggest spinal irritation, or hysteria of the physical form, or hay-fever, or nervous dyspepsia among these people is but to joke.” These primitive people can go, when required, for weeks and months sleeping but 1 or 2 hours out of the 24; they can labor for all day, or for 2 days, eating nothing or but little; hog and hominy and lish, all the year round, they can eat without getting dyspepsia; indulgence of passions several-fold greater, at least, than is the habit of the whites, either there or here, never injures them either permanently or temporarily; if you would find a virgin among them, it is said you must go to the cradle; alcohol, when they can get it, they drink with freedom, and become intoxicated like the whites, but rarely, indeed, manifest the symptoms of delirium-tremens, and never of chronic alcoholism”

These blacks cannot summon as much energy for a moment in an emergency as the whites, since they have less control over their energies, but in holding-on power, in sustained, continuous, unbroken muscular endurance, for hours and days, they surpass the whites.”

The West is where the East was a quarter of a century ago—passing more rapidly, as it would appear, through the same successive stages of development.”

4. LONGEVITY OF BRAIN-WORKERS AND THE RELATION OF AGE TO WORK

Without civilization there can be no nervousness; there is no race, no climate, no environment that can make nervousness and nervous disease possible and common save when reenforced by brain-work and worry and in-door life. This is the dark and, so far as it goes, truthful side of our theme; the brighter side is to be drawn in the present chapter.

Thomas Hughes, in his Life of Alfred the Great, makes a statement that <the world’s hardest workers and noblest benefactors have rarely been long-lived>. That any intelligent writer of the present day should make a statement so untrue shows how hard it is to destroy an old superstition.

The remark is based on the belief which has been held for centuries that the mind can be used only at the injurious expense of the body. This belief has been something more than a mere popular prejudice; it has been a professional dogma, and has inspired nearly all the writers on hygiene since medicine has been a science; and intellectual and promising youth have thereby been dissuaded from entering brain-working professions; and thus, much of the choicest genius has been lost to civilization; students in college have abandoned plans of life to which their tastes inclined, and gone to the farm or workshop; authors, scientists, and investigators in the several professions have thrown away the accumulated experience of the better half of life, and retired to pursuits as uncongenial as they were profitless. The delusion has, therefore, in 2 ways, wrought evil, specifically by depriving the world of the services of some of its best endowed natures, and generally by fostering a habit of accepting statement for demonstration.

Between 1864 and 1866 I obtained statistics on the general subject of the relation of occupation to health and longevity that convinced me of the error of the accepted teachings in regard to the effect of mental labor.”

The views I then advocated, and which I enforced by statistical evidence were:

1st. That the brain-working classes—clergymen, lawyers, physicians, merchants, scientists, and men of letters, lived much longer than the muscle-working classes.

2nd. That those who followed occupations that called both muscle and brain into exercise, were longer-lived than those who lived in occupations that were purely manual.

3rd. That the greatest and hardest brain-workers of history have lived longer on the average than brain-workers of ordinary ability and industry.

4th. That clergymen were longer-lived than any other great class of brain-workers. [QUE PRAGA!]

5th. That longevity increased very greatly with the advance of civilization; and that this increase was too marked to be explained merely by improved sanitary knowledge.

6th. That although nervous diseases increased with the increase of culture, and although the unequal and excessive excitements and anxieties attendant on mental occupations of a high civilization were so far both prejudicial to health and longevity, yet these incidental evils were more than counter-balanced by the fact that fatal inflammatory diseases have diminished in frequency and violence in proportion as nervous diseases have increased; an also that brain-work is, per se, healthful and conducive to longevity.”

the greater majority of those who die in any one of the three great professions — law, theology, and medicine — have, all their lives, from 21 upwards, followed that profession in which they died.”

I have ascertained the longevity of 500 of the greatest men in history. The list I prepared includes a large proportion of the most eminent names in all the departments of thought and activity. (…) the average age of those I have mentioned, I found to be 64.2. (…) the greatest men of the world have lived longer on the average than men of ordinary ability in the different occupations by 14 years” The value of this comparison is enforced by the consideration that longevity has increased with the progress of civilization, while the list I prepared represents every age of recorded history.” “I am sure that any chronology comprising from 100 to 500 of the most eminent personages in history, at any cycle, will furnish an average longevity of from 64 to 70 years. Madden, in his very interesting work The Infirmities of Genius, gives a list of 240 illustrious names, with their ages at death.”

IV comparative longevity of brain-workers

The full explanation of the superior longevity of the brain-working classes would require a treatise on the science of sociology, and particularly of the relation of civilization to health. The leading factors, accounting for the long life of those who live by brain-labor, are:

(…)

In the successful brain-worker worry is transferred into work; in the muscle-worker work too often degrades into worry.” “To the happy brain-worker life is a long vacation; while the muscle-worker often finds no joy in his daily toil, and very little in the intervals.”

Longevity is the daughter of comfort. Of the many elements that make up happiness, mental organization, physical health, fancy, friends, and money—the last is, for the average man, greater than any other, except the first.”

for a large number, sleep is a luxury of which they never have sufficient for real recuperation”

The nervous temperament, which usually predominates in brain-workers, is antagonistic to fatal, acute, inflammatory disease, and favorable to long life.”

Nervous people, if not too feeble, may die everyday. They do not die; they talk of death, and each day expect it, and yet they live. Many of the most annoying nervous diseases, especially of the functional, and some even of the structural varieties, do not rapidly destroy life, and are, indeed, consistent with great longevity.”

the nervous man can expose himself to malaria, to cold and dampness, with less danger of disease, and with less danger of death if he should contract disease, than his tough and hardy brother.”

In the conflict with fevers and inflammations, strength is often weakness, and weakness becomes strength—we are saved through debility.”

Still further, my studies have shown that, of distinctively nervous diseases, those which have the worst pathology and are the most hopeless, such as locomotor ataxia, progressive muscular atrophy, apoplexy with hemiplegia, and so on, are more common and more severe, and more fatal among the comparatively vigorous and strong, than among the most delicate and finely organized. Cancer, even, goes hardest with the hardy, and is most relievable in the nervous.”

Women, with all their nervousness—and in civilized lands, women are more nervous, immeasurably, than men, and suffer more from general and special nervous diseases—yet live quite as long as men, if not somewhat longer; their greater nervousness and far greater liability to functional diseases of the nervous system being compensated for by their smaller liability to certain acute and inflammatory disorders, and various organic nervous diseases, likewise, such as the general paralysis of insanity.”

Brain-workers can adapt their labor to their moods and hours and periods of greatest capacity for labor better than muscle-workers. In nearly all intellectual employments there is large liberty; literary and professional men especially, are so far masters of their time that they can select the hours and days for their most exacting and important work; and when from any cause indisposed to hard thinking, can rest and recreate, or limit themselves to mechanical details.”

Forced labor, against the grain of one’s nature, is always as expensive as it is unsatisfactory”

Even coarser natures have their moods, and the choicest spirits are governed by them; and they who worship their moods do most wisely; and those who are able to do so are the fortunate ones of the earth.”

Again, brain-workers do their best work between the ages of 25-45; before that period they are preparing to work; after that period, work, however extensive it may be, becomes largely accumulation and routine.” “It is as hard to lay a stone wall after one has been laying it 50 years as during the first year. The range of muscular growth and development is narrow, compared with the range of mental growth; the day-laborer soon reaches the maximum of his strength. The literary or scientific worker goes on from strength to strength, until what at 25 was impossible, and at 30 difficult, at 35 becomes easy, and at 40 a past-time.”

The number of illustrious names of history is by no means so great as is currently believed; for, as the visible stars of the firmament, which at a glance appear infinite in number, on careful estimate are reduced to a few thousands, so the galaxy of genius, which appears interminable on a comprehensive estimate, presents but few lights of immortal fame. Mr. Galton, in his Hereditary Genius, states that there have not been more than 400 great men in history.”

obscurity is no sure evidence of demerit, but only a probability of such”

Only in rare instances is special or general talent so allied with influence, or favor, or fortune, or energy that commands circumstances, that it can develop its full functions; <things are in the saddle and ride mankind>, environment commands the environed.”

The stars we see in the sky are but mites compared with the infinite orbs that shall never be seen; but no star is a delusion—each one means a world, the light of which very well corresponds to its size and distance from the earth and sun.” “Routine and imitation work can no more confer the fame that comes from work that is original and creative than the moon can take the place of the sun.”

It is this confounding of force with the results of force, of fame with the work by which fame is attained that causes philosophers to dispute, deny, or doubt, or to puzzle over the law of the relation of age to work, as here announced.

When the lightning flashes along the sky, we expect a discharge will soon follow, since light travels faster than sound; so some kinds of fame are more rapidly diffused than others, and are more nearly contemporaneous with their origin; but as a law, there is an interval — varying from years to hundreds of years — between the doing of any original work and the appreciation of that work by any considerable number of mankind that we call fame.

The great men that we know are old men; but they did the work that has made them great when they were young; in loneliness, in poverty, often, as well as under discouragement, and in neglected or despised youth has been achieved all that has advanced, all that is likely to advance mankind.”

In the man of genius, the idea starts where, in the man of routine, it leaves off.”

Original work—that done by geniuses who have thereby attained immortal fame, is the only kind of work that can be used as the measure of cerebral force in all our search for this law of the relation of work to the time of life at which work is done for the two-fold reason—first, that it is the highest and best measure of cerebral force; and, secondly, because it is the only kind of work that gives earthly immortality.”

Men do not long remember, nor do they earnestly reverence those who have done only what everybody can do. We never look up, unless the object at which we look is higher than ourselves; the forces that control the rise and fall of reputation are as inevitable and as remorseless as heat, light, and gravity; if a great man looms up from afar, it is because he is taller than the average man; else, he would pass below the horizon as we receded from him; factitious fame is as impossible as factitious heat, light, or gravity; if there be force, there must have been, somewhere, and at some time, a source whence that force was evolved.”

the strength of a man is his strength at his strongest point—what he can do in any one direction, at his very best. However weak and even puerile, immature, and non-expert one may be in all other directions except one, be gains an immortality of fame if, in that one direction he develops a phenomenal power; weaknesses and wickednesses, serious immoralities and waywardnesses are soon forgotten by the world, which is, indeed, blinded to all these defects in the face of the strong illumination of genius. Judged by their defects, the non-expert side of their character, moral or intellectual, men like Burns,¹ Shakespeare, Socrates, Cicero, Caesar, Napoleon, Beethoven, Mozart, Byron, Dickens, etc., are but as babes or lunatics, and far, very far below the standard of their fellows.”

¹ Poeta escocês, 1759-96.

SOBRE A PRECOCIDADE E “GASTO DA ENERGIA MENTAL”: “Men to whom these truths are repelling put their eyes on those in high positions and in the decline of life, like Disraeli or Gladstone, forgetting that we have no proof that either of these men have ever originated a new thought during the past 25 years, and that in all their contributions to letters during that time there is nothing to survive, or worthy to survive, their authors.

They point to Darwin, the occupation of whose old age has been to gather into form the thoughts and labors of his manhood and youth, and whose only immortal book was the product of his silver and golden decade.”

IV the relation of age to original work

The lives of some great men are not sufficiently defined to differentiate the period, much less the decade or the year of their greatest productive force. Such lives are either rejected, or only the time of death and the time of first becoming famous are noted; very many authors have never told the world when they thought-out or even wrote their masterpieces, and the season of publication is the only date that we can employ. These classes of facts, it will be seen, tell in favor of old rather than of young men, and will make the year of maximum production later rather than earlier, and cannot, therefore, be objected to by those who may doubt my conclusions.”

For those who have died young, and have worked in original lines up to the year of their death, the date of death has sometimes been regarded as sufficient. Great difficulty has been found in proving the dates of the labors of the great names of antiquity, and, therefore, many of them are necessarily excluded from consideration, but in an extended comparison between ancient and modern brain-workers, so far as history makes possible, there was but little or no difference.”

This second or supplementary list was analyzed in the same way as the primary list, and it was found that the law was true of these, as of those of greater distinction. The conclusion is just, scientific, and inevitable, that if we should go down through all the grades of cerebral force, we should find this law prevailing among medium and inferior natures, that the obscure, the dull, and the unaspiring accomplished the little they did in the direction of relatively original work in the brazen and golden decades.” Tenho 8 anos pela frente.

These researches were originally made as far back as 1870, and were first made public in lectures delivered by me before the Long Island Historical Society. The titles of the lectures were, Young Men in History, and the Decline of Moral Principle in Old Age.”

Finally, it should be remarked that the list has been prepared with absolute impartiality, and no name and no date has been included or omitted to prove any theory. The men who have done original or important work in advanced age, such as Dryden,¹ Radetzky,² Moltke,³ Thiers,4 De Foe,5 have all been noted, and are embraced in the average.”

¹ Poeta inglês, 1631-1700.

² Marechal, militar estrategista alemão que combateu inclusive Napoleão, vivendo ativo até uma idade avançada (1766-1858).

³ Provavelmente o Conde Adam Moltke (1710-1792), diplomata dinamarquês. Seu filho foi primeiro-ministro.

4 Marie Adolph –, político e escritor francês, 1797-1877, foi presidente eleito na França após a queda dos Bourbon.

5 Daniel Defoe viveu 71 anos e também foi ensaísta e publicou obras de não-ficção, além de seu maior sucesso.

The golden decade alone represents nearly 1/3 of the original work of the world. (…) The year of maximum productiveness is 39.”

All the athletes with whom I have conversed on this subject, the guides and lumbermen in the woods — those who have always lived solely by muscle — agree substantially to this: that their staying power is better between the ages of 35 and 45, than either before or after. To get the best soldiers, we must rob neither the cradle nor the grave; but select from those decades when the best brain-work of the world is done.”

Original work requires enthusiasm; routine work, experience.” “Unconsciously the people recognize this distinction between the work that demands enthusiasm and that which demands experience, for they prefer old doctors and lawyers, while in the clerical profession, where success depends on the ability to constantly originate and express thought, young men are the more popular, and old men, even of great ability, passed by. In the editorial profession original work is demanded, and most of the editorials of our daily press are written by young men. In the life of every old man there comes a point, sooner or later, when experience ceases to have any educating power; and when, in the language of Wall St., he becomes a bear; in the language of politics, a Bourbon.”

some of the greatest poets, painters, and sculptors, such as Dryden, Richardson, Cowper, Young, De Foe, Titian, Christopher Wren, and Michael Angelo, have done a part of their very best work in advanced life. The imagery both of Bacon and of Burke seemed to increase in richness as they grew older.

In the realm of reason, philosophic thought, invention and discovery, the exceptions are very rare. Nearly all the great systems of theology, metaphysics, and philosophy are the result of work done between 20 and 50.”

Michael Angelo and Sir Christopher Wren could wait for a quarter or even half a century before expressing their thoughts in St. Peter’s or St. Paul’s; but the time of the conception of those thoughts — long delayed in their artistic expression — was the time when their cerebral force touched its highest mark.

In the old age of literary artists, as Carlyle, Dickens, George Elliot, or Tennyson, the form may be most excellent; but from the purely scientific side the work though it may be good, is old; a repetition often-times, in a new form, of what they have said many times before.”

The philosophy of Bacon can never be written but once; to re-write it, to present it a 2nd time, in a different dress, would indicate weakness, would seem almost grotesque; but to statuary and painting we return again and again; we allow the artist to re-portray his thought, no matter how many times; we visit in succession a hundred cathedrals, all very much alike; and a delicious melody grows more pleasing with repetition; whence it is that in poetry — the queen of the arts — old age has wrought little, or not at all, since the essence of poetry is creative thought, and old age is unable to think; whence, also, in acting — the oldest of all the arts, the servant of all — the best experts are often at their best, or not far below their best, save for the acquisition of new characters, in the iron and wooden decades.”

Similarly with the art of writing—the style, the dress, the use of words, the art of expressing thoughts, and not of thinking. Men who have done their best thinking before 40 have done their best writing after that period.” it is thought, and not the language of thought, that best tests the creative faculties.”

The conversation of old men of ability, before they have passed into the stage of imbecility, is usually richer and more instructive than the conversation of the young; for in conversation we simply distribute the treasures of memory, as a store hoarded during long years of thought and experience. He who thinks as he converses is a poor companion, as he who must earn his money before he spends any is a poor man. When an aged millionnaire makes a liberal donation it costs him nothing; he but gives out of abundance that has resulted by natural accumulation from the labors of his youth and middle life.”

An amount of work not inconsiderable is done before 25 and a vast amount is done after 40; but at neither period is it usually of the original or creative sort that best measures the mental forces.” “In early youth we follow others; in old age we follow ourselves.”

The same law applies to animals. Horses live to be about 25, and are at their best from 8 to 14” “Dogs live 9 or 10 years, and are fittest for the hunt between 2 and 6.”

Children born of parents one or both of whom are between 25 and 40, are, on the average, stronger and smarter than those born of parents one or both of whom are very much younger or older than this.” “we are most productive when we are most reproductive [18-26??].”

In an interesting paper entitled When Women Grow Old, Mrs. Blake has brought facts to show that the fascinating power of the sex is often-times retained much longer than is generally assumed.

She tells us of Aspasia, who, between the ages of 30 and 50 was the strongest intellectual force in Athens; of Cleopatra, whose golden decade for power and beauty was between 30 and 40; of Livia, who was not far from 30 when she gained the heart of Octavius; of Anne of Austria, who at 38 was thought to be the most beautiful queen in Europe; of Catherine II of Russia, who, even at the silver decade was both beautiful and imposing; of Mademoiselle Mars, the actress, whose beauty increased with years, and culminated between 30 and 45; of Madame Recamier, who, between 25 and 40, and even later, was the reigning beauty in Europe; of Ninon de I’Enclos, whose own son — brought up without knowledge of his parentage — fell passionately in love with her when she was at the age of 37, and who even on her 60th birthday received an adorer young enough to be her grandson.

The voice of our great prima donnas is at its very best between 27 and 35; but still some retains, in a degree, its strength and sweetness even in the silver decade. The voice is an index of the body in all its functions, but the decay of other functions is not so readily noted.”

As a lad of 16, Lord Bacon began to think independently on great matters; at 44, published his great work on The Advancement of Learning; at 36, published 12 of his Essays; and at 60 collected the thoughts of his life in his Organum. His old age was devoted to scientific investigation.

At the age of 29, Descartes began to map out his system of philosophy, and at 41 began its publication, and at 54 he died.

Schelling, as a boy, studied philosophy, and at 24 was a brilliant and independent lecturer, and at 27 had published many important works; at 28 was professor of philosophy and arts, and wrote his best works before 50.

Dryden, one of the exceptions to the average, did his best work when comparatively old; his Absalom was written at 50, and his Alexander’s Feast when he was nearly 70.

Dean Swift wrote his Tale of a Tub at 35, and his Gulliver’s Travels at 59.”

Charles Dickens wrote Pickwick at 25, Oliver Twist and Nicholas Nickleby before 27, Christmas Chimes at 31, David Copperfield at 38, and Dombey and Son at 35. Thus we see that nearly all his greatest works were written before he was 40; and it is amazing how little all the writings of the last 20 years of his life took hold of the popular heart, in comparison with Pickwick and David Copperfield, and how little effect the most enormous advertising and the cumulative power of a great reputation really have to give a permanent popularity to writings that do not deserve it. If Dickens had died at 40 his claim to immortality would have been as great as now, and the world of letters would have been little, if any, the loser. The excessive methodical activity of his mature and advanced life could turn off works with fair rapidity; but all his vast experience and all his earnest striving failed utterly to reach the standard of his reckless boyhood. His later works were more perfect, perhaps, judged by some canons, but the genius of Pickwick was not in them.”

Edison with his 300 patents, is not the only young inventor. All inventors are young. Colt was a boy of 21 when he invented the famous weapon that bears his name; and Goodyear began his experiments in rubber while a young man of 24, and made his first success at 38, and at 43 had brought his discovery to approximate perfection.”

The name of Bichat is one of the greatest in science, and he died at 32.”

Handel at 19 was director of the opera at Hamburg; at 20 composed his first opera; at 35 was appointed manager of the Royal Theatre at London; at 25 composed Messiah and Jephtha, and in old age and blindness his intellect was clear and his power of performance remarkable.”

Luther early displayed eloquence, and at 20 began to study Aristotle;¹ at 29 was doctor of divinity, and when he would refuse it, it was said to him that <he must suffer himself to be dignified, for that God intended to bring about great things in the church by his name>; at 34 he opposed the Indulgencies, and set up his 95 propositions; at 37 he publicly burned the Pope’s bull; at 47 he had completed his great task.”

¹ Realmente é impossível derivar prazer de ler Aristóteles antes dessa idade, senão uma ainda mais avançada!

Von Moltke between 65 and 70 directed the operation of the great war of Prussia against Austria and France. But that war was but a conclusion and consummation of military study and organization that had been going on for a quarter of a century.”

Jenner at 21 began his investigation into the difference between cow-pox and small-pox. His attention was called to the subject by the remark of a country girl, who said in his hearing that she could not have the small-pox, because she had had the cow-pox.” Varíola e varíola bovina. Bom… realmente existem ovos de Colombo!

old men, like nations, can show their treasures of art long after they have begun to die; this, indeed, is one of the sweetest and most refreshing compensations for age”

A contemporary deader in science (Huxley) has asserted that it would be well if all men of science could be strangled at the age of 60, since after that age their disposition — with possible exceptions here and there — is to become reactionary and obstructionists”

Se um homem não é belo aos 20, forte aos 30, experiente aos 40 e rico aos 50, ele jamais será belo, forte, experiente ou rico neste mundo.” Lutero

Só começamos a contar nossos anos quando já não há nada mais a ser contado” Emerson

Procrastinamos nossos trabalhos literários até termos experiência e habilidade o bastante, até um dia descobrirmos que nosso talento literário era uma efervescência juvenil que finalmente perdemos.” E.

Quem em nada tem razão aos 30, nunca terá.”

Revoluções não são feitas por homens de óculos, assim como sussurros contendo verdades novas nunca são ouvidos por quem já entrou na idade da surdez” Oliver Holmes

Como pode ser que “o povo da minha rua” seja, para tantos indivíduos, a gente mais burra de toda a Terra? E, pior ainda, que todos que o dizem pareçam estar com a razão?!

Dizem que os jovens são os únicos que não escutam a voz da razão na discussão sobre a verdadeira idade da razão ser a juventude, e não a velhice. Ou eles estão errados ou eles estão errados.

It is not in ambitious human nature to be content with what we have been enabled to achieve up to the age of 40. (…) Happiness may augment with years, because of better external conditions; and yet the highest happiness is obtained through work itself more than through the reward of work”

a wise man declared that he would like to be forever 35, and another, on being asked his age, replied that it was of little account provided that it was anywhere between 25 and 40.”

$$$: “Capacity for original work age does not have, but in compensation it has almost everything else. The querulousness of age, the irritability, the avarice are the resultants partly of habit and partly of organic and functional changes in the brain. Increasing avarice is at once the tragedy and the comedy of age; as we near the end of our voyage we become more chary of our provisions, as though the ocean and not the harbor were before us.” “our intellectual ruin very often dates from the hour when we begin to save money.” A do meu pai começou quando criança.

PORQUE SIM, PORQUE EU MANDEI – POR QUE VOCÊ É ASSIM? NÃO RESPEITA SEU PAI, NÃO? POR QUE NÃO FAZ UM DOUTORADO? POR QUE NÃO COMPRA UM CARRO? “Moral courage is rare in old age; sensitiveness to criticism and fear of opposition take the place, in the iron and wooden decades, of delight in criticism and love of opposition of the brazen and golden decades” Nostalgic UnB times…

fame like wealth makes us cautious, conservative, cowardly, since it implies the possibility of loss.”

when the intellect declines the man is obliged to be virtuous. Physical health is also needed for indulgence in many of the vices”

The decline of the moral faculties in old age may be illustrated by studying the lives of the following historic characters: Demosthenes, Cicero, Sylla, Charles V, Louis XIV, Frederic of Prussia, Napoleon (prematurely old), Voltaire, Jeffries, Dr. Johnson, Cromwell, Burke, Sheridan, Pope, Newton, Ruskin, Carlyle, Dean Swift, Chateaubriand, Rousseau, Milton, Bacon, Earl Pussell, Marlborough and Daniel Webster. In some of these cases the decline was purely physiological, in others pathological; in the majority it was a combination of both.

Very few decline in all the moral faculties. One becomes peevish, another avaricious, another misanthropic, another mean and tyrannical, another exacting and ugly, another sensual, another cold and cruelly conservative, another excessively vain and ambitious, others simply lose their moral enthusiasm and their capacity for resisting disappointment and temptation.”

There are men who in extreme age preserve their teeth sound, their hair unchanged, their complexion fresh, their appetite sharp and digestion strong and sure, and their repose sweet and refreshing, and who can walk and work to a degree that makes their children and grandchildren feel very humble; but these observed exceptions in no way invalidate the general law, which no one will dispute, that the physical powers reach their maximum between 20 and 40, and that the average man at 70 is less muscular and less capable of endurance than the average man at 40.”

For age hath opportunity no less

Than youth itself, though in another dress;

And as the evening twilight fades away,

The sky is filled with stars invisible by day.”

Longfellow

To age is granted in increasing richness the treasures of memory and the delights of recognition which most usually come from those who, at the time of the deeds whose value they recognize, were infants or unborn; only those who bury their contemporaries, can obtain, during their own lifetime, the supremacy of fame.”

POR QUE CRIANÇAS PRODÍGIO SÃO A MAIOR FALSIFICAÇÃO POSSÍVEL: “Mrs. Carlyle, when congratulated on the honors given to her husband on the delivery of his Edinburgh address, replied with a certain disdain, as though he should have been honored before; but only by a reversal of the laws of the evolution of fame shall the manifestation of genius and the recognition of genius be simultaneous.”

The high praise of contemporaries is almost insulting, since it implies that he whom they honor is but little better than themselves. Permanent fame, even in this rapid age [!!], is a plant of slow growth—first the blade; then, after a time, the ear; then, after many, many years, the full corn in the ear”

MEU COPYDESK E EU DE 2015 PARA CÁ SENTIMO-NOS ASSIM: “while the higher power of creating is disappearing, the lower, but for many the more needful, and with contemporaries more quickly appreciated, power of imitation, repetition, and routine, is increasing; we can work without working, and enjoy without striving”

O TRABALHO MATA AOS POUCOS: “An investigation made more recently by a Berlin physician into the facts and data relating to human longevity shows the average age of clergymen to be 65; of merchants, 63; clerks and farmers, 61; military men, 59; lawyers, 58; artists, 57; and medical men, 56 [!]. Statistics are given showing that medical men in England stand high in the scale of longevity. Thus, the united ages of 28 physicians who died there last year, amount to 2,354 years, giving an average of more the 84 years to each [!]. The youngest of the number was 80; the oldest, 93; 2 others were 92 and 89, respectively; 3 were 87, and 4 were 86 each; and there were also more than 50 who averaged from 74 to 75 years.”

That precocity predicts short life, and is therefore a symptom greatly to be feared by parents, has, I believe, never been questioned. (…) plants that are soon to bloom are soon to fade”

APOSTO MINHA VIDA QUE MORREREI ANTES DE A.: “It is probable that, of two individuals with precisely similar organizations and under similar circumstances, the one that develops earlier will be the first to die.”

MINHA ‘GENÉTICA’ NÃO AJUDA: “millionnaires in intellect as well as in money, who can afford to expend enormous means without becoming impoverished.”

Investigating the records of the past two centuries, Winterburn finds 213 recorded cases of acknowledged musical prodigies. None of them died before their 15th year, some attained the age of 103 — and the average duration of life was 58 — showing that, with all their abnormal precocity, they exceed the ordinary longevity by about 6%.”

an almost irresistible impulse to the art in which they are destined to excel manifests itself in future virtuosi— in poets, painters, etc., from their earliest youth.” Wieland

Uma idéia de filme bem ruim: O ESCRITOR NOVATO DE 40 ANOS!

A infância revela o homem, como a manhã revela o dia.” Milton

Madden – Infirmities of Genius (downloads)

MEMENTO À “PROFESSORA SORRISO”: “The stupidity attributed to men of genius may be really the stupidity of their parents, guardians, and biographers.”

Music and drawing appeal to the senses, attract attention, and are therefore appreciated, or at least observed by the most stupid parents, and noted even in the most superficial biographies. Philosophic and scientific thought, on the contrary, does not at once, perhaps may never, reveal itself to the senses—it is locked up in the cerebral cells; in the brain of that dull, pale youth, who is kicked for his stupidity and laughed at for his absent-mindedness, grand thoughts may be silently growing”

Newton, according to his own account, was very inattentive to his studies and low in his class, but a great adept at kite-flying, with paper lanterns attached to them, to terrify the country people, of a dark night, with the appearance of comets; and when sent to market with the produce of his mother’s farm, was apt to neglect his business, and to ruminate at an inn, over the laws of Kepler.”

This belief is strengthened by the consideration that many, perhaps the majority, of the greatest thinkers of the world seemed dull, inane, and stupid to their neighbors, not only in childhood but through their whole lives.”

It is probable, however, that nearly all cases of apparent stupidity in young geniuses are to be explained by the want of circumstances favorable to the display of their peculiar powers, or to a lack of appreciation or discernment on the part of their friends.”

As compared with the world, the most liberal curriculum is narrow; to one avenue of distinction that college opens, the world opens ten.”

GREAT precocity, like GREAT genius, is rare.”

O GÊNIO & O GENIOSO: “There is in some children a petty and morbid smartness that is sometimes mistaken for precocity, but which in truth does not deserve that distinction.”

A DOENÇA DE STEWIE: “Petty smartness is often-times a morbid symptom; it comes from a diseased brain, or from a brain in which a grave predisposition to disease exists; such children may die young, whether they do or do not early exhibit unusual quickness.”

A AMEBA SUPREMACISTA: “M.D. Delaunay has addressed to the Societé de Biologie a communication in which he takes the ground that precocity indicates biological inferiority. To prove this he states that the lower species develop more rapidly than those of a higher order; man is the slowest of all in developing and reaching maturity, and the lower orders are more precocious than the higher. As proof of this he speaks of the children of the Esquimaux, negroes, Cochin Chinese, Japanese, Arabs, etc. (…) He also states that women are more precocious than men”

THE RECURRING THEME: “The highest genius, as here and elsewhere seen, never repeats itself; very great men never have very great children; and in biological analysis, geniuses who are very precocious may be looked upon as the last of their race or of their branch—from them degeneracy is developed; and this precocity, despite their genius, may be regarded as the forerunner of that degeneracy.”

Leibniz, at 12 understood Latin authors well, and wrote a remarkable production; Gassendi, <the little doctor>, preached at 4; and at 10 wrote an important discourse; Goethe, before 10, wrote in several languages; Meyerbeer, at 5, played remarkably well on the piano; Niebuhr, at 7, was a prodigy, and at 12 had mastered 18 languages [QUÊ?!]; Michael Angelo at 19 had attained a very high reputation; at 20 Calvin was a fully-fledged reformer, and at 24 published great works on theology that have changed the destiny of the world; Jonathan Edwards, at 10, wrote a paper refuting the materiality of the soul, and at 12 was so amazingly precocious that it was predicted of him that he would become another Aristotle; at 20 Melanchthon was so learned that Erasmus exclaimed: <My God! What expectations does not Philip Melanchthon create!>.”

In order that a great man shall appear, a double line of more or less vigorous fathers and mothers must fight through the battles for existence and come out triumphant. However feeble the genius may be, his parents or grandparents are usually strong; or if not especially strong, are long-lived. Great men may have nervous if not insane relatives; but the nervous temperament holds to life longer than any other temperament. (…) in him, indeed, the branch of the race to which he belongs may reach its consummation, but the stock out of which he is evolved must be vigorous, and usually contains latent if not active genius.”

The cerebral and muscular forces are often correlated; the brain is a part of the body. This view, though hostile to the popular faith, is yet sound and supportable; a large and powerful brain in a small and feeble body is a monstrosity.”

a hundred great geniuses, chosen by chance, will be larger than a hundred dunces anywhere — will be broader, taller, and more weighty.”

In any band of workmen on a railway, you shall pick out the <boss> by his size alone: and be right 4 times out of 5.”

In certain of the arts extraordinary gifts may lift their possessor into fame with but little effort of his own, but the choicest seats in the temples of art are given only to those who have earned them by the excellence that comes from consecutive effort, which everywhere test the vital power of the man.”

One does not need to practice medicine long to learn that men die that might just as well live if they had resolved to live and that many who are invalids could become strong if they had the native or acquired will to vow that they would do so. Those who have no other quality favorable to life, whose bodily organs are nearly all diseased, to whom each day is a day of pain, who are beset by life-shortening influences, yet do live by the determination to live alone.”

the pluck of the Anglo-Saxon is shown as much on the sick-bed as in Wall Street or on the battlefield.” “When the negro feels the hand of disease pressing upon him, however gently, all his spirit leaves him.”

INNER VOW: “they live, for the same reason that they become famous; they obtain fame because they will not be obscure; they live because they will not die.”

it is the essence of genius to be automatic and spontaneous. Many a huckster or corner tradesman expends each day more force in work or fretting than a Stewart or a Vanderbilt.”

As small print most tires the eyes, so do little affairs the most disturb us” “the nearer our cares come to us the greater the friction; it is easier to govern an empire than to train a family.”

Great genius is usually industrious, for it is its nature to be active; but its movements are easy, frictionless, melodious. There are probably many school-boys who have exhausted themselves more over a prize composition than Shakespeare over Hamlet, or Milton over the noblest passages in Paradise Lost.”

So much has been said of the pernicious effects of mental labor, of the ill-health of brain-workers of all classes, and especially of clergymen, that very few were prepared to accept the statement that the clergy of this country and of England lived longer than any other class, except farmers; and very naturally a lurking fallacy was suspected. Other observers, who have since given special attention to the subject, have more than confirmed this conclusion, and have shown that clergymen are longer lived than farmers.” “A list of 10,000 is sufficient and more than sufficient for a generalization; for the second 5,000 did nothing more than confirm the result obtained by the first. It is fair and necessary to infer that if the list were extended to 10,000, 20,000, or even 100,000, the average would be found about the same.” “In their manifold duties their whole nature is exercised — not only brain and muscle in general, but all, or nearly all, the faculties of the brain — the religious, moral, and emotional nature, as well as the reason. Public speaking, when not carried to the extreme of exhaustion, is the best form of gymnastics that is known; it exercises every inch of a man, from the highest regions of the brain to the smallest muscle.” “The average income of the clergymen of the leading denominations of this country in active service as pastors of churches (including salary, house rent, wedding fees, donations, etc.), is between $800 and $1000, which is probably not very much smaller than the net income of all other professional classes. Furthermore, the income of clergymen in active service is collected and paid with greater certainty and regularity, and less labor of collection on their part, than the income of any other class except, perhaps, government officials; then, again, their earnings, whether small or great, come at once, as soon as they enter their profession, and is not, as with other callings, built up by slow growth.” “Merchants now make, always have made, and probably always will make, most of the money of the world; but business is attended with so much risk and uncertainty, and consequent anxiety, that merchants die sooner than clergymen, and several years sooner than physicians and lawyers.” “During the past 15 years, there has been a tendency, which is now rapidly increasing, for the best endowed and best cultured minds of our colleges to enter other professions, and the ministry has been losing, while medicine, business, and science have been gaining.”

There are those who come into life thus weighted down, not by disease, not by transmitted poison in the blood, but by the tendency to disease, by a sensitiveness to evil and enfeebling forces that seems to make almost every external influence a means of torture; as soon as they are born, debility puts its terrible bond upon them, and will not let them go, but plays the tyrant with them until they die. Such persons in infancy are often on the point of dying, though they may not die; in childhood numberless physical ills attack them and hold them down, and, though not confining them to home, yet deprive them, perhaps, of many childish delights; in early maturity an army of abnormal nervous sensations is waiting for them, the gauntlet of which they must run if they can; and throughout life every function seems to be an enemy.

The compensations of this type of organization are quite important and suggestive, and are most consolatory to sufferers. Among these compensations, this perhaps is worthy of first mention — that this very fineness of temperament, which is the source of nervousness, is also the source of exquisite pleasure. Highly sensitive natures respond to good as well as evil factors in their environment, salutary as well as pernicious stimuli are ever operating upon them, and their capacity for receiving, for retaining, and for multiplying the pleasures derived from external stimuli is proportionally greater than that of cold and stolid organizations: if they are plunged into a deeper hell, they also rise to a brighter heaven (…) art, literature, travel, social life, and solitude, pour out on them their selected treasures; they live not one life but many lives, and all joy is for them variously multiplied. To such temperaments the bare consciousness of living, when life is not attended by excessive exhaustion or by pain, or when one’s capacity for mental or muscular toil is not too closely tethered, is often-times a supreme felicity. The true psychology of happiness is gratification of faculties, and when the nervous are able to indulge even moderately and with studied caution and watchful anxiety their controlling desires of the nobler order, they may experience an exquisiteness of enjoyment that serves, in a measure, to reward them for their frequent distresses.”

The physician who collects his fee before his patient has quite recovered, does a wise thing, since it will be paid more promptly and more gratefully than after the recovery is complete.”

Nervous organizations are rarely without reminders of trouble that they escape — their occasional wakefulness and indigestion, their headaches and backaches and neuralgias, their disagreeable susceptibility to all evil influences that may act on the constitution, keep them ever in sight of the possibility of wliat they might have been, and suggest to them sufferings that others endure, but from which they are spared.”

While it is true that pain is more painful than its absence is agreeable, so that we think more of what is evil than of what is good in our environment, and dwell longer on the curses than the blessings of our lot, and fancy all others happier than ourselves, yet it is true likewise that our curses make the blessings more blissful by contrast”

There are those who though never well are yet never sick, always in bondage to debility and pain, from which absolute escape is impossible, yet not without large liberty of labor and of thought” “Such persons may be exposed to every manner of poison, may travel far and carelessly with recklessness, even may disregard many of the prized rules of health; may wait upon and mingle with the sick, and breathe for long periods the air of hospitals or of fever-infested dwellings, and come out apparently unharmed.”

This recuperative tendency of the nervous system is stronger, often-times, than the accumulating poison of disease, and overmasters the baneful effects of unwise medication and hygiene. Between the ages of 25 and 35, especially, the constitution often consolidates as well as grows, acquires power as well as size, and throws off, by a slow and invisible evolution, the subtile habits of nervous disease, over which treatment the most judicious and persistent seems to have little or no influence. There would appear to be organizations which at certain times of life must needs pass through the dark valley of nervous depression, and who cannot be saved therefrom by any manner of skill or prevision; who must not only enter into this valley, but, having once entered, cannot turn back: the painful, and treacherous, and agonizing horror, wisdom can but little shorten, and ordinary misdoing cannot make perpetual; they are as sure to come out as to go in; health and disease move in rhythm; the tides in the constitution are as demonstrable as the tides of the ocean, and are sometimes but little more under human control.” It is an important consolation for those who are in the midst of an attack of sick-headache, for example, that the natural history of the disease is in their favor. In a few days at the utmost, in a few hours frequently, the storm will be spent, and again the sky will be clear, and perhaps far clearer than before the storm arose.” nearly all severe pain is periodic, intermittent, rhythmical: the violent neuralgias are never constant, but come and go by throbs, and spasms, and fiercely-darting agonies, the intervals of which are absolute relief. After the exertion expended in attacks of pain, the tired nerve-atoms must need repose. Sometimes the cycles of debility, alternating with strength, extend through long years — a decade of exhaustion being followed by a decade of vigor.”

There are those who pass through an infancy of weakness and suffering and much pain, and through a childhood and early manhood in which the game of life seems to be a losing one, to a healthy and happy maturity; all that is best in their organizations seems to be kept in reserve, as though to test their faith, and make the boon of strength more grateful when it comes.”

Perfect health is by no means the necessary condition of long life; in many ways, indeed, it may shorten life; grave febrile and inflammatory diseases are invited and fostered by it, and made fatal, and the self-guarding care, without which great longevity is almost impossible, is not enforced or even suggested.” “Headaches, and backaches, and neuralgias, are safety-valves through which nerve-perturbations escape, and which otherwise might become centres of accumulated force, and break forth with destruction beyond remedy. The liability to sudden attacks of any form of pain, or distress, or discomfort, under overtoil or from disregard of natural law, is, so far forth, a blessing to its possessor, making imperative the need of foresight and practical wisdom in the management of health, and warning us in time to avoid irreparable disaster. The nervous man hears the roar of the breakers from afar, while the strong and phlegmatic steers boldly, blindly on, until he is cast upon the shore, often-times a hopeless wreck.”

A neurastenia também tem o nome de “cãibra do escritor”. No trecho a seguir, a referida “cãibra” está mais próxima de um surto neurastênico agudo, do qual, defende Beard, o ‘nervoso típico’ está protegido: “Those who are sensitive, and nervous, and delicate, whom every external or internal irritation injures, and who appreciate physical injury instantly, as soon as the exciting cause begins to act, cannot write long enough to get writer’s cramp; they are warned by uneasiness or pain, by weariness, local or general, and are forced to interrupt their labors before there has been time to receive a fixed or persistent disease.” “had they been feeble they would have been unable to persevere in the use of the pen so as to invite permanent nervous disorder.” Without such warnings they might have continued in a life of excessive friction and exhausting worry, and never have suspected that permanent invalidism was in waiting for them, until too late to save themselves either by hygiene or medication. When a man is prostrated nervously, all the forces of nature rush to his rescue; but the strong man, once fully fallen, rallies with difficulty, and the health-evolving powers may find a task to which, aided or unaided, they are inadequate.”

The history of the world’s progress from savagery to barbarism, from barbarism to civilization, and, in civilization, from the lower degrees towards the higher, is the history of increase in average longevity, corresponding to and accompanied by increase of nervousness. Mankind has grown to be at once more delicate and more enduring, more sensitive to weariness and yet more patient of toil, impressible but capable of bearing powerful irritation: we are woven of finer fibre, which, though apparently frail, yet outlasts the coarser, as rich and costly garments often-times wear better than those of rougher workmanship.”

Among our educated classes there are nervous invalids in large numbers, who have never known by experience what it is to be perfectly well or severely ill, whose lives have been not unlike a march through a land infested by hostile tribes, that ceaselessly annoy in front and on flank, without ever coming to a decisive conflict, and who, in advanced age, seem to have gained wariness, and toughness, and elasticity, by the long discipline of caution, of courage, and of endurance; and, after having seen nearly all their companions, whose strength they envied, struck down by disease, are themselves spared to enjoy, it may be, their best days, at a time when, to the majority, the grasshopper becomes a burden, and life each day a visibly losing conflict with death.” “the irritability, the sensitiveness, the capriciousness of the constitution, between the ages of 15 and 45, have, in a degree, disappeared, and the system has acquired a certain solidity, steadiness, and power; and thus, after a long voyage against opposing winds and fretting currents, they enter the harbor in calmness and peace.”

MEU SÉCULO ME IMPEDE DE COMPARTILHAR DESTE OTIMISMO: “It may be doubted whether, in the history of disease of any kind, there has been made so decided and so satisfactory an advance as has been made within the last quarter of a century, in the treatment of nervousness in its various manifestations.” “One great factor in the modern treatment of these functional nervous diseases is individualization, no two cases being treated precisely alike, but each one being studied by itself alone. Among wise physicians, the day for wholesale treatment of nervous diseases can never return. The result of all this progress is, that thousands who formerly would have suffered all their lives, and with no other relief except that which comes from the habitual addiction to narcotics, can now be cured, or permanently relieved, or at least put into working order where they are most useful and happy.” if all new modes of action of nerve-force are to be so many added pathways to sorrow,—if each fresh discovery or invention is to be matched by some new malady of the nerves,—if insanity and epilepsy and neurasthenia, with their retinue of neuroses, through the cruel law of inheritance, are to be organized in families, descending in fiery streams throught the generations, we yet have this assurance,—that science, with keen eyes and steps that are not slow, is seeking and is finding means of prevention and of relief.”

5. PHYSICAL FUTURE OF THE AMERICAN PEOPLE [epílogo cagado e ‘poliânico’ totalmente desnecessário]

This increase of neuroses cannot be arrested suddenly; it must yet go on for at least 25 or 50 years, when all of these disorders shall be both more numerous and more heterogenous than at present. But side by side with these are already developing signs of improved health and vigor that cannot be mistaken; and the time must come—not unlikely in the first half of the 20th century—when there will be a halt or retrograde movement in the march of nervous diseases, and while the absolute number of them may be great, relatively to the population, they will be less frequent than now; the evolution of health, and the evolution of nervousness, shall go on side by side.”

Health is the offspring of relative wealth.” “febrile and inflammatory disorders, plagues, epidemics, great accidents and catastrophes even, visit first and last and remain longest with those who have no money.” the absence of all but forced vacations—the result, and one of the worst results, of poverty—added to the corroding force of envy, and the friction of useless struggle,—all these factors that make up or attend upon simple want of money, are in every feature antagonistic to health and longevity. Only when the poor become absolute paupers, and the burden of life is taken from them and put upon the State or public charity, are they in a condition of assured health and long life.” “The inmates of our public institutions of charity of the modern kind are often the happiest of men, blessed with an environment, on the whole, far more salubrious than that to which they have been accustomed, and favorably settled for a serene longevity.” “For the same reasons, well-regulated jails are healthier than many homes, and one of the best prescriptions for the broken-down and distressed is for them to commit some crime.”

A fat bank account tends to make a fat man; in all countries, amid all stages of civilization and semi-barbarism, the wealthy classes have been larger and heavier than the poor.” “In India this coincidence of corpulence and opulence has been so long observed that it is instinctively assumed; and certain Brahmins, it is said, in order to obtain the reputation of wealth, studiously cultivate a diet adapted to make them fat.”

The majority of our Pilgrim Fathers in New England, and of the primitive settlers in the Southern and Middle States, really knew but little of poverty in the sense in which the term is here used. They were an eminently thrifty people, and brought with them both the habits and the results of thrift to their homes in the New World. Poverty as here described is of a later evolution, following in this country, as in all others, the pathway of a high civilization.”

the best of all antidotes and means of relief for nervous disease is found in philosophy.” Thus it is in part that Germany, which in scientific and philosophic discovery does the thinking for all nations, and which has added more to the world’s stock of purely original ideas than any other country, Greece alone excepted, is less nervous than any other nation; thus it is also that America, which in the same department has but fed on the crumbs that fall from Germany’s table, has developed a larger variety and number of functional nervous diseases than all other nations combined.”

The capacity for growth in any given direction, physical or mental, is always limited; no special gift of body or mind can be cultivated beyond a certain point, however great the tenderness and care bestowed upon it.”

In man, that higher operation of the faculties which we call genius is hereditary, transmissible, running through and in families as demonstrably as pride or hay-fever, the gifts as well as the sins of the fathers being visited upon the children and the children’s children; general talent, or some special talent, in one or both parents rises and expands in immediate or remote offspring, and ultimately flowers out into a Socrates, a Shakespeare, a Napoleon, and then falls to the ground”

That a single family may rise to enduring prominence and power, it is needful that through long generations scores of families shall endure poverty and pain and struggle with cruel surroundings”

The America of the future, as the America of the present, must be a nation where riches and culture are restricted to the few—to a body, however, the personnel of which is constantly changing.”

Inebriety being a type of the nervous diseases of the family to which it belongs, may properly be here defined and differentiated from the vice and habit of drinking with which it is confounded. The functional nervous disease inebriety, or dipsomania, differs from the simple vice of drinking to excess in these respects:

(…)

The simple habit of drinking even to an extreme degree may be broken up by pledges or by word promises or by quiet resolution, but the disease inebriety can be no more cured in this way than can neuralgia or sick-headache, or neurasthenia, or hay-fever, or any of the family of diseases to which it belongs.

(…)

Of the nervous symptoms that precede, or accompany, or follow inebriety, are tremors, hallucinations, insomnia, mental depressions, and attacks of trance, to which I give the term alcoholic trance.

(…)

even drunkenness in a parent or grandparent may develop in children epilepsy or insanity, or neurasthenia or inebriety.

(…)

The attacks of inebriety may be periodical; they may appear once a month, and with the same regularity as chills and fever or sick-headache, and far more regularly than epilepsy, and quite independent of any external temptation or invitation to drink, and oftentimes are as irresistible and beyond the control of will as spasms of epilepsy or the pains of neuralgia or the delusions of insanity. Inebriety is not so frequent among the classes that drink excessively as among those who drink but moderately, although their ancestors may have been intemperate; it is most frequent in the nervous and highly organized classes, among the brain-workers, those who have lived indoors; there is more excessive drinking West and South than in the East, but more inebriety in the East.”

probably no country outside of China uses, in proportion to population, so much opium as America, and as the pains and nervousness and debility that tempt to the opium habit are on the increase, the habit must inevitably develop more rapidly in the future than in the past; of hay-fever there must, in a not very distant time, be at least 100,000 cases in America, and in the 20th century hundreds of thousands of insane and neurasthenics.”

There must be, also, an increasing number of people who cannot bear severe physical exercise. Few facts relating to this subject are more instructive than this — the way in which horseback-riding is borne by many in modern times. In our country, I meet with large numbers who cannot bear the fatigue of horseback-riding, which used to be looked upon — possibly is looked upon to-day — as one of the best forms of exercise, and one that is recommended as a routine by physicians who are not discriminating in dealing with nervously-exhausted patients.” The greatest possible care and the best judgment are required in prescribing and adapting horseback-riding to nervous individuals of either sex; it is necessary to begin cautiously, to go on a walk for a few moments; and even after long training excess is followed by injury, in many cases.”

ANTIRRUBENISMO: “If either extreme is to be chosen, it is well, on the whole, to err on the side of rest rather than on the side of excess of physical exertion.”

Why Education is behind other Sciences and Arts? Schools and colleges everywhere are the sanctuaries of medievalism, since their aim and their powers are more for retaining what has been discovered than for making new discoveries; consequently we cannot look to institutions or organizations of education for the reconstruction of that system by which they enslave the world and are themselves enslaved. It is claimed by students of Chinese character that that great nation has been kept stationary through its educational policy — anchored for centuries to competitive examinations which their strong nerves can bear while they make no progress. In a milder way, and in divers and fluctuating degrees, all civilized nations take their inspiration from China, since it is the office and life of teaching to look backward rather than forward; in the relations of men as in physics, force answers to force, and as the first, like the second childhood is always reactionary, a class of youths tend by their collective power to bring the teacher down more than he can lift them up. Only conservative natures are fond of teaching; organizations are always in the path of their own reconstruction; mediocrity begets mediocrity, attracts it, and is attracted by it. Whence all our institutions become undying centres of conservatism. The force that reconstructs an organization must come from outside the body that is to be reconstructed.”

The Gospel of Rest. The gospel of work must make way for the gospel of rest. The children of the past generation were forced, driven, stimulated to work, and in forms most repulsive, the philosophy being that utility is proportioned to pain; that to be happy is to be doing wrong, hence it is needful that studies should not only be useless but repelling, and should be pursued by those methods which, on trial, proved the most distressing, wearisome, and saddening. That this philosophy has its roots in a certain truth psychology allows, but the highest wisdom points also to another truth, the need of the agreeable; our children must be driven from study and all toil, and in many instances coaxed, petted, and hired to be idle; we must drive them away from schools as our fathers drove them towards the schools; one must be each moment awake and alive and active, to keep a child from stealthily learning to read; our cleverest offspring loves books more than play, and truancies [matar aula] and physical punishments are far rarer than half a century ago.”

From investigations at Darmstadt, Paris, and Neuremburg, Dr. Treichler concludes that one-third of the pupils suffer more or less from some form of headache. It is not probable that these headaches in children are the result purely of intellectual exertion, but of intellectual exertion combined with bad air, with the annoyances and excitements and worries, the wasting and rasping anxieties of school life.”

Even studies that are agreeable and in harmony with the organs, and to which tastes and talents are irresistibly inclined, are pursued at an expenditure of force which is far too great for many nervously organized temperaments. I have lately had under my care a newly married lady who for some years has been in a state of neurasthenia of a severe character, and of which the exciting cause was devotion to music at home; long hours at the piano, acting on a neurasthenic temperament, given to her by inheritance, had developed morbid fears and all the array of nervous symptoms that cluster around them, so that despite her fondness for a favorite art she was forced to abandon it, and from that time was dated her improvement, though at the time that I was called in to see her she had yet a long way to travel before she would reach even approximate health.”

The reconstruction of the principles of evidence, the primary need of all philosophy, which cannot much longer be delayed, is to turn nearly all that we call history into myth, and destroy and overthrow beyond chance of resurrection all but a microscopic fraction of the world’s reasoning. Of the trifle that is saved, the higher wisdom of coming generations will know and act upon the knowledge that a still smaller fraction is worthy of being taught, or even remembered by any human being.” A tragédia é que uma filosofia do conhecimento só pode vir depois da burra e didática memorização de fatos tão lineares quanto sem nexo. Ou seja: chega-se ao ideal da educação quando ela já está finalizada ou, antes, só se chega ao suposto ideal, descobrindo-se que o começo devera ter sido diferente, quando o começo se sedimentou. Pode-se ensinar certo, mas não se pode aprender certo!

The fact that anything is known, and true and important for some is of itself no reason why all should know or attempt to know it”

Our children are coaxed, cajoled, persuaded, enticed, bluffed, bullied, and driven into the study of ancient and modern tongues; though the greatest men in all languages, whose writings are the inspiration to the study of languages themselves knew no language but their own; and, in all the loftiest realms of human creative power the best work has been done, and is done today, by those who are mostly content with the language in which they were cradled.” “of all accomplishments, the ability to speak and write in many tongues is the poorest barometer of intellectual force, and the least satisfactory for happiness and practical use”

Shakespeare, drilled in modern gymnasia and universities, might have made a fair school-master, but would have kept the world out of Hamlet and Othello.”

Of the sciences multiplying everyday, but few are to be known by any one individual; he who has studied enough of the systematized knowledge of men, and looked far enough in various directions in which it leads to know which his tastes and environment best adapt him to follow, and who resolutely obeys his tastes, even in opposition to all teachers,(*) philosophers, and scholars, has won the battle of life” Mementos: Jabur, Edsono (um representante dos jornalistas e um dos pseudossociofiloepistemólogos)

the study of the art of thinking, of the philosophy of reasoning, in mathematics, poetry, science, literature, or language, is the best exercise for those who would gain this mental discipline”

O coach está para para o acadêmico de hoje como os sofistas estavam para os filósofos jônicos e eleatas da Grécia Antiga: é um sintoma da crise e insustentabilidade desse modo de conhecimento, mas tampouco chega a lugar algum. Prenuncia um tipo de Sócrates que vem aí?

In all spheres of thought, the most hospitable of intellects, the most generous in their welcome to new truths or dreams of truth are those who have once learned the great secret of life—how to forget.”

GUSMÓN: “Conscientious professors in colleges often-times exhort their graduates to keep up some of the studies of college life during the activity of years — if those graduates are ever to do much in the world, it is by doing precisely NOT what they are thus advised to do.”

ESPECIALISTA AGRAMATICAL: “The details of geography, of mathematics, and of languages, ancient as well as modern, of most of the sciences, ought, and fortunately are, forgotten almost as soon as learned, save by those who become life-experts in these special branches”

The systems of Froebel and Pestalozzi, and the philosophy of Rousseau in his Émile, analyzed and formulated in physiological language is, in substance, that it costs less force and is more natural and easy to get into a house through the doors, than to break down the walls, or come through the roof, or climb up from the cellar. Modern education is burglary; we force ideas into the brain through any other pathway and every other way except the doors and windows, and then we are astonished that they are unwelcome and so quickly expelled.”

they see with the mind’s eye, though we close their eyelids.”

Medicine has been taught in all our schools in a way the most unphilosophical, and despite all the modifications and improvements of late years, by bedside teaching and operations and demonstrations, the system of medical education is in need of reconstruction from the foundation; it begins where it should end; it feeds the tree through the leaves and branches instead of through the roots; physiology itself is taught unphysiologically; the conventional, hereditary, orthodox style is, for the student to take systematic text-books, go through them systematically from beginning to end, and attend systematic lectures, reserving study at the bedside for the middle and later years of his study; the didactic instruction coming first, and the practical instruction and individual observation coming last. Psychology and experience require that this should be reversed; the first years of the medical student’s life should be given to the bedside, the laboratory and dissecting room, and the principles of systematic instruction should be kept for the last years, and then used very sparingly. The human mind does not work systematically, and all new truths enter most easily and are best retained when they enter in psychological order. System in text-books is a tax on the nerve-force, costly both of time and of energy, and it is only by forgetting what has been taught them in the schools that men even attain eminence in the practice of medicine.

The first lesson and the first hour of medical study should be at the bedside of the sick man; before reading a book or hearing a lecture, or even knowing of the existence of a disease, the student should see the disease, and then, after having seen it and been instructed in reference to it, his reading will be a thousand-fold more profitable than it would had he read first and seen the case afterwards. Every practitioner with any power of analyzing his own mental operations knows that his reading of disease is always more intelligent after he has had a case, or while he has a case under treatment under his own eyes, and he knows also that all his reading of abstract, systematic books is of but little worth to him when he meets his first case, unless he re-read, and if he do so, he will find that he has forgotten all he has read before, and he will find, also, that he never understood what he read, and perhaps thoroughly and accurately recited on examination. By this method one shall learn more what is worth learning of medicine in one month, than now we learn in a year, under the common system, and what is learned will be in hand and usable, and will be obtained at incommensurably less cost of energy, as well as of time. So-called <systematic instruction> is the most extravagant form of instruction and is really no instruction, since the information which it professes to give does not enter the brain of the student, though the words in which it is expressed may be retained, and recited or written out on examination. I read the other day an opening lecture by a professor in one of our chief medical schools. I noticed that the professor apologized for being obliged to begin with what was dry and uninteresting, but stated that in a systematic course it was necessary to do so. It will not be his fault only, but rather the fault of the machinery of which he is one of the wheels, if the students who listen to and take notes of and worry over his lecture, never know what he means; 5 minutes study of a case of rheumatism or an inflamed joint, under the aid of an expert instructor, will give a person more knowledge of inflammation, in relation to the practice of medicine, than a year of lectures on that subject.

I make particular reference to medical education, not because it is the leading offender, but because it has made greater progress, perhaps, than almost any other kind of modern education.” and the time will come when men shall read with amusement and horror of intelligent, human, and responsible young men beginning a medical course by listening to systematic abstract lectures.” 140 anos e nada…

In theological seminaries, students are warned about preaching, or speaking, or lecturing during their 1st or 2nd year, and tied and chained down to lectures and homiletics, and theology and history” Nothing David (or Solomon) would be good at…

Aside from the study of language, which is a separate matter, the first day’s work in a theological school should be the writing or preparing a sermon, and homiletics should follow — not precede.”

All languages should be learned as we learn our own language — not through grammars or dictionaries, but through conversation and reading, the grammars and dictionaries being reserved for a more advanced stage of investigation and for reference, just as in the language in which we were born.”

I applaud the English because they boast of their ignorance of American geography; of what worth to them, of what worth to most of us whether Montana be in California, or Alaska be or be not the capital of Arizona?”

The Harvard professor who says that when students enter his room his desire is, not to find out what they knew, but what they did not know, ought to have been born in the 20th century, and possibly in the 30th, for his philosophy is so sound and so well grounded psychology that he cannot hope to have it either received or comprehended in his lifetime; and the innovation that Harvard has just promised, of having the teacher recite and the pupils ask the questions, is one of the few gleams of light in the great darkness by which this whole subject of education has been enveloped.”

EDSONO’S EXQUISITE CLASS OF TORTURE (2009): Lectures, except they be of a clinical sort [belo troca-trilho!], in which appeals are made to the senses, cost so much in nerve-force, in those that listen to them, that the world cannot much longer afford to indulge in them and the information they give is of a most unsatisfactory sort, since questioning, and interruption, and repetition, and reviewing are scarcely possible (…) The human brain is too feeble and limited an organ to catch a new idea when first stated, and if the idea be not new it is useless to state it.”

ServIce on dem and us

dire dim straits

a threat!

One of the pleasantest memories in my life, is that, during my medical education, I did not attend one lecture out of 12 — save those of a clinical sort — that were delivered (brilliant and able as some of them were) in the college where I studied, and my regret is that the poverty of medical literature at that time compelled me to attend even those. All the long lectures in my academical course at the college were useful to me — and I think were useful to all my classmates — only by enforcing the necessity, and inspiring the habit of enduring passively and patiently what we know to be in all respects painful and pernicious, providing we have no remedy.”

Original thinkers and discoverers, and writers are objects of increasing worry on the part of their relatives and friends lest they break down from overwork; whereas, it is not so much these great thinkers as the young school-girl or bank clerk that needs our sympathy.”

In England during the last summer, I attempted, without any human beings on whom to experiment, to explain some of the theories and philosophies of trance before an audience composed of the very best physiologists and psychologists of Europe, and with no hetter success than at home. If I had had but one out of the 20 or 30 cases on whom I have lately experimented, to illustrate and enforce my views, there would have been, I am sure, no difficulty in making clear not only the facts, but what is of chief importance, the interpretation of the facts.”

Modern competitive examinations are but slightly in advance of the system of recitations and lectures. They seem to have been invented by someone who wished to torture rather than benefit mankind, and whose philosophy was: whatever is disagreeable is useful, and that the temporary accumulation of facts is true wisdom, and an accurate measure of cerebral force.”

Knowing by heart is not knowing at all” Montaigne

the greatest fool may often pass the best examination [Exemplo contemporâneo: ‘Patrick Damascenos’ se tornando médicos diplomados por universidades federais – no mínimo os minions esquecem o que aprendem em História após 30 dias (‘conteúdo inútil’, etc.), embora apostilas do Sigma ou Galois nunca fossem lá muito confiáveis, para início de conversa…]; no wise man can always tell what he knows; ideas come by suggestion rather than by order; you must wait for their appearing at their own time and not at ours” “he who can always tell what he knows, knows little worth knowing.”

The first signs of ascension, as of declension, in nations are seen in women.”

palace cars and elevators and sewing machines are types of recent improvements that help to diminish the friction of modern life. Formerly [!!!] inventors increased the friction of our lives and made us nervous.” E que diabos eram palace cars?

The Germanization of America — by which I mean the introduction through very extensive immigration, of German habits and character — is a phenomenon which can now be observed, even by the dullest and nearest-sighted, in the large cities of the Northern portion of our country.” O nazismo foi o último a chegar.

tending to displace pernicious whiskey by less pernicious beer and wine, setting the example of coolness and calmness, which the nervously exhausted American very much needs.”

Tempos em que valia a pena se conservar: “We have been all English in our conservatism, a quality which has increased in proportion as we have gained anything of wealth or character or any manifestation of force whatsoever, that is worth preserving.” Hoje os americanos são azeitonas vencidas em conserva.

after such a vacation one needed a vacation.”

The nervousness of the third generation of Germans [?] is a fact that comes to my professional notice more and more.”

Not only are the <ha, ha’s> [RONALDINHO SOCCER!], of which so much [mundial] SPORT was once made, heard much less frequently than formerly in public meetings, but there is a positive ease and attractiveness to very many of the English speakers in and out of Parliament, in the pulpit and on the platform, that is thoroughly American” it was proved that if all the [congress] speakers continued to speak as often and as elaborately as they had been speaking, a number of years would be required before they could adjourn [se significa entrar em recesso ou perder a próxima eleição, deixo a critério do leitor de criptas!].”

the forces that renovate and save are mightier far than the forces that emasculate and destroy.”

Não sei se chamo o comentário de genial ou estúpido: “The American race, it is said, is dying out; but there is no American race. Americans are the union of European races and peoples, as lakes are fed by many streams, and can only disappear with the exhaustion of its sources. Europe must die before America. In sections of America, as in New England, and in large cities, the number of children to a family in certain classes is too small for increase of population.” Uma eterna sucessão de sins e nãos no melhor estilo Cleber Machado!

Felizmente o Deus Europeu-Ocidental morreu e a Ásia com seu rostinho de beldade imortal de 20 aninhos vem aí…

GLOSSÁRIO PSICANALÍTICO ou A FANTÁSTICA FÁBRICA DE CASOS ou ainda “NOVELA DAS NOJEIRAS E SUJIDADES DAS BIOGRAFIAS DOS PSICANALISTAS ATÉ AQUI (2001, por falta de dados mais atuais)”

considerações preliminares (Roud. & Plon)

a terminologia analítica dá uma impressão insólita que a língua de Freud não dá, se os recursos da língua do tradutor não (sic) forem sempre explorados; em outros casos é a simplicidade da expressão freudiana que torna imperceptível o seu tecnicismo.” “O método conveniente é antes de mais nada histórico-crítico, como o do Vocabulaire technique et critique de la philosophie, de André Lalande. Eram estas as intenções iniciais quando, por volta de 1937-39, se começou a executar o projeto de um vocabulário da psicanálise. Os dados recolhidos perderam-se”

a oposição entre <pulsão> e <instinto>, necessária para a compreensão da teoria psicanalítica, em nenhum lugar é formulada por Freud: a oposição entre <escolha por apoio> de objeto (ou anaclítica) e <escolha narcísica de objeto>, embora retomada pela maior parte dos autores, nem sempre é relacionada com aquilo que em Freud a esclarece: o <apoio> ou <anáclise> das <pulsões sexuais> sobre as funções de <auto-conservação>; a articulação entre <narcisismo> e <auto-erotismo>, sem a qual não se pode situar estas duas noções, perdeu rapidamente a sua primitiva nitidez, e isto até no próprio Freud.”

Psicanalistas não batem cabeça.

O primeiro dicionário de psicanálise, intitulado Handwörterbuch der Psychoanalyse, foi elaborado por Richard Sterba, entre 1931 e 1938. Foram publicados cinco fascículos, até o momento em que a ocupação da Áustria pelos nazistas pôs fim ao empreendimento. A intenção era compor um léxico geral dos termos freudianos, um vocabulário mais do que um recenseamento dos conceitos: <Não desconheço, escreveu Freud em uma carta a seu discípulo, que o caminho que parte da letra A e passa por todo o alfabeto é muito longo, e que percorrê-lo significaria para você uma enorme carga de trabalho. Assim, não o faça, a menos que se sinta internamente levado a isso. Apenas sob o efeito desse impulso, mas certamente não a partir de uma incitação externa!>” “Em sua famosa análise do caso Dora (Ida Bauer), ele frisava que um dicionário é sempre objeto de um prazer solitário e proibido, no qual a criança descobre, à revelia dos adultos, a verdade das palavras, a história do mundo ou a geografia do sexo.” “Sterba interrompeu a redação do seu Handwörterbuch na letra L, e a impressão do último volume na palavra Grössenwahn: <Não sei, declarou vinte anos depois em uma carta a Daniel Lagache, se esse termo se refere à minha megalomania ou à de Hitler.> De qualquer forma, o Handwörterbuch inacabado serviu de modelo para as obras do gênero, todas publicadas na mesma data (1967-1968), em uma época em que o movimento psicanalítico internacional, envolvido em rupturas e dúvidas, experimentava a necessidade de fazer um balanço e recompor, através de um saber comum, a sua unidade perdida. Diversas denominações foram utilizadas: GLOSSÁRIO, dicionário, enciclopédia, vocabulário.” “o Critical Dictionary of Psychoanalysis (600 verbetes) do psicanalista inglês Charles Rycroft, claro, conciso e racional, tinha a vantagem de não ser uma obra coletiva. (…) Rycroft foi também o primeiro a pensar o freudismo sem com isso deixar de considerar a terminologia pós-freudiana (especialmente a de Melanie Klein e de Donald Woods Winnicott).”

Quanto ao célebre Vocabulário da psicanálise(417 verbetes) de Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis, foi o primeiro e único a estabelecer os conceitos da psicanálise encontrando as <palavras> para traduzi-los, segundo uma perspectiva estrutural aplicada à obra de Freud. Composto de verdadeiros artigos (de 20 linhas a 15 páginas), e não de curtas notas técnicas, como os precedentes, inaugurou um novo estilo, optando por analisar <o aparelho nocional da psicanálise>, isto é, os conceitos elaborados por esta para <explicar suas descobertas específicas>. Marcados pelo ensino de Lacan e pela tradição francesa da história das ciências, os autores conseguiram a proeza de realizar uma escrita a duas vozes, impulsionada por um vigor teórico ausente nas outras obras. É a essas qualidades que ela deve seu sucesso.

Os insucessos terapêuticos, a invasão dos jargões e das lendas hagiográficas levaram a uma fragmentação generalizada do movimento freudiano, deixando livre curso à ofensiva fin-de-siècle das técnicas corporais. Relegada entre a magia e o cientificismo, entre o irracionalismo e a farmacologia, a psicanálise logo tomou o aspecto de uma respeitável velha senhora perdida em seus devaneios acadêmicos. O universalismo freudiano teve então o seu crepúsculo, mergulhando seus adeptos na nostalgia das origens heróicas.” Ó! “apareceram monstros polimorfos [Cilas], com entradas anárquicas e profusas, nas quais a lista dos verbetes, artigos e autores estendia-se infinitamente, pretendendo esgotar o saber do mundo, sob o risco de mergulhar as boas contribuições em um terrível caos.” Ver Bouvard e Pécuchet, de Flaubert!

Foram incluídos, enfim, os membros da família de Sigmund Freud, seus mestres diretos, os escritores e artistas com os quais ele manteve correspondência importante ou contato pessoal determinante, [PARTE DA FOFOCA E BASTIDORES] e os 23 livros por ele publicados entre 1891 e 1938, inclusive o segundo, escrito com Josef Breuer (Estudos sobre a histeria), e o último, inacabado e publicado a título póstumo (Esboço de psicanálise). Foi acrescentada uma outra obra póstuma, O presidente Thomas Woodrow Wilson, da qual Freud redigiu apenas o prefácio, mas à qual deu contribuição essencial como co-autor ao lado de William Bullitt.”

ABREVIATURAS BIBLIOGRÁFICAS

ESB Sigmund Freud, Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 24 vols., Rio de Janeiro, Imago, 1977

GW Sigmund Freud, Gesammelte Werke, 17 vols., Frankfurt, Fischer, 1960-1988

IZPInternationale ärztlische Zeitschrift für Psychoanalyse

IJP International Journal of Psycho-Analysis

OC Sigmund Freud, Oeuvres complètes, 21 vols., Paris, PUF, em preparação desde 1989

SE The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud, org. James Strachey, 24 vols., Londres, Hogarth Press, 1953-1974

INÍCIO DO GLOSSÁRIO PROPRIAMENTE DITO, EM ORDEM ALFABÉTICA (ver BIBLIOGRAFIA-BASE e RECOMENDAÇÕES DE LEITURA ao final)

a posteriori ou ação diferida ou só-depois

O termo nachträglich é de uso repetido e constante em F., que muitas vezes o emprega sublinhado. Encontramos também a forma substantivada Nachträglichkeit

Segundo Jung, o adulto reinterpreta o seu passado nas suas fantasias, que constituem outras tantas expressões simbólicas dos seus problemas atuais. (…) meio de fugir das <exigências da realidade> presente” Vinculação com os estratos de Reich.

F. pergunta: por que o recalque incide preferencialmente sobre a sexualidade? (…) O primeiro acontecimento no tempo é constituído por uma cena sexual (sedução por um adulto), mas que não tem então para a criança significação sexual. O segundo apresenta certas analogias, que podem ser superficiais; mas, pelo fato de que nesse meio tempo surgiu a puberdade, a emoção sexual é possível, emoção que o sujeito ligará conscientemente a este segundo acontecimento, quando na realidade é provocada pela recordação do primeiro. (…) O ego utiliza então o recalque, modo de <defesa patológica>”

A tradução como “ação diferida”, em português e inglês, é hoje considerada anacrônica e indutora de confusão. Hoje: complemento ao verbete ab-reação.

ab-reação

#Autorreferente #facebookCasosdeFamília

Tudo menos os anos de zumbi (2009-2011)! Tudo menos o passado e o futuro remotos (o Ceará e a Soneca dos mortos)! Tudo menos o gelo do zero absoluto a que cheguei nestas incríveis zonas temporais que hoje me são estranhas, como se pertencessem a séculos enterrados pela humanidade, cujas vicissitudes ficaram sem registros. Postura que eu classificaria hoje como Anti-Ed***d****. A cura do Vanigracismo. Son of Netherrealm, aiming the Ascension. Thorns and Aborted Trees. You shouldn’t needa drink to kill or exorcize some painful devils… Foda-se a SOMAtória de suas vãs probabilidades…

A persistência do afeto que se liga a uma recordação depende de diversos fatores, e o mais importante deles está ligado ao modo como o sujeito reagiu a um determinado acontecimento. Esta reação pode ser constituída por reflexos voluntários e involuntários, pode ir das lágrimas à vingança. Se tal reação for suficientemente importante, grande parte do afeto ligado ao acontecimento desaparecerá. Se essa reação for reprimida(unterdrückt), o afeto se conservará ligado à recordação.”

A ab-reação é o caminho normal” “a ab-reação pode ser secundária, provocada pela psicoterapia catártica, que permite ao doente rememorar e objetivar pela palavra o acontecimento traumático, e libertar-se assim do quantum de afeto que o tornava patogênico.” TABU É O TEU CU: Verbalizar a morte do próximo. A maior burrice é ser inteligente o tempo todo. Em briga de condomínio de homens das cavernas não se usa terno e gravata nem se apara barba. Às vezes cagar nas calças é, sim, o melhor remédio. Uma ventilada brutal ou cem azias, tu escolhes – que fria! Vaso entupido, contanto que não seja o meu, é merda na cu da pimenta, ehr, quer dizer… Eu não levo desaforo pra casa: deixo debaixo da ponte mesmo…

AB-NEGADO AB-O-TO-‘ADO OR ÍGIDO FREE-GIDON (MICE MARINEER-BIKERS)

CRACK CRACK CRACK! SHRECK!

ranço

abraço

dinasTIA

Jardimdim fancyn’

Socorro!

Carolíngia

do Papado

ad-block

ab-rock

ad odd world Helenistic Hell flows like an

Hell-aclitean pseudorriver

on that party that’s over

DAD

DED

HA-DAD-É O NOVO PRES-

O? PREÇO DO SENTIMENTO SUFO

CADO

PRESIDENTE DO BRASIL

S’Il y a fascists…

we’re gonna smash them

with all your heavy solos

and boots

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AUTOANALstesia

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flow

frown

but not

nut bot

drown’d.

into the dust

in to d dãs

in 2 they do

us

estou tenso, logo fezes muito tudo ISSO

to be or not to be oh honey

sterile

barking at the moon

As 3 histerias antigas (retenções de reação):

a) limitação psicofisiológica (pavor, estado hipnótico) HISTERIA HIPNÓIDE

b) limitação social atual HISTERIA DE RETENÇÃO (sovina de MERDA)

c) repressão consciente voluntária (conscientemente esquecer!) HISTERIA DE DEFESA (é o pior ataque?! – eu diria, antes, MÁ-FÉ)

OBS: “a” e “b” foram “extintas”.

Abraham, Karl

nome indissociável da história da grande saga freudiana. (…) pioneiro no desenvolvimento da psicanálise em Berlim. (…) Elaborou uma teoria dos estágios inspirado em Klein, que foi sua aluna. Formou muitos analistas, entre os quais Helene Deutsch, Edward Glover, Karen Horney, Sandor Rado, Ernst Simmel.”

Em 1906, casou-se com Hedwig Bürgner. Tiveram dois filhos. Abraham analisou sua filha Hilda (1906-1971), descrevendo o caso em um artigo de 1913, intitulado A pequena Hilda, devaneios e sintomas em uma menina de 7 anos.

Mais clínico do que teórico, Abraham escreveu artigos claros e breves, nos quais domina a observação concreta. Devem-se distinguir três épocas. Entre 1907 e 1910, dedicou-se a uma comparação entre a histeria e a demência precoce (que ainda não era chamada esquizofrenia) e à significação do trauma sexual na infância. Durante os dez anos seguintes, estudou a psicose maníaco-depressiva, o complexo de castração na mulher e as relações do sonho com os mitos. Em 1911, publicou um importante estudo sobre o pintor Giovanni Segantini (1859-1899), atingido por distúrbios melancólicos. Em 1912, redigiu um artigo sobre o culto monoteísta de Aton, do qual Freud se serviria em Moisés e o monoteísmo, esquecendo de citá-lo. Enfim, durante o terceiro período, descreveu os três estágios da libido: anal, oral, genital.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Karl Abraham, Oeuvres complètes, 2 vols. (1965), Paris, Payot, 1989;

Hilda Abraham, Karl Abraham, biographie inachevée, Paris, PUF, 1976.

Adler, Alfred (1870-1937)

Adler, primeiro grande dissidente da história do movimento psicanalítico,¹ nasceu em Rudolfsheim, subúrbio de Viena, em 7 de fevereiro de 1870. Na verdade, nunca aderiu às teses de Sigmund Freud, de quem se afastou em 1911, sem ter sido, como Carl Gustav Jung, seu discípulo privilegiado. (…) Ambos eram judeus e vienenses, ambos provinham de famílias de comerciantes que nunca conheceram realmente o sucesso social. Adler freqüentou o mesmo Gymnasium que Freud e fez estudos de medicina mais ou menos idênticos aos seus. Entretanto, originário de uma comunidade de Burgenland, era húngaro, o que fazia dele cidadão de um país cuja língua não falava. Tornou-se austríaco em 1911 e nunca teve a impressão de pertencer a uma minoria ou de ser vítima do anti-semitismo.

Segundo de 6 filhos, tinha saúde frágil, era raquítico e sujeito a crises de falta de ar. Além disso, tinha ciúme do irmão mais velho, que se chamava Sigmund, e com quem teve uma relação de rivalidade permanente, como a que teria mais tarde com Freud.” Vira-se para o Marxismo.

¹ Uma estátua para o rapaz já!

Em 1897, casou-se com Raissa Epstein, filha de um comerciante judeu originário da Rússia. A jovem pertencia aos círculos da intelligentsia e propalava opiniões de esquerda que a afastavam do modo de vida da burguesia vienense, em que a mulher devia ser antes de tudo mãe e esposa. Através dela, Adler freqüentou Léon Trotski (1879-1940) e depois, em 1908, foi terapeuta de Adolf Abramovitch Ioffe (1883-1927), futuro colaborador deste no jornal Pravda.

Em 1898, publicou sua primeira obra, Manual de higiene para a corporação dos alfaiates. Nela, traçava um quadro sombrio da situação social e econômica desse ofício no fim do século: condições de vida deploráveis, causando escolioses e doenças diversas ligadas ao uso de tinturas, salários miseráveis, etc.”

Em 1902, depois de ficar conhecendo Freud, começou a freqüentar as reuniões da Sociedade Psicológica das Quarta-Feiras, fazendo amizade com Wilhelm Stekel.” “Foi nessa data (1909) que começaram a se manifestar divergências fundamentais entre suas posições e as de Freud e seus partidários. Elas constam das Minutas da Sociedade, transcritas por Otto Rank e editadas por Hermann Nunberg.” “Freud começou então a criticar o conjunto das posições de Adler, acusando-o de se apegar a um ponto de vista biológico, de utilizar a diferença dos sexos em um sentido estritamente social e, enfim, de valorizar excessivamente a noção de inferioridade. Hoje, encontra-se a concepção adleriana da diferença dos sexos entre os teóricos do gênero (gender).” “Adler estava edificando uma psicologia do eu, da relação social, da adaptação, sem inconsciente nem determinação pela sexualidade.” “A noção de órgão inferior já existia na história da medicina, em que muitos clínicos observaram que um órgão de menor resistência sempre podia ser o centro de uma infecção. Adler transpunha essa concepção para a psicologia, fazendo da inferioridade deste ou daquele órgão em um indivíduo a causa de uma neurose transmissível por predisposição hereditária. Segundo ele, era assim que apareciam doenças do ouvido em famílias de músicos ou doenças dos olhos em famílias de pintores, etc.” Doenças do estômago em famílias retirantes?

A ruptura entre Freud e Adler foi de uma violência extrema, como mostram as críticas recíprocas que trocaram 35 anos depois. A um interlocutor americano que o questionava sobre Freud, Adler afirmou, em 1937, que <aquele de quem nunca fôra discípulo era um escroque astuto e intrigante>. Por sua vez, informado da morte de seu compatriota, Freud escreveu estas palavras terríveis em uma célebre carta a Arnold Zweig: <Para um rapaz judeu de um subúrbio vienense, uma morte em Aberdeen é por si só uma carreira pouco comum e uma prova de seu progresso. Realmente, o mundo o recompensou com generosidade pelo serviço que ele lhe prestou ao opor-se à psicanálise.>” “Foi preciso esperar pelos trabalhos da historiografia erudita, principalmente os de Henri F. Ellenberger e os de Paul E. Stepansky, para se formar uma idéia mais exata da realidade dessa dissidência.”

Em 1912, publicou O temperamento nervoso, em que expôs o essencial da sua doutrina, e um ano depois fundou a Associação para uma Psicologia Individual, com ex-membros do círculo freudiano, entre os quais Carl Furtmuller (1880-1951) e David Ernst Oppenheim (1881-1943).”

Em 1930, recebeu o título de cidadão de Viena, mas 4 anos depois, pressentindo que o nazismo dominaria a Europa inteira, pensou em emigrar para os Estados Unidos.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Alfred Adler, La Compensation psychique de l’état d’infériorité des organes (1898), Paris, Payot, 1956;

Manès Sperber, Alfred Adler et la psychologie individuelle (1970), Paris, Gallimard, 1972.

abstinência

É em 1915, ao se interrogar sobre qual deve ser a atitude do psicanalista confrontado com as manifestações da transferência amorosa, que Sigmund Freud fala pela primeira vez da regra de abstinência. Esclarece que não pretende evocar apenas a abstinência física do analista em relação à demanda amorosa da paciente, mas o que deve ser a atitude do analista para que subsistam no analisando as necessidades e desejos insatisfeitos que constituem o motor da análise.

Para ilustrar o caráter de tapeação de que se revestiria uma análise em que o analista atendesse às demandas de seus pacientes, Freud evoca a anedota do padre que vai dar os últimos sacramentos a um corretor de seguros descrente: ao final da conversa no quarto do moribundo, o ateu não parece haver se convertido, mas o padre contratou um seguro.”

o tratamento psicanalítico deve, <tanto quanto possível, efetuar-se num estado de frustração e abstinência>. Mas F. deixa claro que não se trata de proibir tudo ao paciente e que a abstinência deve ser articulada com a dinâmica específica de cada análise. Este último esclarecimento foi progressivamente perdido de vista, assim como se esqueceu a ênfase depositada por Freud no caráter incerto da satisfação a longo prazo. O surgimento de uma concepção pedagógica e ortopédica do tratamento psicanalítico contribuiu para a transformação da regra de abstinência em um conjunto de medidas ativas e repressivas, que visam fornecer uma imagem da posição do analista em termos de autoridade e poder.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Sigmund Freud, “Observações sobre o amor transferencial”, (1915), ESB, XII, pp. 208-21. (artigo)

afaniseou afânise

Termo introduzido por Ernest Jones (Early Development of Female Sexuality, 1927); desaparecimento do desejo sexual. Segundo este autor, a afanise seria, nos 2 sexos, objeto de um temor mais fundamental que o temor da castração.”

afeto

O afeto é a expressão qualitativa da quantidade de energia pulsional e das suas variações.” Mais tarde, ainda em Freud (muito confuso): “O afeto é aí definido como a tradução subjetiva da quantidade de energia pulsional. Freud distingue aqui nitidamente o aspecto subjetivo do afeto e os processos energéticos que o condicionam.”

LINK COM #Ab-reação: “Somente quando a evocação da recordação provoca a revivescência do afeto que estava ligado a ela na origem é que a rememoração encontra a sua eficácia terapêutica.”

O mundo como afeto & representação (não existe afeto inconsciente)

Sub-espécies de estados do afeto dinâmico:

a) transformação (ansiedade, depressão)

b) deslocamento (obsessão, paranóia)

c) conversão (histeria)

(Classificação tripartite provavelmente tão obsoleta quanto aquela da histeria enumerada no verbete ab-reação.)

afonia

Perda mais ou menos considerável da força e da clareza da voz.”

afonia”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, http://dicionario.priberam.org/afonia [consultado em 05-10-2018].

agressão

a hipótese de uma <pulsão de agressão> autônoma, emitida por Adler logo em 1908, foi durante muito tempo recusada por Freud” Normal.

…o doente no decorrer de outros tratamentos só evoca transferências ternas e amigáveis em favor da sua cura […]. Na psicaná., em contrapartida, todas as moções, incluindo as hostis, devem ser despertadas, utilizadas pela análise ao se tornarem conscientes.” F.

Um-dois abismo(s) entre o dever e o poder e o ser, hehe!

Os 3 tipos de chistes (e lá vamos nós de novo com esse de TRÊS TIPOS DE…):

a) o ingênuo (o chiste pelo chiste)

b) o hostil (agressivo, negro, defensivo)

c) o obsceno (???)

Alemanha

Sem o advento do nazismo, que a esvaziou da quase totalidade de seus intelectuais e eruditos, a Alemanha teria sido o mais poderoso país de implantação da psicanálise. Se fosse necessário comprovar essa afirmação, bastariam os nomes de seus prestigiosos fundadores, que se naturalizaram americanos, quando não morreram antes de poder emigrar: Karl Abraham, Max Eitingon, Otto Fenichel, Ernst Simmel, Otto Gross, Georg Groddeck, Wilhelm Reich, Erich Fromm, Karen Horney.”

Tratada de <psiquiatria de dona de casa> pelos meios da medicina acadêmica, a psicanálise foi mal-aceita pelos grandes nomes do saber psiquiátrico, e principalmente por Emil Kraepelin. Reprovavam o seu estilo literário e a sua metapsicologia, embora Freud tivesse assimilado em seus trabalhos uma parte importante da nosologia kraepeliniana. Entretanto, foi mesmo no campo do saber psiquiátrico que ela acabou por ser reconhecida, graças à ação de alguns pioneiros.”

No nível universitário, a resistência se manifestou de modo mais determinado. Como sublinha Jacques Le Rider, <a psicologia alemã construíra a sua reputação sobre a pesquisa em laboratório, sobre um método científico do qual a física e a química eram o modelo ideal, e cujo espírito positivo pretendia banir qualquer especulação, reconhecendo apenas um saber sintético: a biologia>. A escola alemã de psicologia reagiu contra a Naturphilosophie do século XIX, essa ciência da alma que florescera na esteira do romantismo e de que se nutriam os trabalhos freudianos.Thomas Mann seria um dos poucos a reconhecer o valor científico desse freudismo julgado excessivamente literário pelos psicólogos universitários.

No campo da filosofia, a psicanálise passava por ser aquele <psicologismo> denunciado por Edmund Husserl desde seus primeiros trabalhos. Assim, ela foi criticada em 1913 por Karl Jaspers (1883-1969) em uma obra monumental, Psicopatologia geral, que teve um grande papel na gênese de uma psiquiatria fenomenológica, principalmente na França, em torno de Eugène Minkowski, de Daniel Lagache e do jovem Jacques Lacan. Em 1937, Alexander Mitscherlisch tentou convencer Jaspers a modificar a sua opinião, mas chocou-se com a hostilidade do filósofo, que manteve-se surdo aos seus argumentos.”

Três congressos se realizaram em cidades alemãs: Nuremberg em 1910, onde foi criada a International Psychoanalytical Association (IPA), Weimar em 1911, do qual participaram 116 congressistas, Munique em 1913, quando se consumou a partida de Jung e seus partidários. Um ano depois, Freud pediu a Abraham que sucedesse a Jung na direção da IPA.”

Centro da divulgação clínica, Berlim continuava sendo pioneira de um certo conservadorismo político e doutrinário. E foi Frankfurt que se tornou o lugar da reflexão intelectual, dando origem à corrente da <esquerda freudiana>, sob a influência de Otto Fenichel, e à instituição do Frankfurter Psychoanalytisches Institut.” “Institut für Sozialforschung (…) Núcleo fundador da futura Escola de Frankfurt, esse instituto de pesquisas sociais fundado em 1923 originou a elaboração da teoria crítica, doutrina sociológica e filosófica que se apoiava simultaneamente na psicanálise, na fenomenologia e no marxismo, para refletir sobre as condições de produção da cultura no seio de uma sociedade dominada pela racionalidade tecnológica.”

Muito se disse, como sabemos, que o seu método original correspondia essencialmente à natureza da burguesia muito refinada de Viena, na época em que ele foi concebido. Claro que isso é totalmente falso em geral, mas mesmo que houvesse um grão de verdade isso em nada invalidaria a obra de Freud. Quanto maior for uma obra, mais estará enraizada em uma situação histórica concreta.”Horkheimer

Em 1930, graças à intervenção do escritor Alfons Paquet (1881-1944), a cidade concedeu a Freud o prêmio Goethe. Em seu discurso, lido por sua filha Anna, Freud prestou homenagem à Naturphilosophie, símbolo do laço espiritual que unia a Alemanha à Áustria, e à beleza da obra de Goethe, segundo ele próxima do eros platônico encerrado no âmago da psicanálise.

Depois da ascensão de Hitler ao poder, Matthias Göring, primo do marechal, decidido a depurar a doutrina freudiana de seu <espírito judaico>, pôs em prática o programa de <arianização da psicanálise>, que previa a exclusão dos judeus e a transformação do vocabulário. Rapidamente, conquistou as boas graças de alguns freudianos, dispostos a se lançarem nessa aventura, como Felix Boehm e Carl Müller-Braunschweig, aos quais se reuniram depois Harald Schultz-Hencke e Werner Kemper. Nenhum deles estava engajado na causa do nazismo. Membros da DPG e do BPI, um freudiano ortodoxo, o segundo adleriano e o terceiro neutro, simplesmente tinham ciúme de seus colegas judeus. Assim, o advento do nacional-socialismo foi para eles uma boa oportunidade de fazer carreira.

ambivalência

Ver também OBJETO (“BOM” E “MAU”).

#OFFTOPICFILOSOFAL É Além do Bem e do Mal a superação do princípio da não-contradição ou apenas uma solução guiada por este princípio? Pegadinha do Mallandgenstein.

anáclise ou apoio

[Devido a divergências de traduções ou simplesmente à incompetência da teoria,] o conceito de Anlehnungnão foi nitidamente apreendido pelos leitores de Freud.” “em francês o substantivo anaclise (anáclise), que traduziria Anlehnung, não é admitido. (…) os autores deste Vocabulário propuseram como equivalente étayage (apoio)”

Trata-se do momento de escolha do primeiro objeto de amor (paixão). A famosa necessidade do supérfluo(encobridor).

Parece que, até hoje, a noção de apoio não foi plenamente apreendida na obra de Freud; quando vemos intervir esta noção, é quase sempre na concepção de escolha de objeto, que longe de defini-la por inteiro, supõe que ela esteja no centro de uma teoria das pulsões.

O seu sentido principal é estabelecer uma [diferença entre as pulsões de autoconservação e o nascimento das pulsões sexuais e auxiliar na compreensão entre a separação entre desenvolvimento da heteronomia e autoerotismo ou narcisimo].” Apoio Exterior

anaclítica, depressão (Klein)

É um tipo de depressão passível de desenvolvimento já em bebês. Poder-se-ia chamar de “desmame traumático” que não foi satisfatoriamente reposto. É estruturalmente oposta à depressão adulta. = HOSPITALIZAÇÃO de ROUDINESCO. O verbete vem de René Spitz (The Psycho-Analytic Study of the Child; La première année de la vie de l’enfant).

análise didática

O ensino formal da psicanálise para a formação do profissional clínico, que inclui a análise propriamente dita do inconsciente do paciente-aprendiz.

Sobre o mito da autoanálise (a 1ª análise didática feita dentro da psicanálise, necessariamente, pelo Pai da disciplina): só Freud? Ou o mesmo afirmara, num congresso, que seria pré-requisito para o exercício da profissão? Respostas mais adiante, nos IMPERDÍVEIS CAPÍTULOS VERBORRÁGICOS DESTA SAGA, amigos!

F. presta homenagem à escola de Zurique por ter <…apresentado a exigência segundo a qual quem quiser praticar análises sobre outros deve 1º submeter-se a uma análise realizada por alguém com experiência>.” Experiência é relativa, diria seu mentor na Filosofia…

Foi em 1922, no Congresso da Associação Psicanalítica Internacional, 2 anos após a fundação do Instituto de Psicanálise de Berlim, que se apresentou a exigência da análise didática para todo e qualquer candidato a analista.”

Para resistir firmemente a essa investida geral do paciente, é preciso que o analista também tenha sido plena e completamente analisado. (…) muitas vezes se julga suficiente que um candidato passe um ano familiarizando-se com os principais mecanismos naquilo a que se chama a sua análise didática. Quanto ao seu progresso ulterior, confia-se no que virá a aprender no decorrer da própria experiência. (…) enquanto nem todos os empreendimentos com fins terapêuticos precisam ser levados até a profundidade quando falamos de uma terminação consumada da análise, o próprio analista deve conhecer e controlar mesmo as fraquezas mais secretas do seu caráter, e isto é impossível sem uma análise plenamente acabada.” Ferenczi

Hmmm… Que torre de Babel não temos aqui!

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Balint, Sobre o sistema de formação psicanalítica

análise direta

Espécie de “análise intensiva” para casos de psicose. Inimiga, portanto, do princípio freudiano de abstinência.

o paciente sente-se compreendido por um terapeuta ao qual atribui a compreensão todo-poderosa de uma mãe ideal; tranqüiliza-se com palavras que visam o conteúdo infantil das suas angústias mostrando a inanidade delas.” Tem-se por base que na terapia para o neurótico a postura do psicanalista tem de ser muito mais neutra. A teoria de base que sustenta essa metodologia é a de que o psicótico é necessariamente aquela criança que sofreu a influências de uma mãe perversa.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Rosen, Direct Analysis

análise existencial (Daseinanalyse)

Entre os adeptos franceses da análise existencial encontramos Eugène Minkowski, o Jean-Paul Sartre de O ser e o nada [Hm… muito mais na persona literária…] e o jovem Michel Foucault (até 1954). (…) Na Grã-Bretanha, é essencialmente em Ronald Laing que encontramos a temática existencial.” how LAING will this treatment take?

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Viktor Frankl, La Psychothérapie et son image de l’homme, Paris, Resma, 1970.

Andersson, Ola

Pioneiro da historiografia erudita, Ola Andersson teve um destino curioso no movimento freudiano. O único livro que escreveu, publicado em 1962 com o título anglófono de Studies in the Pre-history of Psychoanalysis. The Etiology of Psychoneuroses (1886-1896) [ver versão francesa nas indicações de leitura], foi completamente ignorado na Suécia nos meios psicanalíticos, embora seu autor ocupasse funções acadêmicas importantes e fosse responsável pela tradução sueca das obras de Sigmund Freud. [!]”

No seu próprio trabalho, Andersson empreendeu então a primeira grande revisão de um caso princeps dos Estudos sobre a histeria: o caso Emmy von N.. Descobriu seu nome verdadeiro, Fanny Moser, expôs a sua história no congresso da IPA de Amsterdam em 1965, e esperou 14 anos para publicar um artigo sobre esse tema na The Scandinavian Psychoanalytic Review.” “Entretanto, ao contrário de Ellenberger, continuou apegado, como membro da IPA, à ortodoxia oriunda de Ernest Jones, cujo trabalho biográfico admirava, o que o impediu de empenhar-se mais na história erudita. Sofreu muito com seu isolamento no seio da Sociedade Psicanalítica Sueca, a ponto de pedir a Ellenberger, em 1976, que o ajudasse a emigrar para os Estados Unidos.”

Seu sobrenome Andersson, psicanalista ao mesmo tempo integrado e marginal, foi realmente apagado da história intelectual de seu país, a ponto de não figurar na Enciclopédia nacional sueca, ele que havia escrito tantos artigos em diversas enciclopédias suecas.”

Andreas-Salomé, Lou, née Lelia (Louise) von Salomé (1861-1937)

Mais por sua vida do que por suas obras, Lou Andreas-Salomé teve um destino excepcional na história do século XX. Figura emblemática da feminilidade narcísica,¹ concebia o amor sexual como uma paixão física que se esgotava logo que o desejo fosse saciado. Só o amor intelectual, fundado na mais absoluta fidelidade, era capaz, dizia ela, de resistir ao tempo.”

¹ O que seria isso?

Ironizava as invectivas, os boatos e os escândalos, decidida a não se dobrar às imposições sociais. Depois de Nietzsche (1844-1900) e de Rilke (1875-1926), Freud ficou deslumbrado por essa mulher, a quem amou ternamente e que revolucionou a sua existência.

Nascida em São Petersburgo, em uma família da aristocracia alemã, Lou Salomé era filha de um general do exército dos Romanov. Com a idade de 17 anos, recusando-se a ser confirmada pelo pastor da Igreja evangélica reformada, à qual pertencia sua família, colocou-se sob a direção de outro pastor, Hendrik Gillot, dândi brilhante e culto, que se apaixonou por ela logo que a iniciou na leitura dos grandes filósofos.”

Graças a Malwida von Meysenburg (1816-1903), grande dama do feminismo alemão, ficou conhecendo o escritor Paul Rée (1849-1901), que lhe apresentou Nietzsche. Persuadido de que encontrara a única mulher capaz de compreendê-lo, este lhe fez um pedido solene de casamento. Lou recusou-se. A esses dois homens, profundamente apaixonados por ela, propôs então constituírem uma espécie de trindade intelectual, e em maio de 1882 [38 x 33 x 21 anos], para selar o pacto, fizeram-se fotografar juntos, diante de um cenário de papelão: Nietzsche e Rée atrelados a uma charrete, Lou segurando as rédeas.” “Foi a adesão ao narcisismo nietzschiano, e de modo mais geral o culto do ego, característico da Lebensphilosophie (filosofia da vida)¹ fin de siècle, que preparou o encontro de Lou com a psicanálise.” Blá, blá, blá…

¹ Por que afinal via de regra é a filosofia-da-morte, certo?

PICÂNCIA EDÍPICA CHULA

Em junho de 1887, Lou casou-se com o orientalista alemão Friedrich-Carl Andreas, que ensinava na Universidade de Göttingen. O casamento não foi consumado, e Georg Ledebourg, fundador do Partido Social-Democrata alemão tornou-se seu primeiro amante, algum tempo antes de Friedrich Pineles, médico vienense. Essa segunda ligação terminou com um aborto e uma trágica renúncia à maternidade. Lou instalou-se então em Munique, onde ficou conhecendo o jovem poeta Rainer Maria Rilke: <Fui tua mulher durante anos, escreveria ela em Minha vida, porque foste a primeira realidade, em que o homem e o corpo são indiscerníveis um do outro, fato incontestável da própria vida […]. Éramos irmão e irmã, mas como naquele passado longínquo, antes que o casamento entre irmão e irmã se tornasse um sacrilégio.>” “como diria Freud em 1937, <ela foi ao mesmo tempo a musa e a mãe zelosa do grande poeta […] que era tão infeliz diante da vida.>” Mal consigo contar os clichês deste verbete…

Em seu artigo de 1914 sobre o narcisismo, era nela que pensava quando descreveu os traços tão particulares dessas mulheres, que se assemelham a grandes animais solitários mergulhados na contemplação de si mesmos.”“Logo ela abraçou exclusivamente a causa do freudismo. Foi então que se apaixonou porViktor Tausk, o homem mais belo e mais melancólico do círculo freudiano.”“Introduzida no círculo da Berggasse, tornou-se familiar da casa e apegou-se particularmente a Anna Freud. Depois das reuniões das quartas-feiras, Freud a conduzia a seu hotel; depois de cada jantar, a cumulava de flores.”

Fiquei sabendo com temor — e pela melhor fonte — que todos os dias você dedica até dez horas à psicanálise. Naturalmente, considero isso uma tentativa de suicídio mal-dissimulada, o que muito me surpreende, pois, que eu saiba, você tem muito poucos sentimentos de culpa neurótica. Portanto, insisto que pare e de preferência aumente o preço de suas consultas em um quarto ou na metade, segundo as flutuações da queda do marco. Parece que a arte de contar foi esquecida pela multidão de fadas que se reuniram em torno do seu berço quando você nasceu. Por favor, não jogue pela janela este meu aviso.”

Empobrecida pela inflação que assolava a Alemanha e obrigada a manter os membros de sua família arruinados pela Revolução de Outubro, Lou não conseguia suprir suas necessidades. Embora nunca pedisse nada, Freud lhe enviava somas generosas e dividia com ela, como dizia, a sua <fortuna recentemente adquirida>.

OEDIPUS GONNA ANTIOEDIPALIZE YOU: “Lou tornou-se confidente da filha de Freud e até sua segunda analista, quando isso se tornou necessário.”

Para comemorar o seu 75º aniversário, Lou decidiu dedicar a Freud um livro, para expressar sua gratidão e alguns desacordos. Criticava principalmente os erros cometidos pela psicanálise a respeito da criação estética, reduzida abusivamente, dizia ela, a um caso de recalque. Freud aceitou sem reservas a argumentação, mas tentou conseguir que ela mudasse o título da obra (Minha gratidão a Freud).”

A partir de 1933, Lou assistiu com horror à instauração do regime nazista. Conhecia o ódio que lhe consagrava Elisabeth Forster (1846-1935), irmã de Nietzsche, que se tornara adepta fervorosa do hitlerismo. Conhecia os desvios que esta impusera à filosofia do homem de quem fôra tão próxima e que tanto admirava. Não ignorava que os burgueses de Göttingen a chamavam A Feiticeira. Mas decidiu não fugir da Alemanha. Alguns dias depois de sua morte, um funcionário da Gestapo foi à sua casa para confiscar a biblioteca, que seria jogada nos porões da prefeitura:Apresentou-se como razão para esse confisco, escreveu Peters, que Lou fôra psicanalista e praticara aquilo que os nazistas chamavam de ciência judaica, que ela fôra colaboradora e amiga íntima de Sigmund Freud e que a sua biblioteca estava apinhada de autores judeus.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Lou Andreas-Salomé, Fenitschka (Stuttgart, 1898), Paris, Des Femmes, 1985;

______. Érotisme (Frankfurt, 1910, Munique, 1979), in: Eros, Paris, Minuit, 1984; (art.)

______. Rainer Maria Rilke (Leipzig, 1928), Paris, Marendell, 1989;

______. Ma gratitude envers Freud (Viena, 1931, Paris, 1983), Seuil, col. “Points”, 1987, traduzido com o título Lettre ouverte à Freud;

______. Ma vie (Zurique, 1951, Frankfurt 1977), Paris, PUF, 1977;

______. L’Amour du narcissisme, Paris, Gallimard, 1980;

______. Carnets intimes des dernières années (Frankfurt, 1982), Paris, Hachette, 1983;

______. En Russie avec Rilke, 1900. Journal inédit, Paris, Seuil, 1992;

Freud & Lou Andréas-Salomé, correspondência completa (Frankfurt, 1966), Rio de Janeiro, Imago, 1975;

Nietzsche, Rée & Salomé, Correspondance (Frankfurt, 1970), Paris, PUF, 1979;

H.F. Peters, My sister, my spouse (N. York, 1962), Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1986;

Rudolph Binion, Frau Lou, Nietzsche’s Wayward Disciple, Princeton, Princeton University Press, 1968;

Angela Livingstone, Lou Andreas-Salomé: Her Life and Work (Londres, 1984), Paris, PUF, 1990.

antipsiquiatria

Sob certos aspectos, a antipsiquiatria foi a seqüência lógica e o desfecho da psicoterapia institucional. Se esta havia tentado reformar os manicômios e transformar as relações entre os que prestavam e os que recebiam cuidados, no sentido de uma ampla abertura para o mundo da loucura, a antipsiquiatria visou a extinguir os manicômios e eliminar a própria idéia de doença mental.” “foi justamente por ter sido uma revolta que a antipsiquiatria teve, ao mesmo tempo, uma duração efêmera e um impacto considerável no mundo inteiro. Ela foi uma espécie de utopia: a da possível transformação da loucura num estilo de vida, numa viagem, num modo de ser diferente e de estar do outro lado da razão, como a haviam definido Arthur Rimbaud (1854-1891) e, depois dele, o movimento surrealista.”

Assim como o movimento psicanalítico havia fabricado sua lenda das origens através da história de Anna O. (Bertha Pappenheim), a antipsiquiatria também reivindicou a aventura de uma mulher: Mary Barnes. Essa ex-enfermeira, reconhecida como esquizofrênica e incurável, tinha cerca de 40 anos ao ingressar no Hospital de Kingsley Hall, onde Joseph Berke a deixou regredir durante 5 anos. Através dessa descida aos infernos e de uma espécie de morte simbólica, ela pôde renascer para a vida, tornar-se pintora e, mais tarde, redigir sua <viagem>.”

GUERRA FRIA LACAN X SEU MESTRE: “Na França, não houve nenhuma verdadeira corrente antipsiquiátrica, de um lado porque a esquerda lacaniana ocupou parcialmente o terreno da revolta contra a ordem psiquiátrica, através da corrente da psicoterapia institucional, e de outro, em função de Foucault e Gilles Deleuze (1925-1995) [Batman & Robin], cujos trabalhos cristalizaram a contestação <antipsiquiátrica> a uma dupla ortodoxia, freudiana e lacaniana.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

David Cooper, Psiquiatria e antipsiquiatria (Londres, 1967);

Mary Barnes & Joseph Berke. Un voyage à travers la folie (Londres, 1971), Paris, Seuil, 1973;

Thomas Szasz, Le Mythe de la maladie mentale (N. York, 1974), Paris, Payot, 1975.

antropologia

O debate entre os antropólogos e os psicanalistas começou após a publicação, em 1912-1913, do livro Totem e tabu e deu origem a uma nova disciplina, a etnopsicanálise, cujos dois grandes representantes foram Geza Roheim e Georges Devereux. Seu principal contexto geográfico inicial foi a Melanésia, isto é, a Austrália, onde ainda viviam aborígines que, no final do século, eram considerados o povo mais <primitivo> do planeta, e as ilhas situadas a sudoeste do oceano Pacífico (Trobriand e Normanby), habitadas pelos melanésios propriamente ditos e pelos polinésios. Posteriormente, o campo de eleição foi o dos índios da América do Norte.”

Derivada do grego (ethnos: povo, e logos: pensamento), a palavra etnologia só veio a surgir no século XIX. Todavia, o estudo comparativo dos povos remonta a Heródoto. Se, de acordo com os antigos, o mundo estava estaticamente dividido entre a civilização e a barbárie (externa à cidade), a questão colocou-se de outra maneira na era cristã. Os missionários e conquistadores se indagaram, com efeito, se os indígenas tinham alma ou não.”

Daí nasceu a tese de que o primitivo se assemelha à criança, que se assemelha ao neurótico. Foi nesse darwinismo que Freud se inspirou, através dos trabalhos de James George Frazer (1854-1941) sobre o totemismo e de William Robertson Smith (1846-1894) sobre o tabu.”

Na França, a palavra ethnologie, etnologia, surgiu em 1838, para designar o estudo comparativo dos chamados costumes e instituições <primitivos>. Dezessete anos depois, foi suplantada pelo termo antropologia, ao qual o médico Paul Broca (1824-1881) associou seu nome, ao fazer dela uma disciplina física e anatômica que logo desembocou, no contexto da teoria da hereditariedade-degenerescência, no estudo das <raças> e das <etnias>, concebidas como espécies zoológicas.

No mundo anglófono, ao contrário (na Grã-Bretanha e, depois, nos Estados Unidos), a palavra ethnology cobriu o campo da antropologia física (no sentido francês), enquanto se cunhou, em 1908, o termo social anthropology, para designar a cátedra de antropologia de Frazer na Universidade de Liverpool.”

Observe-se que Charles Seligman (1873-1940) e William Rivers (1864-1922), dois antropólogos de formação médica, foram os primeiros a tornar conhecidos no meio acadêmico da antropologia inglesa os trabalhos freudianos sobre o sonho, a hipnose e a histeria. Mais tarde, esse trabalho teve seguimento através da escola culturalista norte-americana, desde Margaret Mead até Ruth Benedict (1887-1948), passando por Abram Kardiner e pelo neofreudismo.”

Quanto à antiga escola de antropologia, ela evoluiria para o racismo, o anti-semitismo e o colaboracionismo, em especial sob a influência de Georges Montandon, ex-médico e adepto das teses do padre Wilhelm Schmidt (1868-1954). Fundador da Escola Etnológica de Viena e diretor, em 1927, do museu etnográfico pontifical de Roma, Schmidt acusaria Freud de querer destruir a família ocidental. Quanto a Montandon, ele participaria do extermínio dos judeus durante o regime de Vichy e seria amigo do psicanalista e demógrafo Georges Mauco.

Foi preciso esperar pela segunda metade do século XX para que fosse introduzida na França, através de Claude Lévi-Strauss, a terminologia anglófona. Em 1954, ele livrou o termo <antropologia> de todas as antigas imagens da hereditariedade-degenerescência, a fim de definir uma nova disciplina que abarcasse, ao mesmo tempo, a etnografia, como primeira etapa de um trabalho de campo, e a etnologia, designada como segunda etapa e primeira reflexão sintética.

Se Marcel Mauss, sobrinho de Émile Durkheim, havia desvinculado a etnologia da sociologia durkheimiana, embora se inspirasse em seus modelos, Claude Lévi-Strauss passou da etnologia para a antropologia, unificando os dois campos (anglófono e francófono) em torno de três grandes eixos: o parentesco (em vez da família e do patriarcado), o universalismo relativista (em vez do culturalismo) e o incesto. Situou-se prontamente como contemporâneo da obra freudiana, à qual se referiu, como ao Curso de lingüística geral de Ferdinand de Saussure (1857-1913), sublinhando, em Tristes trópicos, o que ela lhe havia trazido: <…(essa obra) me revelou que […] são as condutas aparentemente mais afetivas, as operações menos racionais e as manifestações declaradas pré-lógicas que são, ao mesmo tempo, as mais significativas.>“Lévi-Strauss foi, sem sombra de dúvida, o primeiro etnólogo a teorizar a viagem etnológica segundo o modelo de uma estrutura melancólica: todo etnólogo redige uma autobiografia ou escreve confissões, diria ele, em essência, porque tem que passar pelo eu para se desligar do eu.”

PREFIGURAÇÃO DE BAUDRILLARD: “Foi dentro dessa orientação que ele estabeleceu uma analogia entre a técnica de cura xamanista e o tratamento psicanalítico. Na primeira, dizia, o feiticeiro fala e provoca a ab-reação, isto é, a liberação dos afetos do enfermo, ao passo que, na segunda, esse papel cabe ao médico que escuta, no bojo de uma relação na qual é o doente quem fala. Além dessa comparação, Lévi-Strauss mostrou que, nas sociedades ocidentais, tendia a constituir-se uma <mitologia psicanalítica> que fizesse as vezes de sistema de interpretação coletivo: <Assim, vemos despontar um perigo considerável: o de que o tratamento, longe de levar à resolução de um distúrbio preciso, sempre respeitando o contexto, reduza-se à reorganização do universo do paciente em função das interpretações psicanalíticas.> Se a cura, portanto, sobrevém através da adesão a um mito, agindo este como uma organização estrutural, isso significa que esse sistema é dominado por uma eficácia simbólica. Daí a idéia, proposta já em 1947 na Introdução à obra de Marcel Mauss, de que o chamado inconsciente não seria outra coisa senão um lugar vazio onde se consumaria uma