NOTAS DE LITERATURA I/III – Adorno (trad. Jorge de Almeida), ed. 34, 2003. Org. alemã Rolf Tiedemann

“Quem se propõe a traduzir os ensaios de Theodor Adorno tem de enfrentar o desafio de transpor para outra língua um texto que, para os próprios leitores alemães, muitas vezes soa quase como língua estrangeira.”

“o <estilo atonal> de Adorno não é uma simples idiossincrasia, mas uma tentativa de solucionar o antigo impasse histórico da dialética, desde que Hegel a definiu, em uma célebre conversa com Goethe, como o <espírito de contradição organizado>.” ???

“Dois dos ensaios deste 1º volume de Notas de literatura já constavam com excelentes traduções em português, realizadas na década de 70 por Modesto Carone (Posição do narrador no romance contemporâneo) e Rubens Rodrigues Torres Filho (Lírica e sociedade).”

* * *

O ENSAIO COMO FORMA (1954-8)

Ou: o melhor inimigo da filosofia

A forma do ensaio ainda não conseguiu deixar para trás o caminho que leva à autonomia, um caminho que sua irmã, a literatura, já percorreu há muito tempo, desenvolvendo-se a partir de uma primitiva e indiferenciada unidade com a ciência, a moral e a arte.

Lukács

“Ainda hoje, elogiar alguém como écrivain é o suficiente para excluir do âmbito acadêmico aquele que está sendo elogiado.” E não é assim mesmo?

O ensaio sempre fala de algo já formado ou, na melhor das hipóteses, de algo que já tenha existido; é parte de sua essência que ele não destaque coisas novas a partir de um nada vazio, mas se limite a ordenar de uma nova maneira as coisas que em algum momento já foram vivas.

Lukács

“Ser um homem com os pés no chão ou com a cabeça nas nuvens, eis a alternativa.”

“como seria possível, afinal, falar do estético de modo não-estético, sem qualquer proximidade com o objeto, e não sucumbir à vulgaridade intelectual nem se desviar do próprio assunto?”

“Na alergia contra as formas, consideradas como atributos meramente acidentais, o espírito científico acadêmico aproxima-se do obtuso espírito dogmático. …e a reflexão sobre as coisas do espírito torna-se privilégio dos desprovidos de espírito.”

“Esse processo se manifesta de modo mais evidente em Stefan Zweig, que conseguiu em sua juventude escrever alguns ensaios bastante originais, mas que acabou regredindo, em seu livro sobre Balzac, ao estudo psicológico da personalidade criativa. (…) Ensaios desse tipo acabam se confundindo com o estilo de folhetim que os inimigos da forma ensaística costumam confundir com o ensaio.”

“ensaios ruins não são menos conformistas do que dissertações ruins.”

“Com a objetivação do mundo, resultado da desmitologização, a ciência e a arte se separaram; é impossível restabelecer com um golpe de mágica uma consciência para a qual intuição e conceito, imagem e signo constituam uma unidade.”

“Onde a filosofia, mediante empréstimos da literatura, imagina-se capaz de abolir o pensamento objetivante e sua história, enunciada pela terminologia habitual como a antítese entre sujeito e objeto, e espera até mesmo que o próprio Ser ganhe voz em uma poesia que junta Parmênides e Max Jungnickel, ela acaba se aproximando da desgastada conversa fiada sobre cultura.”

“A ambiciosa transcendência da linguagem para além do sentido acaba desembocando em um vazio de sentido, que facilmente pode ser capturado pelo mesmo positivismo diante do qual essa linguagem se julga superior.”

“se a arte pretende tornar-se imediatamente ciência, adequando-se aos parâmetros científicos, então ela sanciona a manipulação pré-artística da matéria, tão carente de sentido quanto o Seyn (Ser) dos seminários filosóficos.”

“A obra de Marcel Proust, tão permeada de elementos científicos positivistas quanto a de Bergson, é uma tentativa única de expressar conhecimentos necessários e conclusivos sobre os homens e as relações sociais, conhecimentos que não poderiam sem mais nem menos ser acolhidos pela ciência, embora sua pretensão à objetividade não seja diminuída nem reduzida a uma vaga plausibilidade.” “Sob a pressão do espírito científico de seus postulados, onipresente até mesmo no artista, ainda que de modo latente, Proust se serviu de uma técnica que copiava o modelo das ciências, para realizar uma espécie de reordenação experimental, com o objetivo de salvar ou restabelecer aquilo que, nos dias do individualismo burguês, quando a consciência individual ainda confiava em si mesma e não se intimidava diante da censura rigidamente classificatória, era valorizado como os conhecimentos de um homem experiente, conforme o tipo do extinto homme de lettres, que Proust invocou novamente como a mais alta forma do diletante.”

“O jovem escritor que queira aprender na universidade o que seja uma obra de arte, uma forma da linguagem, a qualidade estética, e mesmo a técnica estética, terá apenas, na maioria dos casos, algumas indicações esparsas sobre o assunto, ou então receberá informações tomadas já prontas da filosofia em circulação naquele momento, que serão aplicadas de modo mais ou menos arbitrário ao teor das obras em questão. Caso ele se volte para a estética filosófica, será entulhado com proposições tão abstratas que nada dizem sobre as obras que ele deseja compreender, nem se identificam, na verdade, com o conteúdo que, bem ou mal, ele está buscando.”

“Mesmo as doutrinas empiristas, que atribuem à experiência aberta e não antecipável a primazia sobre a rígida ordem conceitual, permanecem sistemáticas na medida em que definem condições para o conhecimento, concebidas de um modo mais ou menos constante, e desenvolvem essas condições em um contexto o mais homogêneo possível. Desde Bacon – ele próprio um ensaísta – o empirismo tem sido um <método>.”

“Nos processos do pensamento, a dúvida quanto ao direito incondicional do método foi levantada quase tão-somente pelo ensaio.”

O grande Sieur de Montaigne talvez tenha sentido algo semelhante quando deu a seus escrito o admiravelmente belo e adequado título de Essais.” Lukács

“É por isso que o ensaio não se deixa intimidar pelo depravado pensamento profundo, que contrapõe verdade e história como opostos irreconciliáveis. (…) O ensaio desafia a noção de que o historicamente produzido deve ser menosprezado como objeto da teoria. A distinção entre uma filosofia primeira e uma mera filosofia da cultura, que pressuporia aquela e se desenvolveria a partir de seus fundamentos, é uma tentativa de racionalizar teoricamente o tabu sobre o ensaio, mas essa distinção não é sustentável.”

“Enquanto o movimento que surge com Kant, voltado contra os resíduos escolásticos no pensamento moderno, substitui as definições verbais pela concepção dos conceitos a partir do processo em que são gerados, as ciências particulares ainda insistem, para preservar a imperturbável segurança de suas operações, na obrigação pré-crítica de definir os conceitos.”

“Embora o pensamento tradicional também se alimente dos impulsos dessa experiência, ele acaba eliminando, em virtude de sua forma, a memória desse processo. (…) o ensaio procede, por assim dizer, metodicamente sem método.”

“é mera superstição da ciência propedêutica pensar os conceitos como intrinsecamente indeterminados, como algo que precisa de definição”

“A fenomenologia transforma em fetiche a relação dos conceitos com a linguagem. O ensaio é tão cético diante do procedimento fenomenológico da análise de significados quanto diante da definição pura e simples.”

“Mas o ensaio não pode nem dispensar os conceitos universais – mesmo a linguagem que não fetichiza o conceito é incapaz de dispensá-los –, nem proceder com eles de maneira arbitrária. (…) Nisso, Benjamin foi o mestre insuperável. [!]”

“O ensaio deveria ser interpretado como um protesto contra as 4 regras estabelecidas pelo Discours de la méthode

A SÉRIE INFINITA DOS ESTUDOS PRELIMINARES: “A ingenuidade do estudante que não se contenta senão com o difícil e o formidável é mais sábia do que o pedantismo maduro, cujo dedo em riste adverte o pensamento de que seria melhor entender o mais simples antes de ousar enfrentar o mais complexo, a única coisa que o atrai. Essa postergação do pensamento serve apenas para impedi-lo.”

“O ensaio continua sendo o que foi desde o início, a forma crítica par excellence; mais precisamente, enquanto crítica imanente de configurações espirituais e confrontação daquilo que elas são com o seu conceito, o ensaio é crítica da ideologia.”

“O pensamento não é poupado pela rebelião baudelairiana da poesia contra a natureza enquanto reserva social.”

“o ensaio é mais dialético do que a dialética, quando esta discorre sobre si mesma. Ele toma a lógica hegeliana ao pé da letra” “a relação entre natureza e cultura é o seu verdadeiro tema. (…) Mas a cultura não é, para o ensaio, um epifenômeno que se sobrepõe ao Ser [aqui, Adorno está tacitamente contrapondo a Escola de Frankfurt a Husserl-Heidegger ou a auto-intitulada pós-filosofia continental] e deve, portanto, ser destruído”

“O ensaio não glorifica a preocupação com o primordial como se esta fosse mais primordial do que a preocupação com o mediado, pois a própria primordialidade é, para ele, objeto de reflexão, algo negativo.”

“Astuciosamente, o ensaio apega-se aos textos como se estes simplesmente existissem e tivessem autoridade. (…) algo comparável à antiga exegese teológica das Escrituras.”

Tudo que é sólido se torna tubo de ensaio.

“o ensaio salva um momento da sofística.”

“A hostilidade do pensamento crítico oficial em relação à felicidade é perceptível sobretudo na dialética transcendental de Kant, que gostaria de eternizar as fronteiras traçadas entre o entendimento e a especulação, a fim de impedir <o divagar por mundos inteligíveis>.” Esse trecho, verdadeiro que seja, está transbordando de ironias!!

Todo ente em repouso perde a referência da sua posição e situação, apesar da sublime tranqüilidade momentânea ou aparente.

Recuperando a fé na escrita? “O ensaio coordena os elementos, em vez de subordiná-los; e só a quintessência de seu teor, não o seu modo de exposição, é comensurável por critérios lógicos.”

“A atualidade do ensaio é a do anacrônico. A hora lhe é mais desfavorável do que nunca. Ele se vê esmagado entre uma ciência organizada na qual todos se arrogam o direito de controlar a tudo e a todos e uma filosofia tornada acomodada”

“Ele escapa à ditadura dos atributos que, desde a definição do Banquete, foram prescritos às idéias como <existindo eternamente, não se modificando ou desaparecendo, nem se alterando ou restringindo> (…) e entretanto o ensaio permanece sendo <idéia>, na medida em que não capitula diante do peso do existente, nem se curva diante do que apenas é.”

Hoje dizer sim, amanhã talvez…

Não sei o porquê, hoje, 19/08, li duas citações muito antigas, que devo ter conhecido em 2008, 2009, ambas figurando Nietzsche, em duas fontes diferentes (este ensaio de Adorno e a biografia de Freud por Roazen, citando o próprio Freud em História do movimento psicanalítico): a primeira (às 19h, no metrô) a famosa declaração de Segismundo alegando que não lia Nietzsche deliberadamente para se furtar ao prazer de descobrir nele o que ele mesmo vinha descobrindo pela psicanálise; a segunda (0h, à meia-noite da eternidade, embarcando no dia 20) aquela famosíssima (fragmento póstumo), direta de Nietzsche, de que dizer sim a um momento é dizer sim a todos os momentos do universo (estranho arremate para um ensaio sobre o ensaio, para um meta-ensaio, evocar tão extemporaneamente o eterno retorno!). Mais estranha ainda esta coincidência brutal que me aconteceu…

Afirmar o presente é negar o passado – viva, viva, VIVA?!

Negar o presente é-se aborrecer em vão do eixo porta que separa!…

“Apenas a infração à ortodoxia do pensamento torna visível, na coisa, aquilo que a finalidade objetiva da ortodoxia procurava, secretamente, manter invisível.”

SOBRE A INGENUIDADE ÉPICA (1943), esboço para Dialética do Esclarecimento

“Tal como a vista da terra distante é agradável aos náufragos,

quando, em mar alto, o navio de boa feitura Posido

faz soçobrar, sob o impulso dos ventos e de ondas furiosas;

e ledos pisam a praia, enfim tendo da Morte escapado;

do mesmo modo a Penélope a vista do esposo era cara

sem que pudesse dos cândidos braços, enfim, desprendê-lo.”

Homero, Odisséia, XXIII, 234ss. – trad. Carlos Alberto Nunes

Und wie erfreulich das Land herschwimmenden Männern erscheinet,

Welchen Poseidons Macht das rüstige Schiff in der Meerflut

Schmetterte, duch die Gewalt des Orkans und geschwollener Brandung;

[…] Freudig anjetzt ersteigen sie Land, dem Verderben entronnen,

So war ihr auch erfreulich der Anblick ihres Gemahls,

Und fest hielt um den Hals sie die Lilienarme geschlungen“

trad. Voss

„O narrador foi desde sempre aquele que resistia à fungibilidade universal, mas o que ele tinha para relatar, historicamente e até mesmo hoje, já era sempre algo fungível.”

“A epopéia imita o fascínio do mito, mas para amenizá-lo. Karl Theodor Preuss chamou essa atitude de <estupidez primordial> (Urdummheit)

Murray, Five stages of Greek religion, 1925

“o narrador passa a controlar o medo”

“O elogio a essa estupidez ingênua da forma acabou transformando a narrativa épica em ideologia, cujo último resíduo está à venda na falsa concretude da antropologia filosófica atual.”

“Ao apegar-se, em sua limitação, ao que aconteceu apenas uma vez, o mito adquire um traço característico que transcende essa limitação.”

“Na ingenuidade épica vive a crítica da razão burguesa.”

“Assim como é fácil ridicularizar a simplicidade homérica, que era já o contrário da simplicidade, ou evocá-la maliciosamente como argumento contra o espírito analítico, assim também seria fácil mostrar o acanhamento de Martin Salander, o último romance de Gottfried Keller” “Nessa recordação daquilo que no fundo não se deixa mais recordar, Keller expressa em sua descrição dos 2 advogados trapaceiros, irmãos gêmeos e duplos um do outro, um quê de verdade, justamente a verdade sobre a fungibilidade hostil à memória, que só seria alcançada por uma teoria que determinasse de forma transparente, a partir da experiência da sociedade, a perda da experiência.”

“A precisão da linguagem descritiva busca compensar a inverdade de todo discurso. O impulso que leva Homero a descrever um escudo como uma paisagem [Ilíada], elaborando uma metáfora para a ação até o ponto em que, tornada autônoma, ela rasga a trama da narrativa [o velho artifício do objeto divino onisciente e simbólico: nele está desenhada a própria batalha que ora se trava], é o mesmo impulso que levou Goethe, Stifter e Keller, os maiores narradores alemães do XIX, a desenhar e pintar em vez de escrever, e os estudos arqueológicos de Flaubert podem muito bem ter sido inspirados por este mesmo impulso.”

A estupidez e cegueira do narrador – não é por acaso que a tradição concebe Homero como um cego”

“As últimas novelas de Stifter testemunham com extrema clareza a passagem da fidelidade ao objeto à obsessão maníaca, e nenhuma narrativa jamais participou da verdade sem ter encarado o abismo no qual mergulha a linguagem, quando esta pretende se transformar em nome e imagem.”

“Enquanto a linguagem, para continuar sendo de fato linguagem, ainda pretende nessas expressões [partículas de coordenação] ser a síntese judiciosa dos nexos entre as coisas, ela renuncia ao juízo quando usa palavras que dissolvem justamente esse nexo. [Poesia] Na concatenação épica, onde a condução do pensamento enfim encontra repouso, a linguagem abre mão de seu direito ao juízo, embora ao mesmo tempo continue sendo, inevitavelmente, juízo.”

Beide, da über der Freier entsetzlichen Mord sie geratschlagt,

Kamen zur prangenden Stadt der Ithaker; nämlich (o saber criticado por Adorno)

Odysseus]

Folgete nach; ihm voraus war Telemachos früher gegangen.“

Odisséia, XXIV, 135ss.

No verde vale, lá onde a fresca fonte

Desce a montanha, murmurando a cada dia,

E a amável sempre-viva no outono me floresce,

Nessa tranqüila paz, querida, pretendo

Te buscar, ou quando, à meia-noite,

A vida invisível ressoa na floresta,

E sobre mim as flores sempre felizes,

As estrelas, desabrocham brilhando”

Hölderlin, À Esperança (An die Hoffnung)

Im grünen Tale, dort, wo der frische Qwell

Vom Berge täglich rauscht und die liebliche

Zeitlose mir am Herbsttag aufblüht,

Dort, in der Stille, du holde, will ich

Dich suchen, oder wenn in der Mitternacht

Das unsichtbare Leben im Haine wallt,

Und über mir die immerfrohen

Blumen, die blühenden Sterne glänzen“

Thomson, Studies in the Odyssey, 1914

„A imagem desenvolvida pela linguagem acaba esquecendo seu próprio significado, para incorporar na imagem a própria linguagem, em vez de tornar a imagem transparente ao sentido lógico do contexto.”

“A conversão objetiva da pura exposição, alheia ao significado, em alegoria objetiva é o que se manifesta tanto na desintegração lógica da linguagem épica quanto no descolamento da metáfora em meio ao curso da ação literal.”

POSIÇÃO DO NARRADOR NO ROMANCE CONTEMPORÂNEO, originalmente conferência falada depois transposta em ensaio em 1954.

“Assim como a pintura perdeu muitas de suas funções tradicionais para a fotografia, o romance as perdeu para a reportagem e para os meios da indústria cultural, sobretudo para o cinema. O romance precisaria se concentrar naquilo de que não é possível dar conta por meio do relato. Só que, em contraste com a pintura, e emancipação do romance em relação ao objeto foi limitada pela linguagem, já que esta ainda o constrange à ficção do relato: Joyce foi coerente ao vincular a rebelião do romance contra o realismo a uma revolta contra a linguagem discursiva.”

“Noções como a de <sentar-se e ler um bom livro> são arcaicas. Isso não se deve meramente à falta de concentração dos leitores, mas sim à matéria comunicada e a sua forma. Pois contar algo significa ter algo especial a dizer, e justamente isso é impedido pelo mundo administrado, pela estandardização e pela mesmice. (…) a disseminada subliteratura biográfica é um produto da desagregação do romance.”

“numa época em que os jornalistas se embriagavam sem parar com os feitos psicológicos de Dostoiévski, a ciência, sobretudo a psicanálise freudiana, há muito tinha deixado para trás aqueles achados do romancista. (…) se porventura existe psicologia em suas obras, ela é uma psicologia do caráter inteligível, da essência, e não do ser empírico, dos homens que andam por aí. E exatamente nisso Dostoiévski é avançado.”

Se o romance quiser permanecer fiel a sua herança realista e dizer como realmente as coisas são, então ele precisa renunciar a um realismo que, na medida em que reproduz a fachada, apenas a auxilia na produção do engodo.”

“quanto mais se alienam uns dos outros os homens, os indivíduos e as coletividades, tanto mais enigmáticos eles se tornam uns para os outros.”

“Em matéria de suscetibilidade contra a forma do relato, ninguém superou Marcel Proust. Sua obra pertence à tradição do romance realista e psicológico, na linha da extrema dissolução subjetivista do romance, uma tradição que leva, sem qualquer continuidade histórica em relação ao autor francês, a obras como Niels Lyhne de Jacobsen e Malte Laurids Brigge de Rilke. Quanto mais firme o apego ao realismo da exterioridade, ao gesto do <foi assim>, tanto mais cada palavra se torna um mero <como se>”

“a precisão de Proust, impelida ao quimérico, sua técnica micrológica, sob a qual a unidade do ser vivo acaba se esfacelando em átomos, nada mais é do que um esforço da sensibilidade estética para produzir essa prova, sem ultrapassar os limites do círculo mágico da forma.”

“seu ciclo de romances se inicia com a lembrança do modo como uma criança adormece, e todo o primeiro livro não é senão um desdobramento das dificuldades que o menino enfrenta para adormecer, quando sua querida mãe não lhe dá o beijo de boa-noite.”

“O romance tradicional, cuja idéia talvez se encarne de modo mais autêntico em Flaubert, deve ser comparado ao palco italiano do teatro burguês. Essa técnica era uma técnica de ilusão. O narrador ergue uma cortina e o leitor deve participar do que acontece, como se estivesse presente em carne e osso. A subjetividade do narrador se afirma na força que produz essa ilusão e na pureza da linguagem que, através da espiritualização, é ao mesmo tempo subtraída do âmbito da empiria, com o qual ela está comprometida. Um pesado tabu paira sobre a reflexão: ela se torna o pecado capital contra a pureza objetiva. Hoje em dia, esse tabu, com o caráter ilusório do que é representado, também perde sua força.”

“A nova reflexão é uma tomada de partido contra a mentira da representação, e na verdade contra o próprio narrador, que busca, como um atento comentador dos acontecimentos, corrigir sua inevitável perspectiva.”

“Só hoje a ironia enigmática de Thomas Mann, que não pode ser reduzida a um sarcasmo derivado do conteúdo, torna-se inteiramente compreensível”

“o leitor é ora deixado do lado de fora, ora guiado pelo comentário até o palco, os bastidores e a casa de máquinas. O procedimento de Kafka, que encolhe completamente a distância, pode ser incluído entre os casos extremos, nos quais é possível aprender mais sobre o romance contemporâneo do que em qualquer das assim chamadas situações médias <típicas>. (…) Seus romances, se é que de fato eles ainda cabem nesse conceito, são a resposta antecipada a uma constituição do mundo na qual a atitude contemplativa tornou-se um sarcasmo sangrento

“O sujeito literário, quando se declara livre das convenções da representação do objeto, reconhece ao mesmo tempo a própria impotência, a supremacia do mundo das coisas, que reaparece em meio ao monólogo.”

“uma linguagem de coisa, deterioradamente associativa, como a que entremeia o monólogo não apenas do romancista, mas também dos inúmeros alienados da linguagem primeira, que constituem a massa.”

“40 anos atrás, em sua Teoria do romance, Lukács perguntava se os romances de Dostoiévski seriam as pedras basilares das épicas futuras, caso eles mesmos já não fossem essa épica. De fato, os romances que hoje contam assemelham-se a epopéias negativas.”

“Nenhuma obra de arte moderna que valha alguma coisa deixa de encontrar prazer na dissonância e no abandono.”

“Essas obras estão acima da controvérsia entre arte engajada e arte pela arte, acima da alternativa, entre a vulgaridade da arte tendenciosa e a vulgaridade da arte desfrutável.”

PALESTRA SOBRE LÍRICA E SOCIEDADE, idem anterior, porém publicada como texto em 1957.

“Quem seria capaz de falar de lírica e sociedade, perguntarão, senão alguém totalmente desamparado pelas musas?”

“Mas dizer de grandes obras de arte que elas são ideologia não é simplesmente fazer injustiça ao próprio teor de verdade dessas obras, é também falsear o conceito de ideologia.”

“A idiossincrasia do espírito lírico contra a prepotência das coisas é uma forma de reação à coisificação do mundo, à dominação das mercadorias sobre os homens, que se propagou desde o início da Era Moderna e que, desde a Revolução Industrial, desdobrou-se em força dominante da vida.”

“Aqueles grandes poetas do passado remoto que são classificados pelos conceitos histórico-literários como representantes da lírica, p.ex. Píndaro e Alceu, mas também boa parte da obra de Walther von der Vogelweide, estão a uma distância descomunal de nossa mais primária representação do que seja a lírica.”

“O eu-lírico acabou perdendo essa unidade com a natureza, e agora se empenha em restabelecê-la, pelo animismo ou pelo mergulho no próprio eu.”

“os segundos que antecedem a bem-aventurança do sono são os mesmos que separam da morte a curta vida. Essa sublime ironia, depois de Goethe, decaiu em sarcasmo.”

“Mas a linguagem também não deve ser absolutizada enquanto voz do Ser, oposta ao sujeito lírico, como agradaria a muitas das teorias ontológicas da linguagem em voga atualmente.”

“A obra de Baudelaire foi a 1ª a registrar esse processo de consumação ou ultimação da ascendência da sociedade sobre o sujeito, na medida em que, como a mais alta conseqüência do Weltschmerz (dor do mundo) europeu, não se contentou com os sofrimentos do indivíduo, mas escolheu como tema de sua acusação a própria modernidade, enquanto negação completa do lírico, extraindo dela suas faíscas poéticas, por força de uma linguagem heroicamente estilizada.”

In ein freundliches Städtchen tret ich ein,

In den Strassen liegt roter Abendschein.

Aus einem offnen Fenster eben,

Über den reichsten Blumenflor

Hinweg, hört man Goldglockkentöne schweben,

Und eine Stimme scheint ein Nachtigallenchor,

Dass die Blüten beben,

Dass die Lüfte leben,

Dass in höherem Rot die Rosen leuchten vor.

Lang hielt ich staunend, lustbeklommen.

Wie ich hinaus vors Tor gekommen,

Ich weiss es wahrlich selber nicht.

Ach hier, wie liegt die Welt so licht!

Der Himmel wogt in purpurnem Gewühle,

Rückwärts die Stadt in goldnem Rauch;

Wie rauscht der Erlenbach,wie rauscht im Grund die Mühle!

Ich bin wie trunken, irrgeführt –

O Muse, du hast mein Herz berührt

Mit einem Liebeshauch!

Mörike

O POEMA DO BEUBO POLIGLOTA

Die Welt ist eine Mühle

Quão ensolarado é o mundo sombrio!

amigável cidadinha

entardecer vermelho espectral

hic!

como cheghic!i aqui?ic

Autotola!foolaDummKopfffff

halo-do-diabo

hálito amável cidade amigável

separação cidade campo litigiosa

cândida pocilga

onde há fumaça doirada

há ouro!

“os ritmos evocam estrofes gregas sem rima” o tradutor brasileiro CAGOU pq RIMOU!

“Os traços supostamente doentios de Mörike, identificados e relatados pelos psicólogos, e mesmo o estancamento de sua produção no último período, são o aspecto negativo de sua extrema compreensão do que é possível. Os poemas desse pároco hipocondríaco de Cleversulzbach, que costuma ser incluído no rol dos artistas ingênuos, são peças de virtuosismo jamais superadas por nenhum mestre de l’art pour l’art.” Não exagera, vai.

In windes-weben

War meine frage

Nur träumerei.

Nur lächeln war

Was du gegeben.

Aus nasser nacht

Ein glanz entfacht —-

Nun drängt der mai

Nun muss ich gar

Um dein aug und haar

Alle tage

In sehnen leben.“

Stefan George

„a atitude aristocrática“ „Ela não é a pose que exaspera o burguês, incapaz de manusear esses poemas, mas o eu-lírico é fruto da dialética que nega a si mesmo a identificação com o status quo enquanto esse mesmo sujeito segue intimamente ligado à realidade vigente” “a forma é medieval de um modo quase imperceptível” “a neo-romântica ausência de qualquer arcaísmo grosseiro eleva a canção acima de toda ficção desesperada, que ela entretanto oferece”

SAID BUT THROUGH… AMMY U.!

“mágica brutal de uma varinha de condão”

“A harmonia da canção é extorquida de uma extrema dissonância: ela se baseia naquilo que Valéry denominava refus, uma implacável recusa a todos os meios pelos quais a convenção lírica imagina capturar a aura das coisas.” “o ouvido do discípulo de Mallarmé ouve sua própria língua como se fosse estrangeira.”

Paradoxo típico de tradutor, o poeta precisa se trair para não trair a si mesmo.

“Assim como, p.ex., as mais sublimes obras musicais não se esgotam puramente na sua construção, mas a transcendem com um par de notas ou compassos supérfluos, o mesmo ocorre nesse poema com o <gar>, uma goetheana <sedimentação do absurdo>, pela qual a língua escapa da intenção subjetiva que trouxe a palavra ao texto.”

EM MEMÓRIA DE EICHENDORFF, idem, e textualizada em 58.

“O ritmo do tempo está abalado. Enquanto as vielas da filosofia ecoam a metafísica do tempo, o próprio tempo, antes medido pelo andamento contínuo do transcorrer de uma vida, alienou-se do humano; precisamente por isso ele é objeto de acirradas discussões.”

“Grandes artistas de vanguarda, como Schoenberg, não precisavam provar para si mesmos, demonstrando raiva em relação aos predecessores, o quanto haviam conseguido escapar da autoridade do passado.”

“A tradição só é negada por aqueles que jamais a romperão”

Um poeta lírico que virou cancionero popular, ideal como acompanhamento de música clássica: “o ciclo Die schöne Müllerin (A bela moleira), de Schubert, só é inteiramente acessível a quem alguma vez cantou, no coro da escola, o arranjo vulgar de Das Wandern ist des Müllers Lust (Passear é o prazer do moleiro).” Devo desistir antes de tentar, então?

“Quem bebe é mais esperto,

Já sente da idéia o gostinho,

Sem nenhum guia por perto,

Sobe aos céus bem rapidinho.”


“Quando agora a noite me encontra

E tudo escurece em severa pompa.”

“Ele não foi um poeta da pátria (Heimat), mas sim um poeta da nostalgia (Heimweh), no sentido de Novalis, de quem se sabia próximo.”

“Enquanto hoje, após a decadência da tradição, o conservadorismo, como um arbitrário elogio aos <vínculos>, serve apenas para justificar um estado de coisas ruim, houve um tempo em que ele queria algo bastante diverso, que só pode ser considerado em relação a seu contrário, a barbárie emergente.”

“Sua superioridade em relação a todos os reacionários que hoje lançam mão de sua obra é comprovada pelo fato de que ele, como também a grande filosofia de sua época, compreendia a necessidade da revolução, que tanto o assustava: ele encarna algo da verdade crítica da consciência daqueles que devem pagar o preço do passo adiante dado pelo Weltgeist.”

Uma atmosfera de tempestade pairava sobre o país inteiro, todos sentiam que algo grandioso estava para acontecer, ma expectativa calada e temerosa, ninguém do quê, havia invadido todos os ânimos, em maior ou menor grau. Nessa atmosfera sufocante apareceram, como sempre ocorre em catástrofes anunciadas, personagens estranhos e aventureiros inacreditáveis, como o Conde Saint-Germain, Cagliostro e outros ‘emissários do futuro’, por assim dizer”

“quanto menos a ordem pré-capitalista pode ser restaurada, mais obstinadamente a ideologia se aferra a sua essência, imaginando-a como sendo a-histórica e absolutamente garantida.”

O toi que la nuit rend si belle

“Eichendorff participa secretamente dessa corrente subterrânea da literatura alemã, que vai do Sturm und Drang e do jovem Goethe até Wedeking, Brecht e o expressionismo, passando por Büchner e muitas obras de Hauptmann.”

“Genialmente falsa é a metáfora do riacho, que murmura <para lá e para cá>, pois o movimento dos rios tem um único sentido, mas esse lá e cá espelha a insensatez daquilo que o murmúrio tem a dizer ao eu, que o escuta, em vez de localizá-lo; expressões como essa antecipam características do Impressionismo.”

Wolken ziehen wie schwere Träume


Se tens uma corça preferida,

Não a deixes pastar sozinha

“Nos contos de fada recolhidos pelos irmãos Grimm, nenhuma floresta é jamais descrita, ou mesmo caracterizada; e que floresta seria mais floresta do que as dos contos de fada?”

SÄNGERLEBEN

Schläft ein Lied in allen Dingen,

Die da träumen fort und fort,

Und die Welt hebt an zu singen,

Triffst du nur das Zauberwort

„Nenhuma das imagens de Eichendorff é apenas aquilo que é, mas nenhuma pode ser levada ao próprio conceito: essa flutuação vacilante do momento alegórico é seu meio poético.”

“Há mais de 50 anos, o esquecido esteta alemão Theodor Meyer desenvolveu, em seu livro Das Stilgesetz der Poesie, uma teoria tão modestamente exposta quanto astuciosamente concebida, contra toda a tradição do Laocoonte de Lessing e certamente sem conhecer Mallarmé.”

Und muss ich, wie im Strome dort die Welle,

Ungehört verrauschen an des Frülings Schwelle

„o murmúrio não é som mas sim ruído”

e cada vez mais rápido, sem parar para descansar, precipitou-se pelos jardins e vinhedos em direção à pacata cidade; pois até o murmúrio das árvores ele ouviu como um sussurro claro e compreensível, e os altos e fantasmagóricos choupos lhe pareciam 3x maiores, com suas longas sombras esticadas”

“exprime um estranhamento que não pode ser superado por nenhum pensamento, apenas pelo puro som.” O grito de Laura Palmer

Dass das weiche Wasser in Bewegung mit der Zeit den Stein besiegt. Du verstehst

Brecht sobre Lao-Tsé Tung (Água mole em pedra dura tanto bate até que fura. Tu me entendes)

EU LA(R)GO DAS PALAVRAS

“O que poderia ser dito de menos interessante sobre uma paisagem noturna, além de que ela é tranqüila? Seria possível imaginar um lugar-comum mais fatal do que a trompa do postilhão? [Mais ou menos equivalente hoje ao carteiro que toca a campainha]”

Um grito no meio da rua numa noite de cidade pequena apaga luzes, não as acende!

Onde a floresta murmura suave”

“Como na recapitulação musical, o poema se fecha em círculo.”

estriBRILHO

“Há mais substância na poesia de Eichendorff do que na dos inauguradores do Romantismo alemão, que ele considerava parte da história e não compreendia tão bem. Se o Romantismo, nas palavras de outro de seus representantes tardios, Kierkegaard, consuma em cada experiência o batismo do esquecimento, consagrando-a à eternidade da lembrança, certamente essa lembrança era necessária para fazer justiça à idéia do Romantismo, em contradição com sua própria imediatidade e presença.”

CODA (dá mais corda)

“O Liederkreis opus 39 de Schumann, sobre poemas de Eichendorff, é um dos grandes ciclos líricos da história da música.”

“da melancolia do primeiro Lied, em sustenido menor, ao êxtase do último, em sustenido maior.” “o último do ciclo, em fá sustenido maior, conduz essa progressão ainda uma quinta acima.” “o quarto desce a sol maior, uma terça em relação ao Lied anterior”

“A peça Wehmut é formalmente um intermezzo, como antes a Waldgespräch, mas agora um intermezzo inteiramente lírico, um momento de <auto-reflexão> do ciclo.”

Nicht schnell

“deve-se pensar em tranqüilas mínimas, não em semínimas.”

“tom maior pálido”

Waldgespräch é uma daquelas composições modelares de Schumman das quais surgiu Brahms.” “Musicalmente, a originalidade está nos acordes discrepantes, alterados cromaticamente, que expressam a ameaçadora atração.” “Sobre a palavra wissen há um acorde de subdominante que, com a formação de um duplo retardo, assume o timbre de um triângulo.”

“a claridade que se transforma em som”

“Pelo modo como esse acorde de nona é disposto e resolvido figurativamente, esse acorde evita a opulência que tantas vezes assume em Wagner, Strauss e compositores mais recentes.”

“o ouvido persegue esses intervalos no infinito”

“Nenhum ouvido atento pode resistir à extensão rítmica das palavras finais, Als flöge sie nach Haus (Como se ele voasse para casa), onde dois compassos 3/8 se transformam em um único.”

“Também aqui a estrofe final é essencialmente um Abgesang, mas o Lied como um todo se abstém de simetrias criadas por repetição”

“arrojadas dissonâncias, provavelmente únicas em Schumann e na 1ª metade do XIX (…) como se a modernidade dessa harmonização quisesse salvar o poema de seu envelhecimento”

legato de vozes harmônicas instrumentais”

Zwielicht, talvez a mais grandiosa peça do ciclo, quanto à forma uma simples canção estrófica, é extremamente contrapontística, em forte contraste com a anterior, trazendo aquela interpretação de Bach, infinitamente produtiva, que escandaliza o historicismo, embora mantenha Bach vivo, em constante metamorfose.”

7 NOTAS

O SER EM SI

DO LADO DE LÁ

CHEGA DÁ DÓ

ANDA DE RÉ

ANTES DE MIM

O FÁDO DO SOL

NA MINHA CABEÇA


cravo bem-temperado de molho pro cozido

“submergindo toda a música em sua profundidade”

“torna mais denso o tecido contrapontístico”

“o constante retorno da oposição entre ritardando e a tempo

“O senso formal de Schumman triunfa no fato de que, para compensar os momentos obstinadamente retardantes, ele escreve um Abgesang que flui quase sem resistência, chegando por isso mesmo a ser extremamente assombroso, embora o ritmo da trompa seja sempre marcado, até as duas últimas notas da parte vocal.”

“O núcleo da melodia da Mondnacht é um acorde de 7ª transposto.” “A aflição intensifica-se quando, antes das palavras Mit dem Mondesglanz herein, omite-se um acento no compasso.” VTNC!

A FERIDA HEINE, conferência textualizada em 56.

“Os nacional-socialistas não foram os primeiros a difamá-lo. Na verdade, eles quase o honraram quando atribuíram seu poema Die Loreley a um hoje célebre <poeta desconhecido>, sancionando inesperadamente como canção folclórica esses versos dissimuladamente cintilantes, que lembram figurinos de ninfas renanas parisienses de uma ópera perdida de Offenbach.”

“O veredicto da Escola de George[?] pode ser atribuído ao nacionalismo, mas o de Karl Kraus não se deixa apagar.”

“Evitam o escândalo aqueles que se limitam ao Heine prosador, cuja estatura é algo que salta aos olhos, em meio ao nível completamente desolador do período entre Goethe e Nietzsche.”

“uma força polêmica não-inibida por nenhum servilismo, algo sempre raro na Alemanha.”

August von Platen, p.ex., teve a oportunidade de experimentar essa força quando redigiu um ataque anti-semita a Heine, sofrendo uma derrota que hoje em dia seria possível chamar de existencial, se o conceito de <existencial> não estivesse sendo tão cuidadosamente preservado do contágio com a existência real dos homens.”

“Desde que Leibniz virou as costas para Spinoza, todo o Iluminismo alemão de certa forma fracassou”

“Politicamente, Heine foi um companheiro inconstante: mesmo em relação ao socialismo. Mas, em contraste com esse movimento, Heine manteve-se fiel, na sua imagem de uma sociedade justa, à idéia de uma felicidade irrestrita, facilmente posta de lado pelo ditado <quem não trabalha não come>. Sua aversão à pureza e ao rigor revolucionários indica a desconfiança diante dos elementos rançosos e ascéticos que, além de permearem vários dos primeiros documentos do socialismo, mais tarde contribuíram para as tendências trágicas de seu desenvolvimento. Mas Heine, o individualista, e em tão alta medida que só ouviu de Hegel a voz do individualismo, não se curvou ao conceito individualista de interioridade. Sua idéia de satisfação dos sentidos compreendia a satisfação com o mundo exterior, uma sociedade sem coerção nem privações.”

“A violência da sociedade capitalista em desenvolvimento já havia se tornado tão grande que a lírica não podia mais ignorá-la, se não quisesse afundar em um intimismo provinciano. Com isso, Heine se equipara a Baudelaire como ponto alto do modernismo do séc. XIX.”

“O hein romântico, que vivia dessa felicidade da autonomia, foi desmascarado pelo Heine iluminista, que trouxa à tona o caráter de mercadoria, até então latente, de suas obras.”

“A essência de Heine não se revelou inteiramente na música daqueles que compuseram suas canções, mas somente 40 anos após sua morte, na obra de Gustav Mahler

REVENDO O SURREALISMO (1956)

“Se o Surrealismo fosse simplesmente uma coletânea de ilustrações literárias e gráficas de Jung ou mesmo de Freud, ele não apenas realizaria uma mera duplicação supérflua daquilo que a própria teoria já exprime, em vez de recorrer a metáforas, como também seria tão inofensivo que não deixaria nenhum espaço para o escândalo”

“Aquilo que é pensado como mero sonho, e isso Cocteau já havia percebido, não afeta a realidade, mesmo que sua imagem possa ser afetada.”

“a espontaneidade, mesmo nos processos psicanalíticos de associação, não é de modo algum espontânea. Todo analista sabe o quanto é trabalhoso e difícil, quanta vontade é requerida para a expressão espontânea, que ocorre na situação analítica graças justamente a esse esforço, um esforço que, certamente, também configura a situação artística pregada pelos surrealistas.”

“Depois da catástrofe européia, os choques surrealistas perderam toda sua força. É como se tivessem salvado Paris preparando a cidade para o medo: o declínio da metrópole foi um de seus temas centrais.”

“quando éramos crianças, as antigas ilustrações devem ter nos excitado como agora as imagens surrealistas.” “O ovo gigante, do qual a cada momento o monstro do juízo final ameaça nascer, parecia tão grande porque, quando pela primeira vez olhamos um ovo e nos assustamos, éramos muito pequenos.”

“A tensão no surrealismo, que se descarrega no choque, está a meio caminho entre a esquizofrenia e a reificação, e justamente por isso não pode ser confundida com uma inspiração psicológica.”

“É difícil supor que algum dos surrealistas conhecesse a Fenomenologia hegeliana, mas uma frase dessa obra, que deve ser pensada em conjunto com a idéia mais geral da história enquanto progresso na consciência da liberdade, define o teor das obras surrealistas.”

“Suas montagens são as verdadeiras naturezas-mortas.”

“As obras pornográficas seriam os melhores modelos do surrealismo. O que acontece nas colagens, o que nelas está contido de modo espasmódico, assemelha-se às alterações que ocorrem em uma imagem pornô no instante da satisfação do voyeur. Nas colagens, os seios cortados, as pernas de manequins em meias de seda, são monumentos aos objetos do instinto pervertido, que outrora despertavam a libido.”

“Como um instantâneo do momento em que se desperta, o surrealismo é parente da fotografia.”

“O surrealismo recolhe o que a Neue Sachlichkeit recusa aos homens; as deformações testemunham o efeito da proibição no que um dia foi desejado. Através das deformações, o surrealismo salva o antiquado, um álbum de idiossincrasias, no qual se desgasta a promessa de felicidade (…) Mas se hoje o surrealismo parece obsoleto, isso ocorre porque os homens já renunciaram a essa consciência da renúncia, capturada no negativo fotográfico do surrealismo.”

SINAIS DE PONTUAÇÃO (1956)

“O ! não se assemelha a um ameaçador dedo em riste? Os ?? não se parecem com luzes de alerta ou com uma piscadela? Os :, segundo Karl Kraus, abrem a boca: coitado do escritor que não souber saciá-los. Visualmente, o ; lembra um bigode caído; é ainda mais forte, para mim, a sensação de seu sabor rústico. Marotas e satisfeitas, as «» lambem os lábios.”

!

:

“Em nenhum de seus elementos a linguagem é tão semelhante à música quanto nos sinais de pontuação. A , e o . correspondem à cadência interrompida e à cadência autêntica. ! são como silenciosos golpes de pratos, ? são acentuações de frases musicais no contratempo, : são acordes de sétima da dominante; e a diferença entre , e ; só será sentida corretamente por quem percebe o diferente peso de um fraseado forte e fraco na forma musical. Mas talvez a idiossincrasia contra os sinais de pontuação, surgida há 50 anos [há 150 anos] e da qual nenhuma pessoa atenta pôde escapar, seja menos a revolta contra um elemento ornamental do que a expressão da forte divergência entre música e linguagem.”

‘ = ponto e vírgula grego

“mas talvez os sinais gregos só tenham sido inventados pelos humanistas do séc. XVI.”

“! tornaram-se insuportáveis como gestos de autoridade, com os quais o escritor pretende introduzir, de fora, uma ênfase que a própria coisa não é capaz de exercer, enquanto a contrapartida musical da exclamação, o sforzato, é ainda hoje tão imprescindível quanto no tempo de Beethoven, quando marcava a irrupção da vontade subjetiva na trama musical. Os !!, porém, degeneraram em usurpadores da autoridade, asserções de importância.”

“Nos textos expressionistas, os !! se assemelham às cifras milionárias das cédulas do período da inflação alemã.”

“O – ainda serve apenas para preparar surpresas traiçoeiras que, justamente por terem sido preparadas, já não mais surpreendem.”

* * *…

“Dispostos como estrofe, os versos destruiriam barbaramente o equilíbrio da linguagem, mas se fossem reproduzidos simplesmente como prosa causariam um efeito ridículo, porque a métrica e a rima soariam como um jogo de palavras feito ao acaso, daí a /. O travessão moderno é demasiado brusco para realizar o que deve ser feito nesses casos. A capacidade de perceber fisiognomicamente tais diferenças é, no entanto, o pressuposto para todo uso adequado dos sinais de pontuação.”

“Mas se aqueles …, tomados da repetição de frações decimais na aritmética, são reduzidos a .., como fez a Escola de George, então o que se pretende é continuar impunemente a reivindicar a infinitude fictícia, na medida em que se apresenta como sendo exato algo que, segundo seu próprio sentido, quer ser inexato.!”

“A pontuação utilizada pelo escrevinhador sem-vergonha não é melhor do que a do escritor envergonhado.”

“As abundantes “” irônicas usadas por Marx e Engels são sombras lançadas pelo procedimento totalitário sobre seus escritos, que tinham em vista justamente o contrário:”

“Quando a sintaxe e a pontuação abdicam do direito de articular e moldar os fatos, de criticá-los, a linguagem está prestes a capitular ao que meramente existe, antes mesmo que o pensamento tenha tempo de realizar outra vez, fervorosamente e por si mesmo, essa capitulação. Isso começa com a perda do ;, e termina com a ratificação da imbecilidade por uma racionalidade depurada de qualquer mistura.”

“O cauteloso se inclinará a colocar as inserções PARENTÉTICAS entre ––, e não entre (), pois estes retiram da frase aquele material, criando o que poderíamos chamar de <enclaves>, ao passo que, na boa prosa, nada deve ser imprescindível para o todo da estrutura. Ao confessar que são prescindíveis, os () renunciam implicitamente à pretensão de integridade da forma lingüística”

“Proust, a quem dificilmente se poderia chamar de filisteu, e cujo pendatismo nada mais é que um aspecto de sua grandiosa força micrológica, não hesitou em utilizar ().”

“(a ilusão de continuidade da narrativa é rompida, e o narrador a-social está disposto a se esgueirar através de todas as suas janelas para iluminar, com a lanterna cega de uma memória de nenhum modo involuntária, o obscuro temps durée.)”

“Diante dos sinais de pontuação, o escritor encontra-se em permanente perigo; se fosse possível, quando se escreve, ter o controle sobre si mesmo, seria perceptível a impossibilidade de usar corretamente qualquer sinal de pontuação, e se desistiria de escrever.”

“Ele não pode confiar nas regras – freqüentemente rígidas e grosseiras, mas também não pode ignorá-las, se não quiser cair em uma espécie de excentricidade ou ferir a essência do que não é aparente, ao sublinhá-lo – e essa não-aparência é o elemento vital da pontuação.”

“O conflito deve ser suportado a cada vez, e é preciso muita força ou muita estupidez para não perder a coragem.”

“Cada sinal cuidadosamente evitado é uma reverência feita pela escrita ao som que ela sufoca.”

O ARTISTA COMO REPRESENTANTE, conferência, texto em 1953.

“a poésie pure de Valéry, o discípulo de Mallarmé, impiedosamente fechada a qualquer comunicação com um suposto público leitor.”

“não é possível pensar o material histórico da literatura alemã sem Baudelaire, apesar –OU JUSTAMENTE POR CAUSA- da intransigência de George, seu grande tradutor.”

“Se a coletânea de poemas de Valéry esboçada por Rilke jamais alcançou o peso das grandes traduções de George, ou das traduções de Swinburne por Borchardt, isso não se deve apenas aos melindres do objeto. Rilke violou a lei fundamental de toda tradução legítima, a fidelidade ao texto

Valéry, Degas, dança, desenho, trad. 2003.

Assim como um leitor meio distraído rabisca nas margens de uma obra e produz, ao sabor da ausência ou do lápis, pequenos seres ou vagas ramagens, ladeando as massas legíveis, farei o mesmo, segundo o capricho da mente, em torno desses poucos estudos de Edgar Degas.”

“Sem dúvida, haveria razões para se escandalizar, quando se vê um filósofo falando de um livro escrito por um poeta esotérico, sobre um pintor obcecado pelo trabalho manual.”

“De um modo geral, as grandes intuições sobre arte ocorrem ou em uma absoluta distância, por uma dedução conceitual não-afetada pela chamada <compreensão artística>, como em Kant ou Hegel, ou nessa absoluta proximidade, a atitude de quem não se confunde com o público, pois se encontra nos bastidores, acompanhando a realização da obra sob o aspecto da fatura, da técnica.”

O que chamo de ‘a grande arte’ é simplesmente a arte que exige que todas as faculdades de um homem sejam nela utilizadas, e cujas obras são tais que todas as faculdades de um outro homem sejam invocadas no interesse de compreendê-las…”

Um amador, um connaisseur do tempo de Júlio II ou de Luís XIV, ficaria muito espantado se lhe contassem que quase tudo o que ele considerava essencial na pintura é hoje não somente negligenciado como está radicalmente ausente das preocupações do pintor e das exigências do público.”

O homem completo está morrendo”

É preciso ter uma idéia elevada, não do que se faz, mas do que se poderá fazer um dia; sem o quê não vale a pena trabalhar

Edgar Degas

Como o jogador perseguido por combinações de partidas, assombrado à noite pelo espectro do tabuleiro de xadrez ou do feltro onde as cartas são lançadas, obcecado por imagens táticas e soluções mais vivas que reais, assim o artista é essencialmente artista.” V.

“a teoria da obra de arte engajada, tal como ela hoje se propagou, simplesmente passa por cima do fato que domina de modo irrevogável a sociedade de troca: a alienação entre os homens e também entre o espírito objetivo e a sociedade que ele exprime e julga. Essa teoria deseja que a arte fale imediatamente aos homens, como se o imediato, em um mundo de mediação universal, pudesse ser realizado imediatamente!”

Mais um desses ermitões que sabem o horário dos trens” Degas

Por vezes me ocorre o pensamento de que o trabalho do artista é um trabalho de tipo muito antigo; o próprio artista é uma sobrevivência, um operário ou um artesão de uma espécie em via de desaparecer, que trabalha em seu próprio quarto, usa procedimentos muito pessoais e muito empíricos, vive na desordem e na intimidade de suas ferramentas, vê o que quer e não o que o cerca, usa potes quebrados, sucata doméstica, objetos condenados … Talvez essas condições estejam mudando, ao aspecto dessas ferramentas improvisadas e do ser singular que com elas se acomoda veremos opor-se o quadro do laboratório pictórico de um homem rigorosamente vestido de branco, com luvas de borracha, obedecendo a um horário muito preciso, armado de aparelhos e de instrumentos estritamente especializados, cada qual com seu lugar e com uma oportunidade exata de uso?” V.

“O artista deve transformar a si mesmo em instrumento: tornar-se até mesmo coisa, se não quiser sucumbir à maldição do anacronismo em meio ao mundo reificado.”

a grande música consiste no cumprimento de “obligations”, de obrigações que o compositor subscreve desde a primeira nota.

Schoenberg, Style and Idea

A arte moderna tende a explorar quase exclusivamente a SENSIBILIDADE SENSORIAL, em prejuízo da sensibilidade geral ou afetiva, e de nossas faculdades de construção, de adição das durações e de transformações pelo espírito. Sabe maravilhosamente bem excitar a atenção e usa todos os meios para excitá-la: intensidades, contrastes, enigmas, surpresas. Captura por vezes, pela sutileza de seus meios ou pela audácia da execução, algumas presas bastante preciosas: estados muito complexos ou muito efêmeros, valores irracionais, sensações em estado nascente, ressonâncias, correspondências, pressentimentos de uma instável profundidade … Mas há um preço a ser pago por estas vantagens” V.

“Não se tornar estúpido, não se deixar enganar, não ser cúmplice: estes são os modos de comportamento social sedimentados na obra de Valéry (…) Para ele, construir obras de arte significa recusar o ópio no qual se transformou a grande arte sensível, desde Wagner, Baudelaire e Manet

“Além disso, pode-se perguntar se, apesar da guinada objetiva que ele confere à interpretação da obra de arte, ele não acaba impondo, como Nietzsche, uma metafísica do artista. Não me atrevo a decidir se Valéry, ou também Nie., superestimaram a arte.”

“contra toda a entronização do gênio, profundamente arraigada, sobretudo na estética alemã, desde Kant e Schelling.”

SOBRE O AUTOR

Adorno doutorou-se em filosofia aos 21 anos com um trabalho sobre Husserl! Sempre nos voltamos contra aquilo que proferimos na hubris da juventude!

“A amizade com Benjamin afeta decisivamente os rumos da reflexão filosófica de Adorno nesse período [do exílio na Inglaterra, e posteriormente EUA].” Em 1949 retorna a Frankfurt. Minima moralia é de 1951.

“No confronto com as correntes positivistas e heideggerianas da época, Adorno publica diversos livros de ensaios, entre eles Prismas, Intervenções e Palavras e sinais.” “Segue escrevendo sobre música, com diversos livros de ensaios e duas grandes monografias, uma sobre Mahler e outra sobre Alban Berg [seu professor]. Em 1966 conclui sua obra filosófica mais ambiciosa, Dialética negativa, e se concentra na realização de uma Teoria estética, que seria publicada postumamente em 1971. Abalado pelo confronto com alunos, nas revoltas estudantis de 1969, Adorno morre de infarto em 6 de agosto do mesmo ano, quando passava férias na cidade de Visp, Suiça.”

+recomendações de A.:

Cartas (Benjamin, Horkheimer, Thomas Mann…)

Dissonâncias. Música no mundo administrado.

Filosofia da Nova Música

Introdução à sociologia da música

Kierkegaard. Construção do estético

Para a metacrítica da teoria do conhecimento. Estudos sobre Husserl e as antinomias filosóficas, 1956 (complemento póstumo ao doutorado precoce?).

Três estudos sobre Hegel

sobre:

Rodrigo Duarte, Adornos, 1997.

Barbara Freitag, A teoria crítica: ontem e hoje, 1986.

Flávio Kothe, Benjamin & Adorno: confrontos, 1979.

Álvaro Valls, Estudos de estética e filosofia da arte: numa perspectiva adorniana, 2002.

DICIONÁRIO

beben: vibrar, chacoalhar

leuchten: brilhar

Nachdichten: recriação poética

Rauch: fumaça

rauschen: murmurar

HENRY VIII

–Curiosa peça de bons costumes–

“…think you see them great,
And follow’d with the general throng and sweat

Of thousand friends; then in a moment, see
How soon this mightiness meets misery:
And, if you can be merry then, I’ll say
A man may weep upon his wedding-day.”

“To-day the French,
All clinquant, all in gold, like heathen gods,
Shone down the English; and, to-morrow, they
Made Britain India: every man that stood
Show’d like a mine. Their dwarfish pages were
As cherubins, all guilt: the madams too,
Not used to toil, did almost sweat to bear
The pride upon them, that their very labour
Was to them as a painting”

ABERGAVENNY

…the devil is a niggard,
Or has given all before, and he begins
A new hell in himself.”

NORFOLK

Grievingly I think,
The peace between the French and us not values
The cost that did conclude it.”

“For France hath flaw’d the league, and hath attach’d
Our merchants’ goods at Bourdeaux.”

“…You know his nature,
That he’s revengeful, and I know his sword
Hath a sharp edge: it’s long and, ‘t may be said,
It reaches far, and where ‘twill not extend,
Thither he darts it. Bosom up my counsel,
You’ll find it wholesome. Lo, where comes that rock
That I advise your shunning.

Enter CARDINAL WOLSEY, the purse borne before him”

“A beggar’s book outworths a noble’s blood.”

NORFOLK

Be advised;
Heat not a furnace for your foe so hot
That it do singe yourself: we may outrun,
By violent swiftness, that which we run at,
And lose by over-running. Know you not,
The fire that mounts the liquor til run o’er,
In seeming to augment it wastes it? Be advised:
I say again, there is no English soul
More stronger to direct you than yourself,
If with the sap of reason you would quench,
Or but allay, the fire of passion.”

“…This holy fox,
Or wolf, or both,–for he is equal ravenous
As he is subtle, and as prone to mischief
As able to perform’t; his mind and place
Infecting one another, yea, reciprocally–
Only to show his pomp as well in France
As here at home, suggests the king our master
To this last costly treaty…”

Sergeant

Sir,
My lord the Duke of Buckingham, and Earl
Of Hereford, Stafford, and Northampton, I
Arrest thee of high treason, in the name
Of our most sovereign king.”

KING HENRY VIII

…Sixth part of each?
A trembling contribution! Why, we take
From every tree lop, bark, and part o’ the timber;
And, though we leave it with a root, thus hack’d,
The air will drink the sap. To every county
Where this is question’d send our letters, with
Free pardon to each man that has denied
The force of this commission: pray, look to ’t;
I put it to your care.”

CARDINAL WOLSEY

Stand forth, and with bold spirit relate what you,
Most like a careful subject, have collected
Out of the Duke of Buckingham.

KING HENRY VIII

Speak freely.

Surveyor

First, it was usual with him, every day
It would infect his speech, that if the king
Should without issue die, he’ll carry it so
To make the sceptre his: these very words
I’ve heard him utter to his son-in-law,
Lord Abergavenny; to whom by oath he menaced
Revenge upon the cardinal.

CARDINAL WOLSEY

Please your highness, note
This dangerous conception in this point.
Not friended-by by his wish, to your high person
His will is most malignant; and it stretches
Beyond you, to your friends.”

KING HENRY VIII

Speak on:
How grounded he his title to the crown,
Upon our fail? to this point hast thou heard him
At any time speak aught?

Surveyor

He was brought to this
By a vain prophecy of Nicholas Hopkins.

KING HENRY VIII

What was that Hopkins?

Surveyor

Sir, a Chartreux friar,
His confessor, who fed him every minute
With words of sovereignty.

KING HENRY VIII

How know’st thou this?

Surveyor

Not long before your highness sped to France,
The duke being at the Rose, within the parish
Saint Lawrence Poultney, did of me demand
What was the speech among the Londoners
Concerning the French journey: I replied,
Men fear’d the French would prove perfidious,
To the king’s danger.”

QUEEN KATHARINE

If I know you well,
You were the duke’s surveyor, and lost your office
On the complaint o’ the tenants: take good heed
You charge not in your spleen a noble person
And spoil your nobler soul: I say, take heed;
Yes, heartily beseech you.”

“If, quoth he, I for this had been committed,

As, to the Tower, I thought, I would have play’d

The part my father meant to act upon

The usurper Richard; who, being at Salisbury,

Made suit to come in’s presence; which if granted,

As he made semblance of his duty, would

Have put his knife to him.”

CARDINAL WOLSEY

Now, madam, may his highness live in freedom,
and this man out of prison?

QUEEN KATHARINE

God mend all!”

KING HENRY VIII

There’s his period,
To sheathe his knife in us. He is attach’d;
Call him to present trial: if he may
Find mercy in the law, ‘tis his: if none,
Let him not seek ‘t of us: by day and night,
He’s traitor to the height.

Exeunt”

“Two women placed together makes cold weather”

“Duas mulheres lado a lado fazem do lugar gelado”

“Você ajudará a passar as horas;

Sente no meio destas senhoras.”

SANDS

By my faith,

And thank your lordship. By your leave, sweet ladies:

If I chance to talk a little wild, forgive me;

I had it from my father.

ANNE

Was he mad, sir?

SANDS

O, very mad, exceeding mad, in love too:

But he would bite none; just as I do now,

He would kiss you twenty with a breath.

Kisses her”

BUCKINGHAM

(…)

You few that loved me,

And dare be bold to weep for Buckingham,

His noble friends and fellows, whom to leave

Is only bitter to him, only dying,

Go with me, like good angels, to my end;

And, as the long divorce of steel falls on me,

Make of your prayers one sweet sacrifice,

And lift my soul to heaven. Lead on, o’ God’s name.”

“Nay, Sir Nicholas,

Let it alone; my state now will but mock me.

When I came hither, I was lord high constable

And Duke of Buckingham; now, poor Edward Bohun:

Yet I am richer than my base accusers,

That never knew what truth meant: I now seal it;

And with that blood will make ‘em one day groan for’t.

My noble father, Henry of Buckingham,

Who first raised head against usurping Richard,

Flying for succor to his servant Banister,

Being distress’d, was by that wretch betray’d,

And without trial fell; God’s peace be with him!

Henry the Seventh succeeding, truly pitying

My father’s loss, like a most royal prince,

Restored me to my honours, and, out of ruins,

Made my name once more noble. Now his son,

Henry the Eighth, life, honour, name and all

That made me happy at one stroke has taken

For ever from the world. I had my trial,

And, must needs say, a noble one; which makes me,

A little happier than my wretched father:

Yet thus far we are one in fortunes: both

Fell by our servants, by those men we loved most;

A most unnatural and faithless service!

Heaven has an end in all: yet, you that hear me,

This from a dying man receive as certain:

Where you are liberal of your loves and counsels

Be sure you be not loose; for those you make friends

And give your hearts to, when they once perceive

The least rub in your fortunes, fall away

Like water from ye, never found again

But where they mean to sink ye.”

Chamberlain

I left him private,

Full of sad thoughts and troubles.

NORFOLK

What’s the cause?

Chamberlain

It seems the marriage with his brother’s wife

Has crept too near his conscience.

SUFFOLK

No, his conscience

Has crept too near another lady.

NORFOLK

‘Tis so:

This is the cardinal’s doing, the king-cardinal:

That blind priest, like the eldest son of fortune,

Turns what he list. The king will know him one day.”

NORFOLK

How holily he works in all his business!

And with what zeal! for, now he has crack’d the league

Between us and the emperor, the queen’s great nephew,

He dives into the king’s soul, and there scatters

Dangers, doubts, wringing of the conscience,

Fears, and despairs; and all these for his marriage:

And out of all these to restore the king,

He counsels a divorce; a loss of her

That, like a jewel, has hung twenty years

About his neck, yet never lost her lustre;

Of her that loves him with that excellence

That angels love good men with…”

“…his curses and his blessings

Touch me alike, they’re breath I not believe in.

I knew him, and I know him; so I leave him

To him that made him proud, the pope.”

KING HENRY VIII

Who’s there, ha?

NORFOLK

Pray God he be not angry.

KING HENRY VIII

Who’s there, I say? How dare you thrust yourselves

Into my private meditations?

Who am I? ha?”

CARDINAL WOLSEY

…All the clerks,

I mean the learned ones, in Christian kingdoms

Have their free voices: Rome, the nurse of judgment,

Invited by your noble self, hath sent

One general tongue unto us, this good man,

This just and learned priest, Cardinal Campeius;

Whom once more I present unto your highness.”

CARDINAL WOLSEY

[Aside to GARDINER] Give me your hand much joy and

favour to you;

You are the king’s now.

GARDINER

[Aside to CARDINAL WOLSEY]

But to be commanded

For ever by your grace, whose hand has raised me.”

“O, my lord,

Would it not grieve an able man to leave

So sweet a bedfellow? But, conscience, conscience!

O, ‘tis a tender place; and I must leave her.

Exeunt”

ANNE

O, God’s will! much better
She ne’er had known pomp: though’t be temporal,
Yet, if that quarrel, fortune, do divorce
It from the bearer, ‘tis a sufferance panging
As soul and body’s severing.

Old Lady

Alas, poor lady!
She’s a stranger now again.”

ANNE

By my troth and maidenhead,
I would not be a queen.

Old Lady

Beshrew me, I would,
And venture maidenhead for’t; and so would you,
For all this spice of your hypocrisy:
You, that have so fair parts of woman on you,
Have too a woman’s heart; which ever yet
Affected eminence, wealth, sovereignty;
Which, to say sooth, are blessings…”

CHAMBERLAIN, Aside

I have perused her well;
Beauty and honour in her are so mingled
That they have caught the king: and who knows yet
But from this lady may proceed a gem
To lighten all this isle? I’ll to the king,
And say I spoke with you.
Exit Chamberlain

Old Lady

How tastes it? is it bitter? forty pence, no.
There was a lady once, ‘tis an old story,
That would not be a queen, that would she not,
For all the mud in Egypt: have you heard it?

ANNE

Come, you are pleasant.

Old Lady

With your theme, I could
O’ermount the lark. The Marchioness of Pembroke!
A thousand pounds a year for pure respect!
No other obligation! By my life,
That promises moe thousands: honour’s train
Is longer than his foreskirt. By this time
I know your back will bear a duchess: say,
Are you not stronger than you were?”

A descrição cenográfica mais completa que já li em Shakespeare:

SCENE IV. A hall in Black-Friars.

Trumpets, sennet, and cornets. Enter two Vergers, with short silver wands; next them, two Scribes, in the habit of doctors; after them, CANTERBURY alone; after him, LINCOLN, Ely, Rochester, and Saint Asaph; next them, with some small distance, follows a Gentleman bearing the purse, with the great seal, and a cardinal’s hat; then two Priests, bearing each a silver cross; then a Gentleman-usher bare-headed, accompanied with a Sergeant-at-arms bearing a silver mace; then two Gentlemen bearing two great silver pillars; after them, side by side, CARDINAL WOLSEY and CARDINAL CAMPEIUS; two Noblemen with the sword and mace. KING HENRY VIII takes place under the cloth of state; CARDINAL WOLSEY and CARDINAL CAMPEIUS sit under him as judges. QUEEN KATHARINE takes place some distance from KING HENRY VIII. The Bishops place themselves on each side the court, in manner of a consistory; below them, the Scribes. The Lords sit next the Bishops. The rest of the Attendants stand in convenient order about the stage”

QUEEN KATHARINE

…  Alas, sir,
In what have I offended you? what cause
Hath my behavior given to your displeasure,
That thus you should proceed to put me off,
And take your good grace from me? Heaven witness,
I have been to you a true and humble wife,
At all times to your will conformable;
Ever in fear to kindle your dislike,
Yea, subject to your countenance, glad or sorry
As I saw it inclined: when was the hour
I ever contradicted your desire,
Or made it not mine too? Or which of your friends
Have I not strove to love, although I knew
He were mine enemy? what friend of mine
That had to him derived your anger, did I
Continue in my liking? nay, gave notice
He was from thence discharged. Sir, call to mind
That I have been your wife, in this obedience,
Upward of twenty years, and have been blest
With many children by you: if, in the course
And process of this time, you can report,
And prove it too, against mine honour aught,
My bond to wedlock, or my love and duty,
Against your sacred person, in God’s name,
Turn me away; and let the foul’st contempt
Shut door upon me, and so give me up
To the sharp’st kind of justice. Please you sir,
The king, your father, was reputed for
A prince most prudent, of an excellent
And unmatch’d wit and judgment: Ferdinand,
My father, king of Spain, was reckon’d one
The wisest prince that there had reign’d by many
A year before: it is not to be question’d
That they had gather’d a wise council to them
Of every realm, that did debate this business,
Who deem’d our marriage lawful: wherefore I humbly
Beseech you, sir, to spare me, till I may
Be by my friends in Spain advised; whose counsel
I will implore: if not, i’ the name of God,
Your pleasure be fulfill’d!”

QUEEN KATHARINE

I will, when you are humble; nay, before,
Or God will punish me. I do believe,
Induced by potent circumstances, that
You are mine enemy, and make my challenge
You shall not be my judge: for it is you
Have blown this coal betwixt my lord and me;
Which God’s dew quench! Therefore I say again,
I utterly abhor, yea, from my soul
Refuse you for my judge; whom, yet once more,
I hold my most malicious foe, and think not
At all a friend to truth.

CARDINAL WOLSEY

I do profess
You speak not like yourself; who ever yet
Have stood to charity, and display’d the effects
Of disposition gentle, and of wisdom
O’ertopping woman’s power. Madam, you do me wrong:
I have no spleen against you; nor injustice
For you or any: how far I have proceeded,
Or how far further shall, is warranted
By a commission from the consistory,
Yea, the whole consistory of Rome.”

QUEEN KATHARINE

My lord, my lord,
I am a simple woman, much too weak
To oppose your cunning. You’re meek and
humble-mouth’d;
You sign your place and calling, in full seeming,
With meekness and humility; but your heart
Is cramm’d with arrogancy, spleen, and pride.
You have, by fortune and his highness’ favours,
Gone slightly o’er low steps and now are mounted
Where powers are your retainers, and your words,
Domestics to you, serve your will as’t please
Yourself pronounce their office. I must tell you,
You tender more your person’s honour than
Your high profession spiritual: that again
I do refuse you for my judge; and here,
Before you all, appeal unto the pope,
To bring my whole cause ‘fore his holiness,
And to be judged by him.

She curtsies to KING HENRY VIII, and offers to depart

Crier

Katharine Queen of England, come into the court.

GRIFFITH

Madam, you are call’d back.

QUEEN KATHARINE

What need you note it? pray you, keep your way:
When you are call’d, return. Now, the Lord help,
They vex me past my patience! Pray you, pass on:
I will not tarry; no, nor ever more
Upon this business my appearance make
In any of their courts.

Exeunt QUEEN KATHARINE and her Attendants

KING HENRY VIII

Go thy ways, Kate:
That man i’ the world who shall report he has
A better wife, let him in nought be trusted,
For speaking false in that: thou art, alone,
If thy rare qualities, sweet gentleness,
Thy meekness saint-like, wife-like government,
Obeying in commanding, and thy parts
Sovereign and pious else, could speak thee out,
The queen of earthly queens: she’s noble born;
And, like her true nobility, she has
Carried herself towards me.”

CARDINAL CAMPEIUS

So please your highness,
The queen being absent, ‘tis a needful fitness
That we adjourn this court till further day:
Meanwhile must be an earnest motion
Made to the queen, to call back her appeal
She intends unto his holiness.

KING HENRY VIII

(Aside) I may perceive
These cardinals trifle with me: I abhor
This dilatory sloth and tricks of Rome.
My learn’d and well-beloved servant, Cranmer,
Prithee, return: with thy approach, I know,
My comfort comes along. Break up the court:
I say, set on.

Exeunt in manner as they entered”

QUEEN KATHARINE

O, good my lord, no Latin;
I am not such a truant since my coming,
As not to know the language I have lived in:
A strange tongue makes my cause more strange,
suspicious;
Pray, speak in English: here are some will thank you,
If you speak truth, for their poor mistress’ sake;
Believe me, she has had much wrong: lord cardinal,
The willing’st sin I ever yet committed
May be absolved in English.”

CARDINAL CAMPEIUS

Most honour’d madam,
My Lord of York, out of his noble nature,
Zeal and obedience he still bore your grace,
Forgetting, like a good man your late censure
Both of his truth and him, which was too far,
Offers, as I do, in a sign of peace,
His service and his counsel.”

“Ye have angels’ faces, but heaven knows your hearts.
What will become of me now, wretched lady!
I am the most unhappy woman living.
Alas, poor wenches, where are now your fortunes!
Shipwreck’d upon a kingdom, where no pity,
No friend, no hope; no kindred weep for me;
Almost no grave allow’d me: like the lily,
That once was mistress of the field and flourish’d,
I’ll hang my head and perish.”

SUFFOLK

The cardinal’s letters to the pope miscarried,
And came to the eye o’ the king: wherein was read,
How that the cardinal did entreat his holiness
To stay the judgment o’ the divorce; for if
It did take place, ‘I do,’ quoth he, ‘perceive
My king is tangled in affection to
A creature of the queen’s, Lady Anne Bullen.’

SURREY

Has the king this?

SUFFOLK

Believe it.

SURREY

Will this work?

Chamberlain

The king in this perceives him, how he coasts
And hedges his own way. But in this point
All his tricks founder, and he brings his physic
After his patient’s death: the king already
Hath married the fair lady.”

“…Katharine no more
Shall be call’d queen, but princess dowager
And widow to Prince Arthur.”

CARDINAL WOLSEY

The packet, Cromwell.
Gave’t you the king?

CROMWELL

To his own hand, in’s bedchamber.

CARDINAL WOLSEY

Look’d he o’ the inside of the paper?

CROMWELL

Presently
He did unseal them: and the first he view’d,
He did it with a serious mind; a heed
Was in his countenance. You he bade
Attend him here this morning.”

CARDINAL WOLSEY [Aside]

…There’s more in’t than fair visage. Bullen!
No, we’ll no Bullens. Speedily I wish
To hear from Rome. The Marchioness of Pembroke!

NORFOLK

He’s discontented.

SUFFOLK

May be, he hears the king
Does whet his anger to him.”

“…yet I know her for
A spleeny Lutheran; and not wholesome to
Our cause, that she should lie i’ the bosom of
Our hard-ruled king. Again, there is sprung up
An heretic, an arch one, Cranmer; one
Hath crawl’d into the favour of the king,
And is his oracle.

NORFOLK

He is vex’d at something.”

HENRY VIII

(…)

My father loved you:
His said he did; and with his deed did crown
His word upon you. Since I had my office,
I have kept you next my heart; have not alone
Employ’d you where high profits might come home,
But pared my present havings, to bestow
My bounties upon you.

CARDINAL WOLSEY

[Aside] What should this mean?”

“He parted frowning from me, as if ruin
Leap’d from his eyes: so looks the chafed lion
Upon the daring huntsman that has gall’d him;
Then makes him nothing. I must read this paper;
I fear, the story of his anger. ‘Tis so;
This paper has undone me: ‘tis the account
Of all that world of wealth I have drawn together
For mine own ends; indeed, to gain the popedom,
And fee my friends in Rome. O negligence!
Fit for a fool to fall by: what cross devil
Made me put this main secret in the packet
I sent the king? Is there no way to cure this?
No new device to beat this from his brains?
I know ‘twill stir him strongly; yet I know
A way, if it take right, in spite of fortune
Will bring me off again. What’s this? ‘To the Pope!’”

“Vain pomp and glory of this world, I hate ye:
I feel my heart new open’d. O, how wretched
Is that poor man that hangs on princes’ favours!
There is, betwixt that smile we would aspire to,
That sweet aspect of princes, and their ruin,
More pangs and fears than wars or women have:
And when he falls, he falls like Lucifer,
Never to hope again.”

“I feel within me
A peace above all earthly dignities,
A still and quiet conscience. The king has cured me,
I humbly thank his grace; and from these shoulders,
These ruin’d pillars, out of pity, taken
A load would sink a navy, too much honour:
O, ‘tis a burthen, Cromwell, ‘tis a burthen
Too heavy for a man that hopes for heaven!”

CROMWELL

O my lord,
Must I, then, leave you? must I needs forego
So good, so noble and so true a master?
Bear witness, all that have not hearts of iron,
With what a sorrow Cromwell leaves his lord.
The king shall have my service: but my prayers
For ever and for ever shall be yours.

(…)

Had I but served my God with half the zeal
I served my king, he would not in mine age
Have left me naked to mine enemies.”

“But, I beseech you, what’s become of Katharine,
The princess dowager? how goes her business?

First Gentleman

That I can tell you too. The Archbishop
Of Canterbury, accompanied with other
Learned and reverend fathers of his order,
Held a late court at Dunstable, six miles off
From Ampthill where the princess lay; to which
She was often cited by them, but appear’d not:
And, to be short, for not appearance and
The king’s late scruple, by the main assent
Of all these learned men she was divorced,
And the late marriage made of none effect
Since which she was removed to Kimbolton,
Where she remains now sick.”

CAPUCIUS

Madam, in good health.

KATHARINE

So may he ever do! and ever flourish,
When I shal l dwell with worms, and my poor name
Banish’d the kingdom! Patience, is that letter,
I caused you write, yet sent away?

PATIENCE

No, madam.

Giving it to KATHARINE

KATHARINE

Sir, I most humbly pray you to deliver
This to my lord the king.”

HENRY VIII

(…)

You take a precipice for no leap of danger,
And woo your own destruction.

CRANMER

God and your majesty
Protect mine innocence, or I fall into
The trap is laid for me!”

“…Look, the good man weeps!
He’s honest, on mine honour. God’s blest mother!
I swear he is true–hearted; and a soul
None better in my kingdom. Get you gone,
And do as I have bid you.
Exit CRANMER

He has strangled
His language in his tears.”

Old Lady

Ay, ay, my liege;
And of a lovely boy: the God of heaven
Both now and ever bless her! ‘tis a girl,
Promises boys hereafter. Sir, your queen
Desires your visitation, and to be
Acquainted with this stranger ‘tis as like you
As cherry is to cherry.”

Chancellor

My good lord archbishop, I’m very sorry
To sit here at this present, and behold
That chair stand empty: but we all are men,
In our own natures frail, and capable
Of our flesh; few are angels: out of which frailty
And want of wisdom, you, that best should teach us,
Have misdemean’d yourself, and not a little,
Toward the king first, then his laws, in filling
The whole realm, by your teaching and your chaplains,
For so we are inform’d, with new opinions,
Divers and dangerous; which are heresies,
And, not reform’d, may prove pernicious.”

CRANMER

Is there no other way of mercy,
But I must needs to the Tower, my lords?

GARDINER

What other
Would you expect? you are strangely troublesome.
Let some o’ the guard be ready there.”

KING HENRY VIII

No, sir, it does not please me.
I had thought I had had men of some understanding
And wisdom of my council; but I find none.
Was it discretion, lords, to let this man,
This good man,–few of you deserve that title,–
This honest man, wait like a lousy footboy
At chamber–door? and one as great as you are?
Why, what a shame was this! Did my commission
Bid ye so far forget yourselves? I gave ye
Power as he was a counsellor to try him,
Not as a groom: there’s some of ye, I see,
More out of malice than integrity,
Would try him to the utmost, had ye mean;
Which ye shall never have while I live.”

Garter

Heaven, from thy endless goodness, send prosperous
life, long, and ever happy, to the high and mighty
princess of England, Elizabeth!”

KING HENRY VIII

Thank you, good lord archbishop:
What is her name?

CRANMER

Elizabeth.

KING HENRY VIII

Stand up, lord.

KING HENRY VIII kisses the child

With this kiss take my blessing: God protect thee!
Into whose hand I give thy life.”

“This royal infant–heaven still move about her!–
Though in her cradle, yet now promises
Upon this land a thousand thousand blessings,
Which time shall bring to ripeness: she shall be–
But few now living can behold that goodness–
A pattern to all princes living with her,
And all that shall succeed: Saba was never
More covetous of wisdom and fair virtue
Than this pure soul shall be: all princely graces,
That mould up such a mighty piece as this is,
With all the virtues that attend the good,
Shall still be doubled on her: truth shall nurse her,
Holy and heavenly thoughts still counsel her:
She shall be loved and fear’d: her own shall bless her;
Her foes shake like a field of beaten corn,
And hang their heads with sorrow: good grows with her:
In her days every man shall eat in safety,
Under his own vine, what he plants; and sing
The merry songs of peace to all his neighbours:
God shall be truly known; and those about her
From her shall read the perfect ways of honour,
And by those claim their greatness, not by blood.
Nor shall this peace sleep with her: but as when
The bird of wonder dies, the maiden phoenix,
Her ashes new create another heir,
As great in admiration as herself;
So shall she leave her blessedness to one,
When heaven shall call her from this cloud of darkness,
Who from the sacred ashes of her honour
Shall star-like rise, as great in fame as she was,
And so stand fix’d: peace, plenty, love, truth, terror,
That were the servants to this chosen infant,
Shall then be his, and like a vine grow to him:
Wherever the bright sun of heaven shall shine,
His honour and the greatness of his name
Shall be, and make new nations: he shall flourish,
And, like a mountain cedar, reach his branches
To all the plains about him: our children’s children
Shall see this, and bless heaven.”

CRANMER

She shall be, to the happiness of England,
An aged princess; many days shall see her,
And yet no day without a deed to crown it.
Would I had known no more! but she must die,
She must, the saints must have her; yet a virgin,
A most unspotted lily shall she pass
To the ground, and all the world shall mourn her.”

EPILOGUE
‘Tis ten to one this play can never please
All that are here: some come to take their ease,
And sleep an act or two; but those, we fear,
We have frighted with our trumpets; so, ‘tis clear,
They’ll say ‘tis naught: others, to hear the city
Abused extremely, and to cry ‘That’s witty!’
Which we have not done neither: that, I fear,
All the expected good we’re like to hear
For this play at this time, is only in
The merciful construction of good women;
For such a one we show’d ‘em: if they smile,
And say ‘twill do, I know, within a while
All the best men are ours; for ‘tis ill hap,
If they hold when their ladies bid ‘em clap.”

AMERICAN NERVOUSNESS: ITS CAUSES AND CONSEQUENCES (A supplement to “Nervous exhaustion: Neurasthenia”) – George Beard, 1881.

-Um glamouroso retrato da decadência ocidental, embora ingenuamente otimista quanto a ele e de um ultimado chauvinismo ianque!-

Nervousness is strictly deficiency or lack of nerve-force. This condition, together with all the symptoms of diseases that are evolved from it, has developed mainly within the 19th century, and is especially frequent and severe in the Northern and Eastern portions of the United States. Nervousness, in the sense here used, is to be distinguished rigidly and systematically from simple excess of emotion and from organic disease.”

The sign and type of functional nervous diseases that are evolved out of this general nerve sensitiveness is neurasthenia (nervous exhaustion), which is in close and constant relation with such functional nerve maladies as certain physical forms of hysteria, hay-fever [rinite alérgica], sick-headache, inebriety, and some phases of insanity; is, indeed, a branch whence at early or later stages of growth these diseases may take their origin.”

The greater prevalence of nervousness in America is a complex resultant of a number of influences, the chief of which are dryness of the air, extremes of heat and cold, civil and religious liberty, and the great mental activity made necessary and possible in a new and productive country under such climatic conditions.

A new crop of diseases has sprung up in America, of which Great Britain until lately knew nothing, or but little. A class of functional diseases of the nervous system, now beginning to be known everywhere in civilization, seem to have first taken root under an American sky, whence their seed is being distributed.

All this is modern, and originally American; and no age, no country, and no form of civilization, not Greece, nor Rome, nor Spain, nor the Netherlands, in the days of their glory, possessed such maladies.” Not in their glories, that is.

to solve it in all its interlacings, to unfold its marvellous phenomena and trace them back to their sources and forward to their future developments, is to solve the problem of sociology itself.” [!!!]

Among the signs of American nervousness specially worthy of attention are the following: The nervous diathesis [degenerescência genética, i.e., uma suposta maior vulnerabilidade a doenças dos nervos decorrente da debilidade dos progenitores]; susceptibility to stimulants and narcotics and various drugs, and consequent necessity of temperance¹ [e ainda chama essa abordagem de sociológica sem levar em conta o fator cultural?]; increase of the nervous diseases inebriety [alcoolismo ou uma ligeira variação deste – suscetibilidade exagerada –, que o autor diferenciará no segundo capítulo] and neurasthenia (nervous exhaustion), hay-fever, neuralgia [dor crônica nas terminações nervosas], nervous dyspepsia [indigestão], asthenopia [fadiga ocular e dores de cabeça derivadas] and allied diseases and symptoms [bem específico…]; early and rapid decay of teeth [já fez seu Amil Dental?]; premature baldness; sensitiveness to cold and heat; increase of diseases not exclusively nervous, as diabetes and certain forms of Bright’s disease of the kidneys and chronic catarrhs; unprecedented beauty of American women; frequency of trance and muscle-reading [a tênue linha entre a paranormalidade e simples efeitos de indução eletromagnética]; the strain of dentition, puberty, and change of life; American oratory, humor [haha!], speech, and language; change in type of disease during the past half-century, and the greater intensity of animal life on this continent. [???]

¹ Ah, obviamente Sêneca e Epicuro concordariam contigo!

longevity has increased, and in all ages brain-workers have, on the average, been long-lived, the very greatest geniuses being the longest-lived of all.” “the law of the relation of age to work, by which it is shown that original brain-work is done mostly in youth and early and middle life, the latter decades being reserved for work requiring simply experience and routine.” Pequena confusão entre decaimento fisiológico e e incorporação da experiência como forma de reduzir o esforço mental!

Poetas românticos não usavam a cabeça? Pois sua efemeridade é mais-que-popular…

in all our cyclopedias of medicine, the terms hysteria, somnambulism, ecstasy, catalepsy, mimicry of disease, spinal congestion, incipient ataxy, epilepsy, spasms and congestions, anemias and hyperemias, alcoholism, spinal irritation, spinal exhaustion, cerebral paresis, cerebral exhaustion and irritation, nervousness and imagination [!] are thrown together recklessly, confusedly, hopelessly as in a witches cauldron; and in all, and through all, one shall look vainly—save here and there, for an intelligent and differential description of neurasthenia, the most frequent, the most important, the most interesting nervous disease of our time, or of any time

still our medical graduates, after years spent in listening to lectures, must wait for their diploma before they are even ready to begin the study of this side of the nervous system. Meantime the literature of ataxia [desarranjo da coordenação motora], which is but an atom compared with the world of functional nervous diseases, has risen and is yet rising with infinite repetitions and revolutions to volumes and volumes.”

So far as I know, there has been no hostile criticism of this philosophy in Germany, but in England, even now, these views are not unanimously sustained.” Nazistas retesados.

1. NATURE AND DEFINITION OF NERVOUSNESS

Trance, with its numerous, interesting and intricate phenomena, a condition that has been known in all ages, and among almost all people, is not nervousness, albeit nervous people are sometimes subject to it. See my work on Trance [não muito interessado, mas obrigado assim mesmo!], in which this distinction between physiology and psychology is discussed more fully and variously illustrated.” “This interesting survival of the Middle Ages that we have right here with us today, is the most forcible single illustration that I know of, of the distinction between unbalanced mental organization and nervousness. These Jumpers are precious curiosities, relics or antiques that the 14th century has, as it were, dropped right into the middle of the 19th. The phenomena of the Jumpers are as interesting, scientifically, as any phenomena can be, but they aren’t contributions to American nervousness.

Brainlessness (excess of emotion over intellect) is, indeed, to nervousness, what idiocy is to insanity”

Nervousness is not passionateness. A person who easily gets excited or angry, is often called nervous. One of the signs, and in some cases, one of the first signs of real nervousness, is mental irritability, a disposition to become fretted over trifles; but in a majority of instances, passionate persons are healthy—their exhibitions of anger are the expression of normal emotions, and not in any sense evidences of disease, although they may be made worse by disease, either functional or organic. Nervousness is nervelessness—a lack of nerve-force.” “In medical science we are forced to retain terminology that is in the last degree unscientific, for the same reason that we retain our orthography, which in the English language is, as all know, very bad indeed.” <Febre da grama> realmente não é muito literal!

fear of lightning, or fear of responsibility, of open places or of closed places, fear of society, fear of being alone, fear of fears, fear of contamination, fear of everything, deficient mental control, lack of decision in trifling matters, hopelessness, deficient thirst and capacity for assimilating fluids, abnormalities of the secretions, salivation, tenderness of the spine, and of the whole body, sensitiveness to cold or hot water, sensitiveness to changes in the weather, coccyodynia, pains in the back, heaviness of the loins and limbs, shooting pains simulating those of ataxia, cold hands and feet, pain in the feet, localized peripheral numbness and hypersesthesia, tremulous and variable pulse and palpitation of the heart, special idiosyncrasies in regard to food, medicines, and external irritants, local spasms of muscles, difficulty of swallowing, convulsive movements, especially on going to sleep, cramps [cãibras ou cólicas], a feeling of profound exhaustion unaccompanied by positive pain, coming and going, ticklishness [hiperdelicadeza ou sensibilidade; em sentido mais estrito, facilidade para sentir comichão ou cócegas], vague pains and flying neuralgias, general or local itching, general and local chills and flashes of heat [calafrios e ondas de calor esporádicos], attacks of temporary paralysis, pain in the perineum, involuntary emissions, partial or complete impotence, irritability of the prostatic urethra, certain functional diseases of women [vague!], excessive gaping and yawning [bocejar exagerado], rapid decay and irregularities of the teeth, oxalates, urates, phosphates and spermatozoa in the urine, vertigo or dizziness, explosions in the brain at the back of the neck [?!], dribbling and incontinence of urine [incontinência urinária e seu reverso, alternados], frequent urination, choreic movements of different parts of the body, trembling of the muscles or portions of the muscles in different parts of the body, exhaustion after defecation and urination, dryness of the hair, falling away of the hair and beard, slow reaction of the skin, etc. Dr. Neisser, of Breslau, while translating my work on Nervous Exhaustion into German, wrote me that the list of symptoms was not exhaustive. This criticism is at once accepted, and was long ago anticipated. An absolutely exhaustive catalogue of the manifestations of the nervously exhausted state cannot be prepared, since every case differs somewhat from every other case.”

There are millionnaires of nerve-force—those who never know what it is to be tired out, or feel that their energies are expended, who can write, preach, or work with their hands many hours, without ever becoming fatigued, who do not know by personal experience what the term <exhaustion> means; and there are those—and their numbers are increasing daily—who, without being absolutely sick, without being, perhaps for a lifetime, ever confined to the bed a day with acute disorder, are yet very poor in nerve-force; their inheritance is small, and they have been able to increase it but slightly, if at all; and if from overtoil, or sorrow, or injury, they overdraw their little surplus, they may find that it will require months or perhaps years to make up the deficiency, if, indeed they ever accomplish the task. The man with a small income is really rich, as long as there is no overdraft on the account; so the nervous man may be really well and in fair working order as long as he does not draw on his limited store of nerve-force. But a slight mental disturbance, unwonted toil or exposure, anything out of and beyond his usual routine, even a sleepless night, may sweep away that narrow margin, and leave him in nervous bankruptcy, from which he finds it as hard to rise as from financial bankruptcy.”

Hence we see that neurasthenics who can pursue without any special difficulty the callings of their lives, even those callings requiring great and prolonged activity, amid perhaps very considerable excitement, as that of statesmanship, politics, business, commercial life, or in overworked professions, are prostrated at once when they are called upon to do something outside of their line, where their force must travel by paths that have never been opened and in which the obstructions are numerous and can only be overcome by greater energy than they can supply.” The purpose of treatment in cases of nervous exhaustion is of a two-fold character— to widen the margin of nerve-force, and to teach the patient how to keep from slipping over the edge.”

Our title is justified by this, that if once we understand the causes and consequences of American nervousness, the problems connected with the nervousness of other lands speedily solve themselves.” The philosophy of Germany has penetrated to all civilized nations; in all directions we are becoming Germanized. Similarly, the nervousness of America is extending over Europe, which, in certain countries, at least, is becoming rapidly Americanized. Just as it is impossible to treat of German thought without intelligent reference to the thought of other nationalities, ancient or modern, so is it impossible to solve the problem of American nervousness without taking into our estimate the nervousness of other lands and ages. [Acaba de contradizer o grifado em verde!]”

O REVERSO DA MEDALHA

Indeed, nervousness, in its extreme manifestations, seems to save one from these organic incurable diseases of the brain and of the cord; with some exceptions here and there, the neurasthenic does not go into or die of nervous disease.” They may become insane—some of them do; they may become bed-confined invalids; they may be forced, as they often are, to resign their occupations, but they do not, as rule, develop the structural maladies to which here refer.” nervousness is a physical not a mental state, and its phenomena do not come from emotional excess or excitability or from organic disease but from nervous debility and irritability.”

2. SIGNS OF AMERICAN NERVOUSNESS

No one dies of spinal irritation; no one dies of cerebral irritation; no one dies of hay-fever; rarely one dies of hysteria; no one dies of general neuralgia; no one dies of sick-headache; no one dies of nervous dyspepsia; quite rarely does one die of nervous exhaustion; and even when these conditions are the cause of death they are not noted as such in the tables of mortality” Nervousness of constitution is, indeed, an aid to longevity, and in various ways; it compels caution, makes imperative the avoidance of evil habits, and early warns us of the approach of peril.” Wickedness was solemnly assigned as the cause of the increase of nervous diseases, as though wickedness were a modern discovery.” nervous diathesis—an evolution of the nervous temperament.” “It includes those temperaments, commonly designated as nervous, in whom there exists a predisposition to neuralgia, dyspepsia, chorea, sick-headache, functional paralysis, hysteria, hypochondriasis, insanity, or other of the many symptoms of disease of the central or peripheral nervous system.”

A fine organization. The fine organization is distinguished from the coarse by fine, soft hair, delicate skin, nicely chiselled features [bem-cinzelada ou esculpida – somos belos!], small bones, tapering extremities [membros pontiagudos, i.e., que se afunilam nas mãos e nos pés, na canela e no antebraço!], and frequently by a muscular system comparatively small and feeble. It is frequently associated with superior intellect, and with a strong and active emotional nature.” “It is the organization of the civilized, refined, and educated, rather than of the barbarous and low-born and untrained”

The nervous diathesis appears, within certain limits, to protect the system against attacks of fever and inflammation.” Isso explicaria porque só tive febre uma vez desde a idade adulta.

The tuberculous diathesis frequently accompanies a fine organization; but fine organizations only in a certain proportion of cases have a tuberculous diathesis. The nervous diathesis is frequently not only not susceptible to tuberculosis, but apparently much less so than the average, and sometimes, indeed, seems to be antagonistic to it, for there are many nervous patients in whom no amount of exposure or hardship or imprudence seems to be able to develop phthisis [tísica]” Devo acrescentar alguma imunidade ao câncer?

Among Americans of the higher orders, those who live in-doors, drinking is becoming a lost art; among these classes drinking customs are now historic, must be searched for, read or talked about, like extinct or dying-away species.” There is, perhaps, no single fact in sociology more instructive and far reaching than this, and this is but a fraction of the general and sweeping fact that the heightened sensitiveness of Americans forces them to abstain entirely, or to use in incredible and amusing moderation, not only the stronger alcoholic liquors, whether pure or impure, but also the milder wines, ales, and beers, and even tea and coffee.”

I replied that there were very few nervous patients who were not injured by it, and very few who would not find it out without the aid of any physician. Our fathers could smoke, our mothers could smoke, but their children must oft-times be cautious; and chewing is very rapidly going out of custom, and will soon, like snuff-taking, become a historic curiosity; while cigars give way to cigarettes. From the cradle to the grave the Chinese empire smokes, and when a sick man in China has grown so weak that he no longer asks for his pipe, they give up hope, and expect him to die. Savage tribes without number drink most of the time when not sleeping or fighting, and without suffering alcoholism, or without ever becoming inebriates [!]” But 50 years ago opium produced sleep; now the same dose keeps us awake, like coffee or tea—susceptibility to this drug has been revolutionized.” Thus the united forces of climate and civilization are pressing us back from one stimulant to another, until, like babes, we find no safe retreat save in chocolate and milk and water.”

Reprove an Angola negro for being drunk and he will reply, <My mother is dead,> as though that were excuse enough. Even as recently as the beginning of the present century, the custom of drinking at funerals yet survived with our fathers. At the present time both culture and conscience are opposed to such habits.”

It is through the alcohol, and not the adulterations, that excessive drinking injures.” This functional malady of the nervous system which we call inebriety, as distinguished from the vice or habit of drunkenness, may be said to have been born in America, has here developed sooner and far more rapidly than elsewhere, and here also has received earlier and more successful attention from men of science.” For those individuals who inherit a tendency to inebriety, the only safe course is absolute abstinence, especially in early life; and in certain cases treatment of the nervous system, on the exhaustion of which the inebriety depends.”

AQUILO QUE NENHUMA REVISTA DE NUTRIÇÃO DIRÁ: “we so often find not only epileptics, but neurasthenics and nervous persons with other symptoms, are free and sometimes excessive eaters. They say their food does not give them strength, and it does not, for the same reason that the acid poured into the impure fluid of the battery does not give us electric force. There are those who all their lives are habitually small eaters and yet are great workers, and there are those who, though all their lives great eaters, are never strong; their food is either not digested or thoroughly assimilated, and so a much smaller fraction than should be is converted into nerve-force.”

In all the great cities of the East, among the brain-working classes of our large cities everywhere, pork, in all its varieties and preparations, has taken a subordinate place among the meats upon our tables, for the reason that the stomach of the brain-worker cannot digest it.”

Four and 5 meals a day is, or has been, the English and, notably, the German custom. Foreigners have greatly surpassed us in the taking of solid as well as liquid food.”

The eyes also are good barometers of our nervous civilization. The increase of asthenopia and short-sightedness [miopia], and, in general, of the functional disorders of the eye, are demonstrated facts and are most instructive. The great skill and great number of our oculists are constant proof and suggestions of the nervousness of our age. The savage can usually see well; myopia is a measure of civilization.” “near-sightedness increases in schools” Macnamara declares that he took every opportunity of examining the eyes of Southall aborigines of Bengal, for the purpose of discovering whether near-sightedness and diseases of like character existed among them, and he asserts that he never saw a young Southall whose eyes were not perfect.”

at the age of 20, 26% of Americans are near-sighted. In Russia, 42%, and in Germany, 62%.” A nação mais intelectual do mundo.

American dentists are the best in the world, because American teeth are the worst in the world.”

Irregularities of teeth, like their decay, are the product primarily of civilization, secondarily of climate. These are rarely found among the Indians or the Chinese; and, according to Dr. Kingsley, are rare even in idiots”

It is probable that negroes are troubled earlier than Indians. The popular impression that negroes always have good teeth is erroneous—the contrast between the whiteness of the teeth and the blackness of the face tending not a little to flatter them.”

Coarse races and peoples, and coarse individuals can go with teeth badly broken down without being aware of it from any pain; whereas, in a finely organized constitution, the very slightest decay in the teeth excites pain which renders filling or extracting imperative. The coarse races and coarse individuals are less disturbed by the bites of mosquitoes, by the presence of flies or of dirt on the body, than those in whom the nervous diathesis prevails”

It is said, for example, of the negroes of the South, that they rarely if ever sneeze.”

Special explanations without number have been offered for this long-observed phenomenon—the early and rapid decay of American teeth—such as the use of sweets, the use of acids, neglect of cleanliness, and the use of food that requires little mastication. But they who urge these special facts to account for the decay of teeth of our civilization would, by proper inquiry, learn that the savages and negroes, and semi-barbarians everywhere, in many cases use sweets far more than we, and never clean their mouths, and never suffer, except in old age.”

the only races that have poor teeth are those who clean them.” Quando o remédio vem mais tarde que a doença.

Among savages in all parts of the earth baldness is unusual, except in extreme age, and gray hairs come much later than with us. So common is baldness in our large cities that what was once a deformity and exception is now almost the rule, and an element of beauty.”

Increased sensitiveness to both heat and cold is a noteworthy sign of nervousness.”

Cold bathing is not borne as well as formerly.” “Water treatment is as good for some forms of nervous disease as it ever was; but it must be adapted to the constitution of the patient, and adapted also to the peculiar needs of each case.”

The disease, state, or condition to which the term neurasthenia is applied is subdivisible, just as insanity is subdivided into general paresis or general paralysis of the insane, epileptic insanity, hysterical, climatic, and puerperal insanity; just as the disease or condition that we call trance is subdivided into clinical varieties, such as intellectual trance, induced trance, cataleptic trance, somnambulistic trance, emotional trance, ecstatic trance, etc.

That diabetes is largely if not mainly a nervous disease is becoming more and more the conviction of all medical thinkers, and that, like Bright’s disease, it has increased of late, can be proved by statistics that in this respect are in harmony with observation.”

A ERA DA RINITE E DAS ALERGIAS: “A single branch of our neurological tree, hay-fever, has in it the material for years of study; he who understands that, understands the whole problem. In the history of nervous disease I know not where to look for anything as extraordinary or instructive as the rise and growth of hay-fever in the USA.”

Catarrh of the nose and nasal pharyngeal states — so-called nasal and pharyngeal catarrh — is not a nervous disease, in the strict sense of the term, but there is often a nervous element in it; and in the marked and obstinate forms it is, like decay and irregularities of the teeth, one of the signs or one of the nerve-symptoms of impairment of nutrition and decrease of vital force which make us unable to resist change of climate and extremes of temperature.”

The phenomenal beauty of the American girl of the highest type, is a subject of the greatest interest both to the psychologist and the sociologist, since it has no precedent, in recorded history, at least; and it is very instructive in its relation to the character and the diseases of America.”

The same climatic peculiarities that make us nervous also make us handsome”

In no other country are the daughters pushed forward so rapidly, so early sent to school, so quickly admitted into society; the yoke of social observance (if it may be called such), must be borne by them much sooner than by their transatlantic sisters — long before marriage they have had much experience in conversation and in entertainment, and have served as queens in social life, and assumed many of the responsibilities and activities connected therewith. Their mental faculties in the middle range being thus drawn upon, constantly from childhood, they develop rapidly a cerebral activity both of an emotional and an intellectual nature, that speaks in the eyes and forms the countenance; thus, fineness of organization, the first element of beauty, is supplemented by expressiveness of features — which is its second element”

Handsome women are found here and there in Great Britain, and rarely in Germany; more frequently in France and in Austria, in Italy and Spain”

One cause, perhaps, of the almost universal homeliness of female faces among European works of art is the fact that the best of the masters never saw a handsome woman.” Esqueceu da relatividade histórica do tipo belo!

If Raphael had been wont to see everyday in Rome or Naples what he would now see everyday in New York, Baltimore, or Chicago, it would seem probable that, in his Sistine Madonna he would have preferred a face of, at least, moderate beauty, to the neurasthenic and anemic type that is there represented. [?]”

To the first and inevitable objection that will be made to all here said — namely, that beauty is a relative thing, the standard of which varies with age, race, and individual — the answer is found in the fact that the American type is today more adored in Europe than in America; that American girls are more in demand for foreign marriages than any other nationality; and that the professional beauties of London that stand highest are those who, in appearance and in character have come nearest the American type.” Isso se chama cultura hegemônica, e não um argumento de defesa – e um pouco de chauvinismo também…

The ruddiness or freshness, the health-suggesting and health-sustaining face of the English girl seem incomparable when partially veiled, or when a few rods away” HAHA. Uma obra não muito recomendável na parte estética… Beleza EXÓTICA!

The European woman steps with a firmer tread than the American, and with not so much lightness, pliancy, and grace. In a multitude, where both nations are represented, this difference is impressive.”

The grasp of the European woman is firmer and harder, as though on account of greater strength and firmness of muscle. In the touch of the hand of the American woman there is a nicety and tenderness that the English woman destroys by the force of the impact.”

3. CAUSES OF AMERICAN NERVOUSNESS

Punctuality is a greater thief of nervous force than is procrastination of time. We are under constant strain, mostly unconscious, often-times in sleeping as well as in waking hours, to get somewhere or do something at some definite moment.”

In Constantinople indolence is the ideal, as work is the ideal in London and New York”

There are those who prefer, or fancy they prefer, the sensations of movement and activity to the sensations of repose”

The telegraph is a cause of nervousness the potency of which is little understood. (…) prices fluctuated far less rapidly, and the fluctuations which now are transmitted instantaneously over the world were only known then by the slow communication of sailing vessels or steamships” “every cut in prices in wholesale lines in the smallest of any of the Western cities, becomes known in less than an hour all over the Union; thus competition is both diffused and intensified.”

Rhythmical, melodious, musical sounds are not only agreeable, but when not too long maintained are beneficial, and may be ranked among our therapeutical agencies.”

The experiments, inventions, and discoveries of Edison alone have made and are now making constant and exhausting draughts on the nervous forces of America and Europe, and have multiplied in very many ways, and made more complex and extensive, the tasks and agonies not only of practical men, but of professors and teachers and students everywhere” Um tanto utópico e nostálgico para um “médico pragmático”…

On the mercantile or practical side the promised discoveries and inventions of this one man have kept millions of capital and thousand of capitalists in suspense and distress on both sides of the sea.”

the commerce of the Greeks, of which classical histories talk so much, was more like play — like our summer yachting trips”

The gambler risks usually all that he has; while the stock buyer risks very much more than he has. The stock buyer usually has a certain commercial, social, and religious position, which is thrown into the risk, in all his ventures”

as the civilized man is constantly kept in check by the inhibitory power of the intellect, he appears to be far less emotional than the savage, who, as a rule, with some exceptions, acts out his feelings with comparatively little restraint.”

Love, even when gratified, is a costly emotion; when disappointed, as it is so often likely to be, it costs still more, drawing largely, in the growing years of both sexes, on the margin of nerve-force, and thus becomes the channel through which not a few are carried on to neurasthenia, hysteria, epilepsy, or insanity.”

A modern philosopher of the most liberal school states that he hates to hear one laugh aloud, regarding the habit, as he declares, a survival of barbarism.”

There are two institutions that are almost distinctively American — political elections and religious revivals”

My friend, presidents and politicians are chips and foam on the surface of the sea; they are not the sea; tossed up by the tide and left on the shore, but they are not the tide; fold your arms and go to bed, and most of the evils of this world will correct themselves, and, of those that remain, few will be modified by anything that you or I can do.”

The experiment attempted on this continent of making every man, every child, and every woman an expert in politics and theology is one of the costliest of experiments with living human beings, and has been drawing on our surplus energies with cruel extravagance for 100 years.” Agora, 250…

Protestantism, with the subdivision into sects which has sprung from it, is an element in the causation of the nervous diseases of our time. No Catholic country is very nervous, and partly for this—that in a Catholic nation the burden of religion is carried by the church.” Coitado do Brasil, trocando o certo pelo duvidoso assim…

The difference between Canadians and Americans is observed as soon as we cross the border, the Catholic church and a limited monarchy acting as antidotes to neurasthenia and allied affections. Protestant England has imitated Catholicism, in a measure, by concentrating the machinery of religion and taking away the burden from the people. It is stated —although it is supposed that this kind of statistics are unreliable— that in Italy insanity has been on the increase during these few years in which there has been civil and religious liberty in that country.”

The anxieties about the future, family, property, etc., are certainly so wearing on the negro, that some of them, without doubt, have expressed a wish to return to slavery.”

advances in science are not usually made by committees—indeed, are almost never made by them, least of all by government committees”

The people of this country have been pressed constantly with these 3 questions: How shall we keep from starving? Who is to be the next president? And where shall we go when we die? In a limited, narrow way, other nations have met these questions; at least two of them, that of starvation and that of the future life; but nowhere in ancient or modern civilization have these 3 questions been agitated so severely or brought up with such energy as here.”

Those who have acquired or have inherited wealth, are saved an important percentage of this forecasting and fore-worry”

The barbarian cares nothing for the great problems of life; seeks no solution — thinks of no solution of the mysteries of nature, and, after the manner of many reasoners in modern delusions, dismisses what he cannot at once comprehend as supernatural, and leaves it unsatisfactorily solved for himself, for others, and for all time”

Little account has been made of the fact that the old world is small geographically. The ancient Greeks knew only of Greece and the few outside barbarians who tried to destroy them. The discovery of America, like the invention of printing, prepared the way for modern nervousness; and, in connection with the telegraph, the railway, and the periodical press increased a hundred-fold the distresses of humanity.” The burning of Chicago—a city less than half a century old, on a continent whose existence was unknown a few centuries ago—becomes in a few hours the property of both hemispheres, and makes heavy drafts on the vitality not only of Boston and New York, but of London, Paris, and Vienna.”

Letter-writing is an index of nervousness; those nations who writes the most letters being the most nervous, and those who write scarcely at all, as the Turks and Russians, knowing nothing or but very little of it.”

The education of the Athenian boy consisted in play and games and songs, and repetitions of poems, and physical feats in the open air. His life was a long vacation, in which, as a rule, he rarely toiled as hard as the American lad in the intervals of his toil. (…) What they called work, gymnastics, competition games, and conversations on art and letters, is to us recreation.”

Up to a certain point work develops capacity for work; through endurance is evolved the power of greater endurance; force becomes the parent of force. But here, as in all animate nature, there are limitations of development which cannot be passed. The capacity of the nervous system for sustained work and worry has not increased in proportion to the demands for work and worry that are made upon it.”

GREEN COMMENT LAND: “Continuous and uniform cold as in Greenland, like continuous and uniform heat as on the Amazon, produces enervation and languor; but repeated alternations of the cold of Greenland and the heat of the Amazon produce energy, restlessness, and nervousness.”

The element of dryness of the air, peculiar of our climate as distinguished from that of Europe, both in Great Britain and on the Continent, is of the highest scientific and practical interest.” “On the nervous system this unusual dryness and thinness of the air have a many-sided influence; such as increase of headaches, neuralgias, and diminished capacity for sustaining cerebral toil.” The organs, pianos, and violins of America are superior to those made in Europe at the present time. This superiority is the result, not so much of greater skill, ingenuity, or experience, but—so far as I can learn, from conversing with experts in this line—from the greater dryness of the air, which causes the wood to season better than in the moist atmosphere of Europe.”

Moisture conducts electricity, and an atmosphere well charged with moisture, other conditions being the same, will tend to keep the electricity in a state of equilibrium, since it allows free and ready conduction at all times and in all directions.” In regions where the atmosphere is excessively dry, as in the Rocky Mountains, human beings—indeed all animals, become constantly acting lightning-rods, liable at any moment to be made a convenient pathway through which electricity going to or from the earth seeks an equilibrium.”

in the East our neuralgic and rheumatic patients, just before thunder-storms, are suddenly attacked by exquisite pains that at once disappear with the fair weather. There are those so sensitive that for 100 miles, and for a full day in advance, as Dr. Mitchell has shown, they can predict the approach of a storm.”

Dryness of the air, whether external or internal, likewise excites nervousness by heightening the rapidity of the processes of waste and repair in the organism, so that we live faster than in a moist atmosphere.”

one of the Manchester mill owners asserted that, during a season of dry weather, there was, in weaving alone, a loss of 5%, in quantity, and another loss of 5%, in quality; in spinning, also, an equal loss is claimed. To maintain moisture in mills, sundry devices have been tried, which have met, I believe, with partial success in practice.”

Even in our perfect Octobers, on days that are pictures of beauty and ideals of climate — just warm enough to be agreeable and stimulating enough not to be depressing, we yet remain in the house far more than Europeans are wont to do even in rainy or ugly seasons.” So what, Mr. Productive Media?

The English know nothing of summer, as we know of it — they have no days when it is dangerous, and scarcely any days when it is painful to walk or ride in the direct rays of the sun; and in winter, spring, and fall there are few hours when one cannot by proper clothing keep warm while moderately exercising.”

The Kuro Siwo stream of the Pacific, with its circuit of 18,000 miles, carries the warm water of the tropics towards the poles, and regulates in a manner the climate of Japan. Mr. Croll estimates that if the Gulf Stream were to stop, the annual temperature of London would fall 30 degrees [Farenheit], and England would become as cold as Nova Zembla. It is the influence of the Gulf Stream that causes London, that is 11° farther north than New York, to have an annual mean temperature but 2° lower.”

According to Miss Isabella Bird, who has recently published a work entitled Unbeaten Tracks in Japan, which is not only the very best work ever written on Japan, but one of the most remarkable works of travel ever written by man or woman, it seems that the Japanese suffer both from extremes of heat and cold, from deep snows and ice, and from the many weeks of sultriness such as oppress us in the US. The atmosphere of Japan is though far more moist than that of America, in that respect resembling some of the British Isles”

Our Meteorological Bureau has justified its existence and labors by demonstrating and popularizing the fact that our waves of extreme heat and of extreme cold and severe climatic perturbations of various kinds are born in or pass from the Pacific through these mountains and travel eastward, and hence their paths can be followed and their coming can be predicted with a measure of certainty.”

in the latter part of the winter and early spring—or what passes for spring, which is really a part of winter, and sometimes its worse part—there is more suffering from cold, more liability to disease, by taking cold, and more debility from long confinement in dry and overheated air than in early and mid-winter”

the strong races, like the Hebrews and Anglo-Saxons, succeed in nearly all climates, and are dominant wherever they go; but in unlimited or very extended time, race is a result of climate and environment.”

Savages may go to the most furious excesses without developing any nervous disease; they may gorge themselves, or they may go without eating for a week, they may rest in camp or they may go upon laborious campaigns, and yet never have nervous dyspepsia, sick-headache, hay-fever, or neuralgia.”

No people in the world are so careful of their diet, the quality and quantity of their food, and in regard to their habits of drinking, as the very class of Americans who suffer most from these neuroses.”

Alcohol only produces inebriety when it acts on a nervous system previously made sensitive. Alcoholism and inebriety are the products not of alcohol, but of alcohol plus a certain grade of nerve degeneration.”

But bad air, that is, air simply made impure by the presence of human beings, without any special contagion, seems powerless to produce disease of any kind, unless the system be prepared for it. Not only bad air, but bad air and filth combined, the Chinese of the lower orders endure both in this country and their own, and are not demonstrably harmed thereby (…) but impure air, plus a constitution drawn upon and weakened by civilization, is an exciting cause of nervous disease of immense force.”

The philosophy of the causation of American nervousness may be expressed in algebraic formula as follows: civilization in general + American civilization in particular (young and rapidly growing nation, with civil, religious, and social liberty) + exhausting climate (extremes of heat and cold, and dryness) + the nervous diathesis (itself a result of previously named factors) + overwork or overworry, or excessive indulgence of appetites or passions = an attack of neurasthenia or nervous exhaustion.”

Dr. Habsch, the chief oculist in Constantinople, says that the effect of tobacco upon the eyes is very problematical; that everybody smokes from morning to night, the men a great deal, the women a little less than the men, and the children smoke from the age of 7 and 8 years. He states that the number of cases of amaurosis [cegueira] is very limited. If expert oculists would examine the eyes of the Chinese, who smoke quite as much as the Turks, if not more, and smoke opium as well as tobacco, they would unquestionably confirm the conclusion of Dr. Habsch among the Turks. Dr. Habsch believes that in persons with a very delicate skin and conjunctiva [membrana mucosa que liga as pálpabras com o tecido ocular propriamente dito] among the Turks, smoking frequently causes chronic irritation, local congestion, profuse lachrymation, blepharitis ciliaris [inflamação dos cílios], and more or less intense redness of the eyelids. (cf. Dr. Webster on Amblyopia [Perda de visão] from the Use of Tobacco) [livro inexistente na web]”

The Hollanders, according to a most expert traveller, Edmondo De Amicis, are the greatest smokers of Europe; on entering a house, with the first greeting you are offered a cigar, and when you leave another is handed to you; many retire with a pipe in their mouth, re-light it if they awake during the night; they measure distances by smoke – to such a place by not so many miles but by so many pipes.” “Says one Hollander, smoke is our second breath; says another, the cigar is the 6th finger of the hand.”

Opium eating in China does not work in the way that the same habit does in the white races.” “when it is said of a Chinaman that he smokes opium, it is meant that he smokes to excess and has a morbid craving for it, just as with us the expression a man drinks means that he drinks too much”

It is clear that the habit of taking opium does not necessarily impair fertility, since large families are known among those who use opium, even to excess.”

Among my nervous patients I find very many who cannot digest vegetables, but must use them with much caution; but all China lives on vegetables, and indigestion is not a national disease. Many of the Chinese live in undrained grounds, in conditions favorable to ague and various fevers, but they do not suffer from these diseases, nor from diseases of the lungs and bronchial tubes, to the same extent as foreign residents there who do not use opium.”

I have been twice favored with the chance to study Africa in America. On the sea islands of the South, between Charleston and Savannah, there are thousands of negroes, once slaves, most of whom were born on those islands, who there will die, and who at no time have been brought into relation with our civilization, except so far as it is exhibited in a very few white inhabitants in the vicinity. Intellectually, they can be not very much in advance of their African ancestors; in looks and manners they remind me of the Zulus now exhibiting in America; for although since emancipation they have been taught by philanthropists, part of the time under governmental supervision, some of the elements of common school teaching, yet none of them have made, or are soon likely to make, any very important progress beyond those elements, and few, if any of them, even care to exercise the art of reading after it is taught them. Here, then, is a bit of barbarism at our door-steps; here, with our own eyes, and with the aid of those who live near them and employ them, I have sought for the facts of comparative neurology. There is almost no insanity among these negroes; there is no functional nervous disease or symptoms among them of any name or phase; to suggest spinal irritation, or hysteria of the physical form, or hay-fever, or nervous dyspepsia among these people is but to joke.” These primitive people can go, when required, for weeks and months sleeping but 1 or 2 hours out of the 24; they can labor for all day, or for 2 days, eating nothing or but little; hog and hominy and lish, all the year round, they can eat without getting dyspepsia; indulgence of passions several-fold greater, at least, than is the habit of the whites, either there or here, never injures them either permanently or temporarily; if you would find a virgin among them, it is said you must go to the cradle; alcohol, when they can get it, they drink with freedom, and become intoxicated like the whites, but rarely, indeed, manifest the symptoms of delirium-tremens, and never of chronic alcoholism”

These blacks cannot summon as much energy for a moment in an emergency as the whites, since they have less control over their energies, but in holding-on power, in sustained, continuous, unbroken muscular endurance, for hours and days, they surpass the whites.”

The West is where the East was a quarter of a century ago—passing more rapidly, as it would appear, through the same successive stages of development.”

4. LONGEVITY OF BRAIN-WORKERS AND THE RELATION OF AGE TO WORK

Without civilization there can be no nervousness; there is no race, no climate, no environment that can make nervousness and nervous disease possible and common save when reenforced by brain-work and worry and in-door life. This is the dark and, so far as it goes, truthful side of our theme; the brighter side is to be drawn in the present chapter.

Thomas Hughes, in his Life of Alfred the Great, makes a statement that <the world’s hardest workers and noblest benefactors have rarely been long-lived>. That any intelligent writer of the present day should make a statement so untrue shows how hard it is to destroy an old superstition.

The remark is based on the belief which has been held for centuries that the mind can be used only at the injurious expense of the body. This belief has been something more than a mere popular prejudice; it has been a professional dogma, and has inspired nearly all the writers on hygiene since medicine has been a science; and intellectual and promising youth have thereby been dissuaded from entering brain-working professions; and thus, much of the choicest genius has been lost to civilization; students in college have abandoned plans of life to which their tastes inclined, and gone to the farm or workshop; authors, scientists, and investigators in the several professions have thrown away the accumulated experience of the better half of life, and retired to pursuits as uncongenial as they were profitless. The delusion has, therefore, in 2 ways, wrought evil, specifically by depriving the world of the services of some of its best endowed natures, and generally by fostering a habit of accepting statement for demonstration.

Between 1864 and 1866 I obtained statistics on the general subject of the relation of occupation to health and longevity that convinced me of the error of the accepted teachings in regard to the effect of mental labor.”

The views I then advocated, and which I enforced by statistical evidence were:

1st. That the brain-working classes—clergymen, lawyers, physicians, merchants, scientists, and men of letters, lived much longer than the muscle-working classes.

2nd. That those who followed occupations that called both muscle and brain into exercise, were longer-lived than those who lived in occupations that were purely manual.

3rd. That the greatest and hardest brain-workers of history have lived longer on the average than brain-workers of ordinary ability and industry.

4th. That clergymen were longer-lived than any other great class of brain-workers. [QUE PRAGA!]

5th. That longevity increased very greatly with the advance of civilization; and that this increase was too marked to be explained merely by improved sanitary knowledge.

6th. That although nervous diseases increased with the increase of culture, and although the unequal and excessive excitements and anxieties attendant on mental occupations of a high civilization were so far both prejudicial to health and longevity, yet these incidental evils were more than counter-balanced by the fact that fatal inflammatory diseases have diminished in frequency and violence in proportion as nervous diseases have increased; an also that brain-work is, per se, healthful and conducive to longevity.”

the greater majority of those who die in any one of the three great professions — law, theology, and medicine — have, all their lives, from 21 upwards, followed that profession in which they died.”

I have ascertained the longevity of 500 of the greatest men in history. The list I prepared includes a large proportion of the most eminent names in all the departments of thought and activity. (…) the average age of those I have mentioned, I found to be 64.2. (…) the greatest men of the world have lived longer on the average than men of ordinary ability in the different occupations by 14 years” The value of this comparison is enforced by the consideration that longevity has increased with the progress of civilization, while the list I prepared represents every age of recorded history.” “I am sure that any chronology comprising from 100 to 500 of the most eminent personages in history, at any cycle, will furnish an average longevity of from 64 to 70 years. Madden, in his very interesting work The Infirmities of Genius, gives a list of 240 illustrious names, with their ages at death.”

IV comparative longevity of brain-workers

The full explanation of the superior longevity of the brain-working classes would require a treatise on the science of sociology, and particularly of the relation of civilization to health. The leading factors, accounting for the long life of those who live by brain-labor, are:

(…)

In the successful brain-worker worry is transferred into work; in the muscle-worker work too often degrades into worry.” “To the happy brain-worker life is a long vacation; while the muscle-worker often finds no joy in his daily toil, and very little in the intervals.”

Longevity is the daughter of comfort. Of the many elements that make up happiness, mental organization, physical health, fancy, friends, and money—the last is, for the average man, greater than any other, except the first.”

for a large number, sleep is a luxury of which they never have sufficient for real recuperation”

The nervous temperament, which usually predominates in brain-workers, is antagonistic to fatal, acute, inflammatory disease, and favorable to long life.”

Nervous people, if not too feeble, may die everyday. They do not die; they talk of death, and each day expect it, and yet they live. Many of the most annoying nervous diseases, especially of the functional, and some even of the structural varieties, do not rapidly destroy life, and are, indeed, consistent with great longevity.”

the nervous man can expose himself to malaria, to cold and dampness, with less danger of disease, and with less danger of death if he should contract disease, than his tough and hardy brother.”

In the conflict with fevers and inflammations, strength is often weakness, and weakness becomes strength—we are saved through debility.”

Still further, my studies have shown that, of distinctively nervous diseases, those which have the worst pathology and are the most hopeless, such as locomotor ataxia, progressive muscular atrophy, apoplexy with hemiplegia, and so on, are more common and more severe, and more fatal among the comparatively vigorous and strong, than among the most delicate and finely organized. Cancer, even, goes hardest with the hardy, and is most relievable in the nervous.”

Women, with all their nervousness—and in civilized lands, women are more nervous, immeasurably, than men, and suffer more from general and special nervous diseases—yet live quite as long as men, if not somewhat longer; their greater nervousness and far greater liability to functional diseases of the nervous system being compensated for by their smaller liability to certain acute and inflammatory disorders, and various organic nervous diseases, likewise, such as the general paralysis of insanity.”

Brain-workers can adapt their labor to their moods and hours and periods of greatest capacity for labor better than muscle-workers. In nearly all intellectual employments there is large liberty; literary and professional men especially, are so far masters of their time that they can select the hours and days for their most exacting and important work; and when from any cause indisposed to hard thinking, can rest and recreate, or limit themselves to mechanical details.”

Forced labor, against the grain of one’s nature, is always as expensive as it is unsatisfactory”

Even coarser natures have their moods, and the choicest spirits are governed by them; and they who worship their moods do most wisely; and those who are able to do so are the fortunate ones of the earth.”

Again, brain-workers do their best work between the ages of 25-45; before that period they are preparing to work; after that period, work, however extensive it may be, becomes largely accumulation and routine.” “It is as hard to lay a stone wall after one has been laying it 50 years as during the first year. The range of muscular growth and development is narrow, compared with the range of mental growth; the day-laborer soon reaches the maximum of his strength. The literary or scientific worker goes on from strength to strength, until what at 25 was impossible, and at 30 difficult, at 35 becomes easy, and at 40 a past-time.”

The number of illustrious names of history is by no means so great as is currently believed; for, as the visible stars of the firmament, which at a glance appear infinite in number, on careful estimate are reduced to a few thousands, so the galaxy of genius, which appears interminable on a comprehensive estimate, presents but few lights of immortal fame. Mr. Galton, in his Hereditary Genius, states that there have not been more than 400 great men in history.”

obscurity is no sure evidence of demerit, but only a probability of such”

Only in rare instances is special or general talent so allied with influence, or favor, or fortune, or energy that commands circumstances, that it can develop its full functions; <things are in the saddle and ride mankind>, environment commands the environed.”

The stars we see in the sky are but mites compared with the infinite orbs that shall never be seen; but no star is a delusion—each one means a world, the light of which very well corresponds to its size and distance from the earth and sun.” “Routine and imitation work can no more confer the fame that comes from work that is original and creative than the moon can take the place of the sun.”

It is this confounding of force with the results of force, of fame with the work by which fame is attained that causes philosophers to dispute, deny, or doubt, or to puzzle over the law of the relation of age to work, as here announced.

When the lightning flashes along the sky, we expect a discharge will soon follow, since light travels faster than sound; so some kinds of fame are more rapidly diffused than others, and are more nearly contemporaneous with their origin; but as a law, there is an interval — varying from years to hundreds of years — between the doing of any original work and the appreciation of that work by any considerable number of mankind that we call fame.

The great men that we know are old men; but they did the work that has made them great when they were young; in loneliness, in poverty, often, as well as under discouragement, and in neglected or despised youth has been achieved all that has advanced, all that is likely to advance mankind.”

In the man of genius, the idea starts where, in the man of routine, it leaves off.”

Original work—that done by geniuses who have thereby attained immortal fame, is the only kind of work that can be used as the measure of cerebral force in all our search for this law of the relation of work to the time of life at which work is done for the two-fold reason—first, that it is the highest and best measure of cerebral force; and, secondly, because it is the only kind of work that gives earthly immortality.”

Men do not long remember, nor do they earnestly reverence those who have done only what everybody can do. We never look up, unless the object at which we look is higher than ourselves; the forces that control the rise and fall of reputation are as inevitable and as remorseless as heat, light, and gravity; if a great man looms up from afar, it is because he is taller than the average man; else, he would pass below the horizon as we receded from him; factitious fame is as impossible as factitious heat, light, or gravity; if there be force, there must have been, somewhere, and at some time, a source whence that force was evolved.”

the strength of a man is his strength at his strongest point—what he can do in any one direction, at his very best. However weak and even puerile, immature, and non-expert one may be in all other directions except one, be gains an immortality of fame if, in that one direction he develops a phenomenal power; weaknesses and wickednesses, serious immoralities and waywardnesses are soon forgotten by the world, which is, indeed, blinded to all these defects in the face of the strong illumination of genius. Judged by their defects, the non-expert side of their character, moral or intellectual, men like Burns,¹ Shakespeare, Socrates, Cicero, Caesar, Napoleon, Beethoven, Mozart, Byron, Dickens, etc., are but as babes or lunatics, and far, very far below the standard of their fellows.”

¹ Poeta escocês, 1759-96.

SOBRE A PRECOCIDADE E “GASTO DA ENERGIA MENTAL”: “Men to whom these truths are repelling put their eyes on those in high positions and in the decline of life, like Disraeli or Gladstone, forgetting that we have no proof that either of these men have ever originated a new thought during the past 25 years, and that in all their contributions to letters during that time there is nothing to survive, or worthy to survive, their authors.

They point to Darwin, the occupation of whose old age has been to gather into form the thoughts and labors of his manhood and youth, and whose only immortal book was the product of his silver and golden decade.”

IV the relation of age to original work

The lives of some great men are not sufficiently defined to differentiate the period, much less the decade or the year of their greatest productive force. Such lives are either rejected, or only the time of death and the time of first becoming famous are noted; very many authors have never told the world when they thought-out or even wrote their masterpieces, and the season of publication is the only date that we can employ. These classes of facts, it will be seen, tell in favor of old rather than of young men, and will make the year of maximum production later rather than earlier, and cannot, therefore, be objected to by those who may doubt my conclusions.”

For those who have died young, and have worked in original lines up to the year of their death, the date of death has sometimes been regarded as sufficient. Great difficulty has been found in proving the dates of the labors of the great names of antiquity, and, therefore, many of them are necessarily excluded from consideration, but in an extended comparison between ancient and modern brain-workers, so far as history makes possible, there was but little or no difference.”

This second or supplementary list was analyzed in the same way as the primary list, and it was found that the law was true of these, as of those of greater distinction. The conclusion is just, scientific, and inevitable, that if we should go down through all the grades of cerebral force, we should find this law prevailing among medium and inferior natures, that the obscure, the dull, and the unaspiring accomplished the little they did in the direction of relatively original work in the brazen and golden decades.” Tenho 8 anos pela frente.

These researches were originally made as far back as 1870, and were first made public in lectures delivered by me before the Long Island Historical Society. The titles of the lectures were, Young Men in History, and the Decline of Moral Principle in Old Age.”

Finally, it should be remarked that the list has been prepared with absolute impartiality, and no name and no date has been included or omitted to prove any theory. The men who have done original or important work in advanced age, such as Dryden,¹ Radetzky,² Moltke,³ Thiers,4 De Foe,5 have all been noted, and are embraced in the average.”

¹ Poeta inglês, 1631-1700.

² Marechal, militar estrategista alemão que combateu inclusive Napoleão, vivendo ativo até uma idade avançada (1766-1858).

³ Provavelmente o Conde Adam Moltke (1710-1792), diplomata dinamarquês. Seu filho foi primeiro-ministro.

4 Marie Adolph –, político e escritor francês, 1797-1877, foi presidente eleito na França após a queda dos Bourbon.

5 Daniel Defoe viveu 71 anos e também foi ensaísta e publicou obras de não-ficção, além de seu maior sucesso.

The golden decade alone represents nearly 1/3 of the original work of the world. (…) The year of maximum productiveness is 39.”

All the athletes with whom I have conversed on this subject, the guides and lumbermen in the woods — those who have always lived solely by muscle — agree substantially to this: that their staying power is better between the ages of 35 and 45, than either before or after. To get the best soldiers, we must rob neither the cradle nor the grave; but select from those decades when the best brain-work of the world is done.”

Original work requires enthusiasm; routine work, experience.” “Unconsciously the people recognize this distinction between the work that demands enthusiasm and that which demands experience, for they prefer old doctors and lawyers, while in the clerical profession, where success depends on the ability to constantly originate and express thought, young men are the more popular, and old men, even of great ability, passed by. In the editorial profession original work is demanded, and most of the editorials of our daily press are written by young men. In the life of every old man there comes a point, sooner or later, when experience ceases to have any educating power; and when, in the language of Wall St., he becomes a bear; in the language of politics, a Bourbon.”

some of the greatest poets, painters, and sculptors, such as Dryden, Richardson, Cowper, Young, De Foe, Titian, Christopher Wren, and Michael Angelo, have done a part of their very best work in advanced life. The imagery both of Bacon and of Burke seemed to increase in richness as they grew older.

In the realm of reason, philosophic thought, invention and discovery, the exceptions are very rare. Nearly all the great systems of theology, metaphysics, and philosophy are the result of work done between 20 and 50.”

Michael Angelo and Sir Christopher Wren could wait for a quarter or even half a century before expressing their thoughts in St. Peter’s or St. Paul’s; but the time of the conception of those thoughts — long delayed in their artistic expression — was the time when their cerebral force touched its highest mark.

In the old age of literary artists, as Carlyle, Dickens, George Elliot, or Tennyson, the form may be most excellent; but from the purely scientific side the work though it may be good, is old; a repetition often-times, in a new form, of what they have said many times before.”

The philosophy of Bacon can never be written but once; to re-write it, to present it a 2nd time, in a different dress, would indicate weakness, would seem almost grotesque; but to statuary and painting we return again and again; we allow the artist to re-portray his thought, no matter how many times; we visit in succession a hundred cathedrals, all very much alike; and a delicious melody grows more pleasing with repetition; whence it is that in poetry — the queen of the arts — old age has wrought little, or not at all, since the essence of poetry is creative thought, and old age is unable to think; whence, also, in acting — the oldest of all the arts, the servant of all — the best experts are often at their best, or not far below their best, save for the acquisition of new characters, in the iron and wooden decades.”

Similarly with the art of writing—the style, the dress, the use of words, the art of expressing thoughts, and not of thinking. Men who have done their best thinking before 40 have done their best writing after that period.” it is thought, and not the language of thought, that best tests the creative faculties.”

The conversation of old men of ability, before they have passed into the stage of imbecility, is usually richer and more instructive than the conversation of the young; for in conversation we simply distribute the treasures of memory, as a store hoarded during long years of thought and experience. He who thinks as he converses is a poor companion, as he who must earn his money before he spends any is a poor man. When an aged millionnaire makes a liberal donation it costs him nothing; he but gives out of abundance that has resulted by natural accumulation from the labors of his youth and middle life.”

An amount of work not inconsiderable is done before 25 and a vast amount is done after 40; but at neither period is it usually of the original or creative sort that best measures the mental forces.” “In early youth we follow others; in old age we follow ourselves.”

The same law applies to animals. Horses live to be about 25, and are at their best from 8 to 14” “Dogs live 9 or 10 years, and are fittest for the hunt between 2 and 6.”

Children born of parents one or both of whom are between 25 and 40, are, on the average, stronger and smarter than those born of parents one or both of whom are very much younger or older than this.” “we are most productive when we are most reproductive [18-26??].”

In an interesting paper entitled When Women Grow Old, Mrs. Blake has brought facts to show that the fascinating power of the sex is often-times retained much longer than is generally assumed.

She tells us of Aspasia, who, between the ages of 30 and 50 was the strongest intellectual force in Athens; of Cleopatra, whose golden decade for power and beauty was between 30 and 40; of Livia, who was not far from 30 when she gained the heart of Octavius; of Anne of Austria, who at 38 was thought to be the most beautiful queen in Europe; of Catherine II of Russia, who, even at the silver decade was both beautiful and imposing; of Mademoiselle Mars, the actress, whose beauty increased with years, and culminated between 30 and 45; of Madame Recamier, who, between 25 and 40, and even later, was the reigning beauty in Europe; of Ninon de I’Enclos, whose own son — brought up without knowledge of his parentage — fell passionately in love with her when she was at the age of 37, and who even on her 60th birthday received an adorer young enough to be her grandson.

The voice of our great prima donnas is at its very best between 27 and 35; but still some retains, in a degree, its strength and sweetness even in the silver decade. The voice is an index of the body in all its functions, but the decay of other functions is not so readily noted.”

As a lad of 16, Lord Bacon began to think independently on great matters; at 44, published his great work on The Advancement of Learning; at 36, published 12 of his Essays; and at 60 collected the thoughts of his life in his Organum. His old age was devoted to scientific investigation.

At the age of 29, Descartes began to map out his system of philosophy, and at 41 began its publication, and at 54 he died.

Schelling, as a boy, studied philosophy, and at 24 was a brilliant and independent lecturer, and at 27 had published many important works; at 28 was professor of philosophy and arts, and wrote his best works before 50.

Dryden, one of the exceptions to the average, did his best work when comparatively old; his Absalom was written at 50, and his Alexander’s Feast when he was nearly 70.

Dean Swift wrote his Tale of a Tub at 35, and his Gulliver’s Travels at 59.”

Charles Dickens wrote Pickwick at 25, Oliver Twist and Nicholas Nickleby before 27, Christmas Chimes at 31, David Copperfield at 38, and Dombey and Son at 35. Thus we see that nearly all his greatest works were written before he was 40; and it is amazing how little all the writings of the last 20 years of his life took hold of the popular heart, in comparison with Pickwick and David Copperfield, and how little effect the most enormous advertising and the cumulative power of a great reputation really have to give a permanent popularity to writings that do not deserve it. If Dickens had died at 40 his claim to immortality would have been as great as now, and the world of letters would have been little, if any, the loser. The excessive methodical activity of his mature and advanced life could turn off works with fair rapidity; but all his vast experience and all his earnest striving failed utterly to reach the standard of his reckless boyhood. His later works were more perfect, perhaps, judged by some canons, but the genius of Pickwick was not in them.”

Edison with his 300 patents, is not the only young inventor. All inventors are young. Colt was a boy of 21 when he invented the famous weapon that bears his name; and Goodyear began his experiments in rubber while a young man of 24, and made his first success at 38, and at 43 had brought his discovery to approximate perfection.”

The name of Bichat is one of the greatest in science, and he died at 32.”

Handel at 19 was director of the opera at Hamburg; at 20 composed his first opera; at 35 was appointed manager of the Royal Theatre at London; at 25 composed Messiah and Jephtha, and in old age and blindness his intellect was clear and his power of performance remarkable.”

Luther early displayed eloquence, and at 20 began to study Aristotle;¹ at 29 was doctor of divinity, and when he would refuse it, it was said to him that <he must suffer himself to be dignified, for that God intended to bring about great things in the church by his name>; at 34 he opposed the Indulgencies, and set up his 95 propositions; at 37 he publicly burned the Pope’s bull; at 47 he had completed his great task.”

¹ Realmente é impossível derivar prazer de ler Aristóteles antes dessa idade, senão uma ainda mais avançada!

Von Moltke between 65 and 70 directed the operation of the great war of Prussia against Austria and France. But that war was but a conclusion and consummation of military study and organization that had been going on for a quarter of a century.”

Jenner at 21 began his investigation into the difference between cow-pox and small-pox. His attention was called to the subject by the remark of a country girl, who said in his hearing that she could not have the small-pox, because she had had the cow-pox.” Varíola e varíola bovina. Bom… realmente existem ovos de Colombo!

old men, like nations, can show their treasures of art long after they have begun to die; this, indeed, is one of the sweetest and most refreshing compensations for age”

A contemporary deader in science (Huxley) has asserted that it would be well if all men of science could be strangled at the age of 60, since after that age their disposition — with possible exceptions here and there — is to become reactionary and obstructionists”

Se um homem não é belo aos 20, forte aos 30, experiente aos 40 e rico aos 50, ele jamais será belo, forte, experiente ou rico neste mundo.” Lutero

Só começamos a contar nossos anos quando já não há nada mais a ser contado” Emerson

Procrastinamos nossos trabalhos literários até termos experiência e habilidade o bastante, até um dia descobrirmos que nosso talento literário era uma efervescência juvenil que finalmente perdemos.” E.

Quem em nada tem razão aos 30, nunca terá.”

Revoluções não são feitas por homens de óculos, assim como sussurros contendo verdades novas nunca são ouvidos por quem já entrou na idade da surdez” Oliver Holmes

Como pode ser que “o povo da minha rua” seja, para tantos indivíduos, a gente mais burra de toda a Terra? E, pior ainda, que todos que o dizem pareçam estar com a razão?!

Dizem que os jovens são os únicos que não escutam a voz da razão na discussão sobre a verdadeira idade da razão ser a juventude, e não a velhice. Ou eles estão errados ou eles estão errados.

It is not in ambitious human nature to be content with what we have been enabled to achieve up to the age of 40. (…) Happiness may augment with years, because of better external conditions; and yet the highest happiness is obtained through work itself more than through the reward of work”

a wise man declared that he would like to be forever 35, and another, on being asked his age, replied that it was of little account provided that it was anywhere between 25 and 40.”

$$$: “Capacity for original work age does not have, but in compensation it has almost everything else. The querulousness of age, the irritability, the avarice are the resultants partly of habit and partly of organic and functional changes in the brain. Increasing avarice is at once the tragedy and the comedy of age; as we near the end of our voyage we become more chary of our provisions, as though the ocean and not the harbor were before us.” “our intellectual ruin very often dates from the hour when we begin to save money.” A do meu pai começou quando criança.

PORQUE SIM, PORQUE EU MANDEI – POR QUE VOCÊ É ASSIM? NÃO RESPEITA SEU PAI, NÃO? POR QUE NÃO FAZ UM DOUTORADO? POR QUE NÃO COMPRA UM CARRO? “Moral courage is rare in old age; sensitiveness to criticism and fear of opposition take the place, in the iron and wooden decades, of delight in criticism and love of opposition of the brazen and golden decades” Nostalgic UnB times…

fame like wealth makes us cautious, conservative, cowardly, since it implies the possibility of loss.”

when the intellect declines the man is obliged to be virtuous. Physical health is also needed for indulgence in many of the vices”

The decline of the moral faculties in old age may be illustrated by studying the lives of the following historic characters: Demosthenes, Cicero, Sylla, Charles V, Louis XIV, Frederic of Prussia, Napoleon (prematurely old), Voltaire, Jeffries, Dr. Johnson, Cromwell, Burke, Sheridan, Pope, Newton, Ruskin, Carlyle, Dean Swift, Chateaubriand, Rousseau, Milton, Bacon, Earl Pussell, Marlborough and Daniel Webster. In some of these cases the decline was purely physiological, in others pathological; in the majority it was a combination of both.

Very few decline in all the moral faculties. One becomes peevish, another avaricious, another misanthropic, another mean and tyrannical, another exacting and ugly, another sensual, another cold and cruelly conservative, another excessively vain and ambitious, others simply lose their moral enthusiasm and their capacity for resisting disappointment and temptation.”

There are men who in extreme age preserve their teeth sound, their hair unchanged, their complexion fresh, their appetite sharp and digestion strong and sure, and their repose sweet and refreshing, and who can walk and work to a degree that makes their children and grandchildren feel very humble; but these observed exceptions in no way invalidate the general law, which no one will dispute, that the physical powers reach their maximum between 20 and 40, and that the average man at 70 is less muscular and less capable of endurance than the average man at 40.”

For age hath opportunity no less

Than youth itself, though in another dress;

And as the evening twilight fades away,

The sky is filled with stars invisible by day.”

Longfellow

To age is granted in increasing richness the treasures of memory and the delights of recognition which most usually come from those who, at the time of the deeds whose value they recognize, were infants or unborn; only those who bury their contemporaries, can obtain, during their own lifetime, the supremacy of fame.”

POR QUE CRIANÇAS PRODÍGIO SÃO A MAIOR FALSIFICAÇÃO POSSÍVEL: “Mrs. Carlyle, when congratulated on the honors given to her husband on the delivery of his Edinburgh address, replied with a certain disdain, as though he should have been honored before; but only by a reversal of the laws of the evolution of fame shall the manifestation of genius and the recognition of genius be simultaneous.”

The high praise of contemporaries is almost insulting, since it implies that he whom they honor is but little better than themselves. Permanent fame, even in this rapid age [!!], is a plant of slow growth—first the blade; then, after a time, the ear; then, after many, many years, the full corn in the ear”

MEU COPYDESK E EU DE 2015 PARA CÁ SENTIMO-NOS ASSIM: “while the higher power of creating is disappearing, the lower, but for many the more needful, and with contemporaries more quickly appreciated, power of imitation, repetition, and routine, is increasing; we can work without working, and enjoy without striving”

O TRABALHO MATA AOS POUCOS: “An investigation made more recently by a Berlin physician into the facts and data relating to human longevity shows the average age of clergymen to be 65; of merchants, 63; clerks and farmers, 61; military men, 59; lawyers, 58; artists, 57; and medical men, 56 [!]. Statistics are given showing that medical men in England stand high in the scale of longevity. Thus, the united ages of 28 physicians who died there last year, amount to 2,354 years, giving an average of more the 84 years to each [!]. The youngest of the number was 80; the oldest, 93; 2 others were 92 and 89, respectively; 3 were 87, and 4 were 86 each; and there were also more than 50 who averaged from 74 to 75 years.”

That precocity predicts short life, and is therefore a symptom greatly to be feared by parents, has, I believe, never been questioned. (…) plants that are soon to bloom are soon to fade”

APOSTO MINHA VIDA QUE MORREREI ANTES DE A.: “It is probable that, of two individuals with precisely similar organizations and under similar circumstances, the one that develops earlier will be the first to die.”

MINHA ‘GENÉTICA’ NÃO AJUDA: “millionnaires in intellect as well as in money, who can afford to expend enormous means without becoming impoverished.”

Investigating the records of the past two centuries, Winterburn finds 213 recorded cases of acknowledged musical prodigies. None of them died before their 15th year, some attained the age of 103 — and the average duration of life was 58 — showing that, with all their abnormal precocity, they exceed the ordinary longevity by about 6%.”

an almost irresistible impulse to the art in which they are destined to excel manifests itself in future virtuosi— in poets, painters, etc., from their earliest youth.” Wieland

Uma idéia de filme bem ruim: O ESCRITOR NOVATO DE 40 ANOS!

A infância revela o homem, como a manhã revela o dia.” Milton

Madden – Infirmities of Genius (downloads)

MEMENTO À “PROFESSORA SORRISO”: “The stupidity attributed to men of genius may be really the stupidity of their parents, guardians, and biographers.”

Music and drawing appeal to the senses, attract attention, and are therefore appreciated, or at least observed by the most stupid parents, and noted even in the most superficial biographies. Philosophic and scientific thought, on the contrary, does not at once, perhaps may never, reveal itself to the senses—it is locked up in the cerebral cells; in the brain of that dull, pale youth, who is kicked for his stupidity and laughed at for his absent-mindedness, grand thoughts may be silently growing”

Newton, according to his own account, was very inattentive to his studies and low in his class, but a great adept at kite-flying, with paper lanterns attached to them, to terrify the country people, of a dark night, with the appearance of comets; and when sent to market with the produce of his mother’s farm, was apt to neglect his business, and to ruminate at an inn, over the laws of Kepler.”

This belief is strengthened by the consideration that many, perhaps the majority, of the greatest thinkers of the world seemed dull, inane, and stupid to their neighbors, not only in childhood but through their whole lives.”

It is probable, however, that nearly all cases of apparent stupidity in young geniuses are to be explained by the want of circumstances favorable to the display of their peculiar powers, or to a lack of appreciation or discernment on the part of their friends.”

As compared with the world, the most liberal curriculum is narrow; to one avenue of distinction that college opens, the world opens ten.”

GREAT precocity, like GREAT genius, is rare.”

O GÊNIO & O GENIOSO: “There is in some children a petty and morbid smartness that is sometimes mistaken for precocity, but which in truth does not deserve that distinction.”

A DOENÇA DE STEWIE: “Petty smartness is often-times a morbid symptom; it comes from a diseased brain, or from a brain in which a grave predisposition to disease exists; such children may die young, whether they do or do not early exhibit unusual quickness.”

A AMEBA SUPREMACISTA: “M.D. Delaunay has addressed to the Societé de Biologie a communication in which he takes the ground that precocity indicates biological inferiority. To prove this he states that the lower species develop more rapidly than those of a higher order; man is the slowest of all in developing and reaching maturity, and the lower orders are more precocious than the higher. As proof of this he speaks of the children of the Esquimaux, negroes, Cochin Chinese, Japanese, Arabs, etc. (…) He also states that women are more precocious than men”

THE RECURRING THEME: “The highest genius, as here and elsewhere seen, never repeats itself; very great men never have very great children; and in biological analysis, geniuses who are very precocious may be looked upon as the last of their race or of their branch—from them degeneracy is developed; and this precocity, despite their genius, may be regarded as the forerunner of that degeneracy.”

Leibniz, at 12 understood Latin authors well, and wrote a remarkable production; Gassendi, <the little doctor>, preached at 4; and at 10 wrote an important discourse; Goethe, before 10, wrote in several languages; Meyerbeer, at 5, played remarkably well on the piano; Niebuhr, at 7, was a prodigy, and at 12 had mastered 18 languages [QUÊ?!]; Michael Angelo at 19 had attained a very high reputation; at 20 Calvin was a fully-fledged reformer, and at 24 published great works on theology that have changed the destiny of the world; Jonathan Edwards, at 10, wrote a paper refuting the materiality of the soul, and at 12 was so amazingly precocious that it was predicted of him that he would become another Aristotle; at 20 Melanchthon was so learned that Erasmus exclaimed: <My God! What expectations does not Philip Melanchthon create!>.”

In order that a great man shall appear, a double line of more or less vigorous fathers and mothers must fight through the battles for existence and come out triumphant. However feeble the genius may be, his parents or grandparents are usually strong; or if not especially strong, are long-lived. Great men may have nervous if not insane relatives; but the nervous temperament holds to life longer than any other temperament. (…) in him, indeed, the branch of the race to which he belongs may reach its consummation, but the stock out of which he is evolved must be vigorous, and usually contains latent if not active genius.”

The cerebral and muscular forces are often correlated; the brain is a part of the body. This view, though hostile to the popular faith, is yet sound and supportable; a large and powerful brain in a small and feeble body is a monstrosity.”

a hundred great geniuses, chosen by chance, will be larger than a hundred dunces anywhere — will be broader, taller, and more weighty.”

In any band of workmen on a railway, you shall pick out the <boss> by his size alone: and be right 4 times out of 5.”

In certain of the arts extraordinary gifts may lift their possessor into fame with but little effort of his own, but the choicest seats in the temples of art are given only to those who have earned them by the excellence that comes from consecutive effort, which everywhere test the vital power of the man.”

One does not need to practice medicine long to learn that men die that might just as well live if they had resolved to live and that many who are invalids could become strong if they had the native or acquired will to vow that they would do so. Those who have no other quality favorable to life, whose bodily organs are nearly all diseased, to whom each day is a day of pain, who are beset by life-shortening influences, yet do live by the determination to live alone.”

the pluck of the Anglo-Saxon is shown as much on the sick-bed as in Wall Street or on the battlefield.” “When the negro feels the hand of disease pressing upon him, however gently, all his spirit leaves him.”

INNER VOW: “they live, for the same reason that they become famous; they obtain fame because they will not be obscure; they live because they will not die.”

it is the essence of genius to be automatic and spontaneous. Many a huckster or corner tradesman expends each day more force in work or fretting than a Stewart or a Vanderbilt.”

As small print most tires the eyes, so do little affairs the most disturb us” “the nearer our cares come to us the greater the friction; it is easier to govern an empire than to train a family.”

Great genius is usually industrious, for it is its nature to be active; but its movements are easy, frictionless, melodious. There are probably many school-boys who have exhausted themselves more over a prize composition than Shakespeare over Hamlet, or Milton over the noblest passages in Paradise Lost.”

So much has been said of the pernicious effects of mental labor, of the ill-health of brain-workers of all classes, and especially of clergymen, that very few were prepared to accept the statement that the clergy of this country and of England lived longer than any other class, except farmers; and very naturally a lurking fallacy was suspected. Other observers, who have since given special attention to the subject, have more than confirmed this conclusion, and have shown that clergymen are longer lived than farmers.” “A list of 10,000 is sufficient and more than sufficient for a generalization; for the second 5,000 did nothing more than confirm the result obtained by the first. It is fair and necessary to infer that if the list were extended to 10,000, 20,000, or even 100,000, the average would be found about the same.” “In their manifold duties their whole nature is exercised — not only brain and muscle in general, but all, or nearly all, the faculties of the brain — the religious, moral, and emotional nature, as well as the reason. Public speaking, when not carried to the extreme of exhaustion, is the best form of gymnastics that is known; it exercises every inch of a man, from the highest regions of the brain to the smallest muscle.” “The average income of the clergymen of the leading denominations of this country in active service as pastors of churches (including salary, house rent, wedding fees, donations, etc.), is between $800 and $1000, which is probably not very much smaller than the net income of all other professional classes. Furthermore, the income of clergymen in active service is collected and paid with greater certainty and regularity, and less labor of collection on their part, than the income of any other class except, perhaps, government officials; then, again, their earnings, whether small or great, come at once, as soon as they enter their profession, and is not, as with other callings, built up by slow growth.” “Merchants now make, always have made, and probably always will make, most of the money of the world; but business is attended with so much risk and uncertainty, and consequent anxiety, that merchants die sooner than clergymen, and several years sooner than physicians and lawyers.” “During the past 15 years, there has been a tendency, which is now rapidly increasing, for the best endowed and best cultured minds of our colleges to enter other professions, and the ministry has been losing, while medicine, business, and science have been gaining.”

There are those who come into life thus weighted down, not by disease, not by transmitted poison in the blood, but by the tendency to disease, by a sensitiveness to evil and enfeebling forces that seems to make almost every external influence a means of torture; as soon as they are born, debility puts its terrible bond upon them, and will not let them go, but plays the tyrant with them until they die. Such persons in infancy are often on the point of dying, though they may not die; in childhood numberless physical ills attack them and hold them down, and, though not confining them to home, yet deprive them, perhaps, of many childish delights; in early maturity an army of abnormal nervous sensations is waiting for them, the gauntlet of which they must run if they can; and throughout life every function seems to be an enemy.

The compensations of this type of organization are quite important and suggestive, and are most consolatory to sufferers. Among these compensations, this perhaps is worthy of first mention — that this very fineness of temperament, which is the source of nervousness, is also the source of exquisite pleasure. Highly sensitive natures respond to good as well as evil factors in their environment, salutary as well as pernicious stimuli are ever operating upon them, and their capacity for receiving, for retaining, and for multiplying the pleasures derived from external stimuli is proportionally greater than that of cold and stolid organizations: if they are plunged into a deeper hell, they also rise to a brighter heaven (…) art, literature, travel, social life, and solitude, pour out on them their selected treasures; they live not one life but many lives, and all joy is for them variously multiplied. To such temperaments the bare consciousness of living, when life is not attended by excessive exhaustion or by pain, or when one’s capacity for mental or muscular toil is not too closely tethered, is often-times a supreme felicity. The true psychology of happiness is gratification of faculties, and when the nervous are able to indulge even moderately and with studied caution and watchful anxiety their controlling desires of the nobler order, they may experience an exquisiteness of enjoyment that serves, in a measure, to reward them for their frequent distresses.”

The physician who collects his fee before his patient has quite recovered, does a wise thing, since it will be paid more promptly and more gratefully than after the recovery is complete.”

Nervous organizations are rarely without reminders of trouble that they escape — their occasional wakefulness and indigestion, their headaches and backaches and neuralgias, their disagreeable susceptibility to all evil influences that may act on the constitution, keep them ever in sight of the possibility of wliat they might have been, and suggest to them sufferings that others endure, but from which they are spared.”

While it is true that pain is more painful than its absence is agreeable, so that we think more of what is evil than of what is good in our environment, and dwell longer on the curses than the blessings of our lot, and fancy all others happier than ourselves, yet it is true likewise that our curses make the blessings more blissful by contrast”

There are those who though never well are yet never sick, always in bondage to debility and pain, from which absolute escape is impossible, yet not without large liberty of labor and of thought” “Such persons may be exposed to every manner of poison, may travel far and carelessly with recklessness, even may disregard many of the prized rules of health; may wait upon and mingle with the sick, and breathe for long periods the air of hospitals or of fever-infested dwellings, and come out apparently unharmed.”

This recuperative tendency of the nervous system is stronger, often-times, than the accumulating poison of disease, and overmasters the baneful effects of unwise medication and hygiene. Between the ages of 25 and 35, especially, the constitution often consolidates as well as grows, acquires power as well as size, and throws off, by a slow and invisible evolution, the subtile habits of nervous disease, over which treatment the most judicious and persistent seems to have little or no influence. There would appear to be organizations which at certain times of life must needs pass through the dark valley of nervous depression, and who cannot be saved therefrom by any manner of skill or prevision; who must not only enter into this valley, but, having once entered, cannot turn back: the painful, and treacherous, and agonizing horror, wisdom can but little shorten, and ordinary misdoing cannot make perpetual; they are as sure to come out as to go in; health and disease move in rhythm; the tides in the constitution are as demonstrable as the tides of the ocean, and are sometimes but little more under human control.” It is an important consolation for those who are in the midst of an attack of sick-headache, for example, that the natural history of the disease is in their favor. In a few days at the utmost, in a few hours frequently, the storm will be spent, and again the sky will be clear, and perhaps far clearer than before the storm arose.” nearly all severe pain is periodic, intermittent, rhythmical: the violent neuralgias are never constant, but come and go by throbs, and spasms, and fiercely-darting agonies, the intervals of which are absolute relief. After the exertion expended in attacks of pain, the tired nerve-atoms must need repose. Sometimes the cycles of debility, alternating with strength, extend through long years — a decade of exhaustion being followed by a decade of vigor.”

There are those who pass through an infancy of weakness and suffering and much pain, and through a childhood and early manhood in which the game of life seems to be a losing one, to a healthy and happy maturity; all that is best in their organizations seems to be kept in reserve, as though to test their faith, and make the boon of strength more grateful when it comes.”

Perfect health is by no means the necessary condition of long life; in many ways, indeed, it may shorten life; grave febrile and inflammatory diseases are invited and fostered by it, and made fatal, and the self-guarding care, without which great longevity is almost impossible, is not enforced or even suggested.” “Headaches, and backaches, and neuralgias, are safety-valves through which nerve-perturbations escape, and which otherwise might become centres of accumulated force, and break forth with destruction beyond remedy. The liability to sudden attacks of any form of pain, or distress, or discomfort, under overtoil or from disregard of natural law, is, so far forth, a blessing to its possessor, making imperative the need of foresight and practical wisdom in the management of health, and warning us in time to avoid irreparable disaster. The nervous man hears the roar of the breakers from afar, while the strong and phlegmatic steers boldly, blindly on, until he is cast upon the shore, often-times a hopeless wreck.”

A neurastenia também tem o nome de “cãibra do escritor”. No trecho a seguir, a referida “cãibra” está mais próxima de um surto neurastênico agudo, do qual, defende Beard, o ‘nervoso típico’ está protegido: “Those who are sensitive, and nervous, and delicate, whom every external or internal irritation injures, and who appreciate physical injury instantly, as soon as the exciting cause begins to act, cannot write long enough to get writer’s cramp; they are warned by uneasiness or pain, by weariness, local or general, and are forced to interrupt their labors before there has been time to receive a fixed or persistent disease.” “had they been feeble they would have been unable to persevere in the use of the pen so as to invite permanent nervous disorder.” Without such warnings they might have continued in a life of excessive friction and exhausting worry, and never have suspected that permanent invalidism was in waiting for them, until too late to save themselves either by hygiene or medication. When a man is prostrated nervously, all the forces of nature rush to his rescue; but the strong man, once fully fallen, rallies with difficulty, and the health-evolving powers may find a task to which, aided or unaided, they are inadequate.”

The history of the world’s progress from savagery to barbarism, from barbarism to civilization, and, in civilization, from the lower degrees towards the higher, is the history of increase in average longevity, corresponding to and accompanied by increase of nervousness. Mankind has grown to be at once more delicate and more enduring, more sensitive to weariness and yet more patient of toil, impressible but capable of bearing powerful irritation: we are woven of finer fibre, which, though apparently frail, yet outlasts the coarser, as rich and costly garments often-times wear better than those of rougher workmanship.”

Among our educated classes there are nervous invalids in large numbers, who have never known by experience what it is to be perfectly well or severely ill, whose lives have been not unlike a march through a land infested by hostile tribes, that ceaselessly annoy in front and on flank, without ever coming to a decisive conflict, and who, in advanced age, seem to have gained wariness, and toughness, and elasticity, by the long discipline of caution, of courage, and of endurance; and, after having seen nearly all their companions, whose strength they envied, struck down by disease, are themselves spared to enjoy, it may be, their best days, at a time when, to the majority, the grasshopper becomes a burden, and life each day a visibly losing conflict with death.” “the irritability, the sensitiveness, the capriciousness of the constitution, between the ages of 15 and 45, have, in a degree, disappeared, and the system has acquired a certain solidity, steadiness, and power; and thus, after a long voyage against opposing winds and fretting currents, they enter the harbor in calmness and peace.”

MEU SÉCULO ME IMPEDE DE COMPARTILHAR DESTE OTIMISMO: “It may be doubted whether, in the history of disease of any kind, there has been made so decided and so satisfactory an advance as has been made within the last quarter of a century, in the treatment of nervousness in its various manifestations.” “One great factor in the modern treatment of these functional nervous diseases is individualization, no two cases being treated precisely alike, but each one being studied by itself alone. Among wise physicians, the day for wholesale treatment of nervous diseases can never return. The result of all this progress is, that thousands who formerly would have suffered all their lives, and with no other relief except that which comes from the habitual addiction to narcotics, can now be cured, or permanently relieved, or at least put into working order where they are most useful and happy.” if all new modes of action of nerve-force are to be so many added pathways to sorrow,—if each fresh discovery or invention is to be matched by some new malady of the nerves,—if insanity and epilepsy and neurasthenia, with their retinue of neuroses, through the cruel law of inheritance, are to be organized in families, descending in fiery streams throught the generations, we yet have this assurance,—that science, with keen eyes and steps that are not slow, is seeking and is finding means of prevention and of relief.”

5. PHYSICAL FUTURE OF THE AMERICAN PEOPLE [epílogo cagado e ‘poliânico’ totalmente desnecessário]

This increase of neuroses cannot be arrested suddenly; it must yet go on for at least 25 or 50 years, when all of these disorders shall be both more numerous and more heterogenous than at present. But side by side with these are already developing signs of improved health and vigor that cannot be mistaken; and the time must come—not unlikely in the first half of the 20th century—when there will be a halt or retrograde movement in the march of nervous diseases, and while the absolute number of them may be great, relatively to the population, they will be less frequent than now; the evolution of health, and the evolution of nervousness, shall go on side by side.”

Health is the offspring of relative wealth.” “febrile and inflammatory disorders, plagues, epidemics, great accidents and catastrophes even, visit first and last and remain longest with those who have no money.” the absence of all but forced vacations—the result, and one of the worst results, of poverty—added to the corroding force of envy, and the friction of useless struggle,—all these factors that make up or attend upon simple want of money, are in every feature antagonistic to health and longevity. Only when the poor become absolute paupers, and the burden of life is taken from them and put upon the State or public charity, are they in a condition of assured health and long life.” “The inmates of our public institutions of charity of the modern kind are often the happiest of men, blessed with an environment, on the whole, far more salubrious than that to which they have been accustomed, and favorably settled for a serene longevity.” “For the same reasons, well-regulated jails are healthier than many homes, and one of the best prescriptions for the broken-down and distressed is for them to commit some crime.”

A fat bank account tends to make a fat man; in all countries, amid all stages of civilization and semi-barbarism, the wealthy classes have been larger and heavier than the poor.” “In India this coincidence of corpulence and opulence has been so long observed that it is instinctively assumed; and certain Brahmins, it is said, in order to obtain the reputation of wealth, studiously cultivate a diet adapted to make them fat.”

The majority of our Pilgrim Fathers in New England, and of the primitive settlers in the Southern and Middle States, really knew but little of poverty in the sense in which the term is here used. They were an eminently thrifty people, and brought with them both the habits and the results of thrift to their homes in the New World. Poverty as here described is of a later evolution, following in this country, as in all others, the pathway of a high civilization.”

the best of all antidotes and means of relief for nervous disease is found in philosophy.” Thus it is in part that Germany, which in scientific and philosophic discovery does the thinking for all nations, and which has added more to the world’s stock of purely original ideas than any other country, Greece alone excepted, is less nervous than any other nation; thus it is also that America, which in the same department has but fed on the crumbs that fall from Germany’s table, has developed a larger variety and number of functional nervous diseases than all other nations combined.”

The capacity for growth in any given direction, physical or mental, is always limited; no special gift of body or mind can be cultivated beyond a certain point, however great the tenderness and care bestowed upon it.”

In man, that higher operation of the faculties which we call genius is hereditary, transmissible, running through and in families as demonstrably as pride or hay-fever, the gifts as well as the sins of the fathers being visited upon the children and the children’s children; general talent, or some special talent, in one or both parents rises and expands in immediate or remote offspring, and ultimately flowers out into a Socrates, a Shakespeare, a Napoleon, and then falls to the ground”

That a single family may rise to enduring prominence and power, it is needful that through long generations scores of families shall endure poverty and pain and struggle with cruel surroundings”

The America of the future, as the America of the present, must be a nation where riches and culture are restricted to the few—to a body, however, the personnel of which is constantly changing.”

Inebriety being a type of the nervous diseases of the family to which it belongs, may properly be here defined and differentiated from the vice and habit of drinking with which it is confounded. The functional nervous disease inebriety, or dipsomania, differs from the simple vice of drinking to excess in these respects:

(…)

The simple habit of drinking even to an extreme degree may be broken up by pledges or by word promises or by quiet resolution, but the disease inebriety can be no more cured in this way than can neuralgia or sick-headache, or neurasthenia, or hay-fever, or any of the family of diseases to which it belongs.

(…)

Of the nervous symptoms that precede, or accompany, or follow inebriety, are tremors, hallucinations, insomnia, mental depressions, and attacks of trance, to which I give the term alcoholic trance.

(…)

even drunkenness in a parent or grandparent may develop in children epilepsy or insanity, or neurasthenia or inebriety.

(…)

The attacks of inebriety may be periodical; they may appear once a month, and with the same regularity as chills and fever or sick-headache, and far more regularly than epilepsy, and quite independent of any external temptation or invitation to drink, and oftentimes are as irresistible and beyond the control of will as spasms of epilepsy or the pains of neuralgia or the delusions of insanity. Inebriety is not so frequent among the classes that drink excessively as among those who drink but moderately, although their ancestors may have been intemperate; it is most frequent in the nervous and highly organized classes, among the brain-workers, those who have lived indoors; there is more excessive drinking West and South than in the East, but more inebriety in the East.”

probably no country outside of China uses, in proportion to population, so much opium as America, and as the pains and nervousness and debility that tempt to the opium habit are on the increase, the habit must inevitably develop more rapidly in the future than in the past; of hay-fever there must, in a not very distant time, be at least 100,000 cases in America, and in the 20th century hundreds of thousands of insane and neurasthenics.”

There must be, also, an increasing number of people who cannot bear severe physical exercise. Few facts relating to this subject are more instructive than this — the way in which horseback-riding is borne by many in modern times. In our country, I meet with large numbers who cannot bear the fatigue of horseback-riding, which used to be looked upon — possibly is looked upon to-day — as one of the best forms of exercise, and one that is recommended as a routine by physicians who are not discriminating in dealing with nervously-exhausted patients.” The greatest possible care and the best judgment are required in prescribing and adapting horseback-riding to nervous individuals of either sex; it is necessary to begin cautiously, to go on a walk for a few moments; and even after long training excess is followed by injury, in many cases.”

ANTIRRUBENISMO: “If either extreme is to be chosen, it is well, on the whole, to err on the side of rest rather than on the side of excess of physical exertion.”

Why Education is behind other Sciences and Arts? Schools and colleges everywhere are the sanctuaries of medievalism, since their aim and their powers are more for retaining what has been discovered than for making new discoveries; consequently we cannot look to institutions or organizations of education for the reconstruction of that system by which they enslave the world and are themselves enslaved. It is claimed by students of Chinese character that that great nation has been kept stationary through its educational policy — anchored for centuries to competitive examinations which their strong nerves can bear while they make no progress. In a milder way, and in divers and fluctuating degrees, all civilized nations take their inspiration from China, since it is the office and life of teaching to look backward rather than forward; in the relations of men as in physics, force answers to force, and as the first, like the second childhood is always reactionary, a class of youths tend by their collective power to bring the teacher down more than he can lift them up. Only conservative natures are fond of teaching; organizations are always in the path of their own reconstruction; mediocrity begets mediocrity, attracts it, and is attracted by it. Whence all our institutions become undying centres of conservatism. The force that reconstructs an organization must come from outside the body that is to be reconstructed.”

The Gospel of Rest. The gospel of work must make way for the gospel of rest. The children of the past generation were forced, driven, stimulated to work, and in forms most repulsive, the philosophy being that utility is proportioned to pain; that to be happy is to be doing wrong, hence it is needful that studies should not only be useless but repelling, and should be pursued by those methods which, on trial, proved the most distressing, wearisome, and saddening. That this philosophy has its roots in a certain truth psychology allows, but the highest wisdom points also to another truth, the need of the agreeable; our children must be driven from study and all toil, and in many instances coaxed, petted, and hired to be idle; we must drive them away from schools as our fathers drove them towards the schools; one must be each moment awake and alive and active, to keep a child from stealthily learning to read; our cleverest offspring loves books more than play, and truancies [matar aula] and physical punishments are far rarer than half a century ago.”

From investigations at Darmstadt, Paris, and Neuremburg, Dr. Treichler concludes that one-third of the pupils suffer more or less from some form of headache. It is not probable that these headaches in children are the result purely of intellectual exertion, but of intellectual exertion combined with bad air, with the annoyances and excitements and worries, the wasting and rasping anxieties of school life.”

Even studies that are agreeable and in harmony with the organs, and to which tastes and talents are irresistibly inclined, are pursued at an expenditure of force which is far too great for many nervously organized temperaments. I have lately had under my care a newly married lady who for some years has been in a state of neurasthenia of a severe character, and of which the exciting cause was devotion to music at home; long hours at the piano, acting on a neurasthenic temperament, given to her by inheritance, had developed morbid fears and all the array of nervous symptoms that cluster around them, so that despite her fondness for a favorite art she was forced to abandon it, and from that time was dated her improvement, though at the time that I was called in to see her she had yet a long way to travel before she would reach even approximate health.”

The reconstruction of the principles of evidence, the primary need of all philosophy, which cannot much longer be delayed, is to turn nearly all that we call history into myth, and destroy and overthrow beyond chance of resurrection all but a microscopic fraction of the world’s reasoning. Of the trifle that is saved, the higher wisdom of coming generations will know and act upon the knowledge that a still smaller fraction is worthy of being taught, or even remembered by any human being.” A tragédia é que uma filosofia do conhecimento só pode vir depois da burra e didática memorização de fatos tão lineares quanto sem nexo. Ou seja: chega-se ao ideal da educação quando ela já está finalizada ou, antes, só se chega ao suposto ideal, descobrindo-se que o começo devera ter sido diferente, quando o começo se sedimentou. Pode-se ensinar certo, mas não se pode aprender certo!

The fact that anything is known, and true and important for some is of itself no reason why all should know or attempt to know it”

Our children are coaxed, cajoled, persuaded, enticed, bluffed, bullied, and driven into the study of ancient and modern tongues; though the greatest men in all languages, whose writings are the inspiration to the study of languages themselves knew no language but their own; and, in all the loftiest realms of human creative power the best work has been done, and is done today, by those who are mostly content with the language in which they were cradled.” “of all accomplishments, the ability to speak and write in many tongues is the poorest barometer of intellectual force, and the least satisfactory for happiness and practical use”

Shakespeare, drilled in modern gymnasia and universities, might have made a fair school-master, but would have kept the world out of Hamlet and Othello.”

Of the sciences multiplying everyday, but few are to be known by any one individual; he who has studied enough of the systematized knowledge of men, and looked far enough in various directions in which it leads to know which his tastes and environment best adapt him to follow, and who resolutely obeys his tastes, even in opposition to all teachers,(*) philosophers, and scholars, has won the battle of life” Mementos: Jabur, Edsono (um representante dos jornalistas e um dos pseudossociofiloepistemólogos)

the study of the art of thinking, of the philosophy of reasoning, in mathematics, poetry, science, literature, or language, is the best exercise for those who would gain this mental discipline”

O coach está para para o acadêmico de hoje como os sofistas estavam para os filósofos jônicos e eleatas da Grécia Antiga: é um sintoma da crise e insustentabilidade desse modo de conhecimento, mas tampouco chega a lugar algum. Prenuncia um tipo de Sócrates que vem aí?

In all spheres of thought, the most hospitable of intellects, the most generous in their welcome to new truths or dreams of truth are those who have once learned the great secret of life—how to forget.”

GUSMÓN: “Conscientious professors in colleges often-times exhort their graduates to keep up some of the studies of college life during the activity of years — if those graduates are ever to do much in the world, it is by doing precisely NOT what they are thus advised to do.”

ESPECIALISTA AGRAMATICAL: “The details of geography, of mathematics, and of languages, ancient as well as modern, of most of the sciences, ought, and fortunately are, forgotten almost as soon as learned, save by those who become life-experts in these special branches”

The systems of Froebel and Pestalozzi, and the philosophy of Rousseau in his Émile, analyzed and formulated in physiological language is, in substance, that it costs less force and is more natural and easy to get into a house through the doors, than to break down the walls, or come through the roof, or climb up from the cellar. Modern education is burglary; we force ideas into the brain through any other pathway and every other way except the doors and windows, and then we are astonished that they are unwelcome and so quickly expelled.”

they see with the mind’s eye, though we close their eyelids.”

Medicine has been taught in all our schools in a way the most unphilosophical, and despite all the modifications and improvements of late years, by bedside teaching and operations and demonstrations, the system of medical education is in need of reconstruction from the foundation; it begins where it should end; it feeds the tree through the leaves and branches instead of through the roots; physiology itself is taught unphysiologically; the conventional, hereditary, orthodox style is, for the student to take systematic text-books, go through them systematically from beginning to end, and attend systematic lectures, reserving study at the bedside for the middle and later years of his study; the didactic instruction coming first, and the practical instruction and individual observation coming last. Psychology and experience require that this should be reversed; the first years of the medical student’s life should be given to the bedside, the laboratory and dissecting room, and the principles of systematic instruction should be kept for the last years, and then used very sparingly. The human mind does not work systematically, and all new truths enter most easily and are best retained when they enter in psychological order. System in text-books is a tax on the nerve-force, costly both of time and of energy, and it is only by forgetting what has been taught them in the schools that men even attain eminence in the practice of medicine.

The first lesson and the first hour of medical study should be at the bedside of the sick man; before reading a book or hearing a lecture, or even knowing of the existence of a disease, the student should see the disease, and then, after having seen it and been instructed in reference to it, his reading will be a thousand-fold more profitable than it would had he read first and seen the case afterwards. Every practitioner with any power of analyzing his own mental operations knows that his reading of disease is always more intelligent after he has had a case, or while he has a case under treatment under his own eyes, and he knows also that all his reading of abstract, systematic books is of but little worth to him when he meets his first case, unless he re-read, and if he do so, he will find that he has forgotten all he has read before, and he will find, also, that he never understood what he read, and perhaps thoroughly and accurately recited on examination. By this method one shall learn more what is worth learning of medicine in one month, than now we learn in a year, under the common system, and what is learned will be in hand and usable, and will be obtained at incommensurably less cost of energy, as well as of time. So-called <systematic instruction> is the most extravagant form of instruction and is really no instruction, since the information which it professes to give does not enter the brain of the student, though the words in which it is expressed may be retained, and recited or written out on examination. I read the other day an opening lecture by a professor in one of our chief medical schools. I noticed that the professor apologized for being obliged to begin with what was dry and uninteresting, but stated that in a systematic course it was necessary to do so. It will not be his fault only, but rather the fault of the machinery of which he is one of the wheels, if the students who listen to and take notes of and worry over his lecture, never know what he means; 5 minutes study of a case of rheumatism or an inflamed joint, under the aid of an expert instructor, will give a person more knowledge of inflammation, in relation to the practice of medicine, than a year of lectures on that subject.

I make particular reference to medical education, not because it is the leading offender, but because it has made greater progress, perhaps, than almost any other kind of modern education.” and the time will come when men shall read with amusement and horror of intelligent, human, and responsible young men beginning a medical course by listening to systematic abstract lectures.” 140 anos e nada…

In theological seminaries, students are warned about preaching, or speaking, or lecturing during their 1st or 2nd year, and tied and chained down to lectures and homiletics, and theology and history” Nothing David (or Solomon) would be good at…

Aside from the study of language, which is a separate matter, the first day’s work in a theological school should be the writing or preparing a sermon, and homiletics should follow — not precede.”

All languages should be learned as we learn our own language — not through grammars or dictionaries, but through conversation and reading, the grammars and dictionaries being reserved for a more advanced stage of investigation and for reference, just as in the language in which we were born.”

I applaud the English because they boast of their ignorance of American geography; of what worth to them, of what worth to most of us whether Montana be in California, or Alaska be or be not the capital of Arizona?”

The Harvard professor who says that when students enter his room his desire is, not to find out what they knew, but what they did not know, ought to have been born in the 20th century, and possibly in the 30th, for his philosophy is so sound and so well grounded psychology that he cannot hope to have it either received or comprehended in his lifetime; and the innovation that Harvard has just promised, of having the teacher recite and the pupils ask the questions, is one of the few gleams of light in the great darkness by which this whole subject of education has been enveloped.”

EDSONO’S EXQUISITE CLASS OF TORTURE (2009): Lectures, except they be of a clinical sort [belo troca-trilho!], in which appeals are made to the senses, cost so much in nerve-force, in those that listen to them, that the world cannot much longer afford to indulge in them and the information they give is of a most unsatisfactory sort, since questioning, and interruption, and repetition, and reviewing are scarcely possible (…) The human brain is too feeble and limited an organ to catch a new idea when first stated, and if the idea be not new it is useless to state it.”

ServIce on dem and us

dire dim straits

a threat!

One of the pleasantest memories in my life, is that, during my medical education, I did not attend one lecture out of 12 — save those of a clinical sort — that were delivered (brilliant and able as some of them were) in the college where I studied, and my regret is that the poverty of medical literature at that time compelled me to attend even those. All the long lectures in my academical course at the college were useful to me — and I think were useful to all my classmates — only by enforcing the necessity, and inspiring the habit of enduring passively and patiently what we know to be in all respects painful and pernicious, providing we have no remedy.”

Original thinkers and discoverers, and writers are objects of increasing worry on the part of their relatives and friends lest they break down from overwork; whereas, it is not so much these great thinkers as the young school-girl or bank clerk that needs our sympathy.”

In England during the last summer, I attempted, without any human beings on whom to experiment, to explain some of the theories and philosophies of trance before an audience composed of the very best physiologists and psychologists of Europe, and with no hetter success than at home. If I had had but one out of the 20 or 30 cases on whom I have lately experimented, to illustrate and enforce my views, there would have been, I am sure, no difficulty in making clear not only the facts, but what is of chief importance, the interpretation of the facts.”

Modern competitive examinations are but slightly in advance of the system of recitations and lectures. They seem to have been invented by someone who wished to torture rather than benefit mankind, and whose philosophy was: whatever is disagreeable is useful, and that the temporary accumulation of facts is true wisdom, and an accurate measure of cerebral force.”

Knowing by heart is not knowing at all” Montaigne

the greatest fool may often pass the best examination [Exemplo contemporâneo: ‘Patrick Damascenos’ se tornando médicos diplomados por universidades federais – no mínimo os minions esquecem o que aprendem em História após 30 dias (‘conteúdo inútil’, etc.), embora apostilas do Sigma ou Galois nunca fossem lá muito confiáveis, para início de conversa…]; no wise man can always tell what he knows; ideas come by suggestion rather than by order; you must wait for their appearing at their own time and not at ours” “he who can always tell what he knows, knows little worth knowing.”

The first signs of ascension, as of declension, in nations are seen in women.”

palace cars and elevators and sewing machines are types of recent improvements that help to diminish the friction of modern life. Formerly [!!!] inventors increased the friction of our lives and made us nervous.” E que diabos eram palace cars?

The Germanization of America — by which I mean the introduction through very extensive immigration, of German habits and character — is a phenomenon which can now be observed, even by the dullest and nearest-sighted, in the large cities of the Northern portion of our country.” O nazismo foi o último a chegar.

tending to displace pernicious whiskey by less pernicious beer and wine, setting the example of coolness and calmness, which the nervously exhausted American very much needs.”

Tempos em que valia a pena se conservar: “We have been all English in our conservatism, a quality which has increased in proportion as we have gained anything of wealth or character or any manifestation of force whatsoever, that is worth preserving.” Hoje os americanos são azeitonas vencidas em conserva.

after such a vacation one needed a vacation.”

The nervousness of the third generation of Germans [?] is a fact that comes to my professional notice more and more.”

Not only are the <ha, ha’s> [RONALDINHO SOCCER!], of which so much [mundial] SPORT was once made, heard much less frequently than formerly in public meetings, but there is a positive ease and attractiveness to very many of the English speakers in and out of Parliament, in the pulpit and on the platform, that is thoroughly American” it was proved that if all the [congress] speakers continued to speak as often and as elaborately as they had been speaking, a number of years would be required before they could adjourn [se significa entrar em recesso ou perder a próxima eleição, deixo a critério do leitor de criptas!].”

the forces that renovate and save are mightier far than the forces that emasculate and destroy.”

Não sei se chamo o comentário de genial ou estúpido: “The American race, it is said, is dying out; but there is no American race. Americans are the union of European races and peoples, as lakes are fed by many streams, and can only disappear with the exhaustion of its sources. Europe must die before America. In sections of America, as in New England, and in large cities, the number of children to a family in certain classes is too small for increase of population.” Uma eterna sucessão de sins e nãos no melhor estilo Cleber Machado!

Felizmente o Deus Europeu-Ocidental morreu e a Ásia com seu rostinho de beldade imortal de 20 aninhos vem aí…

DANIEL DEFOE, JONATHAN SWIFT & UM PANORAMA DA LITERATURA INGLESA DOS XVIII // OU AINDA: UMA CRÍTICA DA CLASSE MÉDIA E, AINDA, ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PROTOFEMINISTAS – Excertos traduzidos de um capítulo de livro de Terry Eagleton, crítico literário britânico, intitulado “Daniel Defoe and Jonathan Swift”

Os excertos giram em torno de dois autores contemporâneos, talvez os dois mais conhecidos hoje fora da Inglaterra em termos de literatura clássica daquele país – As Viagens de Gulliver veio ao mundo menos de quinze anos depois d’As Aventuras de Robinson Crusoe. São duas obras espantosamente similares e divergentes ao mesmo tempo. Duas narrativas, eu diria, de restless wanderers, viajantes incansáveis, espécies de maníacos tragicamente involuntários por navegar o mundo, sem propósito claro em mente…

Assim como o novelista e ex-condenado Jeffrey Archer, a carreira de Daniel Defoe abrangeu dívidas e alta política, a profissão de escritor e o cárcere. Cronologicamente falando, a arte imitou a vida com Defoe, uma vez que ele começou a escrever maior parte de suas obras enquanto ativista. De outro ângulo, entretanto, sua vida imitou, sim, a arte, pois sua trajetória foi sensacionalista o bastante para que pudesse figurar tranquilamente como o protagonista de suas próprias novelas tumultuadas. Em diversos momentos ele se dedicou ao comércio de vestuário, vinho e tabaco, foi dono de uma fábrica de tijolos, um político vira-casaca, uma espécie de espião do submundo e dos bastidores da política, agente secreto oficial do governo, espécie de diplomata e assessor do império britânico por meio de suas publicações jornalísticas (o que na época chamavam de publicista). Não bastasse todo esse cartel, tomou parte ativa em uma rebelião armada contra Jaime II, excursionou incansavelmente pela Europa e teve um papel crucial nas históricas negociações da unificação política dos reinos da Inglaterra e da Escócia.

Defoe faliu mais de uma vez, foi preso por débitos e até exposto no pelourinho num processo de sedição após publicar um panfleto satírico. Mesmo depois dessa experiência, ele viria a publicar um Hino ao Pelourinho (Hymn to the Pillory), bem como um Hino às Massas (Hymn to the Mob), em que, escandalosamente para a época, enaltecia o povo de extrato inferior por sua extrema lucidez de julgamento. É difícil imaginar outro grande autor inglês fazendo a mesma coisa na mesma época. Entre suas obras, está também Uma História Política do Demônio (A Political History of the Devil), um estudo sobre fantasmas, motivado pela Grande Praga de Londres, um surto da peste bubônica que eclodiu em 1665 e durou até o biblicamente simbólico ano seguinte. Defoe publicou também uma apologia irrestrita da instituição do casamento intitulada Indecência Conjugal; ou da Prostituição Marital. Um tratado sobre a Utilidade e a Inconveniência da Cama de Casal (Conjugal Lewdness; or Matrimonial Whoredom. A Treatise Concerning the Use and Abuse of the Marriage Bed). De modo algum ele seria um ‘novelista’ no puro senso da palavra (o próprio termo em voga criou sua acepção muito mais tarde), muito embora ele tenha atacado os ‘Romances’ (o gênero pré-novelístico por excelência), que para ele eram estórias que não informavam, apenas entretinham (e isso era necessariamente ruim naquela Inglaterra). Suas obras mais consagradas, Moll Flanders e Robinson Crusoe, são ‘novelas’ apenas em retrospecto. Defoe só escrevia aquilo com que pensava poder lucrar, sendo uma espécie de autor oportunista altamente prolífico que ‘atirava para todos os lados’ no mercado literário em ebulição de seus dias. A imprensa da época não discriminava entre gêneros, muito menos Defoe o faria.

Escrever, para Defoe, pois, não passava de commodity, como ele próprio retrata o mundo em suas ‘novelas’, que podemos resumir como ‘uma série de coisas a que se dá um preço de alto a baixo’. Tampouco era Defoe um ‘homem literário’: ao contrário, sua escrita é apressada, não pesa as palavras, e é transparente demais. Um ‘grau zero’ do estilo como se sempre fosse um jornalista ou historiador relatando fatos que tendia a apagar as próprias pegadas, negando seu próprio status de escritor e, portanto, de criador de realidades. O próprio Defoe batizava seu estilo de ‘cáustico’ ou ‘abjeto’ (mean), pretensamente desprovido de conscienciosidade e ignorante dos próprios artifícios. Na linguagem lacônica e um tanto caseira e pré-fabricada de Defoe sentimos, quase pela primeira vez na Literatura, o idioma dos comuns. Linguagem despida de textura e densidade, que permite ao leitor atravessar as palavras e ver as coisas de frente e em si mesmas. ‘O conhecimento das coisas, não das palavras, molda o erudito’, comentou Daniel Defoe no Compleat English Gentleman.¹ Uma profusão de aventuras e incidentes tem forçosamente de compensar as narrativas de Defoe, devido à crueza de textura. A suprema fertilidade de sua técnica é de fato impressionante. Defoe quase não se preocupa com o sentir das coisas, não mais do que um merceeiro passaria o dia acariciando e apalpando seus queijos, que são apenas seu ganha-pão. Defoe é o utilitarista-padrão: mais interessado no valor de troca dos objetos, não em suas qualidades sensuais ou sensórias. Há sem dúvida sensualidade em Defoe, principalmente nas obras de protagonistas mulheres (Moll Flanders e Roxana), mas não sensualismo, voluptuosidade. O realismo defoeniano é um realismo das coisas, enquanto que o de Richardson, por exemplo, é um das pessoas e sentimentos.”

¹ Uma espécie de enciclopédia de seu tempo, hoje de domínio público: https://ia800900.us.archive.org/29/items/compleatenglishg00deforich/compleatenglishg00deforich.pdf. Manuscritos descobertos no séc. XIX, tudo indica que fossem anotações diversas do escritor que ele tinha a intenção de completar e publicar.

Depois de um bom tempo exercendo seu ofício errático, pau-pra-toda-obra, escrevendo meramente para sobreviver, Defoe morreu enquanto se ocultava ou fugia de seus credores, autodeterminado, quem sabe, a acabar da mesma maneira que havia começado, ignorando outros estilos de vida. Foi um Dissidente (um imoralista) numa época em que ser Dissidente (assim, com letra maiúscula mesmo) era o mesmo que não possuir direitos civis. Como muitos de seus compatriotas novelistas, provinha da classe-média baixa econômica mas que possuía um status de pequena-burguesia, devido ao fator da formação intelectual: ilustrado, completou sua educação formal, cultivava ambições de ascensão e em seu meio os jovens eram politicamente articulados. No seu Journal of the Plague Year, ou Jornal do Ano da Peste, ele tripudia de algumas superstições do povão enquanto dá crédito irrestrito a outras. Muito parecido com William Blake em sua origem social, a rebeldia de Defoe afirmava a radical igualdade entre homens e mulheres, sustentando que o handicap feminino não passava do resultado de convenções. Desigualdades sexuais eram puramente culturais, nada naturais. O que distingue suas personagens Roxana e Moll Flanders, como outras tantas prostitutas vigaristas (seja as de luxo ou as que trabalhavam em espeluncas) e objetificadas da literatura de então, é que havia a afirmação premente, em todo o livro: elas não são propriedade de homem algum, elas não são de ninguém. No mundo de Defoe, nenhuma relação é permanente, aliás.”

Quando Moll Flanders diz levianamente que está grata por ter se livrado de seu filho na barriga, todo leitor de época se sentia escandalizado e ao mesmo tempo representado. Roxana é a comerciante-mulher, que embora seja a própria mercadoria é a dona do negócio: recusa o casamento, mesmo com um bom nobre, pois isso seria a ruína total de sua independência financeira. Ser esposa, para Roxana, era o mesmo que ser escrava. Os puritanos da geração de Defoe prezavam tanto a felicidade doméstica quanto o individualismo econômico; o único problema era a completa incompatibilidade de ambos. Sobretudo no caso das mulheres, que em quaisquer das esferas, isoladamente consideradas, estavam de todo modo alijadas da autonomia. Isso não significa que não fosse também uma questão masculina: na prática o individualismo econômico significava uma castração, compelindo à afabilidade, afeição, lealdade e companheirismo que o pai de família devia simbolizar.

Para complementar as credenciais progressistas de Defoe, ele militava pela absoluta soberania do plebeu, cujo direito de não se curvar a uma soberania injusta era, ele pregava, inalienável. Ele defendia os quakers e já então propagava os méritos de uma sociedade etnicamente miscigenada. Estrangeiros, segundo ele, eram um precioso acréscimo para a nação. Defoe troçava das mitologias chauvinistas dos bretões em poemas como O Inglês Puro-Sangue (The True-Born Englishman), cujos versos não hesitam em caracterizar a raça britânica justamente pela sua alta mestiçagem, desdenhando a noção aristocrática de pureza de sangue e ridicularizando a própria idéia-título do ‘puro-sangue’ com suprema ironia: mera ficção e, aliás, contradição. Não é irrelevante para essa polêmica (à época) que Guilherme III, sob quem Defoe exerceu seus trabalhos panfletários, fosse um holandês.”

“‘O que significam as capacidades naturais de qualquer criança sem a educação?’, o autor questiona no Compleat English Gentleman. Apenas tories absolutamente reacionários como Henry Fielding seriam capazes de enaltecer só o lado das qualidades inatas. Defoe não se mostrava pudico em politizar a questão: por trás dessa doutrina pedagógica ‘inocente’ havia toda uma tentativa de impedir as reformas pedagógico-sociais necessárias à Inglaterra, mediante o argumento dos talentos e habilidades congênitos e inalteráveis, que sempre legitimariam só as crianças da nobreza.”

O homem não é rico porque é honesto, mas é honesto porque é rico.

Essa é uma doutrina escandalosamente materialista avant-la-lettre, muito mais típica de um Bertolt Brecht do que de um ardoroso cristão dos Setecentos. Valores morais são o simples reflexo das condições materiais. Os ricos são apenas privilegiados o bastante para não terem de roubar. A moralidade é para aqueles que podem cultivá-la. Ideais calham muito bem a quem tem de sobra o que comer. Defoe também exigia leis que reconhecessem a condição dos miseráveis, ao invés da replicagem de um sistema que, em primeiro lugar, criou a miséria, para depois enforcar os miseráveis por serem eles o que são.”

Se a classe média preza tanto pelo eu autônomo na teoria, como pode ser que viole tanto essa doutrina na prática? Quer ela de fato a independência de todos os seus servos, assalariados que tem tão pouco poder de barganha que são menos do que cidadãos e pouco mais que escravos, sem falar dos colonizados além-mar? Não seria preferível para o pequeno-burguês, secretamente, é claro, preferir a liberdade irrestrita para si e a negativa para todos os competidores no mercado? A pequena-burguesia acredita na autodeterminação da população; mas ao mesmo tempo seus membros, homens e mulheres, não passam de títeres de forças econômicas impessoais. Os protagonistas de Defoe – Moll, Crusoe, Roxana, Coronel Jack – estão todos enleados nessa contradição. Se eles são, num sentido, forjadores de seu próprio destino, são, inegavelmente, vítimas desafortunadas da Providência, das leis do livre comércio e de seus próprios apetites.

No ensaio A Divindade da Troca (The Divinity of Trade), Defoe vê a Natureza como um tipo de capitalista, que – em sua infinita e inapreensível sabedoria burguesa – criou corpos capazes de flutuar sobre as águas, para que se pudessem construir navios e fomentar o comércio; criou as estrelas para nortear os navegadores; e até escavou rios no seio dos continentes que levam as embarcações direto para os recursos espoliáveis de outros países. Animais foram feitos dóceis e submissos deliberadamente para que o homem os explorasse como instrumentos e também como matéria-prima; linhas costeiras pedregosas foram criadas possibilitando a construção de fortalezas; matéria-prima conveniente foi distribuída ao longo de todo o planeta para que cada nação tivesse algo para vender e algo para comprar. Ainda que estejamos falando de um período muito aquém dos oceanos de Coca-Cola e da produção da necessidade quase que instintiva de calçar um Nike, a Natureza, para Defoe, não perdia e não perdeu nada de vista.”

Ora, se o homem era divinizado e elevado de forma sem precedentes nessa nova ordem social, temos em contrapartida a desvantagem de que qualquer indivíduo é indiferentemente intercambiável. Parceiros comerciais, sexuais ou maritais em Defoe vêm e vão, às vezes com tanta individualidade quanto numa coletividade de coelhos. Mas o maior conflito se dá entre as práticas amorais de uma cultura plutocêntrica e autocentrada em excesso e os altos ideais morais que essa própria cultura insiste em pregar.”

O escritor John Dunton, também do séc. XVIII, que teve ligeiro contato com Defoe, geria um jornal mensal devotado à prostituição, ou antes a denegrir a prática da prostituição ao invés de servir como Classificados do corpo humano alheio, o Night Walker: or, Evening Rambles in Search after Lewd Women (O Caminhante Noturno [/o Homem da Noite]: ou Aventuras do Entardecer em Busca de Mulheres Lascivas). Mesmo sendo vanguardista para a época, impossível que fosse um jornal politicamente correto para nossa concepção. A novela naturalista do século XIX procedia a expedientes parecidos, num meio-termo entre a objetificação degradante e gratuita da mulher da noite e a exposição de uma espécie de mal burguês: essas escapadelas maritais tinham um odor sensual e fatalista, havia um certo prazer mórbido no retrato de becos sujos e miseráveis em que todo moralista jogava a moral fora, e a mulher podia ser vista como a vítima de uma (des)ordem social; o século XIX foi cada vez mais inquirindo sobre esta questão de forma científica, menos sensacionalista, mas Defoe não chegou a testemunhar essa evolução.”

A família, para um puritano devoto como Defoe, é um domínio sagrado, como sugere seu panfleto de costumes O Instrutor da Família (The Family Instructor). Ao mesmo tempo, ele advoga, sem constrangimento, que tais laços podem e devem ser cortados quando se tornam mais maus do que bons: quando forem sinônimo de uma degradação do casamento, quando forem sinônimo do aviltamento das relações sangüíneas, acaba sendo a conduta mais autêntica e virtuosa o corte destes laços, ignorados ou tratados como meros meios para outros fins.”

Em Crusoe, é como se o colonialista frio e moderado desse o tom do enredo. Ele (o narrador em primeira pessoa) também é aquele que dá o matiz exótico ao objeto (cenário) em questão, isto é, sua colônia involuntária no meio dos trópicos. Essas narrativas sem adornos e sem culpa de consciência não chegam a destruir os vasos capilares do decoro ideológico da Inglaterra pós-elizabetana, mas são um primeiro desnudamento de sua lógica imperialista. Não são narrativas de uma veia polêmica, ainda, são mais cândidas que outra coisa. Não há sentimentalismo, porque sentimentos não podem ser quantificados, e nesta literatura em que só o que é quantificável é real eles ainda não aparecem. Nesta atmosfera intermediária de amoralismo, o relato é fidedignamente subversivo ou subversivamente fidedigno espelhando a existência social daquelas décadas; as relações são o que são, não o que deveram ser. Não obstante, a pura e simples descrição do fato e da matéria bruta não deixa de ser explosivo em si mesmo, ou conducente à explosão da dinamite próxima. O realismo se torna de grau em grau Política.”

Moll Flanders termina sua história contando como prosperou e chegou ao sucesso após uma vida de crimes, mas acrescentando, com alguma urgência, em tom de confissão compungida, que ela se arrepende sinceramente de todo seu passado. A moral da história – o crime não compensa – é explicitamente contradita pelo final efetivo. O contraste é tão desconcertante que alguns críticos passaram seu tempo imaginando se Defoe foi ou não abertamente sarcástico. Quando o náufrago Crusoe considera a inutilidade de todo o ouro que conseguira trazer do navio até a ilha, mas, no fim, decide levá-lo consigo assim mesmo – isso é uma tirada irônica do autor ou humor involuntário? Quando Crusoe, testemunhando Sexta-Feira que escapa de seus ex-irmãos canibais para não ser comido, reflete acerca da utilidade de levar consigo um servo, sendo este acréscimo a seu ‘patrimônio’ coincidente com um suposto chamado da Providência para salvar um desgraçado, seria essa harmonia entre interesse capitalista e revelação divina um artifício do autor para produzir o riso do leitor? Defoe está ou não depreciando sua heroína Roxana quando ela declara que deve manter seu próprio dinheiro separado do de seu amo e marido, para não misturar seus ganhos ilícitos com o suado e honesto capital do cônjuge?”

Porque se essa for a opinião fática do Defoe o Realista literário e Materialista radical, dificilmente seria também o credo de sua metade dissidente e religiosa. Defoe o Cristão estabelece a moral e a religião como realidades autossuficientes e inquestionáveis. Mas autossuficientes e inquestionáveis até que ponto, cara pálida? Se esses valores transcendentais existem numa esfera própria, eles pouco impactam na conduta efetiva dos personagens. Moll sente pena de uma de suas vítimas mesmo durante o ato de roubá-la, mas sua tristeza nada impede na concretização do ato. Como o Coronel Jack, que pode muito bem ser um perfeito larápio e viver com a consciência remoída. No século XVIII, piedade e nariz empinado não eram estranhos um ao outro. E não se distinguiam muito bem. Ou a moral falha porque está muito mesclada com o mundo material, ou falha porque está, justamente, dele apartada. Defoe reconhece esta última condição quando escreve: ‘Lágrimas e orações não fazem revoluções / Não derrubam tiranos, não quebram grilhões’.”

A moralidade em Defoe é geralmente retrospectiva. Uma vez que você tenha pilhado, pode finalmente ser penitente. Como demonstra o narrador de si próprio em Crusoe, é só ao escrever seus atos que você pode julgar sua vida como um todo. Enquanto tenta entender a própria vida ao vivo, você anda ocupado demais mantendo o nariz acima do nível d’água para levar a termo qualquer reflexão, quanto mais sentir remorso. Só há dois desfechos: continuar ou se afogar. Correr e ainda assim não ganhar nenhum terreno, continuar na condição em que já estava; ou simplesmente perecer. Não é fácil se embrenhar em considerações metafísicas enquanto a necessidade imediata é fugir dos credores ou lidar com seu atual marido. A narrativa sempre ziguezagueia num passo tão frenético que um evento vai borrando o outro num contínuo. Nenhum da horda de personagens da novela Moll Flanders chega a ter um intercurso mais que casual com a heroína – a interação típica entre cosmopolitas, mas impensável na comunidade rural dos livros de uma Jane Austen ou George Eliot. As figuras que interagem com Moll entram e saem de sua vida e das páginas de sua vida como meros transeuntes cruzam pela Piccadilly. A pergunta mais premente na cabeça do leitor que atravessa este processo metonímico virtualmente infindável é: o que vem a seguir? Sentido e relato não são concordes.

Assim como um parvo, diz-se, é incapaz de mascar chiclete e caminhar ao mesmo tempo, os personagens de Defoe só podem agir ou refletir, mas nunca os dois juntos. A ação moralmente informada é rara; a reflexão moral só vem bem depois. É essa a razão da coexistência de dois formatos literários consideravelmente diferentes sob a capa do Robinson Crusoe: a história aventuresca e a autobiografia espiritual. De todos os personagens de Daniel Defoe, Crusoe é o mais feliz na combinação dessa ação racional com a reflexão moral. Mas isso se dá, em parte, por causa das circunstâncias excepcionais: Crusoe está sozinho numa ilha, tem algum trabalho a executar, mas também muito tempo ocioso para meditar.”

Como a vida é terrivelmente material mas também uma sucessão ininterrupta e agitada de eventos, cada ato parece simultaneamente vívido e sem substância. Essas novelas são tornadas artigos fascinantes pelo processo de criação em si mesmo, pelo valor de troca, e não pelo valor de uso (intenção final). Não há uma lógica conclusiva para a narrativa de Defoe, é uma narrativa pura e simples. Não há um momento do livro em que o fechamento seria mais natural que em qualquer outro fecho de capítulo. O eu-lírico apenas prossegue acumulando narrativa(s), como um capitalista jamais cessa de acumular capital. Um pedaço de enredo, como um investimento particular, acaba levando ao próximo. Crusoe mal volta à terra natal e já está em alto-mar de novo, ainda acumulando aventuras, que serão obviamente narradas e contarão com o desejo do eu-lírico de formular um propósito. A sede de narrativa é insaciável. A acumulação de capital parece ter um propósito, mas é pura aparência. Secretamente, pelo menos no mercantilismo defoeniano, subjaz a verdade de que o único fim da acumulação é a própria acumulação. Uma novela de Defoe não tem o epílogo de facto, como têm as novelas de Fielding. Todos os finais são arbitrários, e todos poderiam ser apenas novos começos, se se quisesse.¹ O viajante inquieto só repousa a fim de se preparar para a próxima viagem…”

¹ A maior prova disso é que AS AVENTURAS DE ROBINSON CRUSOE são continuadas pelas NOVAS AVENTURAS DE ROBINSON CRUSOE, por mim panoramicamente traduzidas em https://seclusao.art.blog/2018/08/25/as-novas-aventuras-de-robinson-crusoe-sendo-a-segunda-e-ultima-parte-de-sua-vida-e-contando-as-estranhezas-e-surpresas-de-suas-viagens-por-tres-cantos-do-mundo-versao-co/. O autor escolheu convenientemente que o primeiro livro é a primeira metade da vida de Crusoe, e depois veio a 2ª. Mas nada o impediria de estabelecer uma tripartição, ou uma divisão em 4. Exemplos literários correlatos é o que não falta!

E devido a essa narratividade pura poucos eventos em Defoe são fruídos com densidade o bastante para deixar uma impressão permanente ou recordação intacta. Personagens como Moll ou Roxana vivem premidas pelo pão de cada dia, contando apenas consigo próprias, flutuando conforme a maré, dançando conforme a dança, apostando tudo ou nada a cada momento. Em perfeita adaptação com o mundo altamente mutante que encontram, esses sujeitos sincopam seu ritmo. Ou seja: não há um núcleo central da personalidade, tampouco, porque memórias e aprendizados estarão sempre se acumulando sem uma síntese definitiva. A identidade é uma improvisação, um cálculo, uma estratégia de passagem. Trata-se de uma cadeia de reações possíveis para cada ação promovida pelo ambiente. Os impulsos humanos – avareza, egoísmo, autopreservação – são fixos e imutáveis, é verdade, mas para sempre alcançá-los cada personagem é obrigado a ser flexível a ponto de se converter em metamorfo. A perspicácia e cautela necessárias para lidar com o tema da epidemia no Jornal do Ano da Peste seriam versões escandalosas e exageradas das próprias exigências do cotidiano para o leitor-padrão.”

O Coronel Jack se casa quatro vezes, a despeito de poder passar tranqüilamente sem mulheres, e rompe com uma delas porque ela dilapida sua fortuna. Na veia mais hobbesiana e pragmática possível, o interesse burguês é muito mais fundamental que a o altruísmo iluminista. Só mesmo caçar para comer seria mais premente que caçar para lucrar.”

O eu-narrador deslinda a trama com ar imperturbável que sugere um presente consideravelmente distanciado do passado em que o eu-narrado aparece (anos de intervalo, com toda a certeza). Este último não se pode dar ao luxo dessa parcimônia glacial do primeiro. Há uma tensão constante entre as duas dimensões temporais.”

Embora ‘Deus não esteja morto’, pareceria, a essa altura, para o bom Protestante, que Ele se recolheu deste mundo. Essa é uma das razões para as especulações de Defoe sobre a Providência ecoarem com um quê de vacilação. Ora, lembra o autor em The True-Born Englishman: ‘O que vem da Providência, consiste no interesse de todo o universo.’. Se tomarmos a frase ao pé-da-letra, estariam justificados o estupro, o assassinato, o canibalismo. Cada um desses pecados teria seu papel na manutenção da harmonia do cosmo. Defoe declama piamente no prefácio do Crusoe como devemos honrar a sabedoria da Providência e suas obras, ‘sucedam como sucedam’; mas o protagonista, muito longe de se resignar ao destino, é hiperativo e incansável na tentativa de forjar seus próprios porquês.”

De nossa perspectiva, se Crusoe devera ser punido, não seria por ter vivido a primeira metade da vida como um pagão, mas sim por vender Xury, seu servo, à escravidão brutal e por gerir uma plantation no Brasil movida a mais trabalho escravo. Na verdade, quando naufraga, ele estava justamente prestes a comprar mais mão-de-obra escrava numa expedição clandestina para abastecer seu engenho. Mas nem o personagem nem o autor conseguiriam ver tais ações como pecaminosas, ainda que Crusoe se indigne com as condições do imperialismo espanhol nas Américas. Como com o narrador de O Coração das Trevas de Joseph Conrad, o ‘imperialismo dos outros’ é sempre mais repreensível que o nosso. O Coronel Jack defende o castigo físico dos escravos, e não há qualquer indicativo de que Defoe pensasse diferente. A liberdade era para os ingleses, não para os africanos! Como zeloso puritano, Defoe decerto cria que os ‘selvagens’ estavam condenados irremediavelmente à bestialidade nesta terra, e ao tormento eterno no além. Seu radicalismo (progressismo de vanguarda na política) tinha seus claros limites.”

A Natureza não é mais um livro aberto, mas um texto obscuro a ser decifrado com imensa dificuldade. O Protestante tateia avidamente no escuro atrás de qualquer signo ambíguo de sua própria salvação. Mas o fato é que, num universo secularizado, tudo está entregue à própria contingência, isto é, nada no mundo visível quer dizer alguma coisa nem dá qualquer pista de nada.”

Signos, nesse mundo dessacralizado, como também numa profusão de textos modernistas (dali a duzentos anos), são a priori e incontornavelmente ambíguos. Essa é a razão por que o crente nunca pode parar de trabalhar, porque se não se tem certeza da salvação agora, cada dia seu de labuta pode ser o fiel na balança para a absolvição no dia do Juízo. Ilhas tropicais, é bom lembrar, estão geralmente associadas à indolência, mas não no caso de Crusoe. Ele está sempre ocupado em melhorar e estender sua ‘propriedade paradisíaca’. ‘Eu realmente gostaria de um estábulo maior.’ Tanto é assim que o próprio Crusoe responde a si mesmo, vendo o quão ilógica é essa vontade: ‘Para quê?’. Crusoe não é um capitalista de verdade – é só um de mentirinha, sem mão-de-obra como Outro, sem mercado, consumidor, produto nem competidores ou divisão de trabalho. Mas, ainda que não tenha concorrentes, ele age como se os tivesse…”

A ilha de Crusoe é menos a utopia da pequena-burguesia numa dimensão paralela do que uma versão piorada ou distópica da situação pequeno-burguesa inglesa. Ou, antes, o que uma classe sofre no mundo, Crusoe sofre na sua ilha. Sua solidão é uma versão exponencial da solidão de todos os indivíduos da cidade moderna. Sendo absolutamente dependente num sentido, é verdade que é possível ser absolutamente autodeterminado num outro. Quão enérgico e engenhoso pode-se chegar a ser na administração de seu próprio império seria um índice de sua inclusão entre a minoria eleita. Assim poder-se-ia resolver o conflito aparente entre ser o joguete de Deus e, pelo próprio suor, pregar, no melhor estilo puritano, que o sucesso no trabalho é o melhor sinal que o mundo poderá dar de que você achou favor aos olhos da divindade.”

UM PROBLEMA ISENTO DE QUAISQUER “MEMÓRIAS PÓSTUMAS”: “A narrativa está sempre precariamente ancorada no presente que é um fio de navalha, em que a sorte do personagem é indefinida e o futuro absolutamente duvidoso; mas tudo isso é contado com um tal desassossego e afastamento, fechando um passado, que empresta certa autoridade. Supomos então que o narrador sobreviveu, nem que apenas pelo fato de estar agora, com a maior das calmas, falando de si mesmo na época em que corria perigo. Ansiedade e segurança se acoplam perfeitamente na escrita.”

E assim Defoe continua a insistir que sua estória existe com um fundo moral, embora isso seja obviamente uma farsa. O realismo, no sentido de uma atenção dedicada ao mundo material por si e nele mesmo, não está ainda avalizado neste período literário, embora se encontre em visível ascensão; embora a sociedade em que ele cresce e ascende demande-o cada vez mais, e encoraje-o mais que à moralidade, pois as pessoas passam a acreditar somente no que podem cheirar, tocar, provar. Samuel Johnson argumentava que o fato de um personagem ou evento ser fidedigno à natureza não servia de desculpa para incluí-lo num enredo ou obra de arte. Na teoria, essa colisão entre o moral e o real pode ser resolvida por justificações do autor, no estilo tabloide. Quão mais gráfica e escandalosa uma estória, mais fácil transmitir uma mensagem, poder-se-ia astuciosamente argumentar. Defoe escreve no prefácio para Roxana: ‘Se há qualquer parte da história, no relato de uma má ação, que pareça descrever as coisas de forma muito direta e impudica, todo o cuidado imaginável foi tomado para purificar o trabalho de todas as indecências e indecorosidades…’. Essas linhas, ao que parece, produziam, já naquele tempo, o mesmo efeito que hoje os avisos solenes, prévios a um audiovisual, acerca da presença de sexo e violência nos minutos que seguem: são só um chamariz a mais para a audiência (‘o que é proibido é melhor’), engenhosamente acrescentado pelo autor, sem transgredir nenhuma regra.

A novela realista se torna popular num marco da história em que o cotidiano banal começa a se tornar atrativo por si mesmo. Essa mescla do ordinário e exótico é a síntese do trabalho de Defoe. Parte do prazer extraído da leitura emana da excitação que deriva do puramente mundano. Defoe viveu em tempos turbulentos, e ninguém pode dizer que ele não viveu esses tempos intensa e perigosamente. Em épocas revolucionárias, a teatralidade adquire maior importância, mesmo fora da arte. Como a nova arte imita a vida, o teatral tem de despontar também na arte. Por último: Defoe também sabia o que era sofrer uma bancarrota, ser trancafiado nas galés e embarcar em expedições insólitas das quais não se sabia se se ia voltar.”

James Joyce, que, para nossa surpresa, enumera Defoe entre seus autores prediletos, escreveu do Crusoe que ele encarna ‘todo o espírito anglo-saxão … a independência masculina; a crueldade inconsciente; a persistência; a inteligência devagar mas eficaz; a apatia sexual; a religiosidade prática e metódica; a taciturnidade calculada’. Poderíamos dizer que essa é exatamente a visão que Sexta-Feira tem de Crusoe: Joyce é um súdito colonial da coroa britânica, e com certeza, quando alistado para a guerra, combateu muitos soldados com este perfil, em Dublin. Um ou dois assim são vistos no Ulisses. A passagem acima, que Joyce redigiu enquanto no exílio italiano, tem ainda algo do genial vislumbre do caráter imperial, que era meio-compatível com Joyce (colonizado, mas ao mesmo tempo da elite, ou seja, colonizador pela ótica dos subalternos, das massas irlandesas): outro materialista, o irlandês devia apreciar a fisicalidade intensa de Defoe. Uma vez o dublinense se descreveu como tendo a mente de um verdureiro. Defoe, por sua vez, destila em sua obra o autêntico espírito de uma nação de sapateiros.”

Quem é ele, ele se pergunta no mesmo estilo hipocondríaco do devoto liberal ou do pós-modernista, para interferir com a prática do canibalismo num povo primitivo? Mas o fato de maior parte da novela tratar justamente do know-how do homem civilizado e prático empresta lentes peculiares à tese do universalismo. A racionalidade ortodoxa, no sentido de ensinar quando o importante é se preservar, como não cair de um precipício, por exemplo, é mais plausível como universalidade de todos os povos do que qualquer outro tipo de raciocínio utilitário. É por isso que Sexta-Feira pode ajudar Crusoe nos trabalhos braçais muito antes de poder falar Inglês, porque a lógica do mundo material é comum a todas as culturas. Pedras caem em ambas (a ocidental e a autótocne) porque obedecem à gravidade, seja no Haiti ou em Huddersfield; quatro mãos aplicadas sempre trabalham melhor que duas para carregar objetos pesados; alguém pode jogar-lhe uma corda para evitar que você se afogue ainda que no sistema cultural de quem jogou a corda a água simbolize algo totalmente diferente do que você aprendeu em seus dogmas e valores. A racionalidade prática é, nesse aspecto, o epítome do Anglicismo: se o gentleman chegar de fato aos céus, está na cara que examinarão o lugar com bastante escrutínio, para tirarem o melhor proveito do que ele terá a oferecer. Mas eis um tipo de comportamento, senão onipresente, pelo menos atemporal.”

Não é escassa a literatura da tradição do comerciante-criminoso e vice-versa, dos vigaristas de John Gay em A Ópera do Vagabundo ao Vautrin de Balzac e o Mr. Merdle de Dickens. Como Bertolt Brecht disse: ‘O que é roubar um banco comparado com abrir um?’. A cozinha dos ladrões é a companhia de comércio sem a ideologia da respeitabilidade. O Coronel Jack começa como um ladrão de meia-tigela e termina como um bem-sucedido capitalista na Virgínia, sem nenhum talento a mais do que quando começara sua ‘carreira’. O mestre do crime de Fielding, Jonathan Wild, é um retrato satírico do político Robert Walpole, que funde em sua figura o mundo da alta política e da contravenção chic ou do colarinho branco. A idéia de ir parar numa terra virgem e construir do zero uma civilização deve constituir uma das fantasias mais intensas para a classe média. Sem dúvida isso ajuda a justificar a permanência de Crusoe como clássico sem o menor sinal de que vá ceder o posto tão cedo.”

Ao desafiar a influência do gentil-homem e da nobreza, era necessário, para lograr êxito, desacreditar o poder da antiguidade no processo. Defoe é sardônico sobre a obsessão aristocrática com a pureza de sangue e o matrimônio: Por que – ele pergunta no Compleat English Gentleman – os nobres permitem de boa vontade que amas-de-leite plebéias amamentem seus filhos, já que, ironicamente, elas lhes estão repassando, conforme a própria teoria eugênica dos sangue-azul, um sangue degenerado? N’O Inglês Puro-Sangue ele admite explicitamente a irrelevância do tópico da ancestralidade. Destarte, é uma fantasia muito benquista pelo homem branco imaginar-se num território virgem, poder desfazer toda a história até suas origens, recomeçando-a melhor, já com a ‘classe média’ no poder.”

O MESMO EFEITO DA ESTÁTUA DA LIBERDADE NO PRIMEIRO LONGA DE PLANETA DOS MACACOS: “O que nos deixa derrotados em Robinson Crusoe, e um dos momentos mais insólitos da literatura universal, é aquela misteriosa única pegada encontrada na areia.”

Ainda assim, Robinson Crusoe segue muitos anos sem preocupações em sua ilha; O Gulliver, de Jonathan Swift, não tem a mesma sorte.”

Como Defoe, Swift escreve numa prosa prática, transparente, célere, com o perdão do trocadilho,¹ sem muita textura ou ressonância. Seu texto não possui, como um crítico bem apontou, recessos ou raízes e ramificações mil. Há uma alarmante ausência de metáforas. É um estilo da superfície, sem muita profundeza nem interioridade.² Swift desconfia de toda reflexividade textual como de toda metafísica ou especulação abstrusa. Essa indiferença à verdade filosófica nos conta algo sobre o clero do século XVIII, do qual Swift fazia parte. É quase como um ladrão de banco ser indiferente ao dinheiro. Um aristocrata tory da época de Swift era necessariamente um amador, não um especialista: acreditava num certo número necessário de princípios básicos que o século do Iluminismo vinha tornar acessíveis a todos. Swift não poderia entender, ainda que sobrevivesse a sua época, a era da prosa de gêneros especializada. As Viagens de Gulliver não são, no sentido hodierno da palavra, uma obra ‘literária’, e não teriam saído do papel se o autor pensasse em escrever uma novela. A linguagem de Swift, como a de Defoe, tenta apagar a si mesma desdobrando o real no real, e na época não havia palavra para batizar esse zero fictício. As palavras perdem o valor e privilegiam os objetos, que ocupam o centro do palco. A própria linguagem ideal que o autor imaginou – uma língua que abole a língua – é a transparência do modelo. Isso acontece entre os laputianos gramáticos que, ao invés de conversar entre si usando as cordas vocais e convenções aceitas unicamente pelo seu povo, carregam para um e outro lado uma sacola com diversos objetos que eventualmente precisem comunicar, e vão-nos mostrando ao interlocutor, desempenhando uma caricata ‘linguagem de Babel’. A verdade é que a linguagem humana é este saco, mas sem fundo e diáfano, uma forma de levar o mundo conosco sem carregar peso algum (ainda que com a inconveniência de cada povo ter a sua língua). Os Houyhnhnms evitam elaborações verbais e mantêm uma perfeita correspondência entre palavra e coisa – a tal ponto, aliás, que são incapazes de mentir. Perfeitos como são em sua representação do mundo, se houvera dentre eles um escritor, seria este capaz de produzir uma bela novela realista!”

¹ Swift em inglês é ágil, veloz.

² Sublinhei em verde porque não posso estar minimamente de acordo com Eagleton neste trecho!

As Viagens de Gulliver, muito ao contrário do Crusoe, é um libelo do ‘anti-progressismo’ em que um protagonista amnesíaco parece não aprender nada ou aprender muito pouco em cada uma de suas jornadas; assim que ele parte para uma nova aventura, volta a aparentar ser uma tabula rasa. De fato as viagens de Gulliver são mais entrecortadas que as de Crusoe. Estas, mesmo que possam ser segmentadas pelo autor em capítulos e tomos, parecem bem-costuradas narrativamente. Gulliver vive literalmente episódios desconexos um do outro. Não em vão fala-se d’As Viagens como a suprema paródia do livro de viagem, gênero literário¹ usualmente otimista e cheio de ‘lições e aprendizados’.”

¹ O leitor de minha tradução deve ter percebido que em seu afã descritivo o crítico costuma se contradizer bastante. Aqui, vemos que na verdade o europeu do século XVIII contemporâneo de Defoe e Swift já reconhecia, senão o realismo ou o romantismo, pelo menos certos gêneros literários…

O tory Swift, ao contrário do whiggiano Defoe,¹ nada quer ter a ver com indivíduos. Sua única descrição é a de uma verdade universal, enquanto Gulliver e os personagens secundários servem apenas como meios para ilustrá-la. Gulliver não passa de um dispositivo narrativo bem conveniente, não é um ‘personagem’ propriamente dito, não é possível se identificar resolutamente com ele. Crusoe é bem diferente e vai crescendo em nossa concepção conforme avançam as páginas. Gulliver apenas ‘pede’ que observemos e julguemos os lugares que ele visitou.”

¹ Ver tabelas no final.

Os lilliputianos são cruéis, gananciosos e sectários, como se fossem réplicas em miniatura dos políticos de Westminster. Esse retrato da raça humana como corrupta e imutável é típica do conservantismo anglicano swiftiano. Ele desdenha a possibilidade de qualquer progresso dramático e mudança revolucionária para melhor no campo social, e logo se vê que a tal verdade universal que ele tenta mostrar é uma só: já conhecíamos essa verdade antes de viajarmos. Deus nos deu tudo de que precisávamos logo de partida, e velejar a esmo tropeçando em criaturinhas de uma polegada ou esbarrando no tornozelo de gigantes pouco importa nesse quadro. Talvez todos os indivíduos exóticos que encontramos não passem de distrações válidas unicamente para o momento.”

Mas só sabemos que os lilliputianos são diferentes de nós porque conservamos com eles a identidade do conceito de tamanho. Chamamos tarântulas de tarântulas e não de humanos porque usamos a linguagem, pela qual descrevemos e nomeamos as tarântulas, e elas não. Se as tarântulas fossem tão alienígenas assim à espécie humana, não seria esse o caso. Não se pode falar da diferença sem a comparação e o diagnóstico de algo igual. Os únicos diferentes reais de nós são aqueles que passam invisíveis, de cócoras, bem diante do nosso nariz, e que jamais percebemos.”

A escrita de uma viagem é, mais do que antes, como se vê, um gênero muito duvidoso para um tory se engajar naquele tempo. De um livro como esse esperam-se sobretudo novidades, que são indesejáveis para os conservadores. Defoe escreveu cedo na vida um Ensaio sobre Projetos (Essay on Projects), que era o perfeito contraponto dessa ânsia de imobilismo do tory: exibia grande entusiasmo quanto às reformas técnico-científicas. Crusoe rejeita implicitamente, ao querer sair de casa, os valores benquistos pela aristocracia (o lar, a coroa, a nação). Toda essa sede mercantilista de Crusoe não parece mais do que a pornografia do progresso para muitas mentes mais estreitas ou mais clássicas. Fantasiar com monstros desconhecidos é indecoroso; tudo que não é verossímil só pode nublar nosso julgamento. Crusoe encoraja caprichos tolos e emoções extravagantes que são péssimos para a lei e a ordem. Fora que, quanto mais viaja, mais Crusoe se sente um relativista cultural, algo igualmente insidioso para um tory. Pode ser perigoso para o viajante chegar a se tornar tão sonhador e apegado a coisas estrangeiras, a ponto de bradar, por exemplo, que se deparou com selvagens que, eles sim, são felizes e vivem em harmonia com a natureza. Isso seria negar o pecado original e inspirar nas gentes utopias cândidas e pueris, coisa contra a qual se deve lutar. Além do mais, de que vale, se o aventureiro acabaria sempre voltando ao solo inglês, muito longe dessas tais utopias inúteis? As alusões anti-monárquicas e anti-establishment de tais peregrinações pareceram, em todos os tempos, muito grosseiras aos tories.

Muito do debate em curso no século XVIII girava em torno de um consenso político que pudesse superar as terríveis dissensões do século anterior, mais animoso, de guerras civis e de queda e restauração da monarquia. Swift se referiu em vida a Defoe com toda a prepotência de um patrício: ‘Aquele sujeito que foi exibido no pelourinho – esqueci o nome dele…’. Mas não podemos deixar de observar em Swift o mesmo entusiasmo pelo comércio que em Defoe. Swift é irlandês e a Irlanda estava sempre em posição mais combalida que a metrópole. Além disso, Swift também não dava crédito à teoria da pureza da raça, e gostava de se ver como um burguês em que tudo de seus antepassados já se diluíra há muito tempo, a ponto de torná-lo irreconhecível para estes. Swift foi um tory, mas um tory radical, um exemplar do animal oximorônico que muito enriqueceu a cultura inglesa se formos considerar outros escritores tories e radicais ao mesmo tempo, como William Cobbett e John Ruskin.

Defoe era ‘progressista’ e rebelde, mas chegava a delírios de esnobeza episódicos tão altaneiros que chegou a alterar seu nome de Daniel Foe para Daniel De Foe, e que hoje escrevemos Defoe. A conjunção ‘de’ implica origem nobre. Swift e autores como Pope viam a sociedade britânica como desprovida desde os primórdios de mérito congênito, uma raça venal que além de tudo foi muito corrompida pelo poder e pelo dinheiro com o passar do tempo, atributos que eles viam encarnados pelo odioso primeiro-ministro whig Robert Walpole (já comentado). Mas Defoe não deixava, idem, de criticar a obsessão cega e sem qualquer pano de fundo pelo dinheiro.

Poderíamos ver os mesmos entrelaçamentos complementares e/ou contraditórios em pares como Henry Fielding e Samuel Richardson. Richardson era filho de um carpinteiro de Derbyshire, não completou a escola básica e se tornou impressor, enquanto Fielding era um egresso do colégio de Eton repleto de conexões com figurões. Richardson tinha estilo agressivo, era um campeão das classes médias, e afirmava que o ofício do comércio ‘é infinitamente de mais conseqüência, e devia ser muito mais estimulado que qualquer outra posição ou ranking social, sobretudo as dos títulos inócuos típicas da Inglaterra’. E não obstante Richardson se punha estupefato diante da quantidade de personalidades decrépitas e mesquinhas das novelas de Fielding: chegou a afirmar que se não soubesse quem Fielding era, pensaria se tratar de um cavalariço. Fielding rebatia. Disse uma vez que Pamela de Richardson encorajava jovens aristocratas a se casarem com as camareiras de suas mamães, e que não conseguiria por nada pôr-se no lugar dos nobres de suas novelas. Com efeito, em vez de casar-se com a empregada de sua mãe, Henry Fielding casou-se, no segundo matrimônio, com a empregada de sua primeira esposa!” HA-HA-HA-HA!

O nome Gulliver está muito bem-dado, por sinal.¹ Sua credulidade é o mais das vezes seu ponto fraco. Ele de alguma forma se sente pateticamente (afetivamente) ligado a pessoas que conhece em suas viagens um tanto rápido demais, sem muito senso crítico. Em Lilliput, vangloria-se de seu título de Nardac, espécie de análogo a cavaleiro da rainha, lança-se como líder militar, envolve-se em intrigas as mais pavonescas, tendo de enfrentar um processo para provar que não cometeu fornicação com uma lilliputiana. A impossibilidade física do ato sexual entre seu corpo descomunal perto de um lilliputiano não parece ter passado ora alguma pela cabeça do réu que tentava, afobado, se defender. (…) De herói a vilão da pátria, Gulliver parece ser sempre o mesmo, tanto num pólo como noutro, levado unicamente pelas circunstâncias e vilezas dos outros personagens.”

¹ “Gullible” é bobo, ingênuo.

E a despeito do inconveniente de ser um inglês e de explorar terras tão remotas, ele é um ótimo aluno de idiomas, aprendendo rápido a falar como os nativos em suas jornadas, apesar de que isso soa mais como recurso estilístico para justificar a comunicação de Gulliver nessas praças do que uma característica que Swift gostaria de ter dado sem mais a seu protagonista. Se essa parte da personalidade de Gulliver se mostra tão expedita para se adaptar aos costumes forasteiros, sua outra metade é a de um inglês chauvinista cabeça oca, complacente e cego quanto aos defeitos dos seus conterrâneos. Seu relato visivelmente galante da história do reino britânico ao rei Brobdingnag logo produz um efeito contrário ao esperado, horrorizando-o, a ponto deste rei considerar que, se Gulliver fala mesmo a verdade, todos os bretões não passam de uns vermes.”

Ou ele é um imperialista ou um relativista cultural, sem meio-termo. A questão é que a novela serve para demonstrar a secreta afinidade entre os dois extremos. Não há tanta diferença entre defender acriticamente a Coroa inglesa ou o poder soberano de Lilliput. Se devêramos simpatizar com outras culturas, se isso fosse um imperativo, então por que não simpatizar com a própria civilização? Se devemos desculpar os canibais, por que não as grandes multinacionais que poluem a atmosfera? Se todas as culturas estão em ordem e seguem na supracitada ‘harmonia cósmica’, então na realidade não há nada o quê escolher, e nenhum indício de que os brobdingnaguianos seriam superiores, em qualquer sentido, aos ingleses.”

Swift com certeza conhecia o que era preconceito: difamador dos bons, satirista vituperador altamente imaginativo e polemista de vocação, capaz de ignorar a verdade só para terminar com a razão, acabava inadvertidamente por levantar a bandeira da intolerância política e religiosa. Se a sátira de Fielding é genial, a de Swift é tão brusca e amalucada em contraste que parece até semipatológica. Ele era misógino, autoritário, troçador da canalha, e acima de tudo um representante da Irlanda de seu tempo, isto é, a colônia inglesa que era quase um pária e que, caso houvesse uma corrida entre todos os povos colonizados pela Inglaterra decerto não chegaria em primeiro lugar, no juízo inglês. Eis aqui, outra vez, o incômodo e involuntário papel ambíguo de diplomata e capataz, exercido, como vimos, por James Joyce.”

Enfim, o que As Viagens parece querer ensinar? Que você deveria apreciar todas as culturas humanas em sua parcialidade, sem ser um Gulliver, mas também sem recair no niilismo. Homens e mulheres precisam cultivar ideais, como as virtudes plácidas e racionais dos Houyhnhnms, caso queiram ser mais do que reles materialistas. O problema é deixar que esses ideais exerçam um papel predatório na própria consciência. Isso seria ser tão ao revés de um materialista que representaria a negação do próprio corpo, tão ruim quanto a falta de ideais. Não se deve chegar a esse ponto, o de perceber-se com desgosto por causa do Outro. Não se conformar inteiramente com o próprio corpo, é certo, mas nem por isso chegar a reprimi-lo.”

Se não fosse por terem 4 patas e cauda, os Houyhnhnms talvez não estivessem totalmente fora do lugar num salão janeausteniano, tomando chá com Mr. Knightley. Mas convenhamos que este é o ponto: os Houyhnhnms são menos uma possibilidade humana do que, como um ensaísta bem colocou, uma impossibilidade insultante.”

Qual perspectiva é a correta? Difícil responder na época em que inventaram o microscópio. Quão distanciado ou aproximado dos fatos você precisa estar para vê-lo ‘direito’? O que se vê na lente de um microscópio é a verdade ou a distorção da verdade?”

Os novelistas do Dezoito, tendo estabelecido uma distância do mundo romanesco, estão a maior parte das vezes cônscios de que a crença no fato nu e cru é tão mítica quando o próprio ideal do Romance. A novela, sendo a forma literária que é, nada pode fazer no tocante a decidir qual perspectiva é mais ‘verdadeira’, embora exerça um importante papel na definição do ‘mundo real’. Gulliver é um empiricista ultimado ou crente no fato bruto, um ponto de vista que anda de mãos dadas com seu interesse ‘progressista’ nos problemas técnicos e mecânicos (em contraponto ao próprio Swift, parecendo-se, desse ângulo, uma reedição de Crusoe). Ele é um exemplar do ‘novo homem’: cabeça-dura, ou melhor, obstinado, pragmático, aposta todas as suas fichas na religião chamada progresso, é fascinado por esquemas quiméricos e projetos de reforma social, ansioso por galardoar sua narrativa em primeira pessoa com mapas e provas documentais que para ele atestam a veracidade absoluta do que observa nas nações forasteiras.”

Mas Swift não nos brinda com uma solução ao dilema fundamental. Ele desaparece de vista e dá espaço para o leitor lidar com as contradições postas. É da natureza de sua sátira deixar de propor qualquer resposta construtiva – em parte porque um gentleman não carece de se envolver com esses problemas, ninharia de pequeno-burguês; e em parte porque qualquer solução logo se denunciaria como parcial.”

Swift e Defoe escrevem ambos numa sociedade que acredita na verdade, na razão e na justiça teóricas, mas cuja conduta contumaz se tornou tão falsa, injusta e irracional que já não é possível acreditar em nenhum indivíduo na prática.”

Se ‘primitivos’ como os irlandeses (que não são civilizados como os ingleses, ainda) e os aborígenes do Pacífico Sul forem realmente Yahoos, parece que isso justificaria o imperialismo britânico. Mas se os Yahoos são a humanidade inteira, então os colonizadores são (metaforicamente) bestiais e vivem também cobertos de fezes, o que suprime qualquer direito de soberania que tanto se arrogam. Por esta via, o colonialismo se torna uma questão de um bando de selvagens hipócritas liderando outros selvagens, não-hipócritas. Os mestres seriam tão imprestáveis quanto os súditos – uma opinião que, n’O Coração das Trevas, desautoriza qualquer colonialismo mas confirma, ainda, alguns de seus preconceitos (sim, os nativos são mesmo uns imprestáveis).”

Yahhoo boss (Quintanilla)
O chefe Yahoo

No fim, o que cavalos pensam de nós não é o suficiente para nos rotular como Houyhnhnms nem Yahoos – exceto, talvez, para os antepassados dos nobres anglo-irlandeses, para quem era regra amar um cavalo mais do que seus entes queridos, quem dirá o povão.”

comparison gulliver vs crusoe
comparison swift vs defoe

GLOSSÁRIO PSICANALÍTICO ou A FANTÁSTICA FÁBRICA DE CASOS ou ainda “NOVELA DAS NOJEIRAS E SUJIDADES DAS BIOGRAFIAS DOS PSICANALISTAS ATÉ AQUI (2001, por falta de dados mais atuais)”

considerações preliminares (Roud. & Plon)

a terminologia analítica dá uma impressão insólita que a língua de Freud não dá, se os recursos da língua do tradutor não (sic) forem sempre explorados; em outros casos é a simplicidade da expressão freudiana que torna imperceptível o seu tecnicismo.” “O método conveniente é antes de mais nada histórico-crítico, como o do Vocabulaire technique et critique de la philosophie, de André Lalande. Eram estas as intenções iniciais quando, por volta de 1937-39, se começou a executar o projeto de um vocabulário da psicanálise. Os dados recolhidos perderam-se”

a oposição entre <pulsão> e <instinto>, necessária para a compreensão da teoria psicanalítica, em nenhum lugar é formulada por Freud: a oposição entre <escolha por apoio> de objeto (ou anaclítica) e <escolha narcísica de objeto>, embora retomada pela maior parte dos autores, nem sempre é relacionada com aquilo que em Freud a esclarece: o <apoio> ou <anáclise> das <pulsões sexuais> sobre as funções de <auto-conservação>; a articulação entre <narcisismo> e <auto-erotismo>, sem a qual não se pode situar estas duas noções, perdeu rapidamente a sua primitiva nitidez, e isto até no próprio Freud.”

Psicanalistas não batem cabeça.

O primeiro dicionário de psicanálise, intitulado Handwörterbuch der Psychoanalyse, foi elaborado por Richard Sterba, entre 1931 e 1938. Foram publicados cinco fascículos, até o momento em que a ocupação da Áustria pelos nazistas pôs fim ao empreendimento. A intenção era compor um léxico geral dos termos freudianos, um vocabulário mais do que um recenseamento dos conceitos: <Não desconheço, escreveu Freud em uma carta a seu discípulo, que o caminho que parte da letra A e passa por todo o alfabeto é muito longo, e que percorrê-lo significaria para você uma enorme carga de trabalho. Assim, não o faça, a menos que se sinta internamente levado a isso. Apenas sob o efeito desse impulso, mas certamente não a partir de uma incitação externa!>” “Em sua famosa análise do caso Dora (Ida Bauer), ele frisava que um dicionário é sempre objeto de um prazer solitário e proibido, no qual a criança descobre, à revelia dos adultos, a verdade das palavras, a história do mundo ou a geografia do sexo.” “Sterba interrompeu a redação do seu Handwörterbuch na letra L, e a impressão do último volume na palavra Grössenwahn: <Não sei, declarou vinte anos depois em uma carta a Daniel Lagache, se esse termo se refere à minha megalomania ou à de Hitler.> De qualquer forma, o Handwörterbuch inacabado serviu de modelo para as obras do gênero, todas publicadas na mesma data (1967-1968), em uma época em que o movimento psicanalítico internacional, envolvido em rupturas e dúvidas, experimentava a necessidade de fazer um balanço e recompor, através de um saber comum, a sua unidade perdida. Diversas denominações foram utilizadas: GLOSSÁRIO, dicionário, enciclopédia, vocabulário.” “o Critical Dictionary of Psychoanalysis (600 verbetes) do psicanalista inglês Charles Rycroft, claro, conciso e racional, tinha a vantagem de não ser uma obra coletiva. (…) Rycroft foi também o primeiro a pensar o freudismo sem com isso deixar de considerar a terminologia pós-freudiana (especialmente a de Melanie Klein e de Donald Woods Winnicott).”

Quanto ao célebre Vocabulário da psicanálise(417 verbetes) de Jean Laplanche e Jean-Bertrand Pontalis, foi o primeiro e único a estabelecer os conceitos da psicanálise encontrando as <palavras> para traduzi-los, segundo uma perspectiva estrutural aplicada à obra de Freud. Composto de verdadeiros artigos (de 20 linhas a 15 páginas), e não de curtas notas técnicas, como os precedentes, inaugurou um novo estilo, optando por analisar <o aparelho nocional da psicanálise>, isto é, os conceitos elaborados por esta para <explicar suas descobertas específicas>. Marcados pelo ensino de Lacan e pela tradição francesa da história das ciências, os autores conseguiram a proeza de realizar uma escrita a duas vozes, impulsionada por um vigor teórico ausente nas outras obras. É a essas qualidades que ela deve seu sucesso.

Os insucessos terapêuticos, a invasão dos jargões e das lendas hagiográficas levaram a uma fragmentação generalizada do movimento freudiano, deixando livre curso à ofensiva fin-de-siècle das técnicas corporais. Relegada entre a magia e o cientificismo, entre o irracionalismo e a farmacologia, a psicanálise logo tomou o aspecto de uma respeitável velha senhora perdida em seus devaneios acadêmicos. O universalismo freudiano teve então o seu crepúsculo, mergulhando seus adeptos na nostalgia das origens heróicas.” Ó! “apareceram monstros polimorfos [Cilas], com entradas anárquicas e profusas, nas quais a lista dos verbetes, artigos e autores estendia-se infinitamente, pretendendo esgotar o saber do mundo, sob o risco de mergulhar as boas contribuições em um terrível caos.” Ver Bouvard e Pécuchet, de Flaubert!

Foram incluídos, enfim, os membros da família de Sigmund Freud, seus mestres diretos, os escritores e artistas com os quais ele manteve correspondência importante ou contato pessoal determinante, [PARTE DA FOFOCA E BASTIDORES] e os 23 livros por ele publicados entre 1891 e 1938, inclusive o segundo, escrito com Josef Breuer (Estudos sobre a histeria), e o último, inacabado e publicado a título póstumo (Esboço de psicanálise). Foi acrescentada uma outra obra póstuma, O presidente Thomas Woodrow Wilson, da qual Freud redigiu apenas o prefácio, mas à qual deu contribuição essencial como co-autor ao lado de William Bullitt.”

ABREVIATURAS BIBLIOGRÁFICAS

ESB Sigmund Freud, Edição Standard Brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, 24 vols., Rio de Janeiro, Imago, 1977

GW Sigmund Freud, Gesammelte Werke, 17 vols., Frankfurt, Fischer, 1960-1988

IZPInternationale ärztlische Zeitschrift für Psychoanalyse

IJP International Journal of Psycho-Analysis

OC Sigmund Freud, Oeuvres complètes, 21 vols., Paris, PUF, em preparação desde 1989

SE The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud, org. James Strachey, 24 vols., Londres, Hogarth Press, 1953-1974

INÍCIO DO GLOSSÁRIO PROPRIAMENTE DITO, EM ORDEM ALFABÉTICA (ver BIBLIOGRAFIA-BASE e RECOMENDAÇÕES DE LEITURA ao final)

a posteriori ou ação diferida ou só-depois

O termo nachträglich é de uso repetido e constante em F., que muitas vezes o emprega sublinhado. Encontramos também a forma substantivada Nachträglichkeit

Segundo Jung, o adulto reinterpreta o seu passado nas suas fantasias, que constituem outras tantas expressões simbólicas dos seus problemas atuais. (…) meio de fugir das <exigências da realidade> presente” Vinculação com os estratos de Reich.

F. pergunta: por que o recalque incide preferencialmente sobre a sexualidade? (…) O primeiro acontecimento no tempo é constituído por uma cena sexual (sedução por um adulto), mas que não tem então para a criança significação sexual. O segundo apresenta certas analogias, que podem ser superficiais; mas, pelo fato de que nesse meio tempo surgiu a puberdade, a emoção sexual é possível, emoção que o sujeito ligará conscientemente a este segundo acontecimento, quando na realidade é provocada pela recordação do primeiro. (…) O ego utiliza então o recalque, modo de <defesa patológica>”

A tradução como “ação diferida”, em português e inglês, é hoje considerada anacrônica e indutora de confusão. Hoje: complemento ao verbete ab-reação.

ab-reação

#Autorreferente #facebookCasosdeFamília

Tudo menos os anos de zumbi (2009-2011)! Tudo menos o passado e o futuro remotos (o Ceará e a Soneca dos mortos)! Tudo menos o gelo do zero absoluto a que cheguei nestas incríveis zonas temporais que hoje me são estranhas, como se pertencessem a séculos enterrados pela humanidade, cujas vicissitudes ficaram sem registros. Postura que eu classificaria hoje como Anti-Ed***d****. A cura do Vanigracismo. Son of Netherrealm, aiming the Ascension. Thorns and Aborted Trees. You shouldn’t needa drink to kill or exorcize some painful devils… Foda-se a SOMAtória de suas vãs probabilidades…

A persistência do afeto que se liga a uma recordação depende de diversos fatores, e o mais importante deles está ligado ao modo como o sujeito reagiu a um determinado acontecimento. Esta reação pode ser constituída por reflexos voluntários e involuntários, pode ir das lágrimas à vingança. Se tal reação for suficientemente importante, grande parte do afeto ligado ao acontecimento desaparecerá. Se essa reação for reprimida(unterdrückt), o afeto se conservará ligado à recordação.”

A ab-reação é o caminho normal” “a ab-reação pode ser secundária, provocada pela psicoterapia catártica, que permite ao doente rememorar e objetivar pela palavra o acontecimento traumático, e libertar-se assim do quantum de afeto que o tornava patogênico.” TABU É O TEU CU: Verbalizar a morte do próximo. A maior burrice é ser inteligente o tempo todo. Em briga de condomínio de homens das cavernas não se usa terno e gravata nem se apara barba. Às vezes cagar nas calças é, sim, o melhor remédio. Uma ventilada brutal ou cem azias, tu escolhes – que fria! Vaso entupido, contanto que não seja o meu, é merda na cu da pimenta, ehr, quer dizer… Eu não levo desaforo pra casa: deixo debaixo da ponte mesmo…

AB-NEGADO AB-O-TO-‘ADO OR ÍGIDO FREE-GIDON (MICE MARINEER-BIKERS)

CRACK CRACK CRACK! SHRECK!

ranço

abraço

dinasTIA

Jardimdim fancyn’

Socorro!

Carolíngia

do Papado

ad-block

ab-rock

ad odd world Helenistic Hell flows like an

Hell-aclitean pseudorriver

on that party that’s over

DAD

DED

HA-DAD-É O NOVO PRES-

O? PREÇO DO SENTIMENTO SUFO

CADO

PRESIDENTE DO BRASIL

S’Il y a fascists…

we’re gonna smash them

with all your heavy solos

and boots

but

le but qui est

faire le but

ter in the br…

lay down and d,…

abread

abreact

acts

ontology

AUTOANALstesia

on the

me,ta

metatable

constance

exis’

nstância-do-querer

rot

rough

road

frog

bog

jog

mob

throat

float

at

the

flow

frown

but not

nut bot

drown’d.

into the dust

in to d dãs

in 2 they do

us

estou tenso, logo fezes muito tudo ISSO

to be or not to be oh honey

sterile

barking at the moon

As 3 histerias antigas (retenções de reação):

a) limitação psicofisiológica (pavor, estado hipnótico) HISTERIA HIPNÓIDE

b) limitação social atual HISTERIA DE RETENÇÃO (sovina de MERDA)

c) repressão consciente voluntária (conscientemente esquecer!) HISTERIA DE DEFESA (é o pior ataque?! – eu diria, antes, MÁ-FÉ)

OBS: “a” e “b” foram “extintas”.

Abraham, Karl

nome indissociável da história da grande saga freudiana. (…) pioneiro no desenvolvimento da psicanálise em Berlim. (…) Elaborou uma teoria dos estágios inspirado em Klein, que foi sua aluna. Formou muitos analistas, entre os quais Helene Deutsch, Edward Glover, Karen Horney, Sandor Rado, Ernst Simmel.”

Em 1906, casou-se com Hedwig Bürgner. Tiveram dois filhos. Abraham analisou sua filha Hilda (1906-1971), descrevendo o caso em um artigo de 1913, intitulado A pequena Hilda, devaneios e sintomas em uma menina de 7 anos.

Mais clínico do que teórico, Abraham escreveu artigos claros e breves, nos quais domina a observação concreta. Devem-se distinguir três épocas. Entre 1907 e 1910, dedicou-se a uma comparação entre a histeria e a demência precoce (que ainda não era chamada esquizofrenia) e à significação do trauma sexual na infância. Durante os dez anos seguintes, estudou a psicose maníaco-depressiva, o complexo de castração na mulher e as relações do sonho com os mitos. Em 1911, publicou um importante estudo sobre o pintor Giovanni Segantini (1859-1899), atingido por distúrbios melancólicos. Em 1912, redigiu um artigo sobre o culto monoteísta de Aton, do qual Freud se serviria em Moisés e o monoteísmo, esquecendo de citá-lo. Enfim, durante o terceiro período, descreveu os três estágios da libido: anal, oral, genital.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Karl Abraham, Oeuvres complètes, 2 vols. (1965), Paris, Payot, 1989;

Hilda Abraham, Karl Abraham, biographie inachevée, Paris, PUF, 1976.

Adler, Alfred (1870-1937)

Adler, primeiro grande dissidente da história do movimento psicanalítico,¹ nasceu em Rudolfsheim, subúrbio de Viena, em 7 de fevereiro de 1870. Na verdade, nunca aderiu às teses de Sigmund Freud, de quem se afastou em 1911, sem ter sido, como Carl Gustav Jung, seu discípulo privilegiado. (…) Ambos eram judeus e vienenses, ambos provinham de famílias de comerciantes que nunca conheceram realmente o sucesso social. Adler freqüentou o mesmo Gymnasium que Freud e fez estudos de medicina mais ou menos idênticos aos seus. Entretanto, originário de uma comunidade de Burgenland, era húngaro, o que fazia dele cidadão de um país cuja língua não falava. Tornou-se austríaco em 1911 e nunca teve a impressão de pertencer a uma minoria ou de ser vítima do anti-semitismo.

Segundo de 6 filhos, tinha saúde frágil, era raquítico e sujeito a crises de falta de ar. Além disso, tinha ciúme do irmão mais velho, que se chamava Sigmund, e com quem teve uma relação de rivalidade permanente, como a que teria mais tarde com Freud.” Vira-se para o Marxismo.

¹ Uma estátua para o rapaz já!

Em 1897, casou-se com Raissa Epstein, filha de um comerciante judeu originário da Rússia. A jovem pertencia aos círculos da intelligentsia e propalava opiniões de esquerda que a afastavam do modo de vida da burguesia vienense, em que a mulher devia ser antes de tudo mãe e esposa. Através dela, Adler freqüentou Léon Trotski (1879-1940) e depois, em 1908, foi terapeuta de Adolf Abramovitch Ioffe (1883-1927), futuro colaborador deste no jornal Pravda.

Em 1898, publicou sua primeira obra, Manual de higiene para a corporação dos alfaiates. Nela, traçava um quadro sombrio da situação social e econômica desse ofício no fim do século: condições de vida deploráveis, causando escolioses e doenças diversas ligadas ao uso de tinturas, salários miseráveis, etc.”

Em 1902, depois de ficar conhecendo Freud, começou a freqüentar as reuniões da Sociedade Psicológica das Quarta-Feiras, fazendo amizade com Wilhelm Stekel.” “Foi nessa data (1909) que começaram a se manifestar divergências fundamentais entre suas posições e as de Freud e seus partidários. Elas constam das Minutas da Sociedade, transcritas por Otto Rank e editadas por Hermann Nunberg.” “Freud começou então a criticar o conjunto das posições de Adler, acusando-o de se apegar a um ponto de vista biológico, de utilizar a diferença dos sexos em um sentido estritamente social e, enfim, de valorizar excessivamente a noção de inferioridade. Hoje, encontra-se a concepção adleriana da diferença dos sexos entre os teóricos do gênero (gender).” “Adler estava edificando uma psicologia do eu, da relação social, da adaptação, sem inconsciente nem determinação pela sexualidade.” “A noção de órgão inferior já existia na história da medicina, em que muitos clínicos observaram que um órgão de menor resistência sempre podia ser o centro de uma infecção. Adler transpunha essa concepção para a psicologia, fazendo da inferioridade deste ou daquele órgão em um indivíduo a causa de uma neurose transmissível por predisposição hereditária. Segundo ele, era assim que apareciam doenças do ouvido em famílias de músicos ou doenças dos olhos em famílias de pintores, etc.” Doenças do estômago em famílias retirantes?

A ruptura entre Freud e Adler foi de uma violência extrema, como mostram as críticas recíprocas que trocaram 35 anos depois. A um interlocutor americano que o questionava sobre Freud, Adler afirmou, em 1937, que <aquele de quem nunca fôra discípulo era um escroque astuto e intrigante>. Por sua vez, informado da morte de seu compatriota, Freud escreveu estas palavras terríveis em uma célebre carta a Arnold Zweig: <Para um rapaz judeu de um subúrbio vienense, uma morte em Aberdeen é por si só uma carreira pouco comum e uma prova de seu progresso. Realmente, o mundo o recompensou com generosidade pelo serviço que ele lhe prestou ao opor-se à psicanálise.>” “Foi preciso esperar pelos trabalhos da historiografia erudita, principalmente os de Henri F. Ellenberger e os de Paul E. Stepansky, para se formar uma idéia mais exata da realidade dessa dissidência.”

Em 1912, publicou O temperamento nervoso, em que expôs o essencial da sua doutrina, e um ano depois fundou a Associação para uma Psicologia Individual, com ex-membros do círculo freudiano, entre os quais Carl Furtmuller (1880-1951) e David Ernst Oppenheim (1881-1943).”

Em 1930, recebeu o título de cidadão de Viena, mas 4 anos depois, pressentindo que o nazismo dominaria a Europa inteira, pensou em emigrar para os Estados Unidos.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Alfred Adler, La Compensation psychique de l’état d’infériorité des organes (1898), Paris, Payot, 1956;

Manès Sperber, Alfred Adler et la psychologie individuelle (1970), Paris, Gallimard, 1972.

abstinência

É em 1915, ao se interrogar sobre qual deve ser a atitude do psicanalista confrontado com as manifestações da transferência amorosa, que Sigmund Freud fala pela primeira vez da regra de abstinência. Esclarece que não pretende evocar apenas a abstinência física do analista em relação à demanda amorosa da paciente, mas o que deve ser a atitude do analista para que subsistam no analisando as necessidades e desejos insatisfeitos que constituem o motor da análise.

Para ilustrar o caráter de tapeação de que se revestiria uma análise em que o analista atendesse às demandas de seus pacientes, Freud evoca a anedota do padre que vai dar os últimos sacramentos a um corretor de seguros descrente: ao final da conversa no quarto do moribundo, o ateu não parece haver se convertido, mas o padre contratou um seguro.”

o tratamento psicanalítico deve, <tanto quanto possível, efetuar-se num estado de frustração e abstinência>. Mas F. deixa claro que não se trata de proibir tudo ao paciente e que a abstinência deve ser articulada com a dinâmica específica de cada análise. Este último esclarecimento foi progressivamente perdido de vista, assim como se esqueceu a ênfase depositada por Freud no caráter incerto da satisfação a longo prazo. O surgimento de uma concepção pedagógica e ortopédica do tratamento psicanalítico contribuiu para a transformação da regra de abstinência em um conjunto de medidas ativas e repressivas, que visam fornecer uma imagem da posição do analista em termos de autoridade e poder.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Sigmund Freud, “Observações sobre o amor transferencial”, (1915), ESB, XII, pp. 208-21. (artigo)

afaniseou afânise

Termo introduzido por Ernest Jones (Early Development of Female Sexuality, 1927); desaparecimento do desejo sexual. Segundo este autor, a afanise seria, nos 2 sexos, objeto de um temor mais fundamental que o temor da castração.”

afeto

O afeto é a expressão qualitativa da quantidade de energia pulsional e das suas variações.” Mais tarde, ainda em Freud (muito confuso): “O afeto é aí definido como a tradução subjetiva da quantidade de energia pulsional. Freud distingue aqui nitidamente o aspecto subjetivo do afeto e os processos energéticos que o condicionam.”

LINK COM #Ab-reação: “Somente quando a evocação da recordação provoca a revivescência do afeto que estava ligado a ela na origem é que a rememoração encontra a sua eficácia terapêutica.”

O mundo como afeto & representação (não existe afeto inconsciente)

Sub-espécies de estados do afeto dinâmico:

a) transformação (ansiedade, depressão)

b) deslocamento (obsessão, paranóia)

c) conversão (histeria)

(Classificação tripartite provavelmente tão obsoleta quanto aquela da histeria enumerada no verbete ab-reação.)

afonia

Perda mais ou menos considerável da força e da clareza da voz.”

afonia”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, http://dicionario.priberam.org/afonia [consultado em 05-10-2018].

agressão

a hipótese de uma <pulsão de agressão> autônoma, emitida por Adler logo em 1908, foi durante muito tempo recusada por Freud” Normal.

…o doente no decorrer de outros tratamentos só evoca transferências ternas e amigáveis em favor da sua cura […]. Na psicaná., em contrapartida, todas as moções, incluindo as hostis, devem ser despertadas, utilizadas pela análise ao se tornarem conscientes.” F.

Um-dois abismo(s) entre o dever e o poder e o ser, hehe!

Os 3 tipos de chistes (e lá vamos nós de novo com esse de TRÊS TIPOS DE…):

a) o ingênuo (o chiste pelo chiste)

b) o hostil (agressivo, negro, defensivo)

c) o obsceno (???)

Alemanha

Sem o advento do nazismo, que a esvaziou da quase totalidade de seus intelectuais e eruditos, a Alemanha teria sido o mais poderoso país de implantação da psicanálise. Se fosse necessário comprovar essa afirmação, bastariam os nomes de seus prestigiosos fundadores, que se naturalizaram americanos, quando não morreram antes de poder emigrar: Karl Abraham, Max Eitingon, Otto Fenichel, Ernst Simmel, Otto Gross, Georg Groddeck, Wilhelm Reich, Erich Fromm, Karen Horney.”

Tratada de <psiquiatria de dona de casa> pelos meios da medicina acadêmica, a psicanálise foi mal-aceita pelos grandes nomes do saber psiquiátrico, e principalmente por Emil Kraepelin. Reprovavam o seu estilo literário e a sua metapsicologia, embora Freud tivesse assimilado em seus trabalhos uma parte importante da nosologia kraepeliniana. Entretanto, foi mesmo no campo do saber psiquiátrico que ela acabou por ser reconhecida, graças à ação de alguns pioneiros.”

No nível universitário, a resistência se manifestou de modo mais determinado. Como sublinha Jacques Le Rider, <a psicologia alemã construíra a sua reputação sobre a pesquisa em laboratório, sobre um método científico do qual a física e a química eram o modelo ideal, e cujo espírito positivo pretendia banir qualquer especulação, reconhecendo apenas um saber sintético: a biologia>. A escola alemã de psicologia reagiu contra a Naturphilosophie do século XIX, essa ciência da alma que florescera na esteira do romantismo e de que se nutriam os trabalhos freudianos.Thomas Mann seria um dos poucos a reconhecer o valor científico desse freudismo julgado excessivamente literário pelos psicólogos universitários.

No campo da filosofia, a psicanálise passava por ser aquele <psicologismo> denunciado por Edmund Husserl desde seus primeiros trabalhos. Assim, ela foi criticada em 1913 por Karl Jaspers (1883-1969) em uma obra monumental, Psicopatologia geral, que teve um grande papel na gênese de uma psiquiatria fenomenológica, principalmente na França, em torno de Eugène Minkowski, de Daniel Lagache e do jovem Jacques Lacan. Em 1937, Alexander Mitscherlisch tentou convencer Jaspers a modificar a sua opinião, mas chocou-se com a hostilidade do filósofo, que manteve-se surdo aos seus argumentos.”

Três congressos se realizaram em cidades alemãs: Nuremberg em 1910, onde foi criada a International Psychoanalytical Association (IPA), Weimar em 1911, do qual participaram 116 congressistas, Munique em 1913, quando se consumou a partida de Jung e seus partidários. Um ano depois, Freud pediu a Abraham que sucedesse a Jung na direção da IPA.”

Centro da divulgação clínica, Berlim continuava sendo pioneira de um certo conservadorismo político e doutrinário. E foi Frankfurt que se tornou o lugar da reflexão intelectual, dando origem à corrente da <esquerda freudiana>, sob a influência de Otto Fenichel, e à instituição do Frankfurter Psychoanalytisches Institut.” “Institut für Sozialforschung (…) Núcleo fundador da futura Escola de Frankfurt, esse instituto de pesquisas sociais fundado em 1923 originou a elaboração da teoria crítica, doutrina sociológica e filosófica que se apoiava simultaneamente na psicanálise, na fenomenologia e no marxismo, para refletir sobre as condições de produção da cultura no seio de uma sociedade dominada pela racionalidade tecnológica.”

Muito se disse, como sabemos, que o seu método original correspondia essencialmente à natureza da burguesia muito refinada de Viena, na época em que ele foi concebido. Claro que isso é totalmente falso em geral, mas mesmo que houvesse um grão de verdade isso em nada invalidaria a obra de Freud. Quanto maior for uma obra, mais estará enraizada em uma situação histórica concreta.”Horkheimer

Em 1930, graças à intervenção do escritor Alfons Paquet (1881-1944), a cidade concedeu a Freud o prêmio Goethe. Em seu discurso, lido por sua filha Anna, Freud prestou homenagem à Naturphilosophie, símbolo do laço espiritual que unia a Alemanha à Áustria, e à beleza da obra de Goethe, segundo ele próxima do eros platônico encerrado no âmago da psicanálise.

Depois da ascensão de Hitler ao poder, Matthias Göring, primo do marechal, decidido a depurar a doutrina freudiana de seu <espírito judaico>, pôs em prática o programa de <arianização da psicanálise>, que previa a exclusão dos judeus e a transformação do vocabulário. Rapidamente, conquistou as boas graças de alguns freudianos, dispostos a se lançarem nessa aventura, como Felix Boehm e Carl Müller-Braunschweig, aos quais se reuniram depois Harald Schultz-Hencke e Werner Kemper. Nenhum deles estava engajado na causa do nazismo. Membros da DPG e do BPI, um freudiano ortodoxo, o segundo adleriano e o terceiro neutro, simplesmente tinham ciúme de seus colegas judeus. Assim, o advento do nacional-socialismo foi para eles uma boa oportunidade de fazer carreira.

ambivalência

Ver também OBJETO (“BOM” E “MAU”).

#OFFTOPICFILOSOFAL É Além do Bem e do Mal a superação do princípio da não-contradição ou apenas uma solução guiada por este princípio? Pegadinha do Mallandgenstein.

anáclise ou apoio

[Devido a divergências de traduções ou simplesmente à incompetência da teoria,] o conceito de Anlehnungnão foi nitidamente apreendido pelos leitores de Freud.” “em francês o substantivo anaclise (anáclise), que traduziria Anlehnung, não é admitido. (…) os autores deste Vocabulário propuseram como equivalente étayage (apoio)”

Trata-se do momento de escolha do primeiro objeto de amor (paixão). A famosa necessidade do supérfluo(encobridor).

Parece que, até hoje, a noção de apoio não foi plenamente apreendida na obra de Freud; quando vemos intervir esta noção, é quase sempre na concepção de escolha de objeto, que longe de defini-la por inteiro, supõe que ela esteja no centro de uma teoria das pulsões.

O seu sentido principal é estabelecer uma [diferença entre as pulsões de autoconservação e o nascimento das pulsões sexuais e auxiliar na compreensão entre a separação entre desenvolvimento da heteronomia e autoerotismo ou narcisimo].” Apoio Exterior

anaclítica, depressão (Klein)

É um tipo de depressão passível de desenvolvimento já em bebês. Poder-se-ia chamar de “desmame traumático” que não foi satisfatoriamente reposto. É estruturalmente oposta à depressão adulta. = HOSPITALIZAÇÃO de ROUDINESCO. O verbete vem de René Spitz (The Psycho-Analytic Study of the Child; La première année de la vie de l’enfant).

análise didática

O ensino formal da psicanálise para a formação do profissional clínico, que inclui a análise propriamente dita do inconsciente do paciente-aprendiz.

Sobre o mito da autoanálise (a 1ª análise didática feita dentro da psicanálise, necessariamente, pelo Pai da disciplina): só Freud? Ou o mesmo afirmara, num congresso, que seria pré-requisito para o exercício da profissão? Respostas mais adiante, nos IMPERDÍVEIS CAPÍTULOS VERBORRÁGICOS DESTA SAGA, amigos!

F. presta homenagem à escola de Zurique por ter <…apresentado a exigência segundo a qual quem quiser praticar análises sobre outros deve 1º submeter-se a uma análise realizada por alguém com experiência>.” Experiência é relativa, diria seu mentor na Filosofia…

Foi em 1922, no Congresso da Associação Psicanalítica Internacional, 2 anos após a fundação do Instituto de Psicanálise de Berlim, que se apresentou a exigência da análise didática para todo e qualquer candidato a analista.”

Para resistir firmemente a essa investida geral do paciente, é preciso que o analista também tenha sido plena e completamente analisado. (…) muitas vezes se julga suficiente que um candidato passe um ano familiarizando-se com os principais mecanismos naquilo a que se chama a sua análise didática. Quanto ao seu progresso ulterior, confia-se no que virá a aprender no decorrer da própria experiência. (…) enquanto nem todos os empreendimentos com fins terapêuticos precisam ser levados até a profundidade quando falamos de uma terminação consumada da análise, o próprio analista deve conhecer e controlar mesmo as fraquezas mais secretas do seu caráter, e isto é impossível sem uma análise plenamente acabada.” Ferenczi

Hmmm… Que torre de Babel não temos aqui!

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Balint, Sobre o sistema de formação psicanalítica

análise direta

Espécie de “análise intensiva” para casos de psicose. Inimiga, portanto, do princípio freudiano de abstinência.

o paciente sente-se compreendido por um terapeuta ao qual atribui a compreensão todo-poderosa de uma mãe ideal; tranqüiliza-se com palavras que visam o conteúdo infantil das suas angústias mostrando a inanidade delas.” Tem-se por base que na terapia para o neurótico a postura do psicanalista tem de ser muito mais neutra. A teoria de base que sustenta essa metodologia é a de que o psicótico é necessariamente aquela criança que sofreu a influências de uma mãe perversa.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Rosen, Direct Analysis

análise existencial (Daseinanalyse)

Entre os adeptos franceses da análise existencial encontramos Eugène Minkowski, o Jean-Paul Sartre de O ser e o nada [Hm… muito mais na persona literária…] e o jovem Michel Foucault (até 1954). (…) Na Grã-Bretanha, é essencialmente em Ronald Laing que encontramos a temática existencial.” how LAING will this treatment take?

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Viktor Frankl, La Psychothérapie et son image de l’homme, Paris, Resma, 1970.

Andersson, Ola

Pioneiro da historiografia erudita, Ola Andersson teve um destino curioso no movimento freudiano. O único livro que escreveu, publicado em 1962 com o título anglófono de Studies in the Pre-history of Psychoanalysis. The Etiology of Psychoneuroses (1886-1896) [ver versão francesa nas indicações de leitura], foi completamente ignorado na Suécia nos meios psicanalíticos, embora seu autor ocupasse funções acadêmicas importantes e fosse responsável pela tradução sueca das obras de Sigmund Freud. [!]”

No seu próprio trabalho, Andersson empreendeu então a primeira grande revisão de um caso princeps dos Estudos sobre a histeria: o caso Emmy von N.. Descobriu seu nome verdadeiro, Fanny Moser, expôs a sua história no congresso da IPA de Amsterdam em 1965, e esperou 14 anos para publicar um artigo sobre esse tema na The Scandinavian Psychoanalytic Review.” “Entretanto, ao contrário de Ellenberger, continuou apegado, como membro da IPA, à ortodoxia oriunda de Ernest Jones, cujo trabalho biográfico admirava, o que o impediu de empenhar-se mais na história erudita. Sofreu muito com seu isolamento no seio da Sociedade Psicanalítica Sueca, a ponto de pedir a Ellenberger, em 1976, que o ajudasse a emigrar para os Estados Unidos.”

Seu sobrenome Andersson, psicanalista ao mesmo tempo integrado e marginal, foi realmente apagado da história intelectual de seu país, a ponto de não figurar na Enciclopédia nacional sueca, ele que havia escrito tantos artigos em diversas enciclopédias suecas.”

Andreas-Salomé, Lou, née Lelia (Louise) von Salomé (1861-1937)

Mais por sua vida do que por suas obras, Lou Andreas-Salomé teve um destino excepcional na história do século XX. Figura emblemática da feminilidade narcísica,¹ concebia o amor sexual como uma paixão física que se esgotava logo que o desejo fosse saciado. Só o amor intelectual, fundado na mais absoluta fidelidade, era capaz, dizia ela, de resistir ao tempo.”

¹ O que seria isso?

Ironizava as invectivas, os boatos e os escândalos, decidida a não se dobrar às imposições sociais. Depois de Nietzsche (1844-1900) e de Rilke (1875-1926), Freud ficou deslumbrado por essa mulher, a quem amou ternamente e que revolucionou a sua existência.

Nascida em São Petersburgo, em uma família da aristocracia alemã, Lou Salomé era filha de um general do exército dos Romanov. Com a idade de 17 anos, recusando-se a ser confirmada pelo pastor da Igreja evangélica reformada, à qual pertencia sua família, colocou-se sob a direção de outro pastor, Hendrik Gillot, dândi brilhante e culto, que se apaixonou por ela logo que a iniciou na leitura dos grandes filósofos.”

Graças a Malwida von Meysenburg (1816-1903), grande dama do feminismo alemão, ficou conhecendo o escritor Paul Rée (1849-1901), que lhe apresentou Nietzsche. Persuadido de que encontrara a única mulher capaz de compreendê-lo, este lhe fez um pedido solene de casamento. Lou recusou-se. A esses dois homens, profundamente apaixonados por ela, propôs então constituírem uma espécie de trindade intelectual, e em maio de 1882 [38 x 33 x 21 anos], para selar o pacto, fizeram-se fotografar juntos, diante de um cenário de papelão: Nietzsche e Rée atrelados a uma charrete, Lou segurando as rédeas.” “Foi a adesão ao narcisismo nietzschiano, e de modo mais geral o culto do ego, característico da Lebensphilosophie (filosofia da vida)¹ fin de siècle, que preparou o encontro de Lou com a psicanálise.” Blá, blá, blá…

¹ Por que afinal via de regra é a filosofia-da-morte, certo?

PICÂNCIA EDÍPICA CHULA

Em junho de 1887, Lou casou-se com o orientalista alemão Friedrich-Carl Andreas, que ensinava na Universidade de Göttingen. O casamento não foi consumado, e Georg Ledebourg, fundador do Partido Social-Democrata alemão tornou-se seu primeiro amante, algum tempo antes de Friedrich Pineles, médico vienense. Essa segunda ligação terminou com um aborto e uma trágica renúncia à maternidade. Lou instalou-se então em Munique, onde ficou conhecendo o jovem poeta Rainer Maria Rilke: <Fui tua mulher durante anos, escreveria ela em Minha vida, porque foste a primeira realidade, em que o homem e o corpo são indiscerníveis um do outro, fato incontestável da própria vida […]. Éramos irmão e irmã, mas como naquele passado longínquo, antes que o casamento entre irmão e irmã se tornasse um sacrilégio.>” “como diria Freud em 1937, <ela foi ao mesmo tempo a musa e a mãe zelosa do grande poeta […] que era tão infeliz diante da vida.>” Mal consigo contar os clichês deste verbete…

Em seu artigo de 1914 sobre o narcisismo, era nela que pensava quando descreveu os traços tão particulares dessas mulheres, que se assemelham a grandes animais solitários mergulhados na contemplação de si mesmos.”“Logo ela abraçou exclusivamente a causa do freudismo. Foi então que se apaixonou porViktor Tausk, o homem mais belo e mais melancólico do círculo freudiano.”“Introduzida no círculo da Berggasse, tornou-se familiar da casa e apegou-se particularmente a Anna Freud. Depois das reuniões das quartas-feiras, Freud a conduzia a seu hotel; depois de cada jantar, a cumulava de flores.”

Fiquei sabendo com temor — e pela melhor fonte — que todos os dias você dedica até dez horas à psicanálise. Naturalmente, considero isso uma tentativa de suicídio mal-dissimulada, o que muito me surpreende, pois, que eu saiba, você tem muito poucos sentimentos de culpa neurótica. Portanto, insisto que pare e de preferência aumente o preço de suas consultas em um quarto ou na metade, segundo as flutuações da queda do marco. Parece que a arte de contar foi esquecida pela multidão de fadas que se reuniram em torno do seu berço quando você nasceu. Por favor, não jogue pela janela este meu aviso.”

Empobrecida pela inflação que assolava a Alemanha e obrigada a manter os membros de sua família arruinados pela Revolução de Outubro, Lou não conseguia suprir suas necessidades. Embora nunca pedisse nada, Freud lhe enviava somas generosas e dividia com ela, como dizia, a sua <fortuna recentemente adquirida>.

OEDIPUS GONNA ANTIOEDIPALIZE YOU: “Lou tornou-se confidente da filha de Freud e até sua segunda analista, quando isso se tornou necessário.”

Para comemorar o seu 75º aniversário, Lou decidiu dedicar a Freud um livro, para expressar sua gratidão e alguns desacordos. Criticava principalmente os erros cometidos pela psicanálise a respeito da criação estética, reduzida abusivamente, dizia ela, a um caso de recalque. Freud aceitou sem reservas a argumentação, mas tentou conseguir que ela mudasse o título da obra (Minha gratidão a Freud).”

A partir de 1933, Lou assistiu com horror à instauração do regime nazista. Conhecia o ódio que lhe consagrava Elisabeth Forster (1846-1935), irmã de Nietzsche, que se tornara adepta fervorosa do hitlerismo. Conhecia os desvios que esta impusera à filosofia do homem de quem fôra tão próxima e que tanto admirava. Não ignorava que os burgueses de Göttingen a chamavam A Feiticeira. Mas decidiu não fugir da Alemanha. Alguns dias depois de sua morte, um funcionário da Gestapo foi à sua casa para confiscar a biblioteca, que seria jogada nos porões da prefeitura:Apresentou-se como razão para esse confisco, escreveu Peters, que Lou fôra psicanalista e praticara aquilo que os nazistas chamavam de ciência judaica, que ela fôra colaboradora e amiga íntima de Sigmund Freud e que a sua biblioteca estava apinhada de autores judeus.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Lou Andreas-Salomé, Fenitschka (Stuttgart, 1898), Paris, Des Femmes, 1985;

______. Érotisme (Frankfurt, 1910, Munique, 1979), in: Eros, Paris, Minuit, 1984; (art.)

______. Rainer Maria Rilke (Leipzig, 1928), Paris, Marendell, 1989;

______. Ma gratitude envers Freud (Viena, 1931, Paris, 1983), Seuil, col. “Points”, 1987, traduzido com o título Lettre ouverte à Freud;

______. Ma vie (Zurique, 1951, Frankfurt 1977), Paris, PUF, 1977;

______. L’Amour du narcissisme, Paris, Gallimard, 1980;

______. Carnets intimes des dernières années (Frankfurt, 1982), Paris, Hachette, 1983;

______. En Russie avec Rilke, 1900. Journal inédit, Paris, Seuil, 1992;

Freud & Lou Andréas-Salomé, correspondência completa (Frankfurt, 1966), Rio de Janeiro, Imago, 1975;

Nietzsche, Rée & Salomé, Correspondance (Frankfurt, 1970), Paris, PUF, 1979;

H.F. Peters, My sister, my spouse (N. York, 1962), Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1986;

Rudolph Binion, Frau Lou, Nietzsche’s Wayward Disciple, Princeton, Princeton University Press, 1968;

Angela Livingstone, Lou Andreas-Salomé: Her Life and Work (Londres, 1984), Paris, PUF, 1990.

antipsiquiatria

Sob certos aspectos, a antipsiquiatria foi a seqüência lógica e o desfecho da psicoterapia institucional. Se esta havia tentado reformar os manicômios e transformar as relações entre os que prestavam e os que recebiam cuidados, no sentido de uma ampla abertura para o mundo da loucura, a antipsiquiatria visou a extinguir os manicômios e eliminar a própria idéia de doença mental.” “foi justamente por ter sido uma revolta que a antipsiquiatria teve, ao mesmo tempo, uma duração efêmera e um impacto considerável no mundo inteiro. Ela foi uma espécie de utopia: a da possível transformação da loucura num estilo de vida, numa viagem, num modo de ser diferente e de estar do outro lado da razão, como a haviam definido Arthur Rimbaud (1854-1891) e, depois dele, o movimento surrealista.”

Assim como o movimento psicanalítico havia fabricado sua lenda das origens através da história de Anna O. (Bertha Pappenheim), a antipsiquiatria também reivindicou a aventura de uma mulher: Mary Barnes. Essa ex-enfermeira, reconhecida como esquizofrênica e incurável, tinha cerca de 40 anos ao ingressar no Hospital de Kingsley Hall, onde Joseph Berke a deixou regredir durante 5 anos. Através dessa descida aos infernos e de uma espécie de morte simbólica, ela pôde renascer para a vida, tornar-se pintora e, mais tarde, redigir sua <viagem>.”

GUERRA FRIA LACAN X SEU MESTRE: “Na França, não houve nenhuma verdadeira corrente antipsiquiátrica, de um lado porque a esquerda lacaniana ocupou parcialmente o terreno da revolta contra a ordem psiquiátrica, através da corrente da psicoterapia institucional, e de outro, em função de Foucault e Gilles Deleuze (1925-1995) [Batman & Robin], cujos trabalhos cristalizaram a contestação <antipsiquiátrica> a uma dupla ortodoxia, freudiana e lacaniana.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

David Cooper, Psiquiatria e antipsiquiatria (Londres, 1967);

Mary Barnes & Joseph Berke. Un voyage à travers la folie (Londres, 1971), Paris, Seuil, 1973;

Thomas Szasz, Le Mythe de la maladie mentale (N. York, 1974), Paris, Payot, 1975.

antropologia

O debate entre os antropólogos e os psicanalistas começou após a publicação, em 1912-1913, do livro Totem e tabu e deu origem a uma nova disciplina, a etnopsicanálise, cujos dois grandes representantes foram Geza Roheim e Georges Devereux. Seu principal contexto geográfico inicial foi a Melanésia, isto é, a Austrália, onde ainda viviam aborígines que, no final do século, eram considerados o povo mais <primitivo> do planeta, e as ilhas situadas a sudoeste do oceano Pacífico (Trobriand e Normanby), habitadas pelos melanésios propriamente ditos e pelos polinésios. Posteriormente, o campo de eleição foi o dos índios da América do Norte.”

Derivada do grego (ethnos: povo, e logos: pensamento), a palavra etnologia só veio a surgir no século XIX. Todavia, o estudo comparativo dos povos remonta a Heródoto. Se, de acordo com os antigos, o mundo estava estaticamente dividido entre a civilização e a barbárie (externa à cidade), a questão colocou-se de outra maneira na era cristã. Os missionários e conquistadores se indagaram, com efeito, se os indígenas tinham alma ou não.”

Daí nasceu a tese de que o primitivo se assemelha à criança, que se assemelha ao neurótico. Foi nesse darwinismo que Freud se inspirou, através dos trabalhos de James George Frazer (1854-1941) sobre o totemismo e de William Robertson Smith (1846-1894) sobre o tabu.”

Na França, a palavra ethnologie, etnologia, surgiu em 1838, para designar o estudo comparativo dos chamados costumes e instituições <primitivos>. Dezessete anos depois, foi suplantada pelo termo antropologia, ao qual o médico Paul Broca (1824-1881) associou seu nome, ao fazer dela uma disciplina física e anatômica que logo desembocou, no contexto da teoria da hereditariedade-degenerescência, no estudo das <raças> e das <etnias>, concebidas como espécies zoológicas.

No mundo anglófono, ao contrário (na Grã-Bretanha e, depois, nos Estados Unidos), a palavra ethnology cobriu o campo da antropologia física (no sentido francês), enquanto se cunhou, em 1908, o termo social anthropology, para designar a cátedra de antropologia de Frazer na Universidade de Liverpool.”

Observe-se que Charles Seligman (1873-1940) e William Rivers (1864-1922), dois antropólogos de formação médica, foram os primeiros a tornar conhecidos no meio acadêmico da antropologia inglesa os trabalhos freudianos sobre o sonho, a hipnose e a histeria. Mais tarde, esse trabalho teve seguimento através da escola culturalista norte-americana, desde Margaret Mead até Ruth Benedict (1887-1948), passando por Abram Kardiner e pelo neofreudismo.”

Quanto à antiga escola de antropologia, ela evoluiria para o racismo, o anti-semitismo e o colaboracionismo, em especial sob a influência de Georges Montandon, ex-médico e adepto das teses do padre Wilhelm Schmidt (1868-1954). Fundador da Escola Etnológica de Viena e diretor, em 1927, do museu etnográfico pontifical de Roma, Schmidt acusaria Freud de querer destruir a família ocidental. Quanto a Montandon, ele participaria do extermínio dos judeus durante o regime de Vichy e seria amigo do psicanalista e demógrafo Georges Mauco.

Foi preciso esperar pela segunda metade do século XX para que fosse introduzida na França, através de Claude Lévi-Strauss, a terminologia anglófona. Em 1954, ele livrou o termo <antropologia> de todas as antigas imagens da hereditariedade-degenerescência, a fim de definir uma nova disciplina que abarcasse, ao mesmo tempo, a etnografia, como primeira etapa de um trabalho de campo, e a etnologia, designada como segunda etapa e primeira reflexão sintética.

Se Marcel Mauss, sobrinho de Émile Durkheim, havia desvinculado a etnologia da sociologia durkheimiana, embora se inspirasse em seus modelos, Claude Lévi-Strauss passou da etnologia para a antropologia, unificando os dois campos (anglófono e francófono) em torno de três grandes eixos: o parentesco (em vez da família e do patriarcado), o universalismo relativista (em vez do culturalismo) e o incesto. Situou-se prontamente como contemporâneo da obra freudiana, à qual se referiu, como ao Curso de lingüística geral de Ferdinand de Saussure (1857-1913), sublinhando, em Tristes trópicos, o que ela lhe havia trazido: <…(essa obra) me revelou que […] são as condutas aparentemente mais afetivas, as operações menos racionais e as manifestações declaradas pré-lógicas que são, ao mesmo tempo, as mais significativas.>“Lévi-Strauss foi, sem sombra de dúvida, o primeiro etnólogo a teorizar a viagem etnológica segundo o modelo de uma estrutura melancólica: todo etnólogo redige uma autobiografia ou escreve confissões, diria ele, em essência, porque tem que passar pelo eu para se desligar do eu.”

PREFIGURAÇÃO DE BAUDRILLARD: “Foi dentro dessa orientação que ele estabeleceu uma analogia entre a técnica de cura xamanista e o tratamento psicanalítico. Na primeira, dizia, o feiticeiro fala e provoca a ab-reação, isto é, a liberação dos afetos do enfermo, ao passo que, na segunda, esse papel cabe ao médico que escuta, no bojo de uma relação na qual é o doente quem fala. Além dessa comparação, Lévi-Strauss mostrou que, nas sociedades ocidentais, tendia a constituir-se uma <mitologia psicanalítica> que fizesse as vezes de sistema de interpretação coletivo: <Assim, vemos despontar um perigo considerável: o de que o tratamento, longe de levar à resolução de um distúrbio preciso, sempre respeitando o contexto, reduza-se à reorganização do universo do paciente em função das interpretações psicanalíticas.> Se a cura, portanto, sobrevém através da adesão a um mito, agindo este como uma organização estrutural, isso significa que esse sistema é dominado por uma eficácia simbólica. Daí a idéia, proposta já em 1947 na Introdução à obra de Marcel Mauss, de que o chamado inconsciente não seria outra coisa senão um lugar vazio onde se consumaria uma autonomia da função simbólica.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

(a eterna busca pelo ramo de ouro) Pierre Bonte & Michel Izard, Dictionnaire de l’ethnologie et de l’anthropologie, Paris, PUF, 1992;

R. Lowie, Histoire de l’ethnologie classique (N. York, 1937), Paris, Payot, 1971.

anulação

o isolamento, uma forma de defesa característica da neurose obsessiva, processo mágico em Freud (1926)

Anzieu, Marguerite (Aimée), paciente de Lacan

Foi Élisabeth Roudinesco quem revelou pela primeira vez, em 1986, a verdadeira identidade dessa mulher, e depois reconstruiu, em 1993, a quase totalidade de sua biografia, a partir do testemunho de Didier Anzieu e dos membros de sua família.”

Marguerite Pantaine provinha de uma família católica e interiorana do centro da França. Criada por uma mãe que sofria de sintomas persecutórios, sonhou desde muito cedo, à maneira de Emma Bovary, sair de sua situação e se tornar uma intelectual. Em 1910, ingressou na administração dos correios e, sete anos depois, casou-se com René Anzieu, também funcionário público. Em 1921, quando grávida de seu filho Didier, começou a ter um comportamento estranho: mania de perseguição, estados depressivos. Após o nascimento do filho, instalou-se numa vida dupla: de um lado, o universo cotidiano das atividades de funcionária dos correios, de outro, uma vida imaginária, feita de delírios. Em 1930, redigiu de enfiada dois romances que quis mandar publicar, e logo se convenceu de estar sendo vítima de uma tentativa de perseguição por parte de Hughette Duflos, uma célebre atriz do teatro parisiense dos anos 30. Em abril de 1931, tentou matá-la com uma facada, mas a atriz se esquivou do golpe e Marguerite foi internada no Hospital Sainte-Anne, onde foi confiada a Jacques Lacan, que fez dela um caso de erotomania e de paranóia de autopunição.

A continuação da história de Marguerite Anzieu é um verdadeiro romance. Em 1949, seu filho Didier, havendo concluído seus estudos de filosofia, resolveu tornar-se analista. Fez sua formação didática no divã de Lacan, enquanto preparava uma tese sobre a auto-análise de Freud sob a orientação de Daniel Lagache, sem saber que sua mãe tinha sido o famoso caso Aimée. Lacan não reconheceu nesse homem o filho de sua ex-paciente, e Anzieu soube da verdade pela boca da mãe, quando esta, por um acaso extraordinário, empregou-se como governanta na casa de Alfred Lacan (1873-1960), pai de Jacques” [!!]

Argentina

Independente desde 1816, depois de ter-se submetido à colonização espanhola, a Argentina viveu sob o reino dos caudilhos durante todo o século XIX. A partir de 1860, a cidade de Buenos Aires, sob a influência da sua classe dominante, os portenhos, esteve na liderança da revolução industrial e da construção de um Estado moderno. Em 1880, realizou-se a unidade entre as diferentes províncias e a cidade portuária se tornou a capital federal do país. Em 50 anos (1880-1930), a Argentina acolheu 6 milhões de imigrantes, italianos ou espanhóis na maioria; três vezes o volume de sua população inicial. Fugindo dos pogroms, os judeus da Europa central e oriental se misturaram a esse movimento migratório e se instalaram em Buenos Aires, fazendo da capital o centro de um cosmopolitismo aberto a todas as idéias novas.” “Fundador do asilo argentino, Lucio Melendez repetiu no seu país o gesto de Philippe Pinel, criando uma organização de saúde mental dotada de uma rede de hospitais psiquiátricos e edificando uma nosografia inspirada em Esquirol. Domingo Cabred, seu sucessor, prosseguiu a obra, adaptando a clínica da loucura aos princípios da hereditariedade-degenerescência. Na mesma época, começaram a afirmar-se as pesquisas em criminologia e em sexologia, enquanto o ensino da psicologia, em todas as suas tendências, tomava uma extensão considerável, com a criação, em 1896, de uma primeira cátedra universitária em Buenos Aires.”

Em 1904, José Ingenieros, psiquiatra e criminologista, publicou o primeiro artigo que mencionava o nome de Freud. Depois, durante os anos 1920, vários autores apresentaram a psicanálise ora como uma moda ou uma epidemia (Anibal Ponce), ora como uma etapa da história da psicologia (Enrique Mouchet). Em 1930, Jorge Thénon afirmou que ela era excessivamente metapsicológica, sem com isso negar o seu interesse. Curiosamente, enquanto uma notável tradução espanhola das obras de Freud estava em preparação em Madri, sob a direção de José Ortega y Gasset, os autores argentinos se referiam a versões francesas. Do mesmo modo, importavam as polêmicas parisienses, às quais acrescentavam — imposição da latinidade — as críticas italianas. Assim, os argumentos de Enrico Morselli (1852-1929) tiveram uma repercussão favorável, enquanto o temível Charles Blondel tinha um franco sucesso ao declarar, por ocasião da sua viagem de conferências em 1927, que Henri Bergson (1859-1941) era o verdadeiro descobridor do inconsciente

e Freud uma espécie de Balzac fracassado [haha!].”

A escola argentina nunca se limitaria a uma única doutrina. Acolheria todas com um espírito de ecletismo, inscrevendo-as quase sempre em um quadro social e político: marxista, socialista ou reformista. Ao longo dos anos e através de suas diversas filiações, ela conservaria o aspecto de uma grande família e saberia organizar suas rupturas sem criar clivagens irreversíveis entre os membros de suas múltiplas instituições.” “Tendo adquirido uma tradição clínica e uma verdadeira identidade freudiana, os argentinos formaram então, pela análise didática, seja em Buenos Aires, seja em seus próprios países, a maioria dos terapeutas dos países de língua espanhola que, por sua vez, se integrariam à IPA, constituindo grupos ou sociedades: Uruguai, Colômbia, Venezuela.” “Em 1977, a América Latina estava a ponto de tornar-se o continente freudiano mais poderoso do mundo, sob a égide da COPAL (futura FEPAL) e em ligação com os grupos brasileiros, capaz de rivalizar com a American Psychoanalytic Association (APsaA) e a Federação Européia de Psicanálise (FEP).” “As duas cisões se produziram no momento em que a Argentina saía de um regime militar clássico, fundado no populismo e herdado do velho caudilhismo, para um sistema de terror estatal. Ora, se o primeiro feria as liberdades políticas, não limitava a liberdade profissional e associativa, da qual dependia o funcionamento das instituições psicanalíticas. O segundo, ao contrário, visava erradicar todas as formas de liberdade individual e coletiva. Por conseguinte, poderia destruir a psicanálise, como fizera outrora o nazismo. § Em 1973, quando Perón voltou ao poder, nomeou Isabelita, sua nova esposa, para o posto de vice-presidente e fez de seu secretário José Lopez Rega o ministro dos assuntos sociais do país. Este apressou-se a criar a Tríplice A (Aliança Argentina Anticomunista), conhecida por seus esquadrões da morte, que serviram de força suplementar para o exército, em suas operações de controle da sociedade civil.Um ano depois, Perón morreu e Isabelita assumiu a sua sucessão, sendo substituída em março de 1976 pelo general Jorge Videla, que instaurou durante 9 anos um dos regimes mais sangrentos do continente latino-americano, com o do general Pinochet no Chile: 30 mil pessoas foram assassinadas e torturadas, sob o rótulo de desaparecidos.” “E foi em nome da defesa de um <ocidente cristão> e da segurança nacional que as forças armadas decidiram erradicar o freudismo e o marxismo, julgados responsáveis pela <degeneração> da humanidade. Ao contrário dos nazistas, não erigiram um instituto como o de Matthias Heinrich Göring e não aboliram a liberdade de associação. A perseguição foi silenciosa, anônima, penetrando no coração da subjetividade.” “Marxista e veterana das Brigadas Internacionais, Marie Langer encontrou-se, desde o seu exílio no México, na vanguarda dos combates, arrastando consigo todos os psicanalistas politizados do país. Foi nessa época que os argentinos, como outrora os judeus europeus, emigraram em grande número para os quatro cantos do mundo, a fim de formar novos grupos freudianos ou integrar-se aos que já existiam na Suécia, na Austrália, na Espanha, nos Estados Unidos, na França.” “Durante todo o período de terror estatal (1976-1985), o interesse pelo pensamento de Lacan progrediu na Argentina de maneira curiosa. Recebido como uma contracultura subversiva e de aspecto esotérico, a doutrina do mestre permitia aos que a faziam frutificar mergulhar em debates sofisticados sobre o passe, o matema e a lógica, e esquecer, ou mesmo ignorar, a sangrenta ditadura instaurada pelo regime. Como seus colegas politizados da IPA, os lacanianos marxistas e militantes se exilaram ou resistiram ao terror.” “Em 1991, Horacio Etchegoyen foi eleito presidente. Técnico do tratamento de tendência kleiniana, analisado por Heinrich Racker e membro da ABdeBA, foi o primeiro presidente de língua espanhola do movimento freudiano.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Jacques Derrida, Geopsychanalyse and the rest of the world, 1981.

associação verbal, teste de

Técnica experimental usada por Carl Gustav Jung, a partir de 1906, para detectar os complexos e isolar as síndromes específicas de cada doença mental. Consiste em pronunciar diante do sujeito uma série de palavras, cuidadosamente escolhidas, pedindo-lhe que responda com a primeira palavra que lhe vier à cabeça e medindo seu tempo de reação.”

Historicamente, essa técnica está ligada à noção de associação de idéias, já utilizada por Aristóteles, que definira seus 3 grandes princípios: a contigüidade, a semelhança e o contraste. No século XIX, a psicologia introspectiva e a filosofia empirista conferiram-lhe tamanha importância que o associacionismo transformou-se numa verdadeira doutrina, na qual se inspirariam todas as correntes da psicologia e, em especial, Freud”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Freud/Jung: correspondência completa (Paris, 1975).

atenção (uniformemente) flutuante

É o “espelho” da associação livre: faz parte do método de conduta do analista frente ao paciente (busca de neutralidade).

Tal como o paciente deve contar tudo o que lhe passa pelo espírito, eliminando todas as objeções lógicas e afetivas que pudessem levá-lo a fazer uma escolha, assim o médico deve estar apto a interpretar tudo o que ouve a fim de que possa descobrir aí tudo o que o insconsciente dissimula”F., 1912

Graças a ela, o analista pode conservar na memória uma multidão de elementos aparentemente insignificantes cujas correlações só aparecerão posteriormente.”

ouvir com o terceiro ouvido”Reik

empatia infraverbal”

Se o isso são imagens, como escutá-las? Porque mesmo que emitissem sons, o isso também não tem ouvidos, ainda que tivesse bocas

ato falho

Os editores da Standard Edition observam que para designá-lo foi preciso criar em inglês um termo, parapraxis. Em francês, o tradutor de Psicopatologia da vida cotidiana utilizou a expressão acte manqué, que adquiriu fôro de cidadania, mas parece que na prática psicanalítica corrente na França ela designa principalmente uma parte do campo coberto pelo termo Fehlleistung, quer dizer, as falhas da ação stricto sensu [enquanto que, para Freud, o ato falho pode ser compreendido como um ato bem-sucedido do inconsciente, vd. verbete do livro citado].”

auto-análise

Doctor Dream

mantenho a opinião de que esta espécie de análise [dos sonhos] pode ser suficiente para quem é um bom sonhador e não muito anormal.”O inconveniente é que esse tipo de pessoa teria de ser avisado disso (2ª característica)!

Num instante 2, em carta: “Uma verdadeira auto-análise é impossível; se não fosse isso não haveria doença.”

LOOK WHO SAYS… “Considera-se geralmente a auto-análise uma forma particular de resistência à psicanálise que embala o narcisismo e elimina a mola mestra do tratamento, que é a transferência.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Anzieu, Freud’s Self-Analysis (1986) (filho da paciente Marguerite Anzieu de Lacan!)

deb(u)t of the doubt

Nada mais risível e não-enriquecedor do que testemunhar os mútuos ataques dos psicanalistas entre si.

autismo

A PSICANÁLISE CLÁSSICA PRECISA SER SUPEREGOTIZADA APÓS SEU PAPAI: “Termo criado em 1907 por Eugen Bleuler e derivado do grego autos (o si mesmo), para designar o ensimesmamento psicótico do sujeito em seu mundo interno e a ausência de qualquer contato com o exterior, que pode chegar inclusive ao mutismo.” “É numa carta de Carl Gustav Jung a Sigmund Freud, datada de 13 de maio de 1907, que descobrimos como Bleuler cunhou o termo autismo. Ele se recusava a empregar a palavra auto-erotismo, introduzida por Havelock Ellis e retomada por Freud, por considerar seu conteúdo por demais sexual. Por isso, fazendo uma contração de auto com erotismo, adotou a palavra autismo, depois de ter pensado em ipsismo, derivada do latim. Posteriormente, Freud conservou o termo auto-erotismo para designar esse mesmo fenômeno, enquanto Jung adotou o termo introversão.” “Em 1911, em seu principal livro, Dementia praecox ou grupo das esquizofrenias, Bleuler designou por esse termo um distúrbio típico da esquizofrenia e característico dos adultos.”

Cinco grandes sinais clínicos permitiriam, segundo Kanner, reconhecer a psicose autística: o surgimento precoce dos distúrbios (logo nos dois primeiros anos de vida), o extremo isolamento, a necessidade de imobilidade, as estereotipias gestuais e, por fim, os distúrbios da linguagem (ou a criança não fala nunca, ou emite um jargão desprovido de significação, incapaz de distinguir qualquer alteridade).”

Além de Bettelheim, foram a corrente annafreudiana, por um lado, com os trabalhos de Margaret Mahler sobre a psicose simbiótica, e a corrente kleiniana, por outro, que melhor estudaram e trataram o autismo, amiúde com sucesso, com a ajuda dos instrumentos fornecidos pela psicanálise. Nesse contexto, Frances Tustin trouxe uma nova visão sobre essa questão na década de 1970, ao propor uma classificação do autismo em três grupos: o autismo primário anormal, resultante de uma carência afetiva primordial e caracterizado por uma indiferenciação entre o corpo da criança e o da mãe; o autismo secundário, de carapaça, que corresponde em linhas gerais à definição de Kanner; e o autismo secundário regressivo, que seria uma forma de esquizofrenia sustentada por uma identificação projetiva.”

apesar da evolução da psiquiatria genética, nenhum trabalho de pesquisa conseguiu comprovar (como de resto não o fez em relação à esquizofrenia e à psicose maníaco-depressiva) que o autismo verdadeiro (quando não existe nenhuma lesão neurológica anterior) seja de origem puramente orgânica.”

Balint, Michael

Como muitos judeus húngaros cujos antepassados adotaram nomes alemães, decidiu, no fim da guerra, <magiarizar-se> para afirmar assim que pertencia à nação húngara. Tomou então o sobrenome de Balint. Na universidade, ficou conhecendo Alice Szekely-Kovacs, estudante de etnologia, que despertou seu interesse pela psicanálise.”

Foi obrigado, como todos os imigrantes, a refazer os estudos de medicina e teve que enfrentar, além do exílio, a dor de perder de uma só vez quase todos os membros da família. Alice Balint (1898-1939) (a Kovacs acima), sua mulher, e Wilma Kovacs [psicanalista e outrora paciente tratada por Groddeck!], sua sogra, a quem era muito apegado, morreram com um ano de intervalo. Depois da guerra, ficou sabendo que seus pais tinham se suicidado para escapar à deportação.”

A LINHA TÊNUE ENTRE SER WORKHALOIC E “PSICAEROTÔMANO”: “Foi lá também que ficou conhecendo Enid Albu-Eichholtz, sua terceira mulher. Analisada por Donald Woods Winnicott, Enid Balint (1904-1994) iniciou Michael em uma nova técnica, o case work. Tratava-se de comentar e trocar relatos de casos no interior de grupos compostos de médicos e de psicanalistas. Essa experiência deu origem ao que se chama de grupos Balint. Apesar de sua separação em 1953, Michael e Enid continuaram a trabalhar juntos.”

A sobrinha da falecida primeira mulher de Balint se tornou sua tradutora ao Francês!

Grande técnico do tratamento, Balint soube aliar o espírito inovador de seu mestre Ferenczi à tradição clínica da escola inglesa. Nesse aspecto, foi realmente o <húngaro selvagem> da British Psychoanalytical Society (BPS), cujos rituais e cuja esclerose ele criticou com muito humor, prestando homenagem, na primeira ocasião, aos costumes mais liberais da antiga sociedade de Budapeste”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Balint, A falha básica (Londres, 1968), P. Alegre, Artes Médicas, 1993.

Bateson, Gregory (1904-1980)

Marido de Margaret Mead.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

B. (ed.), Perceval le fou. Autobiographie d’un schizophrène (Londres, 1962), Paris, Payot, 1975.

Bauer, Ida, sobrenome de casada Adler (1882-1945), caso Dora

Primeiro grande tratamento psicanalítico realizado por Freud, anterior aos do Homem dos Ratos (Ernst Lanzer)e do Homem dos Lobos (Serguei Constantinovitch Pankejeff), a história de Dora, redigida em dezembro de 1900 e janeiro de 1901 e publicada quatro anos depois, desenrolou-se entre a redação de A interpretação dos sonhos e a dos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade.

GUINESS: “trata-se do documento clínico que mais se comentou, desde sua publicação. (…) o caso dessa jovem tornou-se o objeto privilegiado dos estudos feministas.”

Para a publicação desse 1o tratamento exclusivamente psicanalítico, conduzido com uma mocinha virgem de 18 anos de idade, Freud tomou precauções inauditas. Na época, de fato, a cruzada que se travava contra o freudismo consistia em fazer com que a psicanálise passasse por uma doutrina pansexualista, que tinha por objetivo fazer os pacientes (sobretudo as mulheres) confessarem, por meio da sugestão, <sujeiras> sexuais inventadas pelos próprios psicanalistas. Na Grã-Bretanha e no Canadá, por exemplo, Ernest Jones suportaria o peso de acusações dessa ordem. [Veja em ESCANDINÁVIA que E.J. não era nenhum ‘santinho’.]”

A melhor maneira de falar dessas coisas é sendo seco e direto; e ela é, ao mesmo tempo, a que mais se afasta da lascívia com que esses assuntos são tratados na ‘sociedade’, lascívia esta com que as moças e mulheres estão plenamente habituadas.”

um marido fraco e hipócrita engana sua mulher, uma dona de casa ignorante, com a esposa de um de seus amigos, conhecida numa temporada de férias em Merano. A princípio enciumado, depois indiferente, o marido enganado tenta, de início, seduzir a governanta de seus filhos. Depois, apaixona-se pela filha de seu rival e a corteja durante uma temporada em sua casa de campo, situada às margens do lago de Garda. Horrorizada, esta o rejeita, pespega-lhe uma bofetada e conta a cena a sua mãe, para que ela fale do assunto com seu pai. Este interroga o marido da amante, que nega categoricamente os fatos pelos quais é recriminado. Preocupado em proteger seu romance extraconjugal, o pai culpado faz com que a filha passe por mentirosa e a encaminha para tratamento com um médico que, alguns anos antes, prescrevera-lhe um excelente tratamento contra a sífilis.

A entrada de Freud em cena transforma essa história de família numa verdadeira tragédia do sexo, do amor e da doença. Sob esse aspecto, sua narrativa do caso Dora assemelha-se a um romance moderno: hesitamos entre Arthur Schnitzler, Marcel Proust (1871-1922) e Henrik Ibsen (1828-1906).” “Grande industrial, ele desfrutava de uma bela situação financeira e era admirado pela filha [Dora]. Em 1888, contraiu tuberculose, o que o obrigou a se instalar com toda a família longe da cidade. Assim, optou por residir em Merano, no Tirol, onde travou conhecimento com Hans Zellenka (Sr. K.), um negociante menos abastado que ele, casado com uma bela italiana, Giuseppina ou Peppina (Sra. K.), que sofria de distúrbios histéricos e era uma assídua freqüentadora de sanatórios. Peppina tornou-se amante de Phillip [Bauer] e cuidou dele em 1892, quando ele sofreu um descolamento da retina.”

Katharina, a mãe de Ida, provinha, como o marido, de uma família judia originária da Boêmia. Pouco instruída e bastante simplória, sofria de dores abdominais permanentes, que seriam herdadas pela filha. Nunca se interessara pelos filhos e, desde a doença do marido e da desunião que se seguira a ela, exibia todos os sinais de uma <psicose doméstica>: <Sem mostrar nenhuma compreensão pelas aspirações dos filhos, ela se ocupava o dia inteiro, escreveu F., em limpar e arrumar a casa, os móveis e os utensílios domésticos, a tal ponto que usá-los e usufruir deles tinha-se tornado quase impossível […]. Fazia anos que as relações entre mãe e filha eram pouco afetuosas. A filha não dava a menor atenção à mãe, fazia-lhe duras críticas e escapara por completo de sua influência.> E era uma governanta quem cuidava de Ida. Mulher moderna e <liberada>, esta lia livros sobre a vida sexual e dava informações sobre eles à sua aluna, em segredo. Abriu-lhe os olhos para o romance do pai com Peppina. Entretanto, depois de tê-la amado e de lhe ter dado ouvidos, Dora se desentendera com ela.”

Aos 9 anos de idade [o irmão mais velho de Dora, Otto] se tornara um menino prodígio, a ponto de escrever um drama em cinco atos sobre o fim de Napoleão. Depois, rebelara-se contra as opiniões políticas do pai, cujo adultério aprovava, por outro lado. (…) Secretário do Partido Social-Democrata de 1907 a 1914 e, depois, assessor de Viktor Adler no ministério de Assuntos Exteriores em 1918, viria a ser uma das grandes figuras da intelectualidade austríaca no entre-guerras. No entanto, apesar de seu talento excepcional, nunca se refez do desmoronamento do Império Austro-Húngaro e despendeu mais energia atacando Lenin do que combatendo Hitler (…) Bauer insistiu, até 1934, em fazer cruzadas típicas do pré-guerra contra a Igreja e a aristocracia, num momento em que, justamente, deveria ter-se associado a seus inimigos de outrora para repelir o fascismo. Poucas cegueiras tiveram conseqüências tão pesadas.”

foi em outubro de 1901 que Ida Bauer visitou Freud para dar início a esse tratamento, que duraria exatamente 11 semanas.”

Minha Ida já está garantida.

Dora fôra acusada por Hans[o amigo tarado do pai, quem curiosamente lhe havia metido chifres, i.e., furado seu olho; aqui cabe a citação da coincidência: o pai de Dora era cego de um olho] e por seu pai de ter inventado a cena de sedução. Pior ainda, fôra reprovada por Peppina Zellenka (Sra. K. [a chifradora – e quase chifruda]), que suspeitava que ela lesse livros pornográficos, em particular A fisiologia do amor, de Paolo Mantegazza (1831-1901), publicado em 1872 e traduzido para o alemão 5 anos depois. O autor era um sexólogo darwinista [?], profusamente citado por Richard von Krafft-Ebing e especializado na descrição <etnológica> das grandes práticas sexuais humanas: lesbianismo, onanismo, masturbação, inversão, felação, etc. Ao encaminhar sua filha a Freud, Philipp Bauer esperava que este lhe desse razão e que tratasse de pôr fim às fantasias sexuais da filha.” “O primeiro sonho revelou que Dora era dada à masturbação e que, na realidade, estava enamorada de Hans Zellenka.” “Dora não encontrara em Freud a sedução que esperava dele: ele não fôra compassivo e não soubera empregar com ela uma relação transferencial positiva. Nessa época, com efeito, ele ainda não sabia manejar a transferência na análise.”

fôra a própria Sra. K. que fizera a moça ler o livro proibido, para depois acusá-la. E fôra também ela quem lhe havia falado de coisas sexuais.” Que beleza…

Esse tema da homossexualidade inerente à histeria feminina seria longamente comentado por Jacques Lacan em 1951, enquanto outros autores fariam questão de demonstrar ora que Freud nada entendia de sexualidade feminina,¹ ora que Dora era inanalisável.”

¹ A única coisa certa nesse imbróglio todo!

Ida Bauer nunca se curou de seu horror aos homens.Mas seus sintomas se aplacaram. Após sua curta análise, ela pôde vingar-se da humilhação sofrida, fazendo a Sra. K. confessar o romance com seu pai e levando o Sr. K. a confessar a cena do lago.” “Em 1903, casou-se com Ernst Adler [Adler é o quê afinal, uma espécie de ‘Silva’?], um compositor que trabalhava na fábrica de seu pai.” “Em 1923, sujeita a novos distúrbios — vertigens, zumbidos no ouvido, insônia, enxaquecas —, por acaso chamou à sua cabeceira Felix Deutsch. Contou-lhe toda a sua história, falou do egoísmo dos homens, de suas frustrações e de sua frigidez. Ouvindo suas queixas, Deutsch reconheceu o famoso caso Dora: <Desse momento em diante, ela esqueceu a doença e manifestou um imenso orgulho por ter sido objeto de um texto tão célebre na literatura psiquiátrica.> Então, discutiu as interpretações de seus dois sonhos feitas por Freud. Quando Deutsch tornou a vê-la, os ataques tinham passado.”

Dora tinha voltado contra o próprio corpo a obsessão de sua mãe: <Sua constipação, vivida como uma impossibilidade de ‘limpar os intestinos’, causou-lhe problemas até o fim da vida.>

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Freud, Fragmento da análise de um caso de histeria (1905);

Felix Deutsch, Apostille au “Fragment d’une analyse d’hystérie (Dora)” (1957), Revue Française de Psychanalyse, n. 37, janeiro-abril de 1973, 407-14;

Lacan. O Seminário, livro 17, O avesso da psicanálise (1969-1970) (Paris, 1991), Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1992.

benefício primário e secundário da doença

Defesa secundária e benefício secundário surgem como duas modalidades de resposta do ego a esse <corpo estranho> que o sintoma antes de mais nada é”

O que R***** e Maria D’Stress nunca entenderão: os benefícios de ser sedentário são muito maiores que os de ser um “saudável”!

Bernays, Anna, née Freud (1859-1955), irmã de Sigmund Freud

Em suas lembranças, manifestou o mesmo ciúme que seu irmão sentira em relação a ela, quando era criança. Contou até que pontoAmalia Freudprivilegiava o filho mais velho: ele tinha direito a um quarto só para ele, enquanto as irmãs se apertavam no resto do apartamento. Quando Amalia quis dar aulas de piano a Anna Freud (futura Bernays), Sigmund se opôs e ameaçou deixar a casa. Quando ela tinha 16 anos, ele a impediu de ler as obras de Honoré de Balzac e deAlexandre Dumas (1802-1870). Essa atitude tirânica estava ligada ao fato de que Freud fora muito ciumento de seu irmão Julius Freud, nascido depois dele, e posteriormente se sentira culpado de sua morte.” E o kiko?

Em outubro de 1883, Anna Freud casou-se comEli Bernays, irmão deMartha Bernays, futura mulher de Freud, com o qual este não tardou a se indispor por causa de uma banal história de dinheiro.Novamente manifestou seu ciúme querendo que Martha, sua noiva, tomasse partido por ele, o que ela não fez. Por isso, não assistiu ao casamento da irmã. Tempos depois, deu fim à briga e ajudou os Bernays a emigrar para os Estados Unidos, onde Eli se tornou um homem de negócios muito rico.”

Bettelheim, Bruno (1903-1990)

Não se pode evocar a vida e a obra de Bruno Bettelheim sem levar em conta o escândalo que estourou nos Estados Unidos algumas semanas depois de sua morte. Em conseqüência da publicação, em alguns grandes jornais, de cartas de ex-alunos da Escola Ortogênica de Chicago, que ele dirigira durante cerca de 30 anos e que acolhia crianças classificadas como autistas, a imagem do bom <Dr. B.>, como era chamado, se apagava por trás da figura de um tirano brutal, que fazia reinar o terror em sua escola.”

Os termos de impostor, de falsificador e de plagiário se somaram ao de charlatão. Esse tumulto teve pouca repercussão na França, onde ele gozara, em razão do sucesso de seu livro A fortaleza vaziae do programa dedicado à Escola Ortogênica, realizado por Daniel Karline Tony Lainépara a televisão francesa e difundido em outubro de 1974, de um imenso prestígio que só foi prejudicado pelo declínio geral das idéias filosóficas e psicanalíticas dos anos 1970.”

Nascido em Viena a 28 de agosto de 1903, em uma família da pequena burguesia judaica assimilada, de uma feiúra constatada sem delicadeza pela mãe, que nunca lhe dedicou grande afeição, Bruno Bettelheim manifestou cedo suas tendências à depressão.”

Preso pela Gestapo, chegou a Dachau a 3 de junho de 1938, depois de ter sido violentamente espancado. Transferido depois para o campo de concentração de Buchenwald a 23 de setembro de 1938, encontrou ali Ernst Federn, filho de Paul Federn, companheiro de Freud. Naquele universo de medo, angústia e humilhação permanentes, começou a fazer um trabalho consigo mesmo, para resistir à ação mortífera dos SS. Foi a experiência desses campos a origem do conceito de <situação extrema>, pelo qual ele designava as condições de vida diante das quais o homem pode seja abdicar, identificando-se com a força destruidora, constituída tanto pelo carrasco ou pelo ambiente quanto pela conjuntura, seja resistir, praticando a estratégia da sobrevivência — Sobreviver seria o título de um de seus livros — que consiste em construir para si, a exemplo do que Bettelheim supunha ser a origem do autismo, um mundo interior cujas fortificações o protegeriam das agressões externas. Libertado a 14 de abril de 1939, graças a intervenções que seriam para ele uma nova ocasião de fabular, emigrou para os Estados Unidos, despojado de todos os seus bens.”

Assim, Bruno Bettelheim tornou-se especialista em campos de concentração, qualidade que se revelaria sobrecarregada de muitos mal-entendidos, desta vez com o conjunto da comunidade judaica. Com efeito, os testemunhos dos raros sobreviventes dos campos de morte fariam aparecer a insondável distância que separava o universo concentracionário da empreitada de extermínio sistemático, cujo símbolo será, para sempre, Auschwitz. Bruno Bettelheim levaria anos para admitir essa diferença, recusando-se a ver nela o limite trágico de sua virulenta crítica daquilo que ele apresentava como a passividade dos judeus diante de seus torturadores.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

B., Psychanalyse des contes de fées;

Nina Sutton, Bruno Bettelheim, une vie, Paris, Stock, 1995.

Biblioteca do Congresso (Washington), a tragédia “alexandrina” (para não dizer que tudo se resume a Édipo) da família Freud!

Foi ali, no departamento de manuscritos, que foram depositados os arquivos de Freud (cartas, manuscritos, etc.) e os de inúmeros outros psicanalistas de diferentes países. Essa iniciativa foi tomada por Siegfried Bernfeld. Depois dele, Kurt Eissler, psicanalista também de origem vienense e autor de vários livros sobre Freud, foi, depois da II Guerra Mundial, o principal responsável por esse grande depósito de saber e memória, que assumiu o nome de Sigmund Freud Archives (SFA) ou Arquivos Freud. Ele colecionou documentos apaixonantes, tanto interrogando todos os sobreviventes da saga freudiana quanto preservando a gravação de suas entrevistas em fitas magnéticas. De comum acordo com Anna Freud, Eissler editou normas de conservação draconianas, as quais, respeitando a vontade dos doadores, proibiram à maioria dos pesquisadores externos à IPA o acesso a esse reservatório. Foi sob a direção dele, sumamente ortodoxa, que, a partir de 1979, numa reação ao espírito de censura, produziu-se uma virada revisionista na historiografia freudiana, em especial a propósito da edição das cartas de Freud a Wilhelm Fliess, confiada pelo próprio Eissler a um pesquisador pouco escrupuloso: Jeffrey Moussaieff Masson. A censura e a desconfiança, assim, levaram ao favorecimento de uma iniciativa historiográfica violentamente antifreudiana.” O que eu chamo de ENANTIODROMIA.

A coleção Sigmund Freud, dividida em séries (A, B, E, F e Z), e cujos direitos de publicação dependem da Sigmund Freud Copyrights (que representa os interesses financeiros das pessoas legalmente habilitadas), está agora acessível a todos os pesquisadores. Seu regulamento prevê algumas restrições, ora justificadas e conformes às leis em vigor, ora contestáveis. Quanto à série Z, sujeita a uma suspensão progressiva da imposição de sigilo que se estende até 2100, ela encerra, supostamente, documentos concernentes à vida privada de pessoas (pacientes, psicanalistas, etc.), as quais é preciso proteger.

Na realidade, essa série Z contém alguns textos que nada têm de confidencial, outros que não comportam nenhuma revelação bombástica, ainda que digam respeito a segredos de família ou do divã, e outros, por fim, cuja presença nessa classe nada tem de evidente: p.ex., contratos de Freud com seus editores, cartas trocadas com uma organização esportiva judaica, ou documentos sobre Josef Freud que já são conhecidos dos historiadores. Patrick Mahony e o historiador Yosef Hayim Yerushalmi denunciaram o regulamento que rege a organização dessa série numa conferência notável, realizada em 1994. Este último sublinhou que esconder segredos de polichinelo conduz, antes, a alimentar boatos inúteis, e que a única maneira de evitá-los seria abrir os chamados arquivos secretos.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Yosef Hayim Yerushalmi, “Série Z” (1994), “Une fantaisie archiviste”, Le Débat, 92, novembro-dezembro de 1996, 141-52(artigo);

Jacques Derrida, Mal d’archive, Paris, Galilée, 1995.

Binswanger, Ludwig (1881-1966)

O tio de Ludwig Binswanger, Otto Binswanger (1852-1929), que tratou de Friedrich Nietzsche (1844-1900) e conheceu Freud em 1894, por ocasião de um congresso em Viena, publicou trabalhos sobre a histeria e a paralisia geral. Nomeado professor em Iena, acolheu o sobrinho entre 1907 e 1908 no seu serviço da clínica psiquiátrica desta cidade, onde o jovem Ludwig ficaria conhecendo sua futura mulher, Hertha Buchenberger.”

Sua atração crescente pela filosofia, sua curiosidade e o contato assíduo com intelectuais e artistas de seu tempo, entre os quais Martin Buber (1878-1965), Ernst Cassirer (1874-1945), Martin Heidegger (1889-1976), Edmund Husserl (1859-1938), Karl Jaspers (1883-1969), Edwin Fischer, Wilhelm Furtwängler, Kurt Goldstein (1878-1965), Eugène Minkowski, o levaram a desenvolver uma concepção diferente da via freudiana. Mas esse afastamento não o faria renunciar à teoria. Seu respeito, sua admiração e amizade por Freud ficariam intactos ao longo dos anos, como mostram a sua intervenção do dia 7 de maio de 1936, por ocasião do octogésimo aniversário de Freud, e também o seu texto de 1956, destinado à comemoração do centenário de nascimento do inventor da psicanálise, intitulado Meu caminho para Freud.”

publicou em 1930 Sonho e existência, em que misturava a concepção freudiana da existência humana com as de Husserl e de Heidegger. Foucault redigiria para essa obra, que ele traduziria com Jacqueline Verdeaux, um longo prefácio. Em 1983, na versão inglesa (inédita em francês) da apresentação do seu livro O uso dos prazeres, Foucault evocaria a sua dívida em relação a Binswanger e as razões pelas quais se afastou dele.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Joseph Roth, La Marche de Radetzky (1932), Paris, Seuil, 1982.

Bion, Wilfred Ruprecht

Bion foi o aluno mais turbulento de Melanie Klein, cujo dogmatismo rejeitou para construir uma teoria sofisticada do self e da personalidade, fundada em um modelo matemático e repleta de noções originais — pequenos grupos, função alfa, continente/conteúdo, objetos bizarros, pressupostos de base, grade, etc. — que, em certos aspectos, se assemelhavam às de Jacques Lacan, seu contemporâneo. Como este, tentou dar um conteúdo formal à transmissão do saber psicanalítico, apoiando-se em fórmulas e na álgebra, e, também como ele, apaixonou-se pela linguagem, pela filosofia e pela lógica, mas com uma perspectiva nitidamente cognitivista.”

Nascido em Muttra, no Pendjab, de mãe indiana e pai inglês, engenheiro especialista em irrigação, foi educado por uma ama-de-leite e passou a infância na Índia, no fim da era vitoriana e no apogeu do período colonial. Não sem humor, diria que todos os membros de sua família eram <completamente malucos>. Em sua autobiografia, apresentou sua mãe como uma mulher fria e aterrorizante, que lhe lembrava as correntes de ar geladas das capelas inglesas.”

Só gostava das atividades esportivas e permaneceu virgem até seu casamento, aos 40 anos. Em janeiro de 1916, foi incorporado a um batalhão de blindados e logo estava no campo de batalha de Cambrai, no meio dos obuses e do fogo da guerra. Saiu em 1918 com a patente de capitão, uma sólida experiência da fraternidade humana e dos artifícios da hierarquia militar, de que se serviria anos depois.”

Em 1932, contratado como médico assistente na Tavistock Clinic de Londres, dirigiu tratamentos de adolescentes delinqüentes ou atingidos por distúrbios da personalidade, e ocupou-se durante cerca de dois anos do tratamento de Samuel Beckett.”

Amigo e admirador de James Joyce (1882-1941) desde 1928, Beckett se indispusera com ele dois anos depois, após ter repelido as pretensões amorosas de sua filha, Lucia Joyce, doente de esquizofrenia e tratada por Jung. Atormentado por uma mãe conformista e abusiva, que desconhecia seu talento e desaprovava sua conduta, sofria em 1932 de graves distúrbios respiratórios, de dores de cabeça e de diversos problemas crônicos ligados ao alcoolismo e a uma tendência para a vadiagem. Assim, decidira fazer uma psicoterapia, a conselho de seu amigo, o doutor Geoffrey Thomson. O tratamento com Bion foi conflituoso e difícil. A cada vez que Beckett voltava para a casa de sua mãe em Dublin, sofria de terrors noturnos, torpor e furúnculos no pescoço e no ânus. Por isso, Bion acabou recomendando-lhe que se afastasse dela. Beckett não conseguiu e interrompeu a análise, depois de ter assistido, a conselho de Bion, a uma conferência de Jung na Tavistock Clinic, na qual este afirmava que os personagens de uma ficção são sempre a imagem mental do escritor que os criou.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Didier Anzieu, “Beckett et Bion”, Revue Française de Psychanalyse, Paris, Mentha, 1992. (artigo)

bissexualidade

Assim como todos os trabalhos modernos sobre o transexualismo tomaram por mitos fundadores a lenda de Hermafroditos e os amores da deusa Cibele, as reflexões sobre a bissexualidade sempre tiveram por origem o célebre relato dos infortúnios de Andrógino, feito por Aristófanes no Banquete de Platão”

Foi com a publicação, em 1871, de A descendência do homem, de Charles Darwin (1809-1882), que começou a se efetuar a passagem do mito platônico da androginia para a nova definição da bissexualidade, segundo as perspectivas da ciência biológica. Tratava-se, na época, de dotar o estudo da sexualidade humana de uma terminologia adequada em matéria de <raça>, constituição, espécie, organicidade, etc. A contribuição da embriologia foi decisiva, na medida em que ela pôde mostrar, graças à utilização do microscópio, que o embrião humano era dotado de duas potencialidades, uma masculina e outra feminina. Daí a idéia de que a bissexualidade já não era apenas um mito, porém uma realidade da natureza. Através dos ensinamentos de Carl Claus e, mais tarde, em contato com seu amigo Wilhelm Fliess, Freud adotou, por volta de 1890, a tese da bissexualidade.”

Em seu livro de 1896 sobre as relações entre o nariz e os órgãos genitais, Fliess expôs sua concepção dupla da bissexualidade e da periodicidade, estabelecendo um vínculo entre as dores da menstruação e as do parto, todas remetidas a <localizações genitais> situadas no nariz. Daí decorria a tese da periodicidade, segundo a qual as neuroses nasais, os acessos de enxaqueca e outros sintomas do ciclo feminino obedeciam a um ritmo de 28 dias, como a menstruação.”

Em seguida, após seu rompimento com Fliess, Freud apagaria os vestígios desse empréstimo [teoria da bissexualidade psíquica], sobretudo por causa da delirante história de plágio em que seria implicado por intermédio de Hermann Swoboda.”Pense 2x: com Freud nada é delirante!

Weininger assimilava o judeu à mulher, sublinhando, além disso, que esta era pior do que aquele, uma vez que o judeu, como encarnação de uma dialética negativa, podia ter acesso à emancipação. Assim, a noção de bissexualidade serviu para reinstaurar sob nova forma os velhos preconceitos da época clássica.”

Depois de fazer da bissexualidade o núcleo central de sua doutrina da homossexualidade e da sexualidade feminina, Freud considerou que essa noção era de completa obscuridade, na medida em que não podia articular-se com a de pulsão. Em 1937, porém, deu meia-volta e, em Análise terminável e interminável, mencionou o nome de Fliess e voltou à idéia de 1919 de que ambos os sexos recalcavam o que dizia respeito ao sexo oposto: a inveja do pênis, na mulher, e, no homem, a revolta contra sua própria feminilidade e sua homossexualidade latente: Já mencionei em outros textos que, na época, esse ponto de vista foi-me exposto por Wilhelm Fliess, que se inclinava a ver na oposição entre os sexos a verdadeira causa e o motivo originário do recalque. Só faço reiterar minha discordância de outrora ao me recusar a sexualizar o recalque dessa maneira, e portanto, a lhe dar um fundamento biológico, e não apenas psicológico.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Freud, Bate-se numa criança (1919);

Wilhelm Fliess, Les Relations entre le nez et les organes génitaux féminins présentés selon leurs significations biologiques (Viena, 1897), Paris, Seuil, 1977;

Otto Weininger, Sexe et caractère (Viena, 1903), Lausanne, L’Âge d’Homme, 1975;

Jacques Le Rider, Le Cas Otto Weininger. Racines de l’antiféminisme et de l’antisémitisme, Paris, PUF, 1982.

Bleuler, Eugen (1857-1939)

Inventor dos termos esquizofrenia e autismo, diretor, depois de August Forel, da prestigiosa clínica do Hospital do Burghölzli, por onde passaram todos os pioneiros do freudismo, Eugen Bleuler foi o grande pioneiro da nova psiquiatria do século XX e um reformador do tratamento da loucura comparável ao que tinha sido, um século antes, Philippe Pinel (1745-1825).”“fundou uma verdadeira escola de pensamento, o bleulerismo, que marcou o conjunto do saber psiquiátrico até aproximadamente 1970, data a partir da qual generalizou-se em todos os países do mundo um novo organicismo, nascido da farmacologia.”

Descendentes diretos de uma certa tradição francesa, de Charcot, por um lado, e por outro de Hippolyte Bernheim, os principais especialistas em doenças mentais e nervosas procuravam elaborar uma nova clínica da loucura, fundada não na abstração classificadora, mas na escuta do paciente: queriam ouvir o sofrimento dos doentes, decifrar sua linguagem, compreender a significação de seu delírio e instaurar com eles uma relação dinâmica e transferencial.” “do mesmo modo que Freud transformara a histeria em um paradigma moderno da doença nervosa, Bleuler inventava a esquizofrenia para fazer dela o modelo estrutural da loucura no

século XX.” “Através desse deslocamento, Bleuler renovava o gesto do alienismo do Século das Luzes, segundo o qual a loucura era curável, pois todo indivíduo insano conservava em si umresto de razão, acessível por um tratamento apropriado: o tratamento moral. Ora, no fim do século XIX, as diversas teorias da hereditariedade-degenerescência tinham abolido essa idéia de curabilidade, em proveito de um constitucionalismo da doença mental, tendo como corolário o confinamento perpétuo.”

Se Bleuler queria adaptar a psicanálise ao asilo, Freud sonhava conquistar, desde Viena, via Zurique, a terra prometida da psiquiatria de língua alemã que, nessa época, dominava o mundo. E contava com a fidelidade de Jung, assistente de Bleuler no Burghölzli, para ajudá-lo nesse empreendimento. Contra Bleuler, ele conservou a noção de auto-erotismo e preferiu pensar o domínio da psicose em geral sob a categoria da paranóia, ao invés da esquizofrenia. Opôs assim o sistema de Kraepelin à inovação bleuleriana, mas tranformou-o de cima a baixo, a fim de estabelecer uma distinção estrutural entre neurose, psicose e perversão.

Quanto a Jung, separou-se primeiro de Bleuler, seu mestre em psiquiatria, e depois de Freud, que fizera dele o seu sucessor. Decidiu utilizar a expressão demência precoce, e não a de esquizofrenia, e inventou em 1910 a palavra introversão, que preferiu a autismo, para designar a retirada da libido para o mundo interior do sujeito.”

Depois de ser contestada pela antipsiquiatria, a clínica freudo-bleuleriana foi marginalizada, a partir de 1970, pela elaboração de um Manual diagnóstico e estatístico dos distúrbios mentais (DSM III, IV etc.), de inspiração comportamentalista e farmacológica.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Jean Garrabé, Histoire de la schizophrénie, Paris, Seghers, 1992.

Manfred Bleuler (filho deste Bleuler), La Pensée bleulérienne dans la psychiatrie suisse, Nervure, VIII, novembro de 1995, 23-4.

Bonaparte, Marie

Filha de Roland Bonaparte (1858-1924), neto de Lucien, irmão do imperador, Marie Bonaparte, nascida em Saint-Cloud, era portanto sobrinha-bisneta de Napoleão Bonaparte (1769-1821). Sua mãe morreu por ocasião de seu nascimento e a menina teve uma infância e uma adolescência trágicas. Educada pelo pai, que só se interessava por suas atividades de geógrafo e antropólogo, e por sua avó paterna, verdadeira tirana doméstica, ávida de sucesso e de notoriedade, Marie tinha tudo de uma personagem romanesca.

Seu casamento arranjado com o príncipe Jorge da Grécia (1869-1957), homossexual depravado, alcoólatra e conformista, fez dela uma alteza real coberta de honras e de celebridade, mas sempre obcecada pela procura de uma causa nobre e principalmente preocupada com sua frigidez. Quando encontrou Freud em Viena em 1925, a conselho de René Laforgue, estava à beira do suicídio e acabava de publicar, sob o pseudônimo de Narjani, um artigo no qual louvava o mérito de uma intervenção cirúrgica, em voga na época, que consistia em aproximar o clitóris da vagina, a fim de transferir o orgasmo clitoridiano para a zona vaginal. Acreditava assim que poderia curar sua frigidez e não hesitou em experimentar a operação em si própria, mas sem nunca obter o menor resultado.

Graças ao minucioso trabalho de Célia Bertin, única a ter acesso aos arquivos da família, conhecemos a vida dessa princesa, estimada por Freud, que reinou como soberana sobre a Sociedade Psicanalítica de Paris, da qual foi um dos 12 fundadores, ao lado de René Laforgue, Adrien Borel, Rudolph Loewenstein, Édouard Pichon, Raymond de Saussure, René Allendy, etc. Tradutora incansável da obra freudiana, organizadora do movimento francês, que financiou em parte com seu dinheiro, Marie Bonaparte consagrou a vida à psicanálise, com um entusiasmo e uma coragem invejáveis. Lutou em favor da análise leiga e, diante do nazismo, adotou uma atitude exemplar, negando-se a qualquer concessão. Pagou um resgate considerável para arrancar Freud das garras da Gestapo, salvou seus manuscritos e instalou-o em Londres com toda a família. Foi sua atividade eficaz a serviço da causa que lhe valeu ocupar um lugar central na França e tornar-se uma das personalidades mais respeitadas do movimento freudiano.

Depois da Segunda Guerra Mundial, tornou-se uma espécie de monstro sagrado, incapaz de perceber as ambições, os sonhos e os talentos das duas novas gerações francesas (a segunda e a terceira).

Durante a primeira cisão (1953) e às vésperas da segunda (1963), opôs-se fanaticamente a Jacques Lacan, a quem detestava e que a tratava de <cadáver de Ionesco>. Na verdade, ele lhe tirava o papel de chefe de escola, ao arrastar consigo a juventude psicanalítica francesa.

Apesar de sua extensão, a obra escrita de Marie Bonaparte é bastante medíocre,à exceção de alguns belos textos, entre os quais uma obra monumental sobre Edgar Allan Poe (1809-1849), ilustração dos princípios freudianos da psicobiografia, um artigo de 1927 sobre Marie-Félicité Lefebvre (um caso de loucura criminosa) e os seus famosos <cadernos>: os Cinco cadernos de uma menina, nos quais comentou sua análise e suas lembranças da infância, e os Cadernos negros, diário íntimo em que relatou todos os detalhes de sua vida e as confidências que Freud lhe fez sobre vários assuntos.

Ao contrário do tratamento dos outros discípulos, o da princesa foi interminável. Fez-se em alemão e em inglês, por etapas sucessivas, de 1925 a 1938: cinco a seis meses nos primeiros anos, um a dois meses nos anos seguintes. Desde o início, Marie recebeu uma forte interpretação. Depois de um sonho, em que ela se via em seu berço assistindo a cenas de coito, Freud afirmou peremptoriamente que ela não tinha apenas ouvido essas cenas, como a maioria das crianças que dormem no quarto dos pais, mas que ela as vira em pleno dia. Assustada e sempre preocupada em obter provas materiais, recusou essa afirmação e protestou que não tinha tido mãe. Freud manteve o que afirmara e lembrou a presença de sua ama. Finalmente, Marie decidiu interrogar o meio-irmão de seu pai, que tratava dos cavalos na casa em que passou a infância. Constrangido, o velho contou como tivera relações sexuais em pleno dia, diante do berço de Marie. Ela tinha pois visto cenas de coito, de felação e de cunilíngua.” Um bebê nem sabe separar as partes do corpo!

Durante a análise, ele evitou que ela tivesse uma relação incestuosa com o filho, e impôs certos limites às suas experiências cirúrgicas, sem conseguir, entretanto, impedi-la de passar ao ato. Deve-se dizer que a sua situação contratransferencial era difícil: ao longo de toda a duração dessa análise, Freud sofreu temíveis operações da mandíbula, a fim de combater a progressão do câncer. Como poderia ele, em tais condições, interpretar o gozo sentido por Marie ao manejar o bisturi?”

Deduziu uma psicologia da mulher da qual o inconsciente era esvaziado. Afastando-se simultaneamente da escola vienense e da escola inglesa, distinguiu três categorias de mulheres: as que reivindicam e procuram apropriar-se do pênis do homem; as que aceitam e se adaptam à realidade de suas funções biológicas ou de seu papel social; as que renunciam e se afastam da sexualidade.Essas teses não teriam eco na França, onde o debate sobre esse tema seria conduzido por Simone de Beauvoir (1908-1986) e depois pelos alunos de Lacan (François Perrier e Wladimir Granoff) e Françoise Dolto.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Celia Bertin, La Dernière Bonaparte, Paris, Perrin, 1982.

Borderline (caso-limite)

A noção do borderline faz parte do vocabulário clínico norte-americano e anglo-saxão próprio da corrente da Self-Psychology e, sob certos aspectos, do pós-kleinismo da década de 1960. Perpassa igualmente o neofreudismo e o culturalismo e acabou se integrando à terminologia psicanalítica francesa, sob o nome de états-limites (no plural).”

Otto Fenichel foi um dos primeiros, em 1945, a sublinhar a existência desse tipo de patologia: Existem personalidades neuróticas que, sem desenvolver uma psicose completa, possuem inclinações psicóticas, ou manifestam uma propensão a se servir de mecanismos esquizofrênicos em caso de frustração. Essa noção foi consideravelmente desenvolvida, mais tarde, nos trabalhos de Heinz Kohut e Otto Kernberg, que propôs o termo <organização fronteiriça> para demonstrar com clareza que o estado borderline era estável e duradouro.

Foi o psicanalista norte-americano Harold Searles, especialista em esquizofrenia, quem produziu, nesse mesmo período, os trabalhos mais pertinentes a respeito dessa questão, a partir de uma longa prática na Chesnut Lodge Clinic, uma das mecas do tratamento psicanalítico das psicoses, onde trabalhou Frieda Fromm-Reichmann depois de sua emigração da Alemanha. Marcado pelo ensino de Harry Stack Sullivan, Searles desarticulou a definição clássica da loucura à maneira dos artífices da antipsiquiatria, mostrando que, nos pacientes borderline, o eu funciona de maneira autística. Em seu célebre livro de 1965, O esforço de enlouquecer o outro, Searles criticou a ortodoxia, freudiana sublinhando como a prática ortodoxa da transferência pode desembocar numa estratégia de terror, que consiste em tornar o paciente dependente do analista. Contrastou com isso uma prática da análise inspirada no tratamento dos estados borderline e fundamentada na idéia de reconhecimento mútuo entre o terapeuta e o paciente.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Otto Kernberg, com Michael A. Selzer, Harold W. Koenisgsberg, Arthur C. Carr e Ann H. Appelbaum, La Thérapie psychodinamique des personnalitiés-limites (N. York, 1989), Paris, PUF, 1995.

Bowlby, John

A partir de 1948, dirigiu uma pesquisa sobre as crianças abandonadas ou privadas de lar, cujos resultados tiveram repercussão mundial sobre o tratamento psicanalítico do hospitalismo, da depressão anaclítica e das carências maternas, assim como sobre a prevenção das psicoses. Em 1950, tornou-se assessor da ONU, onde suas teses tiveram papel considerável na adoção de uma carta mundial dos direitos da infância. Um ano depois, publicou o seu relatório Maternal Care and Mental Health, no qual mostrou que a relação afetiva constante com a mãe é um dado fundamental para a saúde psíquica da criança. No fim da vida, sempre apaixonado por biologia e etologia, redigiu a biografia de Charles Darwin (1809-1882). Estudou minuciosamente a primeira infância do sábio, suas doenças psicossomáticas, suas dúvidas e depressões, pintando um vigoroso quadro da época vitoriana e das reações que a revolução darwiniana suscitou na Inglaterra.”

Brasil

Em 1890, o antigo Hospício Pedro II foi transformado em hospital de alienados, na mais pura tradição do gesto de Philippe Pinel (1745-1826). A força da nosologia francesa foi tal, durante cerca de uma década, que a expressão <estar Pinel> passou, na linguagem corrente, a significar <estar louco>.

Foi nesse terreno da primeira reforma asilar que Juliano Moreira, baiano e negro, introduziu a nosografia alemã. Amigo de Emil Kraepelin e excelente conhecedor da Europa, foi nomeado professor na Universidade da Bahia com a idade de 23 anos, e tomou em 1903 a direção do Hospital Nacional de Alienados do Rio de Janeiro. Nove anos depois, graças à sua ação, a psiquiatria se tornou uma especialidade autônoma no currículo dos estudos médicos. Fundador da psiquiatria brasileira moderna, Juliano Moreira foi também o primeiro no país a adotar e divulgar a doutrina freudiana.

a atração dos filhos de família pelas mulheres de cor provinha das relações íntimas da criança branca com a sua ama negra: uma sexualidade carnal e sensual.”

Assim como sob a monogamia surgia sempre a prática mal encoberta da poligamia, sob o monoteísmo perfilavam-se todas as variantes de um politeísmo selvagem. Assim, quando foi instaurado, por um homem negro, um saber psiquiátrico que visava arrancar a loucura das práticas mágicas, a clivagem se repetiu. A nova ordem não conseguiu pôr termo às antigas tradições terapêuticas do transe e das possessões (o candomblé).”

Reservada inicialmente, no período entre as duas guerras, à grande burguesia paulista e a médicos preocupados em seguir as regras ortodoxas da IPA, a psicanálise se tornou, na segunda metade do século, ao desenvolver-se no Rio e em outras cidades, a nova psicologia das classes médias brancas, formadas na universidade. Tomou o lugar da antiga sociologia comteana.”

Nessa época, a análise didática era obrigatória, e Marcondes, que não fizera análise, não podia formar alunos. Aliás, em 1931, teve que enfrentar um charlatão chamado Maximilien Langsner, que obteve grande sucesso em São Paulo. Esse homem usava um nome vienense e praticava a telepatia, proclamando-se o melhor discípulo de Freud. Temendo que esse espetáculo desacreditasse a psicanálise nos meios médicos, Marcondes pediu a Freud que desmascarasse o impostor, o que ele logo fez.”

Dissolvida em 1944, a SBP se reconstituiu em um grupo puramente paulista, a Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), reconhecida pela IPA no Congresso de Amsterdam de 1951. A partir desse momento, houve intercâmbios entre Londres e São Paulo. Apaixonados pelas teorias de Melanie Klein e seus discípulos, analistas paulistas atravessaram o Atlântico para receber uma formação na British Psychoanalytical Society (BPS). Foi o caso de Virgínia Bicudo. Depois de cinco anos em Londres, ela trouxe as suas experiências clínicas da Tavistock Clinic e as ensinou. Por sua vez, Frank Philips, voltando de Londres, realizou no seio do grupo paulista seminários técnicos e teóricos de inspiração kleiniana. À influência compósita argentina acrescentou-se então a do kleinismo, nitidamente mais implantado em São Paulo do que no Rio. Posteriormente, Wilfred Ruprecht Bion, convidado por Philips, se tornaria um dos mestres do grupo paulista.”

Essa expansão da psicanálise nas duas grandes cidades rivais, São Paulo e Rio, assim como na região sul do país, permitiu ao freudismo brasileiro recuperar progressivamente o seu atraso em relação ao movimento argentino, sem com isso fazer emergir em suas fileiras chefes de escola de estatura comparável à dos argentinos. Deve-se dizer que, desde a origem, a situação no Brasil era diferente. Efetivamente, a escola brasileira, na ausência de um sólido movimento migratório durante o período entre as duas guerras, não tivera <fundador> que fosse ao mesmo tempo didata e teórico. E ela só encontrou a sua identidade, de uma cidade à outra, ao filiar-se ora à escola inglesa ou a algumas correntes norte-americanas, ora à escola argentina. Entretanto, desenvolveu uma grande atividade clínica em diversas instituições (hospitais e centros de saúde). A partir de 1960, com a criação da COPAL (futura FEPAL) e depois da Associação Brasileira de Psicanálise (ABP, 1967), ela se tornou, ao lado da escola argentina, a segunda grande potência do freudismo latino-americano.”

Em 31 de março de 1964, depois de dez anos de governo social-democrata, durante os quais o presidente Kubitschek inaugurou a cidade de Brasília, o marechal Castello Branco, apoiado pelos Estados Unidos e pelas classes médias, derrubou o presidente João Goulart e instaurou uma ditadura que duraria vinte anos. (…) Orgulhosos de construírem um Brasil novo, os tecnocratas, os conservadores e os anticomunistas afirmaram sua vontade de governar sem o sufrágio das massas. Os partidos foram dissolvidos, as forças armadas reorganizadas.”

Helena Besserman Vianna, psicanalista de extrema esquerda e membro da outra sociedade (SBPRJ), tomou conhecimento desse artigo. Suas opiniões radicais eram conhecidas, pois ela se expressara publicamente na SBPRJ, por ocasião de um debate com Bion, perguntando-lhe se ele aceitaria analisar um torturador. A assembléia respondera que essa pergunta era <provocadora, nem científica nem construtiva>. Helena enviou a Marie Langer o artigo da Voz Operária, acompanhado do nome e do endereço de Leão Cabernite [psicanalista carioca ligado aos militares, que dentre seus pacientes contava com um torturador, denunciado pelo jornal proletário acima] escritos à mão, para que ela o publicasse em sua revista Cuestionamos e pedisse à direção da IPA a abertura de um inquérito. Marie Langer mandou imediatamente o artigo a Serge Lebovici, presidente da IPA, e a diversos responsáveis do movimento psicanalítico. Depois, publicou-a em sua revista. Marie Langer tinha um peso considerável na IPA, em razão de sua notoriedade e de seu engajamento contra todas as ditaduras latino-americanas.

Preocupado com as conseqüências desse caso para a imagem da psicanálise no mundo, Lebovici preveniu Cabernite e David Zimmermann [sobrenome de fascista], membro da SPPA (Porto Alegre) e presidente da COPAL, que lhe respondeu logo que essa publicação era <um jornaleco que não merecia respeito>.” “Não só os autores negavam qualquer participação de Amílcar Lobo nesse gênero de atividade, como também acusavam o denunciante de fomentar um complô para desestabilizar a psicanálise brasileira, no momento em que ia se realizar o IV Congresso da ABP.” O Amílcar é o Lobo do homem.

Identificada por uma perícia grafológica, Helena Besserman Vianna pagou caro a denúncia do torturador. Sua sociedade recusou-se, durante dois anos, a lhe conferir o título de membro titular, ao passo que ela tinha teoricamente direito a ele, considerando-se o seu currículo. Pior ainda, o conselho de administração da SBPRJ se transformou em tribunal interno para acusá-la de delação, envolvendo a pessoa de um inocente (Amílcar Lobo), de plágio dos textos de seus colegas e enfim de falta de respeito para com Bion: uma verdadeira degradação pública. Posteriormente, Helena foi vítima de uma tentativa de atentado fracassada, por parte da polícia brasileira, prevenida por Amílcar Lobo. Ela só foi definitivamente reabilitada em 1980, quando um ex-prisioneiro revelou publicamente as atrocidades de Amílcar Lobo. Entretanto, nem Cabernite, nem Zimmermann, nem Lebovici prestaram contas de seu erro durante esse período, o que provocou uma verdadeira tempestade nas fileiras das duas sociedades do Rio.”

o lacanismo se implantou maciçamente na universidade, em particular nos departamentos de psicologia, trazendo assim uma cultura e uma identidade para a profissão de psicoterapeuta, abandonada pela ABP, que tendia, apesar de algumas exceções, como Inês Besouchet (1924-1991) por exemplo, a favorecer os médicos. Daí a eclosão paralela de múltiplos grupos, com diversas orientações: 26 no Rio, 27 em São Paulo, 7 no Rio Grande do Sul, 9 em Minas Gerais, ao todo 70 associações, reunindo cerca de 1500 psicoterapeutas. Essa cifra elevava o efetivo total dos psicanalistas freudianos a mais de 3000.”

as extravagâncias xamanísticas do célebre lacaniano brasileiro dos anos 1970, Magno Machado Dias, mais conhecido sob o nome de MDMagno.” “Analisado por Lacan em alguns meses, esse esteta carioca culto e sedutor, professor de semiologia na universidade, fundou em 1975, com Betty Milan, outra analisada de Lacan, o Colégio Freudiano do Rio de Janeiro (CFRJ). Tornou-se o terapeuta dos membros de seu grupo, que freqüentavam seu divã e seus seminários. MDMagno deu ao lacanismo carioca uma furiosa expansão, e o seu Colégio foi o núcleo inicial de todos os grupos formados depois no Rio, por cisões sucessivas. Evoluindo para um culturalismo radical, Magno se apresentava como fundador da psicanálise <abrasileirada>. Segundo a nova genealogia, Freud era o bisavô, Lacan o avô, MDMagno o pai.”

Na Bahia, Emilio Rodrigué, grande figura da escola argentina, realizou uma experiência única em seu gênero. Dissidente da APA, próximo de Marie Langer e do grupo Plataforma, recebera sua formação didática em Londres, com Paula Heimann e Melanie Klein. Instalando-se em 1974 no coração da civilização brasileira, entre a negritude e a colonização, casado com uma sacerdotisa da aristocracia do candomblé, apaixonado por historiografia, conseguiu reunir em torno de si um grupo composto de todas as tendências do freudismo. Assim, foi um dos raros psicanalistas, talvez o único, a estabelecer uma ponte entre todas as culturas do continente latino-americano, sem ceder nem ao universalismo abstrato, nem ao culturalismo desenfreado. Daí o seu lugar de mestre socrático, único na psicanálise neste fim do século XX.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Jurandir Freire Costa, História da psiquiatria no Brasil, Rio de Janeiro, 1976; (documentário)

Marialzira Perestrello, História da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro. Suas origens e fundação, Rio de Janeiro, Imago, 1987.

Breuer, Josef (1842-1925)

A imagem desse brilhante clínico vienense que tratou de Franz Brentano, Johannes Brahms (1833-1897), Marie von Ebner-Eschenbach e seus colegas médicos, o ginecologista Rudolf Chrobak (1843-1910), Theodor Billroth e o próprio

Freud, foi deformada por Ernest Jones. Em sua biografia de Freud, este o apresentou como um terapeuta tímido e estúpido, incapaz de compreender a questão da sexualidade. Foi necessário esperar pelo trabalho deAlbrecht Hirschmüller, historiador da medicina de língua alemã, para que fosse escrita a história das relações entre Freud e Breuer, longe das lendas da historiografia oficial.” “Josef Breuer não era crente nem praticante. Como Freud, permaneceu ligado à sua judeidade, sem proclamar nenhuma fé e defendendo os princípios da assimilação. Em 1859, orientou-se para a medicina, tornando-se aluno de Karl Rokitansky (1804-1878), de Josef Skoda, de Ernst von Brücke e, enfim, do assistente deste, Johann von Oppolzer(1808-1871), notável clínico geral, do qual foi por sua vez assistente. Foi no laboratório de fisiologia de Ewald Hering, rival de Brücke, que começou a trabalhar no problema da respiração. Essa formação fez dele o herdeiro de uma tradição positivista, originária da escola de Hermann von Helmholtz, pela qual se realizava a união de uma medicina de laboratório de estilo alemão e da medicina hospitalar vienense. Tornando-se célebre em 1868 por um estudo sobre o papel do nervo pneumogástrico na regulação da respiração, estudou depois os canais semicirculares do ouvido interno.”

Breuer e Freud tinham em sua clientela doentes mentais, principalmente mulheres histéricas da boa burguesia vienense. Assim, começaram a tornar-se, cada um a seu modo, especialistas em distúrbios psíquicos, o que os levou a assinarem juntos, em 1895, os famosos Estudos sobre a histeria.” “Sua amizade terminou na primavera de 1896. Entretanto, o conflito não foi nem violento nem definitivo, como aconteceu com Fliess e depois com Carl Gustav Jung. Constrangido por ter que pagar sua dívida financeira, Freud comportou-se com Breuer como um filho intransigente e revoltado. Suspeitou que ele quisesse tutelá-lo e acusou-o de ser oportunista e não ter a coragem de defender idéias novas. Na realidade, Breuer não tinha as mesmas ambições que Freud. Não procurando fazer nome na história das ciências nem tornar-se profeta de uma doutrina que iria abalar o mundo, mostrou-se sempre favorável à psicanálise.”

Brücke, Ernst Wilhelm von (1819-1892)

Brücke merece ser considerado o fundador da fisiologia na Áustria.”

Brücke ficara sabendo que eu cheguei várias vezes atrasado ao laboratório. Um dia, ele veio na hora em que eu deveria chegar e me esperou. […] O essencial estava em seus terríveis olhos azuis, cujo olhar me aniquilou. Aqueles que se lembram dos olhos maravilhosos que o mestre conservou até a velhice e que o viram encolerizado podem imaginar facilmente o que senti então.”Interpretação dos Sonhos

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Siegfried Bernfeld, Freud’s earliest theories and the school of Helmholtz, Psychoanalytic Quarterly, XIII, 1944, 341-62;

______. Freud’s scientific beginnings, American Imago, vol. 6, 1949, 163-96;

______. Sigmund Freud M.D., IJP, vol. 32, 1951, 204-17.

Caruso, Igor

em 1947, Caruso se separou sem traumas da WPV, cuja orientação lhe parecia excessivamente médica, excessivamente materialista, ou seja, excessivamente <americana>, para criar o primeiro círculo de trabalho vienense sobre a psicologia das profundezas. Mesmo continuando a ser freudiano, não aceitava os padrões de formação da IPA e, como Lacan, queria dar à psicanálise uma orientação intelectual, espiritual e filosófica. Assim, considerava-a, à luz da fenomenologia, como um método de edificação da personalidade humana (ou personalismo), destinado não a adaptar o sujeito ao princípio de realidade, mas a levá-lo a resolver as tensões resultantes da sua relação conflituosa com o mundo.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Igor Caruso, Psychanalyse et synthèse personnelle (Viena, 1952), Paris, Desclée de Brouwer, 1959.

castração

Em A interpretação dos sonhos todas as passagens relativas à castração, se excetuarmos uma alusão, aliás errada, a Zeus castrando Cronos, são acrescentadas em 1911 ou nas edições posteriores.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Stärcke, The Castration Complex

Charcot (1825-1893)

O nome de Jean Martin Charcot é inseparável da história da histeria, da hipnose e das origens da psicanálise, e também daquelas mulheres loucas, expostas, tratadas e fotografadas no Hospital da Salpêtrière, em suas atitudes passionais: Augustine, Blanche Wittmann, Rosalie Dubois, Justine Etchevery. Essas mulheres, sem as quais Charcot não teria conhecido a glória, eram todas oriundas do povo. Suas convulsões, crises, ataques, suas paralisias eram sem dúvida alguma de natureza psíquica, mas também eram conseqüência de traumas de infância, estupros, abusos sexuais. Em suma, da miséria da alma e do corpo, tão bem-descrita pelo mestre nas suas Lições da terça-feira.”

Graças ao método anátomo-clínico, descreveu a doença que levaria o seu nome: esclerose lateral amiotrófica.”

Foi em 1870 que se interessou pela histeria, por ocasião de uma reorganização dos setores do hospital. De fato, a administração tomou a decisão de separar os alienados dos epiléticos (não-alienados) e das histéricas. Como essas duas últimas categorias de doentes apresentavam sinais convulsivos idênticos, decidiu-se reuni-los em uma seção especial: a seção dos epiléticos simples.” “Charcot inaugurou assim um modo de classificação que distinguia a crise histérica da crise epilética e permitia à doente histérica escapar da acusação de simulação. Assim, abandonou a definição antiga de histeria, para substituí-la pelo conceito mais moderno de neurose.”

recorreu à hipnose: adormecendo as mulheres na Salpêtrière, fabricava sintomas histéricos experimentalmente, fazendo-os desaparecer imediatamente, provando assim o caráter neurótico da doença. Foi nesse ponto que seria atacado por Bernheim.” “em 1887, publicou Os demoníacos na arte, em colaboração com seu aluno Paul Richer (1849-1933). Para ele, tratava-se de encontrar nas crises de possessão e nos êxtases os sintomas de uma doença que ainda não recebera a sua definição científica.” “a fase epileptóide, quando a doente se contraía em uma bola e dava uma volta completa em torno de si mesma, a fase de clownismo, com seu movimento em arco de círculo, a fase passional, com seus êxtases, e enfim o período terminal, com suas crises de contraturas generalizadas. A isso Charcot acrescentava uma variedade <demoníaca> da histeria: aquela em que a Inquisição via os sinais da presença do diabo no útero das mulheres.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Désiré-Magloire Bourneville & Paul Regnard (org.), Iconografia fotográfica da Salpêtrière, “verdadeiro laboratório das representações visuais da histeria” (livro fotográfico).

Mon cher docteur Freud: Charcot’s unpublished correspondance to Freud, 1888-1893, anotações, tradução e comentários de Toby Gelfand, in: Bulletin of the History of Medecine, 62, 1888, 563-88.

Chistes e sua relação com o inconsciente, Os

Freud tinha paixão por aforismos, trocadilhos e anedotas judaicas, e não parou de colecioná-los ao longo de toda a sua vida. Como inúmeros intelectuais vienenses — Karl Kraus, p.ex. —, era dotado de um senso de humor corrosivo e adorava as histórias das Schadhen (casamenteiras judias) ou dos Schnorrer (pedintes), através das quais se exprimiam, por meio do riso, os principais problemas da comunidade judaica da Europa Central, confrontada com o anti-semitismo. Sob esse aspecto, como sublinha Henri F. Ellenberger, seu livro sobre o chiste é um pequeno monumento à memória da vida vienense: ali ele conta histórias de dinheiro e sonhos de glória, e piadas referentes ao sexo, à família, ao casamento, etc.”

QUE INFANTIL… “De Mark Twain (1835-1910) a Dom Quixote, distingue o humor, o cômico e o chiste propriamente dito. Todos os três, afirma, remetem o homem ao estado infantil, pois <a euforia que almejamos atingir por esses caminhos não é outra coisa senão o humor […] de nossa infância, idade em que desconhecíamos o cômico, éramos incapazes de espirituosidade e não precisávamos do humor para nos sentirmos felizes na vida>.”

Em 1916, Abraham Arden Brill redigiu a primeira versão do livro em inglês e escolheu a palavra wit como equivalente de Witz, com o risco de restringir a significação do chiste à espirituosidade intelectual, no sentido como dizemos que alguém <tem espírito>, ou <é uma pessoa espirituosa>, ou <faz tiradas oportunas>. Opondo-se a essa redução, James Strachey preferiu, em 1960, o vocábulo joke, que ampliou a significação do termo, estendendo-o até a blague, a brincadeira ou a farsa, com o risco de dissolver o dito espirituoso, ou seja, o aspecto intelectual do Witz freudiano, no campo mais vasto das diferentes formas de expressão do cômico. Na verdade, por trás dessa querela perfilava-se uma luta ideológica entre os ingleses e os norte-americanos [os anglo-saxões e os judeus?] pela apropriação da obra freudiana. É que Brill havia procurado, em sua tradução, <adaptar> o pensamento freudiano ao espírito de além-Atlântico, transformando certas blagues judaicas em piadas norte-americanas. Strachey, ao contrário, opondo-se a Brill, reivindicava uma fidelidade maior tanto ao texto freudiano quanto à língua inglesa (e não norte-americana) e à história vienense.” “Na França, foi Lacan, contrariando Marie Bonaparte, quem procurou traduzir Witz por trait d’esprit, assim dissociando o trait (rasgo, traço), como significante, do esprit (intelecto, engenho, espírito). A partir daí, os lacanianos, fascinados pelos trocadilhos do mestre, privilegiaram o termo Witz, preferencialmente a chiste, como se o emprego do termo alemão permitisse remeter o Witz freudiano a uma função simbólica da linguagem, a um traço significante não-redutível à diversidade das línguas. Em 1988, quando do lançamento da excelente tradução de Denis Messier, Jean-Bertrand Pontalis redigiu uma nota em que se recusou a traduzir Witz por trait d’esprit. Mesmo levando em conta o caráter positivo da contribuição teórica de Lacan, sublinhou, com justa razão, que o Witz tinha, no sentido freudiano, uma significação muito mais ampla e menos conceitual do que a leitura que dele propusera Lacan. Daí a opção de traduzir o livro como Le Mot d’esprit et sa relation à l’inconscient.”

Ver verbete agressão.

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Theodor Lipps, Komik und Humor. Eine psychologisch-ästhetische Untersuchung, Hamburgo, L. Voss, 1898;

Joël Dor, Introdução à leitura de Lacan, t. 1 (Paris, 1985), P. Alegre, Artes Médicas, 1992;

André Bourguignon, Pierre Cotet, Jean Laplanche & François Robert, Traduzir Freud (Paris, 1989), S. Paulo, Martins Fontes, 1992.

Cinco lições de psicanálise (Sobre a Psicanálise), 1910

Livro de Sigmund Freud, publicado pela primeira vez em inglês, no American Journal of Psychology, sob o título The Origin and Development of Psychoanalysis, numa tradução de H.W. Chase, e depois retraduzido por James Strachey em 1957, sob o título Five Lectures on Psycho-analysis. Publicado em alemão em 1910, sob o título Über Psychoanalyse. Traduzido para o francês em 1920 por Yves Le Lay, sob o título Origine et développement de la psychanalyse, e mais tarde, em 1923, sob o título Cinq Leçons sur la psychanalyse. Retraduzido por Cornélius Heim em 1991, sob o título Sur la psychanalyse. Cinq conférences, e depois, em 1993, por René Lainé & Johanna Stute-Cadiot, sob o título De la psychanalyse.”

Para Freud, esse momento marcou o fim de seu isolamento. No entanto, em 1914, em seu ensaio sobre A história do movimento psicanalítico, falou com certa leviandade das Cinco conferências, afirmando havê-las improvisado. Na verdade — e sua correspondência com Ferenczi o atesta —, redigiu-as durante todo o verão de 1909.”

O COMEÇO DO FIM: “Na época, eu contava apenas 53 anos, sentia-me jovem e saudável, e essa breve temporada no Novo Mundo foi, de maneira geral, benéfica para meu amor-próprio; na Europa, eu me sentia meio proscrito, enquanto ali me vi acolhido pelos melhores como um de seus pares. Foi como que a realização de um devaneio improvável subir ao púlpito de Worcester, para ali proferir as Cinco lições de psicanálise. A psicanálise, portanto, já não era uma formação delirante, havendo-se transformado numa parte preciosa da realidade.”

Inicialmente publicadas em inglês, essas cinco lições nada trazem de novo para quem conhece a essência da obra freudiana. No entanto, por sua clareza exemplar, têm uma função didática e constituem uma iniciação particularmente simples aos princípios gerais da psicanálise.” (veja instruções sobre a ordem da leitura de Freud ao final do post)

ESBOÇO DA OBRA:

A primeira conferência versa sobre a especificidade da abordagem psicanalítica da

neurose. A propósito disso, Freud evoca a história de Anna O. (Bertha Pappenheim) e a lembrança de Josef Breuer.

Na segunda conferência, explica de que modo o abandono da hipnose lhe permitiu captar a manifestação das resistências, do recalque e do sintoma, assim como seu funcionamento em relação ao surgimento de <moções> do desejo por ele qualificadas de <perturbadoras> para o eu.”

¹ Vocabulário intragável!

A conferência de Freud na quarta-feira à tarde, com efeito, foi perturbada pela intromissão de Emma Goldmann, a célebre anarquista norte-americana, acompanhada, nesse dia, por Ben Reitman, o <rei dos vagabundos>.

Em seu prefácio à tradução francesa de 1991, Jean-Bertrand Pontalis sublinhou a engenhosidade de que Freud deu mostras ao usar essa imagem do perturbador. Contudo, sublinhou também que a tática que consiste em desarmar o adversário em potencial comporta o risco de gerar, por força da moderação, um número excessivo de mal-entendidos. Assim, para não chocar o público norte-americano, Freud havia recuado, nesse momento, em relação às posições adotadas em 1905, em seus Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Essa concessão, entretanto, não evitaria que sua doutrina fosse assemelhada a um pansexualismo, tanto nos Estados Unidos quanto em todos os outros lugares.

Esse exemplo de deslizamento epistemológico, responsável por uma certa edulcoração da teoria, também responde pelo interesse desse livro. Nele, com efeito, podemos apreender como foi difícil o combate travado por Freud em prol do uso e da manutenção do termo sexualidade. Como sublinhou Jean Laplanche a esse respeito, <Ceder quanto à palavra já é ceder em ¾ quanto ao próprio conteúdo da idéia.>

cisão

Dá-se o nome de cisão a um tipo de ruptura institucional ocorrida no interior da IPAa partir do fim da década de 1920. O cisionismo é um processo ligado ao desenvolvimento maciço da psicanálise durante o entre-guerras e, mais tarde, durante a segunda metade do século XX. Atesta uma crise da instituição psicanalítica e a transformação desta num aparelho burocrático, destinado a administrar os interesses profissionais da corporação (análise didática e supervisão, análise leiga ou análise feita por médicos) a partir de regras técnicas (duração das sessões e dos tratamentos, currículo, hierarquias) que se tornaram contestáveis aos olhos de alguns de seus membros, a ponto de conduzi-los a rejeitá-las radicalmente e, depois, a promover uma secessão.”

O cisionismo, portanto, é o sintoma da impossibilidade de a psicanálise e o freudismo da segunda metade do século XX serem representados em sua totalidade unicamente pela IPA, ainda que ela seja a associação mais poderosa e mais legítima do mundo. Quanto mais importante é o movimento freudiano num país, mais freqüentes são as cisões. Por isso é que o cisionismo é realmente um fenômeno ligado ao desenvolvimento das instituições psicanalíticas.”

Somente a Grã-Bretanha conseguiu evitar as cisões, através de um arranjo interno da British Psychoanalytical Society (BPS) após as Grandes Controvérsias: em vez de levar a uma verdadeira cisão, os conflitos conduziram a uma divisão tripartite da própria BPS (kleinismo, annafreudismo e o Grupo dos Independentes).”

O termo difere, portanto, de cisma, muitas vezes empregado na terminologia inglesa e que, embora designe a contestação de uma autoridade legítima, tem uma conotação religiosa que não convém à inscrição da psicanálise no século. [hehe]”

A dissidência é um fenômeno historicamente anterior ao das cisões, contemporâneas da expansão maciça da psicanálise no mundo, e do advento da terceira geração psicanalítica mundial (Jacques Lacan, Heinz Kohut, Marie Langer, Wilfred Ruprecht Bion, Igor Caruso, Donald Woods Winnicott).” “De modo geral, emprega-se o termo dissidência para qualificar as duas grandes rupturas que marcaram os primórdios do movimento psicanalítico: com Alfred Adler, em 1911, e com Carl Gustav Jung, em 1913. Essas duas rupturas conduziram seus protagonistas a abandonar o freudismo e fundar, ao mesmo tempo, uma nova doutrina e um novo movimento político e institucional: a psicologia individual, no caso do primeiro, e a psicologia analítica, no que tange ao segundo.” “As dissidências de Wilhelm Stekel e Otto Rank, sob esse aspecto, são diferentes da adleriana e da junguiana, porquanto dizem respeito a certos aspectos da doutrina e não à sua totalidade. Trata-se, pois, de dissidências internas à história da teoria freudiana, da qual conservam quer o essencial, quer uma parte. A dissidência de Wilhelm Reich é da mesma ordem, tendo sido acompanhada, como a de Rank, de uma expulsão da IPA.”

Note-se que Lacan foi o único a utilizar a palavra excomunhão para designar a maneira como foi obrigado a deixar a IPA em 1963. Com isso, inscreveu sua ruptura com a legitimidade freudiana na linha direta do herem de Baruch Spinoza (1632-1677), que era um castigo de caráter leigo, e não religioso. (…) Censurando a instituição freudiana por já não ser freudiana, ele se viu coagido a fundar um novo lugar de legitimidade para o exercício da psicanálise — a École Freudienne de Paris (EFP) —, assim fazendo nascer um movimento que, apesar de se pretender freudiano, seria chamado de lacaniano. Essa é a contradição traduzida pela palavra excomunhão: também o jovem Spinoza foi coagido por seu herem a fundar uma filosofia spinozista.”

Claus, Carl (1835-1899) [não confundir com Karl Kraus]

Em 1874, Freud seguiu seus cursos, no momento em que Claus se dedicava a uma vasta polêmica com outro discípulo alemão de Charles Darwin, Ernst Haeckel. No ano seguinte, obteve por duas vezes uma bolsa para Trieste, onde efetuou pesquisas sobre as gônadas da enguia. Em 1990, Lucille Ritvo foi a primeira a estudar a importância do ensino de Carl Claus na gênese da adesão de Freud ao darwinismo, especialmente à tese da hereditariedade dos caracteres adquiridos.”

complexo

Nenhum outro termo instituído pela psicanálise para as suas necessidades adquiriu tanta popularidade nem foi mais mal-aplicado em detrimento da construção de conceitos mais exatos” F., História da psicanálise

Podemos encontrar diversos motivos para esta reserva de Freud. Repugnava-lhe uma certa tipificação psicológica (por exemplo, o complexo de fracasso), que implica o risco de dissimular a singularidade dos casos e, ao mesmo tempo, apresentar como explicação aquilo que constitui o problema.” “surge, com efeito, a tentação de criar tantos complexos quantos forem os tipos psicológicos que se imaginem” “Note-se que a aparente diversidade dos termos <paterno>, <materno>, etc., remete em cada caso para dimensões da estrutura edipiana, quer essa dimensão seja particularmente dominante em determinado sujeito, quer Freud pretenda dar um relevo especial a determinado momento da sua análise. E assim que, sob o nome de complexo paterno, ele acentua a relação ambivalente com o pai. O complexo de castração, embora o seu tema possa ser relativamente isolado, inscreve-se inteiramente na dialética do complexo de Édipo.” Hm.

No Dictionnaire de psychanalyse et psychotechnique publicado sob a direção de Maryse Choisy na revista Psyche, são descritos cerca de 50 complexos. Escreve um dos autores: <Tentamos dar uma nomenclatura tão completa quanto possível dos complexos conhecidos até agora. Mas todos os dias se descobrem mais.>” HAHAHA

complexo de Electra

Expressão utilizada por Jung como sinônimo do complexo de Édipo feminino, para marcar a existência nos dois sexos, mutatis mutandis, de uma simetria da atitude para com os pais.” Nem mesmo Simone de Beauvoir sabia disso.

compulsão à repetição (Wiederholungszwang)

Ver vocábulos das neuroses

Em psicopatologia concreta, processo incoercível e de origem inconsciente, pelo qual o sujeito se coloca ativamente em situações penosas, repetindo assim experiências antigas sem se recordar doprotótipo e tendo, pelo contrário, a impressão muito viva de que se trata de algo plenamente motivado na atualidade.”

Ela participa de tal modo da investigação especulativa de Freud nesse momento decisivo, com suas hesitações, impasses e mesmo contradições, que é difícil delimitar a sua acepção restrita como também a sua problemática própria.”

De um modo geral, o recalcado procura <retornar> ao presente, sob a forma de sonhos, de sintomas, de atuação

…o que permaneceu incompreendido retorna; como uma alma penada, não tem repouso até que seja encontrada solução e alívio” Quem diria que não foi escrito por um espírita! Mas um surdo pressentimento – ou grande ignorância – me faz pensar que um bisavô meu me deu esse presente e que desde criança esse é meu fado… Tudo se inverte quando percebemos que criamos isso, imploraríamos por isso se não existisse (única realidade possível) e vivemos nossa vida como a MALDIÇÃO DO ESCRITOR, espontaneamente, por paradoxal que pareça.

Lacan distingue duas ordens de repetição, as quais analisa numa perspectiva aristotélica: por um lado, a tyche, encontro dominado pelo acaso — de certo modo, ela é o contrário do kairos, o encontro que ocorre no <momento oportuno> — e que podemos assimilar ao trauma, ao choque imprevisível e incontrolável.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

F., Recordar, repetir, perlaborar

comunismo

instaurou-se entre o marxismo e o freudismo um vínculo que deu origem a uma corrente intelectual designada pelo nome de freudo-marxismo, cujos principais representantes foram os filósofos da Escola de Frankfurt e os psicanalistas da <esquerda freudiana>: desde Otto Fenichel a Wilhelm Reich, passando por Erich Fromm e Herbert Marcuse.”

Freud sempre manifestou uma hostilidade, se não ao marxismo, pelo menos ao comunismo e, acima de tudo, aos freudo-marxistas. Foi contra Reich que se mostrou mais violento, sobretudo em 1933, no momento em que os freudianos de todas as tendências deveriam ter se mobilizado contra o nazismo, e não contra os dissidentes marxistas de seu próprio movimento.(Freud, entretanto, jamais confundiu comunismo com nazismo, como mostra uma carta publicada por Jones, dirigida a Marie Bonaparte em 10 de junho de 1933: <O mundo está se transformando numa enorme prisão. A Alemanha é a pior de suas celas. O que acontecerá na cela austríaca é absolutamente incerto. Prevejo uma surpresa paradoxal na Alemanha. Eles começaram tendo o bolchevismo como seu inimigo mortal e terminarão com algo que não se distinguirá dele — exceto pelo fato de que o bolchevismo, afinal, adotou ideais revolucionários, ao passo que os do hitlerismo são puramente medievais e reacionários.>)

Em todos os países que se tornaram comunistas e onde a psicanálise estava implantada no começo do século, ela foi proibida e seus representantes foram perseguidos, caçados ou obrigados a se exilar. Naqueles em que ainda não existia antes do advento do regime comunista, ela também foi proibida. Num primeiro momento, de 1920 a 1949, e à medida que se deu a stalinização do movimento comunista e a transformação do regime soviético (e de seus satélites) num sistema totalitário, a supressão de todas as liberdades associativas e políticas acarretou a extinção pura e simples da prática psicanalítica e de suas instituições. (…) O pavlovismo tornou-se o padrão generalizado de uma psicologia chamada materialista, que foi contrastada com a ciência burguesa freudiana, dita espiritualista ou reacionária.” “Somente após a queda do comunismo, em 1989, é que o freudismo pôde implantar-se novamente na Rússia e na Romênia, ou encontrar uma nova via de introdução na Polônia, na Bulgária e na República Tcheca.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

André Jdanov, Sur la littérature, l’art et la musique (1948), Paris, Éd. de la Nouvelle Critique, 1950.

Conferências introdutórias sobre psicanálise

Livro inicialmente publicado por Sigmund Freud em 3 partes distintas, entre 1916 e 1917, e depois num único volume, em 1917, sob o título Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse. Traduzido para o francês pela primeira vez em 1921, por Samuel Jankélévitch, sob o título Introduction à la psychanalyse. Traduzido para o inglês pela primeira vez em 1920, sem indicação do tradutor mas sob a direção e com um prefácio de Stanley Granville Hall, sob o título A General Introduction to Psychoanalysis. Mais tarde, traduzido em 1922 por Joan Riviere sob o título Introductory Lectures on Psycho-Analysis, com um prefácio de Ernest Jones. A tradução de Joan Riviere foi posteriormente reeditada em 1935 sob o título A General Introduction to Psychoanalysis, incluindo os dois prefácios. Traduzido em 1964 por James Strachey sob o título Introductory Lectures on Psycho-Analysis.”

As Conferências introdutórias sobre psicanálise compreendem 3 grupos de aulas: as quatro primeiras aulas dizem respeito aos atos falhos; as 11 seguintes são dedicadas ao sonho, e as outras 13, que em si constituem a verdadeira segunda parte do livro, são agrupadas sob o título de Teoria geral das neuroses.”

Mas, nova dificuldade, é impossível assistir a uma sessão de psicanálise, embora seja corriqueiro observar apresentações de doentes no âmbito dos serviços de psiquiatria. Com efeito, a psicanálise pressupõe a fala espontânea e não controlada por parte do paciente; assim, ela versa sobre o que há de mais íntimo e mais pessoal, que não pode ser dito na presença de terceiros.”

As quatro primeiras conferências retomam de forma sintética o tema da Psicopatologia da vida cotidiana.” “Esse corpus de símbolos tende a constituir uma espécie de reservatório de traduções permanentes a que a análise deve recorrer quando o conteúdo manifesto não suscita nenhuma associação, o que, esclarece Freud, não pode ser atribuído a um fenômeno de resistência, mas à especificidade do material. Ele reconhece que esse conjunto de símbolos não deixa de evocar <o ideal da antiga e popular interpretação dos sonhos, um ideal do qual nossa técnica nos afastou consideravelmente>. Nesse ponto e em termos ainda mais claros, renova a advertência acrescentada em 1909 ao texto de A interpretação dos sonhos: <Não se deixem, contudo, seduzir por essa facilidade. Nossa tarefa não consiste em realizar façanhas. A técnica que repousa no conhecimento dos símbolos não substitui a que repousa na associação e não pode comparar-se com ela. Apenas a complementa e lhe fornece dados utilizáveis.>Dito isso, a freqüência das analogias simbólicas no sonho permite a Freud sublinhar o caráter universalista da psicanálise, bem diferente, nesse como em outros aspectos, da psicologia e da psiquiatria.”

as Conferências introdutórias sobre psicanálise não são apenas um manual didático, mas constituem, assim como a maioria das publicações de Freud, uma etapa no desenvolvimento de sua elaboração teórica. Isso se aplica, em particular, ao capítulo sobre a angústia, onde é retomado um certo número de observações clínicas, previamente desenvolvidas no âmbito dos históricos de casos, mas onde são igualmente introduzidas novas concepções, que anunciam as elaborações que Freud iria teorizar em Inibições, sintomas e angústia (1926).”

Em algumas linhas, esclarece sua reticência em fornecer, nesse como noutros pontos, um <guia prático para o exercício da psicanálise>, e demonstra através de exemplos como a transmissão dessa prática passa por vias que não podem ser as do ensino abstrato.” Seria um perigo para os não-hunters aprenderem sobre o Nen.

denegação, negação, for(a)clusão (Lacan, psicose)

Etimologia: do francês forclusion ou prescrição legal (decadência de prazo no Direito).

a denegação é um meio de todo ser humano tomar conhecimento daquilo que recalca em seu inconsciente. Através desse meio, portanto, o pensamento se liberta, por uma lógica da negatividade, das limitações que lhe são impostas pelo recalque.”

* * *

O termo foraclusão foi introduzido pela primeira vez por Lacan, em 4 de julho de1956, na última sessão de seu seminário dedicado às psicoses e à leitura do comentário de Sigmund Freud sobre a paranóia do jurista Daniel Paul Schreber.”

Para compreender a gênese desse conceito, há que relacioná-lo com a utilização que Hippolyte Bernheim fez, em 1895, da noção de alucinação negativa: esta designa a ausência de percepção de um objeto presente no campo do sujeito após a hipnose. Freud retomou o termo, porém não mais o empregou a partir de 1917, na medida em que, em 1914, propôs uma nova classificação das neuroses, psicoses e perversões no âmbito de sua teoria da castração. Deu então o nome de Verneinung ao mecanismo verbal pelo qual o recalcado é reconhecido de maneira negativa pelo sujeito, sem no entanto ser aceito: <Não é meu pai.> Em 1934, o termo foi traduzido em francês por négation.”

Laforgue propunha traduzir por escotomização tanto a renegação (Verleugnung) quanto um outro mecanismo, próprio da psicose e, em especial, da esquizofrenia. Freud recusou-se a acompanhá-lo e distinguiu, de um lado, a Verleugnung, e de outro, a Verdrängung (recalque). A situação descrita por Laforgue despertava a idéia de uma anulação da percepção, ao passo que a exposta por Freud mantinha a percepção, no contexto de uma negatividade: atualização de uma percepção que consiste numa renegação.”

Lacan inspirou-se no trabalho de Maurice Merleau-Ponty (1908-1961), Phénoménologie de la perception, e sobretudo nas páginas desse livro dedicadas à alucinação como <fenômeno de desintegração do real>, componente da intencionalidade do sujeito.”

O ULTRA-ROMÂNTICO VS. O PÓS-MOD. RESSEQUIDO

Normalmente, o alucinado vê coisas a mais, que não existem. Mas e se se tratasse de um alucinado lacaniano? É aquele que não vê o que existe. É como o niilista nietzschiano: cético, não acredita em nada para-além do empírico; mas, o que é pior, sequer dá fé ao empírico e imediato. Dá valor de nada ao que efetivamente está-aí. Não dá presença ao que é imaginário, como o niilista ingênuo clássico. Devaloração de todos os valores.

* * *

um recalque é algo diferente de uma rejeição F.

RECALQUE: Eu não quero lembrar como meu pai é ruim (neurose)

FORACLUSÃO: Não existe um pai que seja ruim. (psicose)

O conceito de foraclusão assumiu, em seguida, uma extensão considerável na literatura lacaniana, a ponto de os discípulos do mestre francês acabarem vendo (senão alucinando) sua existência no corpus freudiano.” He-he.

* * *

A forclusão distinguir-se-ia do recalque em dois sentidos: 1) Os significantes forcluídos não são integrados no inconsciente do sujeito; 2) Não retornam <do interior>, mas no seio do real, especialmente no fenômeno alucinatório.”

Em conclusão, podemos verificar, limitando-nos ao ponto de vista terminológico, que nem sempre o uso do termo Verwerfung abrange a idéia expressa por forclusão e que, inversamente, outras formas freudianas designam o que Lacan procura evidenciar.”

Ulteriormente, quando Freud tender a reinterpretar a projeção como um simples momento secundário do recalque neurótico, ver-se-á obrigado a admitir que a projeção — tomada neste sentido — já não é o fator propulsor essencial da psicose: <Não era exato dizer que a sensação reprimida (ünterdrückt) no interior era projetada para o exterior; reconhecemos antes que o que foi abolido (das Aufgehobene) no interiorvolta do exterior.>

O ego arranca-se à representação insuportável, mas esta está indissoluvelmente ligada a um fragmento da realidade e, realizando esta ação, o ego desligou-se também total ou parcialmente da realidade.” F., 1894

INFELIZMENTE A ÚNICA VÍTIMA DE UM COMPLEXO DE CASTRAÇÃO AQUI ERA O PRÓPRIO SEGISMUNDO: “Nos diversos textos de Freud existe uma ambigüidade indubitável quanto ao que é rejeitado (verworfen) ou recusado (verleugnet) quando a criança não aceita a castração. Será a própria castração? Neste caso, seria uma verdadeira teoria interpretativa dos fatos que seria rejeitada e não uma simples percepção. Tratar-se-á da <falta de pênis> na mulher? Mas então é difícil falar de uma <percepção> que seria recusada, porque uma ausência só é um fato perceptivo na medida em que é relacionada com uma presença possível.”

[Para Lacan,] a forclusão consiste então em não simbolizar o que deveria sê-lo (a castração): é uma <abolição simbólica>.” De acordo com a enantiodromia ou necessidade do retorno do recalcado (forcluído, neste caso) e homeostase das pulsões, o forcluído tem de re-advir no real em forma de ALUCINAÇÃO (ex: quando o Pequeno Hans vê seu dedo ser decepado).

Esse assunto é uma bosta de árido e confuso. Consultar bibliografia complementar!

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Jacques Damourette & Édouard Pichon, “Sur la signification psychologique de la négation en français” (1928), Le Bloc-notes de la Psychanalyse, 5, 1985, 111-32.

Deutsch, Helene

Aos 14 anos, a despeito de sua inteligência e sua beleza, Helene era deprimida, marcada pela hostilidade da mãe em relação a ela e pela tentativa de estupro de que tinha sido vítima por parte do irmão. Para grande escândalo da família, tornou-se então amante de um homem casado e conhecido em toda a cidade: Herman Lieberman. Esse eminente dirigente socialista, que seria ministro do governo polonês no exílio em Londres em 1940, lhe apresentou Rosa Luxemburgo, figura histórica, de quem ela falaria ainda com entusiasmo e admiração no fim da vida, aos 85 anos.”

encontrou Felix Deutsch, jovem médico atraído pelas idéias freudianas, com quem se casou no ano seguinte.”

Seduzido pela inteligência e pelos conhecimentos da jovem, Freud quis fazer dela sua principal discípula e acelerou o curso das coisas.”

seu livro mais importante, Psicologia da mulher, que seria, em 1949, a referência psicanalítica maior de Simone de Beauvoir (1908-1986) em O segundo sexo.”

As longas décadas que se seguiram — ela viveu até os 98 anos — foram ritmadas pelas tensões e conflitos de uma vida conjugal insatisfatória e pela nostalgia da paixão amorosa que marcou sua juventude. Sem dúvida, era essa uma das razões de seu apego à Polônia natal. Manifestava esse sentimento por um forte sotaque, o que fazia com que seus amigos dissessem que <ela falava cinco línguas, todas em polonês>. A grande dama [selvagem] de um freudismo sem concessões, criticando tão severamente a Ego Psychology quanto a standardização, à moda americana, da análise didática, desprovida segundo ela daquele espírito militante ao qual aderira apaixonadamente durante a sua juventude, foi então reconhecida e celebrada no continente americano.”

diferença sexual (A QUESTÃO FREUDO-FEMINISTA)

Razão da cisão kleiniana, que reconhece uma libido masculina e outra feminina.

Quando Simone de Beauvoir (1908-1986) publicou O segundo sexo, em junho de 1949, anunciou desde logo que a reivindicação feminista já estava ultrapassada. Para abordar esse tema a sério, após uma guerra que, na França, permitira às mulheres obterem o direito de voto, era preciso, doravante, tomar uma certa distância. Beauvoir não sabia que seu livro estaria na origem, após um longo desvio pelo continente norte-americano, de uma transformação simultânea dos ideais do feminismo e dos do freudismo.” “Beauvoir estudou a sexualidade à maneira de um historiador e tomou o partido da escola inglesa [kleinismo].” “A seu ver, a questão feminina não era assunto das mulheres, mas da sociedade dos homens, a única responsável, em sua opinião, pela submissão a ideais masculinos.”

O FALO HERMAFRODITA OU BINOMIAL DE LACAN: “o falo é assimilado a um significante puro da potência vital, dividindo igualmente os dois sexos e exercendo, portanto, uma função simbólica. Se o falo não é um órgão de ninguém, nenhuma libido masculina domina a condição feminina.”

Na França, essa leitura lacaniana do falocentrismo abriu caminho, entre 1968 e 1974, para teses diferencialistas encontradas sob a pena de autores — em geral mulheres e psicanalistas — preocupados em definir as características de uma identidade feminina liberta de qualquer substrato biológico ou anatômico. Assistiu-se então, em seguida à reformulação lacaniana, ao surgimento de um feminismo psicanalítico francês que, embora apoiando-se no livro fundador de Simone de Beauvoir, procurou ora contestá-lo radicalmente, ora corrigir seu aspecto naturalista e existencialista através de uma nova referência a Freud.” “Daí esse feminismo radical que renunciou, ao mesmo tempo, ao universalismo iluminista e à concepção freudiana da sexualidade.”

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Luce Irigaray, Speculum de l’autre femme, 1974;

Juliet Mitchell, Psychanalyse et féminisme, 1974;

Michèle Montrelay, L’Ombre et le nom, Paris, Minuit, 1977.

Dolto, Françoise

Em 1949, Françoise Dolto expôs à Sociedade Psicanalítica de Paris (SPP) o caso de duas meninas psicóticas, Bernadette e Nicole. A primeira gritava, sem conseguir fazer-se ouvir. Humanizava os vegetais e coisificava os seres humanos. A segunda permanecia muda, embora não fosse surda. Dolto teve a idéia de pedir à mãe de Bernadette que fabricasse um objeto que teria, para a criança, o papel de um bode expiatório. Deu-lhe o nome de <boneca-flor>: uma haste coberta de tecido verde no lugar do corpo e dos membros, uma margarida artificial para representar o rosto. Bernadette projetou no objeto as suas pulsões mortíferas e começou a falar, enquanto Nicole saía de seu mutismo. Com essa <boneca-flor>, Dolto integrava à sua prática a técnica dos jogos e, embora não tivesse conhecimento, na época, dos trabalhos de Melanie Klein, referia-se implicitamente a uma clínica das relações de objeto, desprovida, entretanto, da temática kleiniana do ódio, da inveja e de qualquer forma de perseguição ligada à idéia de objeto mau. Dessa <boneca-flor>, sairia a representação particular que Dolto faria da imagem do corpo, mais próxima da concepção lacaniana do estágio do espelho do que da definição de Paul Schilder.”

Em janeiro de 1979, Françoise Dolto criou em Paris a primeira Casa Verde, para acolher crianças até a idade de 3 anos, acompanhadas dos pais. <Segundo Dolto, tratava-se de evitar os traumas que marcam a entrada na pré-escola e de manter a segurança que a criança adquiriu no nascimento.>, declarou Jean-François de Sauverzac. Essa experiência teve sucesso e muitas casas verdes foram abertas no Canadá, na Rússia, na Bélgica, etc.”

Tornou-se a figura mais popular da França freudiana, mas foi criticada pelos meios psicanalíticos, que a acusavam de pôr o divã na rua.<Cientista, ela se comportava à maneira dos jornalistas, escreveu Madeleine Chapsal, dizendo o que tinha a dizer a cada dia, com urgência e com desprezo pelo escândalo, pelo choque que poderia causar. Evidentemente, sofreu o contragolpe de sua deliberada imprudência. Foi atacada, afastada, desprezada. Nada disso a deteve.>

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:

Françoise Dolto, Psicanálise e pediatria (Paris, 1939), Rio de Janeiro, Zahar, 1980; O caso Dominique (Paris, 1971), Rio de Janeiro, Zahar, 1981; Seminário de psicanálise de crianças (Paris, 1982, 1988), Rio de Janeiro, Zahar, 1985.

Doolittle, Hilda, dita H.D. (1886-1961)

Publicou várias antologias importantes e um romance autobiográfico, que relata os conflitos da bissexualidade em uma mulher apaixonada por um homem e por outra mulher. Analisada por Sigmund Freud em 1933-1934, publicou em 1956 um depoimento sobre o seu tratamento, composto de duas partes: O advento, conjunto de notas tomadas diariamente durante a análise e Escrito na parede. Reminiscências de uma análise com Freud, relato redigido 10 anos depois.”

duplo vínculo, double bind

Dilema do esquizofrênico, referente à incapacidade de decodificação da mensagem exterior.

egooueu

é corrente em psicanálise admitir que a noção de ego só se teria revestido de um sentido estritamente psicanalítico, técnico, após aquilo a que se chamou a virada de 1920. Esta mudança profunda da teoria, aliás, pode ter correspondido, na prática, a uma nova orientação, voltada para a análise do ego e dos seus mecanismos de defesa, mais do que para a elucidação dos conteúdos inconscientes. É claro que ninguém ignora que Freud falava de ego (Ich) desde os seus primeiros escritos, mas afirma-se que isso acontecia, geralmente, de forma pouco especificada, pois o termo designava então a personalidade no seu conjunto. Considera-se que as concepções mais específicas que atribuem ao ego funções bem determinadas no seio do aparelho psíquico (no Projeto para uma psicologia científica [Entwurt einer Psychologie, 1895], por exemplo) são prefigurações isoladas das noções da segunda tópica.”

o ego do amor-próprio segundo La Rochefoucauld

Freud não só encontra e utiliza acepções clássicas, opondo, por exemplo, o organismo ao meio, o sujeito ao objeto, o interior ao exterior, como emprega o próprio termo Ich nestes diferentes níveis, chegando até a jogar com a ambigüidade da utilização desta palavra; isso mostra que não exclui do seu campo qualquer das significações atribuídas aos termos ego (moi) ou eu (je).”

O ego só põe em funcionamento o processo primário quando não está em condições de fazer funcionar as suas defesas normais (atenção e evitação, por exemplo). No caso da lembrança de um traumatismo sexual (ver: a posteriori) o ego é surpreendido por um ataque interno e só pode <deixar agir um processo primário>. A situação da <defesa patológica> em relação à palavra [associação de complexos] não é pois determinada de maneira unívoca; em certo sentido, o ego é na verdade o agente da defesa, mas, na medida em que só pode se defender separando-se daquilo que o ameaça, abandona a representação inconciliável a um tipo de processo sobre o qual não tem domínio [primário].” Deixa os resquícios para os sonhos encobertos – mas isso só enquanto o trauma não adquire o status de ferida aberta (mórbido). Do contrário, a vida do sujeito em seus processos secundários estará avariada.

para que a alucinação seja evitada e para que a descarga não se produza quer na ausência quer na presença do objeto real, é necessário que seja inibido o processo primário que consiste numa livre propagação da excitação até a imagem.” HOMEOSTASE: “É a permanência nele de um nível de investimento que permite ao ego inibir os processos primários, não só aqueles que levam à alucinação, mas também os que seriam suscetíveis de provocar desprazer (= defesa primária).”

Processos psíquicos primários X Processos psíquicos secundários

Medidas drásticas e daninhas (representações alucinatórias, angústia, pânico) ou que no mínimo se exaurem rapidamente X Amadurecimento do Consciente por interferência paulatina do Supereu (pulsões refreadas, noção de dosagem da energia responsiva)

Ex: sonho X introjeção moral

Esta ambigüidade constitutiva do ego reaparece na dificuldade em dar um sentido unívoco à noção de interior, de excitação interna.Só sei que não sei nem o eu.

O mais engraçado é que, se Freud estivesse correto, a vontade que o eu moral tem de dormir (esgotamento energético) para repor o equilíbrio das representações,ciclicamente perturbado, significaria que a instância auto-cultivada de nosso Ser é impotente e escrava justamente dos instintos mais selvagens (os processos primários salvam os secundários, os secundários em nada são uma evolução ou aperfeiçoamento daqueles). Precisa o Ser esgotar-se a todo momento a fim de estar novamente compensado (energizado) e não sucumbir. Ou seja, a homeostase do sistema (acima) é a liberação dos processos primários, não sua inibição. A leitura de ponta-cabeça do cânone freudiano faria infinitamente mais sentido. Ler Schopenhauer e entendê-lo corretamente (às avessas do que entendeu F.) faria infinitamente mais sentido e nos faria economizar tempo do nosso intelectual, ajudando-nos a compreender melhor nós mesmos e nossa Vontade…

1ª TÓPICA, 2ª TÓPICA, 3ª TÓPICA, TÓPICA ANNAFREUDIANA & “TÓPICA INGLESA” OU HETERODOXA (só para citar as MAIS TRADICIONAIS), uma salada irreconciliável: “É claro que não se pensaria em contrapor a esta orientação da Ego psychology uma exposição do que seria a <verdadeira> teoria freudiana do ego: antes nos impressiona a dificuldade em situar numa única linha de pensamento o conjunto das contribuições psicanalíticas para a noção de ego.” “Mas, se a única energia de que dispõe o aparelho psíquico é a energia interna proveniente das pulsões, aquela de que o ego poderia dispor não pode deixar de ser secundária, derivada do id. Esta solução, que é a mais geralmente admitida por Freud, não podia deixar de conduzir à hipótese de uma <dessexualização> da libido, hipótese da qual se pode pensar que apenas localiza numa noção, por sua vez também problemática, uma dificuldade da doutrina.” “A idéia de uma gênese do ego é cheia de ambigüidades, que aliás foram mantidas por Freud ao longo de toda a sua obra e que só se agravaram com o modelo proposto em Além do princípio do prazer

ego ideal ou eu ideal

Derivado do estágio narcísico, representa o supra-sumo da concepção de um eu perfeito. Sensação de onipotência. Psicose.

O ego ideal é ainda revelado por admirações apaixonadas por grandes personagens da história ou da vida contemporânea, caracterizados pela independência, orgulho, autoridade. Quando o tratamento progride, o ego ideal se delineia, emerge como uma formação irredutível ao supereu.” Lagache, La psychanalyse et la structure de la personnalité

ego, ideal do ou superego

Instância da moral.

Ego Psychology (Psicologia do eu)

foi a Ego Psychology que serviu de grande referência doutrinal, na segunda metade do século, para análises intermináveis e cronometradas, imobilizadas no silêncio, reservadas à burguesia urbana rica e praticadas por médicos preocupados com o prestígio social e a rentabilidade financeira. Essa técnica psicanalítica, aliás, seria violentamente criticada, no interior da própria IPA.”

PAÍS DE RETARDADOS: “As diferentes correntes desse freudismo norte-americano, quaisquer que sejam suas (numerosas) variações são quase sempre perpassadas por uma